Dr. John escrita por Nancy Boy


Capítulo 1
Isnt it obvious?


Notas iniciais do capítulo

Aqui está a minha one de hoje. Inspirada (e com pedaços) das músicas The Sharpest Lives e principalmente Dr. John, do Mika (http://www.youtube.com/watch?v=mZ1zxozHHq4)
Eu devo ser o único ser problemático que fez uma fic de aniversário com um aniversário que não fosse o de 2012, mas tá, né.
Espero que gostem, hm.



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Eu procuro por alegria em um lugar estranho.

Como em quase todas as noites, eu estava no fundo de um bar. Mas dessa vez sozinho.

Era um daqueles dias onde tudo dá errado, a vida é uma merda e você só quer se afogar em veneno. E para coroar, era meu aniversário, o que significava que eu estava ficando mais velho. Que beleza.

Eu não sabia se estava agindo certo. Quer dizer, eu havia feito o certo, claro, mas ficaria feliz? Um dia, pelo menos? Será que Dr. John estava me guiando corretamente?

Ah, Dr. John. Eu ainda não conseguia decidir se gostava dele ou não.

Semanas atrás, eu jurava que não precisava de um psicólogo, apesar de todos dizerem que sim. E por todos, quero dizer minha mãe, meu pai, Mikey, Ray, Bob e... Frank. Eu mandara repetidamente todos eles cuidarem da própria vida, mas quando Frank chegou e disse, com aqueles olhinhos tristes, que gostaria muito que eu procurasse ajuda, foi a gota d'água. Ele parecia tão preocupado... desesperado, até. Não consegui resistir.

Claro que não falei para o Bert. Como faria isso? "Oi, eu estou vendo um psicólogo por sua causa". Ele ficaria realmente puto. Então fui escondido na primeira consulta com o tal Dr. John, de quem tanto me falaram, convencido de que só iria ouvir besteiras. Mas não foi bem assim.

Não sei porque — talvez seja um dom mágico de psicólogos —, eu falei para aquele estranho tudo que estava acontecendo em minha vida. Contei sobre Bert, como ele se tornou importante para mim, sobre as noitadas juntos, as bebidas, as drogas, o sexo descompromissado... E eu fui falando muito animado, até ele me perguntar sobre os outros. "E o que seus pais e amigos acham disso?". O rosto de Frank me veio à mente e eu murchei completamente. Admiti que eles queriam que eu me afastasse de Bert. Mas eles não entendiam, ele era meu amigo, eu só o estava acompanhando...

— Só amigo, sr. Way?

Mais uma vez, Dr. John me calou. Eu não precisei falar nada, pois ele logo continuou:

— Alguém sabe que você se apaixonou?

Eu estava pronto para dizer "não", mas, novamente, lembrei de Frank. Ele me conhecia como ninguém, e eu via o ciúme estampado nele toda vez que eu saía com Bert.

— Talvez... uma pessoa saiba.

— Já conversou com ela sobre isso?

— Não... Quer dizer, ele que me fez vir aqui, isso conta?

Ele anotou algo em sua prancheta e não respondeu.

— Bem, sr. Way – ele falou então, encarando-me com certo fervor, apesar de ainda profissionalmente. — Acho que você já sabe o que fazer. A vida que está levando está te matando. Você está se afundando em vícios.

Eu bufei, irritado. Se fosse para ouvir isso, era melhor ter ido na casa da minha mãe, e seria de graça.

— Então o que você vai fazer, me encaminhar para o AA?

— Não. Isso é um passo futuro. Agora, você precisa se livrar de outro vício que não o álcool, que está te fazendo mal e que só você pode afastar.

— Qual?

— O Bert.

Eu fiquei de boca aberta. Ele estava louco se achava que eu faria isso. Eu acabara de admitir, pela primeira vez, que estava apaixonado pelo cara!

Levantei e o xinguei de umas vinte coisas diferentes, indo em direção à saída. Ele me observou impassível até eu chegar à porta; então falou.

— Observe, Gerard. Preste atenção nas pessoas ao seu redor. Você não precisa de uma vida perigosa para ser feliz.

Eu fui embora.

Quis ignorá-lo, realmente quis; mas na próxima vez que encontrei Bert, já estava hesitante. Será que eu deveria mesmo me afastar dele? Não pensei nisso por muito tempo, já que não demorava para que eu ficasse bêbado, rendendo-me com apenas um beijo.

Mas fui até Dr. John de novo. Falei que estava confuso, que eu sabia que existiriam consequências para o que eu estava fazendo, mas que meus sentimentos estavam me atrapalhando. Ele me aconselhou a ir devagar, recusar algumas saídas, ir empurrando Bert para longe aos poucos. Mas eu não conseguia.

— O que eu estou fazendo errado? — perguntei certa vez, já quase desesperado. — Porque eu continuo tentando, mas algo não está dando certo...

— Você precisa arrumar força de vontade em algum lugar, Gerard – ele me respondeu, já não me chamando mais de "sr. Way". — Sei que é difícil, mas procure algo em que se apoiar. Coloque outra coisa ou pessoa no lugar de Bert em sua mente.

Não era fácil. Bert já desconfiava de que algo estava errado, pois eu me afastava cada vez mais, e eu sempre acabava voltando atrás no progresso quando ele me pressionava. Parecia impossível resistir.

Por fim, Dr. John disse que eu precisava tentar um caminho mais drástico.

— Seu aniversário é na semana que vem, não é? — ele perguntou, afirmando que tomara conhecimento do fato pela minha ficha. — Use-o. Marque essa data como a definitiva.

— Como assim?

— Separe-se de Bert, Gerard. Você tem que pôr um ponto final nisso.

Eu disse que sim, faria isso. Fiquei a semana inteira remoendo os sentimentos, pensando em como faria aquilo, de que forma, porque... O tempo passou rápido demais, e quando eu vi, já era dia nove.

Chamei Bert para o bar que sempre frequentávamos, e ele apareceu muito feliz, dizendo que já estava com saudades de passarmos um tempo lá. Eu senti meu coração querer parar quando o vi, um bolo se formando na garganta. Eu faria aquilo, sabia que sim.

Arrumando coragem não sei de onde, sentei em frente à ele e desabafei tudo. Disse que estava indo em um psicólogo, e que havia percebido que estava acabando com minha vida, e que precisava mudar. Não falei que queria me afastar dele; falei que queria trazê-lo comigo. Queria que ele também percebesse isso tudo, e que seguisse o mesmo caminho. Mas, como eu esperava, ele riu.

— Tá, Gee, falou que você tá indo num psicólogo por minha causa. Me sinto lisongeado.

— É sério, Bert.

O rosto dele mudou um pouco, ficando em dúvida.

— Como assim, "é sério"?

— Eu vou parar de beber, e de todo o resto. Quer você queira ou não. Mas você pode vir comi...

— Como é?

Ele aumentou o tom de voz e os outros clientes do local já nos observavam com vívido interesse.

— Você é idiota, Gerard? Quer abandonar uma vida boa assim?

— Quero abandonar uma vida idiota.

— Ah, agora é idiota, é? Não era idiota semana passada, quando você tava na minha cama com o meu uísque, era?

— Cala a boca, Bert, você sabe que eu tenho razão.

— Tem razão, você sempre tem razão, seu merda...

E por aí foi. Nós continuamos a brigar, gritando um com o outro em pleno bar, e só paramos quando um funcionário disse que seríamos expulsos. Então Bert bufou, olhou para mim com uma raiva que eu nunca presenciara antes e foi embora.

Eu sentei de novo e fiquei lá, encolhido no fundo do lugar, até agora. Havia brigado com alguém que eu amava... ou julgava amar. Não sei se é amor de verdade quando se sente tanta raiva assim; talvez seja. Mas ele não sentia o mesmo, isso deu para ver. Ele nunca sentiu.

Fiquei me amargurando, deixando para trás momentamente a decisão de fugir do álcool ao beber cerveja após cerveja, pensando na merda que eu tinha feito. Eu perdera Bert para sempre agora. Mas acho que ele poderia ir embora, eu superaria. Ele poderia ir assim como a sanidade tinha me abandonado.

De repente, vi uma mão pegar o copo que eu segurava e colocá-lo ao lado. Então percebi um baixinho se sentando à minha frente.

— Hey – Frank me cumprimentou.

— Hey.

— Eu soube o que aconteceu.

— Como?

— Bert reclamou com o Quinn, que reclamou com o Ray, que...

— Tá, tá, já entendi. Então, tá feliz?

Frank deu de ombros e passou o dedo pela borda do copo do qual eu bebia momentos antes.

— Você... — ele falou, baixo, sem olhar para mim. — Você e ele terminaram tudo, mesmo?

— É, acho que sim.

— Sinto muito. Eu sei que você gostava dele.

Dessa vez, eu dei de ombros.

Ficamos em silêncio por alguns segundos, até que eu deixei uma risada amarga escapar por entre meus lábios.

— Eu devo ser o único infeliz que perde ao invés de ganhar no aniversário, né?

Frank me encarou com uma seriedade atípica.

— Você que escolheu isso.

— Ah, Frank! Já não basta o que eu passei, você ainda vai me dar lição...

— Não, não é isso que eu quis dizer. Você que escolheu perder ao invés de ganhar.

Eu franzi o cenho, confuso.

— Como assim?

— Você perdeu o Bert, Gee, mas poderia muito bem ganhar outra pessoa. Era só prestar um pouquinho mais de atenção.

Ele terminou a frase dando um estalido com os dedos na minha testa, o que o fez rir e me fez xingá-lo. Pensei no que ele falara, tentando entender a mensagem... Até que lembrei do que Dr. John me dissera. Eu precisava colocar outra pessoa no lugar de Bert.

Olhei para Frank, que observava o bar distraidamente. Aproximei-me por cima da mesa e o beijei rapidamente.

— Ger, o que...?

— Por favor, Frankie... — sussurrei, ainda apoiado na mesa para ficar perto dele. — Me deixa ganhar alguma coisa hoje.

— Pára com isso – ele me empurrou de volta para meu lugar, e eu o olhei desapontado.

— Por que não?

— Não vou ser só um substituto pra ele, Gee.

Eu suspirei. Ele estava certo, eu não poderia tratá-lo só como um substituto... Mas ele não seria isso. Droga, será que ele não entendia?

— Você não vai ser só isso, Frank. Você vai ser meu salvador.

Ele me encarou, corando de leve.

— Sério?

— Sério. Mas só se você quiser.

Ele olhou para baixo por um momento antes de voltar a falar.

— Eu seria um presente de aniversário bom o bastante pra te deixar feliz hoje?

Eu sorri. Dei a volta na mesa e me joguei sobre ele, sentando em seu colo e ignorando sua exclamação de desconforto.

— O que você acha? — perguntei, envolvendo meus braços em seu pescoço.

Ele sorriu, tímido.

— Não sei... talvez você tenha que perguntar ao Dr. John se é o melhor a fazer.

Eu ri.

— Acho que ele diria que sim.

— Com certeza diria... se ele sabe o que é bom pra ele, aquele espertinho...

Fiquei confuso novamente.

— Hã?

Frank riu, um tanto infantil.

— Eu sou amigo dele, Gee.

Eu xinguei alto de surpresa.

— Não acredito, Frank! Você fez isso tudo de propósito esse tempo todo!

Ele sorriu, um daqueles sorrisos que fazem tudo parecer perfeito. E, olhando bem... Estava tudo perfeito, não estava? Percebi que o que poderia ser meu pior aniversário... estava sendo o melhor.

— Respondendo a sua pergunta – murmurei, aproximando meu rosto do dele e o ouvindo ofegar. — Já tem algo que me deixou feliz hoje, e que já foi o melhor presente que eu poderia ganhar.

— Qual?

— Seu sorriso. Você já me deu seu sorriso.

Ele corou de novo, mas não desviou o olhar.

— Eu acho que consigo melhorar isso – falou, olhando para minha boca sugestivamente.

— Como?

— Te dando meus lábios.

Ele venceu a pouca distância que nos separava e me beijou.

É, não tinha mais dúvidas. Não importa como fora o resto do dia, do ano ou de toda a minha vida: aquele estava sendo o melhor momento. E aquele era o melhor aniversário.

E não sei porque... Algo me disse que um certo psicólogo estava sorrindo naquele instante.


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Notas finais do capítulo

Olha, os discursos de outras pessoas sobre o Gee hoje ficaram tão lindos que é melhor eu nem tentar fazer um -q
Tá, vou falar alguma coisa.
Gerard Way.
Ele é algo, pra mim, antes de tudo. Antes de ser lindo, antes de pegar o Frank (-q), antes até de ser talentoso. Ele é o fundador, o vocalista e um membro da My Chemical Romance. Essa é a maior importância pra mim. Ele está por trás de uma banda que, como todos sabem, salva vidas.
É ele que, cantando "You're in this alone" no meu ouvido, me faz perceber que realmente, contra todas as probabilidades, eu não estou sozinho.
É ele que, através da própria dor por ter perdido uma pessoa importante, me fez perceber que eu conseguiria seguir em frente.
É ele que me faz acompanhá-lo, gritando que eu não tenho medo de continuar vivendo.
É ele que nos diz para continuar correndo.
E eu sei que ele não vai ler isso. Mas vocês vão, e vocês vão perceber que é tudo verdade.
E, no fim das contas, ele sabe. Eu sei que ele sabe ;)