Durante o dia, tudo foi extremamente normal. Kibum cuidara de alguns pacientes com ferimentos leves. Uma menininha que havia caído do escorregador de um parquinho e fizera um pequeno corte na testa, um homem que se engasgara enquanto comia, uma professora que passou mal enquanto lecionava e uma senhora idosa que havia sentido tontura durante o banho. Casos pequenos, resolvidos com curativos, alguns exames simples e desejos de melhoras sinceros. Jonghyun não havia feito nenhum progresso, mas parecia ter acordado de bom humor, MinHo comentara que ele estava sorrindo, mesmo sob a máscara de oxigênio que ainda cobria seu rosto.

Saber que o outro estava feliz aquecia o coração de Kibum, fazendo-o sorrir sem se dar conta. Os cantos de seus lábios se moviam literalmente sozinhos, formando um grande sorriso, simples assim.

– Plantão mais uma vez? – MinHo indagou, ele e o amigo estavam novamente sentados no sofá confortável de seu consultório.

– Na verdade não, apenas quero fazer uma coisa – Kibum respondeu, ainda tinha um ar feliz em sua expressão.

O moreno apenas espreitou os olhos grandes para o outro. Não sabia o que estava se passando, mas ver Kibum alegre o deixava levemente tranquilo. Tinha uma amizade sincera para com o outro e se preocupava com seu bem-estar.

– Então tudo bem, estou indo para casa – se levantou, espreguiçando-se em seguida.

Arrumou todos os pertences em sua maleta negra, aposentando o jaleco num cabideiro discreto ao lado da porta. Vestia uma calça jeans clara e uma camisa branca com gola em formato V. Kibum gostava do amigo justamente por isso, seu estilo era realmente muito bom. Ele sabia combinar roupas simples e ligeiramente sem graça, tornando-as bem harmoniosas e bom, ele sempre ficava sexy.

– Au revoir – se despediram brevemente e seguiram direções opostas no grande corredor do hospital.

Enquanto MinHo se encaminhava para seu carro e provavelmente para seu apartamento, Kibum seguia para o quarto onde um de seus pacientes residia. Sim, Jonghyun.

A julgar pelo horário, ele já estava dormindo. Fato constatado ao adentrar o quarto mergulhado em completo silêncio. Assim como nas outras noites, a luz tornava tudo extremamente claro.

Sentou-se numa cadeira ao lado de Jonghyun e buscou outra lembrança em sua mente, decidindo em poucos segundos qual contaria.

– Hoje a história será sobre a última semana de ensaios, a semana que lhe causou uma boa e engraçada revolta.

Estávamos na última semana de ensaios, de aulas também. Os professores já não lecionavam mais e passávamos o tempo inteiro virados nas carteiras, conversando com nossos colegas sobre os planos que tínhamos para as férias. Eu estava preocupado com o festival, faltavam alguns detalhes importantes para serem resolvidos e eu não tinha tempo algum sobrando, devido aos ensaios da peça, que por serem os últimos, eram dobrados. Você havia finalmente decorado todas as falas e agora tudo parecia perfeito, estava tudo pronto para ser apresentado no sábado. Mas ainda assim tínhamos que passar horas e mais horas no teatro, encenando e nos preparando para o grande dia. Nós dois já éramos um pouco mais próximos e eu sentia uma certa simpatia por sua risada. Tirei um período de aula livre para acertar alguns detalhes sobre a festa do segundo dia. E enquanto caminhava pelos corredores, ouvi gritos vindos da parte externa da escola. Parei defronte uma das várias janelas e vi que alguns alunos formavam uma roda no jardim. Era uma briga, das feias. Consegui ver de relance dois garotos no chão, socando um ao outro com agressividade. Ninguém parecia interessando em apartar a briga, tudo que faziam era gritar e incentivar, gostando da cena estúpida que assistiam. Então outros dois entraram na roda, imponentes. Caminharam até os meninos e deram alguns socos e pontapés, separarando-os rapidamente. Eles eram fortes e resignados. Percebi que um dos garotos estava coberto de sangue e outro tinha o olho extremamente inchado. Dos que entraram mais tarde, um tinha um pequeno corte na sobrancelha direita e o outro um corte no lábio inferior. O diretor estava lá, com os braços cruzados e a cara amarrada. Eu conhecia todos os envolvidos, bom, pelo menos de vista. Os dois mais feridos eram Bang Yongguk e Choi Joonhong, mas todos o chamavam de Zelo. Lee Hyukjae, um aluno do terceiro ano e capitão do clube de futebol foi o que sofreu um corte na sobrancelha. Quanto ao último garoto, era você. Fiquei meio assustado ao perceber tal fato, mas não pude deixar de rir quando vi todos deixarem a temida sala do diretor, caretas emburradas estavam estampadas nos rostos de vocês. Mais tarde, enquanto fazíamos o percurso até minha casa, você contou que além de uma bronca, todos ganharam castigos. Yongguk e Zelo teriam que servir ponche no baile do segundo dia, Hyukjae limparia o salão no dia seguinte a festa e Kim Jonghyun ajudaria na montagem do palco onde encenaríamos a peça e também na organização do salão para o baile. Você estava revoltado, porque não teria tempo para si mesmo durante a última semana, que era sempre o melhor momento do ano letivo. A tal falta de tempo trazia consequências como convidar uma menina qualquer para acompanhá-lo por não ter tempo o suficiente para procurar a melhor, não ter tempo para comprar um terno novo, não ter tempo para planejar o que fariam após a festa, mesmo sabendo que fariam como em todos os outros anos, iriam para o cemitério abandonado e realizariam uma festinha particular. Coisas completamente banais. Mas ainda assim você estava revoltado, e sua expressão o deixava encantador. Os resto da semana foi bem normal, consegui finalmente arrumar todos os detalhes do festival e os ensaios ocorreram de forma calma e tranquila, estávamos prontos.

– Por hoje é só – Kibum sorriu – Amanhã conto como foi o festival.

E então deixou o quarto, feliz consigo mesmo. Era no mínimo estranho sentar-se numa cadeira e contar momentos antigos para alguém que nem ao menos estava ouvindo, porque Jonghyun não esboçava nenhuma reação, apenas continuava na mesma posição durante todo o tempo, dormindo profundamente. Mesmo assim, era algo que fazia bem a Kibum. Era apenas a segunda noite, mas se sentia bem por de alguma forma desabafar as lembranças preciosas que habitavam seu íntimo.