Piloto De Fuga escrita por Blue Butterfly


Capítulo 5
Capítulo 5




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/211011/chapter/5

Abri os olhos e a primeira coisa que vi foi o teto branco com pequenos anjos esculpidos em mármore, em seguida os grandes panos de tons pastéis que rodeavam minha cama, e por fim, sentado ao meu lado, Edward.

Agora que estava claro eu podia ver o grande hematoma na sua face direita, as marcas de insônia debaixo de seus olhos e o corte que já estava cicatrizando. Seus olhos estavam abertos, as pupilas dilatadas pelo sono, o corpo enrijecido e a expressão fria.

-Você ficou – eu me surpreendi, a voz meio rouca pelo sono.

-Eu disse que ficaria.

Ele me olhou, parecia muito cansado.

-Não dormiu?

-Não vim aqui para dormir, vim aqui para ver você.

Eu tentei não me prender aquelas palavras e prossegui, cansada de ser atacada por suas mentiras tão convincentes.

-Mas você podia ter dormido, não precisava ficar acordado a noite inteira me olhando. Não há perigo nessa casa.

 Minha voz tremeu com a mentira e eu esperei que ele não tivesse percebido isso. Era tão difícil continuar mentindo, continuar enganando-o. Por mais que eu o odiasse, não achava justo me aproveitar da sua confiança para traí-lo. Mas não fora isso que ele fizera comigo? Seria tão errado devolver na mesma moeda?

 Aquelas nunca seriam questões fáceis de responder e eu resolvi me levantar e comer alguma coisa para me distrair, seria o melhor naquela situação. Mais uma vez ele me seguiu em silêncio, olhando meio nervoso toda vez que passávamos por alguma janela ou porta, até que paramos novamente na cozinha.

 -Me espere aqui – eu pedi me aproximando da porta – Eu vou comprar pão e leite para nós.

 -Acho que não posso – ele discordou – Eu tenho que ir.

 O fitei, assustada. Ele não podia ter visto todo o meu plano, eu não tinha interpretado tão mal. Mas bastou ver seus olhos para que eu entendesse que ele não ia embora porque sabia que eu o trairia, senão não haveria aquele pedido de desculpas em seu olhar.

 -Então espere que ao menos eu compre alguma coisa para você levar, eu prometo que não vou demorar. Você pode reunir os mantimentos e os remédios enquanto me espera.

 Ele pensou por um momento, dividido, então acenou um sim e saiu da cozinha enquanto eu saía pela porta. Do lado de fora da casa eu respirei profundamente, suspirando e me sentindo aliviada por não estar mais com ele, não ter mais que fingir. Andei rápido até a padaria, sabia que, se eu demorasse, ele não me esperaria, e eu precisava de sua confiança para poder ajudar Jacob. Naquela hora da manhã o lugar estava calmo, só havia um velhinha na minha frente dividida entre geléia de moranga e de laranja. A atendente sorriu ao me ver e chamou uma das funcionárias ociosas para me atender.

 -Bom dia Isabella– a moça me cumprimentou sorrindo.

 -Bom dia Raquel, Lídia, Rosa – eu cumprimentei sorrindo de volta para elas.

 -O que vai querer, querida?

 -Eu preciso de três caixas de leite, dois pacotes de pão de leite, dez pães franceses, um pote de margarina, outro de manteiga, geléia de morango e cinco bombas de chocolate – era tudo o que eu conseguiria carregar até em casa.

 As atendentes se entreolharam, surpresas com o meu pedido um tanto grande para alguém que, teoricamente, morava sozinha, então eu tive que mentir para tirar a dúvida de suas expressões.

 -Estou passando um tempo com os Black, vocês não acreditam o quanto eles comem no café da manhã, ainda mais quando há visitas.

 As moças sorriram, mais calmas depois que eu me expliquei e logo tudo estava em duas sacolas grandes e pesadas.

 -Aqui está, Isabella querida. E nós sentimos muito pelo que te aconteceu – Raquel me falou com um sorriso morto.

 Meu sorriso desapareceu, eu concordei com a cabeça e paguei minha compra, saindo dali com a sensação de que meu coração se partia mais um pouco com a dor da perda.

 Estava atravessando a rua quando um carro preto e grande parou na minha frente e a janela ao lado do motorista desceu, revelando o Senador Caius, Jacob e meu futuro sogro. A porta do passageiro foi aberta e antes que eles me pedissem eu entrei no carro com compra e tudo. Nós rodamos pelo bairro até para numa rua deserta, assim que o carro estacionou Jacob virou para trás e me perguntou, parecendo aliviado:

 -Você está bem?

 -Estou – respondi.

 -Fiquei tão preocupado quando você não me ligou…

 -Eu não podia, ele teria percebido.

 -Ele? – dessa vez era o Senador que me olhava – O anarquista já está na sua casa?

 -Sim, ele soube que eu cheguei e foi me ver. Eu tenho que voltar logo se não ele vai embora e eu não saberei quando ele voltará.

 -Claro, nós entendemos – o Senador voltou a cabeça para frente.

 -Isabella, o que você pretende fazer? – Jacob perguntou, angustiado.

 -Não sei bem, vou pedir que ele volte para me ver.

 -Ele voltará? – o major perguntou.

  -Sim, eu acho.

  Os três homens me encararam naquele momento. Eles não queriam um achismo, eles queriam uma certeza.

  -Isabella, acho que devemos terminar logo com isso – Jacob me disse.

  -Mas vocês não querem os outros? – eu perguntei confusa.

  -É perigoso de mais, não quero ver você correndo perigo, não vale a pena. Talvez se prendermos o anarquista ele revele onde estão os outros.

  Eu balancei a cabeça negativamente, eu sabia que aquilo não daria certo. Edward jamais contaria a alguém onde estava os outros. Ele não trairia os outros assassinos. Pois até mesmos os assassinos tinham um código de conduta. Onde é que estaria o meu?

  -Ele não vai dizer – eu revelei por fim.

  -Ela está certa – o Senador concordou – Esse anarquista é um resiliente, a prisão não vai espantá-lo, eles são animais que não tem noção do que é certo ou do que é errado. Pelo menos eu prefiro pensar assim a crer que eles fazem o que é errado por opção.

  -Então, o que o senhor sugere? – o major perguntou.

  -Senhorita Swan, a senhorita estaria disposta a entrar no esconderijo dos anarquistas em nome de nossa nação?

  Eu me espantei com sua proposta. Aquilo era arriscado de mais, e não era simples de se fazer. Como é que eu poderia convencer Edward a me levar ao esconderijo deles?

  -É perigoso de mais – Jacob disse depois de ver minha reação.

  -Mas é necessário. A senhorita acha que pode manter o disfarce por mais algum tempo? Tenha certeza de que nós vamos protegê-la e nada de mal vai lhe acontecer, eu te dou a minha palavra.

  -Acho que posso, mas não sei como conseguir que ele me leve até os outros anarquistas.

  -Eu tenho um plano – o Senador contou – Vou pedir que alguns dos meus policiais invadam sua casa enquanto ele estiver lá, quando ele ver que os policiais estão cercando a casa e que poderão machucá-la, ele a levará com ele para o esconderijo. Acha que é um bom plano?

Eu abaixei a cabeça, meio envergonhada. Era um plano perfeito, Edward não me deixaria sozinha, não se eu corresse perigo. Ainda de cabeça baixa eu respondi que sim. Eles rodaram mais uma vez até a padaria e me deixaram na rua.

-Cuidado Isabella, e não se preocupe, eu estarei por perto, confie em mim – Jacob me prometeu.

-Eu confio.

Eles foram embora e eu voltei para casa, as compras pesando praticamente o dobro depois daquela conversa e daqueles planos. Ao entrar na cozinha dei com ele andando de um lado para o outro, impaciente. Mas assim que me viu ele relaxou e sorriu, vindo me ajudar com as compras. Nós comemos em silêncio, com Edward nunca era preciso falar o tempo todo, ele era sempre quieto, reservado, convivia muito bem com o silêncio e aquilo era muito útil naquele momento.

-Leve o resto com você, eu espero que ajude por um tempo – eu sugeri depois que nós terminamos o café da manhã.

-Obrigada Bella, você tem um lindo coração.

Eu forcei um sorriso, mas não funcionou muito bem. Ele me olhava preocupado, até mesmo sem jeito, vez ou outra eu percebi que ele abria a boca, mas a fechava em seguida, como se não tivesse coragem, ou não pudesse falar alguma coisa para mim. Ao que tudo indicava, aquele momento de insegurança estava terminando, já que ele ficou de pé e se aproximou de mim, respirando fundo.

-Bella, eu preciso te fazer uma pergunta. Você me responderia? Com toda a sinceridade do mundo?

Tremi. Será que ele tinha percebido? Será que ele sabia o que eu estava prestes a fazer? Mas se ele me perguntava era por que ele não tinha certeza, então eu só precisava ser uma boa mentirosa. Cruzando meus dedos eu respirei fundo e balancei a cabeça afirmativamente.

-Bella… – ele tinha dificuldade de continuar, algo que eu nunca vira nele antes – Você… você sabe que não fomos nós, não é? Quer dizer, nós nunca tocaríamos nos seus pais – agora ele estava agitado, soltando as palavras como se fossem a torrente de uma cachoeira – Nós não matamos pessoas, nunca fizemos isso, e mesmo que se algum de nós cometesse um crime desses, eu não permitiria que fosse com sua família. Eu jamais deixaria alguém te machucar. Você sabe disso, não sabe?

E então eu percebi porque era tão difícil para mim aceitar entregá-lo para a polícia. Não era só porque ele era um grande mentiroso, não, era bem mais do que isso. Era porque nós tínhamos crescido juntos, ele conhecia meus pais e minha família, era meu melhor amigo, e eu não conseguia colocar na minha mente que alguém como ele tinha alguma relação com o que aconteceu com meus pais. Eu não conseguia acreditar que ele fosse capaz de me machucar. E agora, enquanto ele mentia, enquanto ele dizia exatamente o que o Senador disse que ele diria, eu ainda tinha dificuldades de não acreditar. E naquele momento, eu soube que não poderia traí-lo.

-Vá embora Edward – eu pedi empurrando-o para longe de mim – Vá embora o mais rápido possível, antes que eles cheguem.

-Eles? Bella? Do que você está falando?

-Me desculpe – eu pedi, as lágrimas rolando no meu rosto – Você precisa sair daqui agora…

Meu pedido foi silenciado com o som de arrombamento e gritos vorazes. Os guardas estavam ali! Olhei com medo ao meu redor enquanto ouvia os passos deles acelerarem ao passar pela casa. Não demoraria muito e eles estariam na cozinha. Ao meu lado, senti Edward enrijecer e se contrair, furioso, seu rosto ficou vermelho e sombrio enquanto ele me olhava e olhava para a porta, um brilho de raiva em seus olhos profundos.

-Desculpa – eu pedi chorando.

Ele se afastou de mim e correu para a porta dos fundos, pôs a mão na maçaneta e parou, me encarando com ódio. Demorou cerca de meio minuto aquela cena: eu trêmula, me segurando na bancada enquanto as lágrimas rolavam do meu rosto, o barulho que os policiais faziam do lado de fora cada vez maior, Edward parado com a porta meio aberta, me encarando com ódio e dúvida. Até que a cena se quebrou de uma forma inesperada.

Edward voltou até mim e me puxou com violência pelo braço, sibilando furioso que eu calasse a boca e não emitisse nenhum som. No caminho para a porta ele pegou as sacolas com o café da manhã e, ainda apertando meu braço com força, me levou para fora da casa correndo.

Meus vizinhos não estavam por perto, se não com certeza eles teriam barrado a corrida frenética que Edward fazia enquanto eu chorava e tropeçava tentando seguir o ritmo dele. Nós atravessamos a quadra até parar em frente a um carro popular de cor opaca e modelo comum, Edward olhou ao redor, certificando-se que ainda não éramos seguidos e retirou a chave do veículo do bolso de sua calça. Ele me empurrou com violência para o banco de trás, travou as portas e nós tirou dali com pressa, acelerando ao máximo. Eu fiquei encolhida no banco de trás, chorando, sem saber o que ele faria comigo, pois eu sabia que ele tinha percebido a minha traição.

Quando estávamos bem longe da minha casa, ele diminuiu a velocidade e tomou uma das ruas principais, havia um cobertor aos meus pés e eu pensei em péga-lo para enxugar minhas lágrimas quando ele diminui ainda mais a velocidade e me chamou. Eu ergui a cabeça, mas já era tarde de mais. A última coisa que eu vi foi sua mão, fechada em punho, vindo com violência na minha direção. Depois disso eu perdi os sentidos.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Comentem!!! :)