A Grande Busca escrita por Rebeca Bembem


Capítulo 15
Informações, presentes e sustos


Notas iniciais do capítulo

GENTEEEEEEEEEEEEEEE, EU NAO DEMOREI TANTO, FALA SÉRIO NÉ, KKKKK Oi de novo :D me desculpem mesmo por esse cap estar tão grande, mas eu precisava colocar todo o diálogo necessário aqui. Me perdoam? kkk Eu espero realmente que gostem, este aqui deu um trabalhinho peculiar pra escrever, haha
Vejo vocês nos reviews, beeeeeijo



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Paro de me mexer, de piscar, de respirar, praticamente. Trazer seu pai de volta? Por um momento, eu tenho uma imagem de meus pais, perdidos e solitários, vagando em algum lugar escuro e sem saída, esperando que eu tivesse a coragem de abrir uma porta. Uma porta que faria tudo ficar bem de novo. Olho para Bianca, totalmente estupefata. Esse portal é mesmo capaz de trazer os mortos de volta? Primeiro a mãe de Hugo e agora... o pai de Bianca? Então por que não abrimos essa coisa logo? Como que prevendo minhas objeções que estavam prestes a sair jorrando de minha boca, ela acrescenta rapidamente:

- Ele não morreu Alice, não é isso que você está pensando. Ele só está do outro lado, mas ele não foi para o mundo dos mortos, se é que isso existe. O portal é para Lá, a terra de nossos antecessores, a nossa terra. E ninguém que morre vai para Lá.

Solto meu fôlego, os cinco segundos de esperança frenética jogados ao vento cortante. Mas eu ainda não entendo, por que o pai dela estaria lá, em Lá? E nesse momento, solto uma gargalhada histérica, pela brincadeira que aquelas palavras faziam entre si. Amei o nome Lá desde a primeira vez que o ouvi, e em outras circunstâncias teria dado uma risadinha marota com esse joguinho de palavras. Mas agora, ele me parecia até cruel.

- O portal foi aberto antes, e foi assim que ele foi parar lá – ela diz depois que eu me controlo e paro de rir. Começo a passar as mãos em meus braços descobertos, uma mania bem útil para espantar o frio e o nervosismo. Ah, mas não servia de nada contra a curiosidade.

- Aberto quando? – eu pergunto ansiosa.

- Há alguns anos atrás – ela engole em seco e abaixa os olhos, e então eu tenho certeza que ela sabe o dia em que seu pai sumiu. O dia exato em que ele deixou de fazer parte de suas vidas, e elas mudaram para sempre.

- Quando? – insisto, sentindo os pelos dos meus braços se arrepiarem, tanto de frio quanto de expectativa.

- Eu tinha oito anos – ela diz, encarando o vazio. Milhões de coisas relacionadas a “oito anos” vem à minha cabeça e antes que eu possa colocar as coisas em ordem ela acrescenta, dessa vez encarando meus olhos castanhos: - E hoje eu tenho quinze. Foi em 2005. E hoje estamos em 2012. Ou seja, há sete anos que essa porta abriu para deixar entrar meu pai e deixar sair coisas que você vai desejar nunca precisar ver.

O tom sombrio do que ela acabara de dizer me atinge em cheio, deixando um rastro de consternação. Então as datas não batiam. Eu suspiro, coloco a cabeça nas mãos e tento organizar tudo. Eu me lembrava da mãe de Hugo ter morrido quando a gente tinha oito anos, em 2006. Mas o fato era que agora nós tínhamos catorze, e Bianca quinze. Então quando ela tinha oito, nós ainda tínhamos sete. O que significava que quando o portal foi aberto, em 2005, a mãe de Hugo não entrou. Então não fazia sentido nenhum ele estar procurando por ela, porque se ela não entrou no portal ela não estava em Lá. Estava morta. E com uma pontada no peito eu percebo que a mesma situação se aplicava a mim também. Não havia razão em manter esperanças de trazer meus pais de volta. Eles morreram quando eu tinha seis anos. No dia 4 de maio de 2004. Era isso, e não havia nada que eu pudesse fazer para mudar. Levanto a cabeça e olho para Bianca, e pela primeira vez entendo o real significado de ela estar ali, lutando contra os planos da mãe, quando tudo isso era para trazer seu pai de volta. Ela tinha a chance de ter sua família de novo! E a estava desperdiçando. Todos a estavam desperdiçando. Por quê? Talvez eu tenha feito essa pergunta alto demais, porque ela tinha uma resposta a me dar.

- Porque outras coisas podem sair com meu pai de Lá, Alice. Outras coisas, porque não posso chamar de pessoas ou bichos. Já ouviu falar de monstros? – ela pergunta em tom inocente e eu o ignoro concordando com a cabeça e sentindo um sulco abrir em minha testa, tão enrugada ela estava.  – Então, foram essas coisas que saíram de Lá da primeira vez. Coisas horríveis que quase ninguém consegue controlar. Eles só querem sangue, só querem carne fresca. E alguns nem de matar gostam. Gostam mesmo é de brincar com você. Ou mesmo de servir a um mestre tão louco quanto eles.

- Sua mãe – sussurro, aterrorizada, ligando mil pontos que antes não faziam sentido algum.

- Exatamente – ela diz com dor na expressão e eu entendo por que. – E eu não posso deixar que mais dessas coisas saiam novamente. Não posso mesmo. Nem você, nem nenhum de nós. E não se preocupe em eu estar perdendo a chance de ter meu pai de novo. Porque pode ser que ele não seja mais meu pai. Ou que ele não seja mais nada. Não dá pra saber o que aconteceu por aqueles lados, entende? E eu não posso arriscar a segurança de mais ninguém. Não seria justo.

- Então existem coisas como essas a solta? Criaturas que vieram da primeira vez? – pergunto, sentindo um medo crescer dentro de mim.

- Sim senhora. Minha mãe conseguiu controlar algumas delas com a energia dos colares, ou até mesmo com seu próprio gênio, e estas aí são seus capachos até hoje. Você se lembra de uma águia que roubou o colar do seu amigo Pedro?

Balanço a cabeça em confirmação, ignorando o fato de que Bianca sabia coisas demais sobre o que acontecera comigo nesses dias.   

 - Pois então. Essas águias não só águias... são humanos também – e vendo meus olhos arregalados ela acrescenta: - Sim, exatamente como suas amigas Guardiãs. A única diferença é que eles são meninos, todos eles. Os sete. Pode parecer meio ridículo, eu sei, mas assim como as Guardiãs tem sete lobas, os Bárbaros também tem sete águias.

 - Bárbaros? – pergunto com as sobrancelhas franzidas de concentração.

 - Exatamente – ela responde. – É tudo uma questão de cópia, você vai entender mais pra frente – ela parou para rir quando me viu revirar os olhos de revolta. – Fique tranquila, você vai saber. Só não te conto porque não sou a pessoa mais indicada para isso. E além do mais... – ela abaixa a voz e se inclina sobre a mesa, levando a mão direita até a calça, onde pareceu pegar algo no bolso, que manteve em sua mãe fechada, estendo-a a mim. - ... tem algo muito mais útil que eu para te explicar essa história toda. Te esperando – nesse momento ela abre a mão, e uma pequena chave dourada se revela, antiga e enferrujada.

 - O que é isso? – pergunto curiosa e cautelosa ao mesmo tempo.

 - Ora, é uma chave – ela ri, seus olhos azuis faiscando quando ela tira franja negra do olho e abre a minha mão para depositar a pequena chave. – Ela abre um cofre, onde algo muito valioso está escondido há muito tempo. Pertence a minha mãe, se quer saber, mas não deveria. Bom, pertencia – ela sorri. – porque agora é sua. Sempre deveria ter estado com você, e peço desculpas pela intromissão da minha mãe em seus assuntos de família.

 - O que quer dizer com isso? – aperto a chave em minha mão, sentindo sua superfície fria e o arrepio que percorreu meu corpo quando ela disse “família”. Será que aquela chave era da minha família? Será que podia me trazer alguma coisa de volta? Qualquer coisa, qualquer coisa que me lembrasse da minha família...

 - Quero dizer que você vai achar o que procura na Biblioteca Nacional. Embaixo de uma prateleira no terceiro andar. A quinta fileira do lado direito perto da parede – eu franzo as sobrancelhas e tento me concentrar e guardar todos esses dados em minha mente. – Eu não vou te dar um papel com isso escrito, pode ter certeza. Seria perigoso demais – eu concordo com a cabeça, tendo certeza de que não me esqueceria de nenhum desses detalhes. – Você consegue lembrar essas coordenadas?

- O que eu vou achar na quinta fileira do lado direito perto da parede no terceiro andar da Biblioteca Nacional, querida? – e sorrio para Bianca, como quem diz: “não duvide de mim”. Ela sorri de volta e faz sinal com a cabeça para que eu guarde a chave. Eu abro minha mochila e coloco-a bem no fundo, embaixo das outras coisas. Fecho o zíper e volto a colocar a mochila no colo, como se nada tivesse acontecido.

- Embaixo da prateleira você vai achar uma caixa fechada. Como um baú, marrom com detalhes em dourado. Essa chave encaixa nele, e dentro dele... – ela olha para mim enquanto eu prendo a respiração e percebo que vou inclinando o corpo cada vez mais para frente. - ... você vai achar um livro. E isso é tudo que posso dizer sobre ele.

Solto um suspiro de exasperação e faço um esforço desumano para não revirar os olhos e cruzar os braços, irritada. Mas ao olhar para Bianca e vê-la sacudir os ombros e levantar as sobrancelhas soube que era tudo o que ela podia fazer por mim. E eu não ia ser tão ingrata a ponto de não reconhecer que já era o bastante. Noto que a mão esquerda dela continua fechada e que um brilho vermelho escapa por entre os dedos. Ao perceber meu olhar, ela coloca a mão direita por cima e eu desvio meus olhos da pedra escondida, envergonhada, mesmo que não saiba direito por que.

- Eu vou dá-lo pra você, fique tranquila – ela diz, olhando para a pedra cor de sangue com melancolia. – É só que... é um pouco difícil me separar dele, entende? Foi meu pai quem me deu quando eu era pequena, e ele me traz boas lembranças – Bianca dá um sorriso de canto e eu vejo que seu rosto branco está ligeiramente corado. – Mas quando você for embora, eu te entrego. Só preciso dizer adeus, entende? É patético, eu sei, é só um jaspe...

- Não, eu entendo, sério. Elas têm nosso nome, são... o que nos torna mais... nós – e logo depois de ter dito isso, mesmo que não tivesse pensado sobre isso antes, soube que era a mais pura verdade.

 - Exatamente. Nos torna mais nós – ela sorri para mim e estende novamente a mão para o bolso da calça, trazendo um papelzinho pequeno. – O que me lembra de que eu preciso ser bem clara a respeito das minhas instruções a você.

 - Instruções? – eu vejo-a desdobrar o pequeno papel com linhas de caderno.

 - Você lembra que eu te disse que você precisava ter os sete colares? Com você, longe da minha mãe? – concordo com a cabeça e ela prossegue. - Bom, se existem sete pedras, existem sete portadores dessas pedras. E minha mãe está atrás de todos eles, e por isso fez esta lista, com os nomes e endereços de todos eles. Como ela sabe disso tudo? Não me pergunte, querida. Roubei este papel do quarto dela, logo depois que ela foi embora, mas não tenho nem sombra de dúvida de que ela sabe tudo isso de cor e de que este pequeno furto não vai atrapalhá-la em coisa alguma. Mas pode te ajudar, e muito. Aqui, você vai precisar disto – ela estende o papel e eu o pego e começo a ler.

Havia sete pontinhos pretos com sete nomes logo em seguida deles. A caligrafia era delicada e extremamente forte ao mesmo tempo. Meu nome era o primeiro da lista, e logo depois dele vinha escrito: Ametista. Abaixo vinha o endereço de nossa casa na Barra da Tijuca. Sinto um arrepio ao pensar que talvez aquela lista estivesse com Cersei há muito, muito tempo, e que talvez ela só estivesse esperando o momento oportuno para atacar. Logo em seguida vinha: “Arthur, Pedra-da-noite” e embaixo dele uma nota que dizia: “Parque Nacional da Tijuca, Setor Floresta, Centro de Visitantes”. Acho o endereço um tanto quanto curioso, mas prossigo. A próxima era “Bianca, Jaspe”, e um endereço no Leblon. Depois vinha “Cecília, Quartzo Rosa” e... o mesmo endereço no Leblon. Ergo os olhos para Bianca e aponto à lista, e antes que eu possa dizer alguma coisa ela diz:

 - Sim, Cecília mora comigo, desde que ela era uma garotinha de uns três anos. Bom, desde que nós tínhamos três anos, no caso. Os pais dela conheciam os meus e em um belo dia resolveram deixá-la na soleira da porta e nunca mais aparecer. Desde então, ela dá mais orgulho à minha mãe do que eu própria. As duas tem uma relação mais forte do que eu jamais tive com elas. E assim, você pode imaginar, Cecília foi com ela quando todos eles me deixaram sozinha em casa, depois da briga. Eu tive uma briga feia com Cecília, implorei para que ela me ajudasse a impedir a loucura da minha mãe, mas ela não quis ouvir. Sabe o que ela me disse? –faço que não com a cabeça e vejo que a expressão de Bianca se torna dura, incrédula, e que seus olhos começam a ficar vermelhos. – Ela disse que se eu não queria o nosso pai de volta, ela queria. E que ia fazer de tudo pra trazê-lo para nós. Disse que eu era uma filha ingrata e que não merecia o amor da nossa mãe. Você vê, ela já chamava meus pais como se fossem os dela também, e por isso nós éramos praticamente irmãs... – ela suspira e olha para a rua movimentada, quando eu percebo que uma lágrima cai dos seus olhos e ela se apressa em secá-la. – Ela não entende que estou tentando impedir minha mãe por amor... por amor à elas. Ela acha que eu não pertenço àquela família. Ela me disse que não era mais minha irmã.

Eu podia ver profunda dor no rosto de Bianca, e simplesmente não sabia o que dizer. Ela abaixa a cabeça e alisa suas roupas, tentando parecer ocupada e eu prefiro ficar em silêncio.

 - Bom, mas isso acontece nas melhores famílias – ela diz, com um sorriso sem graça. – Eu... – e então olha para mim e muda o que iria dizer. – Nós sabemos bem como é isso.

 - Com certeza – respondo, agora também alisando minhas roupas e pensando que essa era uma fajuta explicação para todos os problemas de família que eu tinha.

 - Se me dá licença, eu vou ao banheiro bem rapidinho. Peça alguma coisa pra gente comer, estou morrendo de fome – Bianca diz enquanto se levanta e entra na parte interna do Café.

Eu pego o cardápio embaixo do suporte de guardanapos e analiso as opções. Escolho pedir um salgado de frango e mais uma lata de chá, pois acabo de perceber que minha garganta está completamente seca. Estendo a mão e aperto um botão em cima de um objeto que também marcava o número da mesa e subitamente me lembro do pedaço de papel com os nomes e endereços. Deixo o cardápio de lado e recomeço a ler. O próximo nome é “Hugo, Hematita” e logo abaixo vem o endereço dele na Barra da Tijuca, a apenas algumas casas de distância da minha. Logo depois vem o nome me causa um aperto no coração: “Manoela, Safira” e a rua e número da nossa casa. O último nome é “Pedro, Esmeralda” e seu endereço no Botafogo. Cito os nomes em minha mente: Alice, Arthur, Bianca, Cecília, Hugo, Manoela e Pedro. Sete. Noto que os únicos da lista que eu ainda não conheço são Arthur e Cecília. Então me lembro das palavras de Bianca: “Você precisa de todos os sete. Com você. Longe dela”. Largo o pedacinho de papel em cima da mesa e penso nas sete pedras que preciso juntar.

Uma ametista, uma pedra-da-noite, um jaspe, um quartzo rosa, uma hematita, uma safira e uma esmeralda. O que me fez perceber que eu tinha chances de conseguir menos pedras do que pensava. Ametista: minha, mas não fazia a menor ideia de onde ela estava, e só a encontraria por acaso. Pedra-da-noite: era de Arthur e eu teria que ir atrás dele. Jaspe: de Bianca, e pelo menos essa eu receberia facilmente. Quartzo rosa? Totalmente fora do meu alcance. Se o que Bianca havia dito era verdade, e Cecília apoiava o plano de Cersei, essa pedra já devia estar com ela há muito tempo. E havia a hematita... de Hugo. Quando eu chegasse em casa teria que respirar fundo mais uma vez e dizer: “Por favor, me dê essa pedra, e venha comigo. Você não pode ajudar a abrir esse portal. Sua mãe não está lá. Ela está morta. Nós precisamos impedir esse desastre”. Eu não tinha tanta certeza de que ele iria acreditar ou até mesmo me dar a pedra. Mas se eu tinha que enfrentar Cersei e toda a sua trupe de capachos, as Guardiãs estariam comigo. E não seria Hugo quem iria me impedir. E por fim, a safira e a esmeralda: de Manoela e Pedro, haviam sido rudemente roubadas de minha casa. Portanto, o primeiro passo seria conseguir a hematita e depois... a pedra-da-noite.

Abro minha mochila e tiro o caderninho e a caneta que trouxera de casa, tratando de anotar tudo aquilo que estava no papel, para que eu não corresse o risco de deixa-lo cair em algum lugar e perder tudo. Guardo o pedaço de papel no meio das folhas e fecho o caderno, guardando-o com a caneta em minha mochila novamente. Começo a pensar que talvez esta visita à Bianca não deixe as Guardiãs tão irritadas. Afinal, eu conseguira muita informação útil, e mais uma pedra e uma chave, que prometia me levar até um livro de família. Fico imaginando o que direi a elas quando voltar. Lyanna, Nymeria e Katy com certeza já sabem onde cada portador mora, e qual é sua pedra. Por isso não havia sentido em me vangloriar daquelas informações. E foi justamente quando me perguntava se elas ficariam orgulhosas de mim pela pedra e pela chave que percebo que havia um problema que eu só havia notado naquele momento. Os planos de Bianca e das Guardiãs para mim eram... diferentes. Bianca propunha que eu devia ir atrás das pedras antes que sua mãe as achasse. Já as guardiãs pretendiam me levar para seu quartel general, a Toca, onde eu seria treinada e protegida enquanto elas cuidavam de tudo.

Suspiro e apoio a cabeça nas mãos, mais uma vez perdida e sem ideia do que fazer ou de para onde ir. Não pense nisso agora, digo a mim mesma. Quando encontrar com Nymeria, conte tudo a ela, e ela saberá o que fazer. Penso na minha recente decisão de agir ao invés de assistir a vida passar e dirijo minha mão até o cabo de Defensora de Almas em minha cintura e agradeço aos céus por não ter precisado usá-la. Ergo a cabeça e olho ao redor para tentar localizar Nymeria, avisar que está tudo bem, quando escuto um pigarrear forçado de alguém tentando chamar minha atenção à minha direita. Viro a cabeça, distraída e sinto o ar sair totalmente dos meus pulmões e o horror crescer dentro de mim ao encarar quem estava ali.

- O que vai pedir, moça? – pergunta a garçonete, com um sorriso tão falso que seus olhos faiscavam para denunciá-lo.

Ali estava uma garota de pelo menos quinze anos de curtos cabelos loiros cor de palha, todos jogados para o mesmo lado, como os de um menino. Usava um vestido preto e um avental branco por cima, e um bloquinho de anotações nas mãos. Minha cabeça começa a girar e eu seguro na mesa para não tombar para frente. Olho novamente para ela e aquele sorriso ameaçador, aqueles olhos púrpura, só para ter certeza. E tenho. Era ela: a garota que aparecera no meu sonho, arrebentando a porta da frente da minha casa. Aquela que olhara para o meu vô estrebuchando no chão e dissera: “Não adianta. Ele está morto, sua tola”. A que rira da minha desgraça bem na minha frente e que agora perguntava o que eu iria pedir. Sinto meu coração bater mais depressa e o susto ainda ferver em mim, enquanto penso no que responder. Aja naturalmente, eu digo a mim mesma, apague essa cara de pavor e simplesmente peça um salgado e um chá. Respiro fundo e pego o cardápio com as mãos tremendo.

 - Acho que vou querer um salgado de frango – digo, sem desviar os olhos do cardápio. – E um chá de pêssego.

 - Claro, Alice, querida – ela diz com voz cortante, e eu sinto um enorme alarme de perigo piscando em algum lugar por perto. - Me diga, como se sente sendo a piada mais conhecida entre nós? Hein? A heroína órfã duas vezes – ela ri. – Tem que admitir que isso soa hilário. – eu abaixo o cardápio e o solto na mesa, tentando pensar rápido e sentindo a raiva bombear quente em minhas veias. Abaixo minhas mãos e agarro com força o punho de Defensora de Almas, dirigindo o meu olhar mais fulminante à garota. Eu não era uma piada. – Quero dizer, deve estar sendo ótimo pra você estar recebendo toda essa atenção. Principalmente da salvadora da pátria, mais conhecida como Burra-Bianca. É um apelido que eu dei pra ela quando éramos menores e ela inventava de fazer a “coisa certa”. Estúpida desde sempre.

Então uma luz clareou minha mente e eu soube quem ela era. Cecília. A irmã “adotada” de Bianca. A que não admitia que Bianca se virasse contra sua própria mãe e seus planos insanos. Tento controlar minha respiração agitada e dou uma rápida olhada em direção ao banheiro, para onde Bianca fora, me perguntando o que fazer até que ela chegasse. Cecília acompanhou meu olhar e antes que ela pudesse fazer qualquer coisa, Bianca estava atrás dela, alguns centímetros mais alta que a garota, fazendo sinal para que eu não dissesse nada, pois Cecília ainda não a havia percebido. Eu prendo a respiração e observo Bianca chegar mais perto de Cecília e começar a falar assustadoramente baixo em seu ouvido. Cecília dá um pulo com o susto e franze as sobrancelhas com o que quer que fosse que estivesse escutando.

Observo a fúria distorcer as feições da garota loira quando ela diz entre os dentes: “Traidora”, e se vira na direção de Bianca e lhe dá um tapa na cara. Levanto da cadeira instantaneamente, com minha mãe agarrada firme ao cabo da espada em minha cintura, e vejo que todas as pessoas ao redor estão olhando extasiadas à cena, provavelmente se perguntando o que estava acontecendo. Dois segundos se passam, três... e ninguém se mexe, nem mesmo Bianca. Ela permanece paralisada, os cabelos negros caindo por cima dos olhos que encaravam o chão, a bochecha tão pálida feita vermelha com a força do golpe. Lentamente, a atividade foi voltando ao Café, enquanto as pessoas passavam a conversar novamente. Então, de repente, Cecília diz algo com voz tão baixa à Bianca que eu só escuto por estar a menos de um passo de suas costas:

 - Você escolheu o lado errado, irmã. E eu não posso mais te ajudar.

Então Bianca levanta a cabeça e fixa os olhos em algum ponto do céu, por entre os vãos da cobertura do Café. Vejo, por sobre o ombro direito de Cecília, que uma linha de preocupação estava se desenhando em sua testa. Um vento mais forte que o que batia até aquele momento tira-lhe os cabelos do rosto e Bianca me encara com extrema determinação. Então ela atira sua pedra vermelha a mim e eu a pego no ar, segurando-a firme em minha mão e recuando dois passos quando Cecília vira para mim e Bianca diz simplesmente:

 - Fuja.

Pego minha mochila da cadeira, pulo o baixo portão que separa o Café da rua e começo a correr pela calçada, esbarrando em todas as pessoas que fugiam da chuva por vir, ouvindo o ruído de bater de asas sobre a minha cabeça.


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Notas finais do capítulo

EAÍÍÍÍ? CURTIRAM A GARÇONETE MANÍACA? HAHAHA
c: mandem reviewssssssssssssssssss
beijos



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