Entre Pontas De Faca E Velhas Histórias escrita por Ana Barbieri


Capítulo 10
Epílogo




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Epílogo

            Me olhei uma última vez no espelho. Meu cabelo estava preso em um coque apertado e não havia nenhum brilho em meu rosto. O vestido preto subia até o pescoço e um anel de rubi estava esquecido e sem utilidade em meu anelar esquerdo. O quarto estava iluminado, mas não era mais o mesmo. Os livros de Edgar Allan Poe foram guardados em um armário e os registros de casos antigos foram trancados dentro do laboratório, bem como o próprio. Desci as escadas e, após me despedir da senhora Holmes e apanhar um ramalhete de rosas, saí de casa.

            A rua não parecia mais tão movimentada e ninguém parou para falar com a dama de preto que passava. Ninguém conseguia falar com ela sem comentar os grandes feitos de seu passado, ao lado daquele que tanto ama. Pegando um coche, me dirigi até o cemitério, mais precisamente até a parte sul. Onde três pessoas queridas estavam enterradas. Parei primeiro no túmulo de minha mãe e deixei algumas rosas, depois, no túmulo de meu pai e deixei mais algumas. Por fim, me ajoelhei de frente para o túmulo de Holmes.

            As lágrimas vinham inconscientemente. Beijei cada uma das dez rosas antes de colocá-las ali e comecei a conversar sozinha, perguntando se ele e meu pai estariam falando sobre como Lestrade continuava um completo incompetente ou se estariam discutindo com minha mãe sobre como eu deveria ter sido uma mulher diferente. Ri amargamente ao imaginar a cena, no fundo, sabia que minha mãe sentir orgulho de sua pequena garotinha. De repente, avistei um pequeno envelope deixado sobre o chão. Estava endereçado a mim, em uma caligrafia totalmente desconhecida.

“Meu último e maior sacrifício, por amor e somente por amor.”

            Me levantei assustada e comecei a olhar em volta.

            _ Holmes! – gritei a plenos pulmões. – HOLMES! Ninguém... – murmurei chorando ainda mais.

            Eu poderia ter sido muitas coisas, mas não era burra. Somente ele poderia ter escrito aquilo e colocado ali. Mas porque não se mostrava? Seu maior sacrifício seria me deixar sofrer? Por um ano. Ninguém mais falava em seu nome, exceto John, Mary, a senhora Hudson e Mycroft. Contudo, sendo egoísta ou não, posso afirmar que era eu quem mais sofria. Não comia direito, eram poucas as noites em que conseguia dormir e Watson vinha me visitar diariamente para averiguar meu estado de saúde e sanidade. Muitos achavam que eu estava louca. Deixei a carta onde estava, suspirando.

            _ Se estiver vivo... por favor... por favor, volte para mim. – disse com tom de voz normal, como se ele estivesse ali ao meu lado.

            Saí do cemitério e voltei para casa. Olhando atentamente para as ruas, esperando que ele estivesse sentado à porta de algum bar, fumando seu cachimbo. Não estava.

            _ Quer que eu traga chá querida? – perguntou a senhora Hudson, compadecida.

            _ Não...

            _ Anne... vai acabar adoecendo se não beber ou comer alguma coisa. – ralhou ela. – O senhor Holmes não gostaria...

            _ Senhora Hudson eu já estou doente há muito tempo. Desde o dia em que o vi caindo na minha frente. Meu coração dói, meu corpo dói... John conseguiu fazer com que meus pulmões melhorassem, mas, foi só. Não sinto fome ou sede, sinto saudade. Saudade de entrar por aquela porta e ouvir a voz dele discutindo com alguém. Saudade de ouvi-lo tocar o violino as três, quatro, cinco, uma da manhã, de vê-lo entrar em casa com um sorriso satisfeito no rosto por um caso terminado. Saudade de discutir com ele... de falar com ele...

            _ Anne...

            _ Eu sei que ele não iria querer isso. Ele nunca gostou que eu demonstrasse fraqueza, não porque condenasse tais sentimentos, mas porque eu nunca fui de sentir isso por muito tempo. Mas em todos aqueles anos, mesmo quando não éramos casados, eu ouvia sobre como ele era quase imortal e por causa disso... nenhum deles, nem meus pais... nenhum deles nunca me ensinou a dizer adeus...

             _ Talvez eles quisessem que a senhorita aprendesse sozinha... Afinal, sempre teve tanta facilidade... – disse a senhora Hudson, meigamente. – Reabra aquelas portas, saia anunciando pela cidade que será você a resolver os casos agora!

            _ Sem ele? – perguntei sorrindo de lado, com pesar.

            _ O senhor Holmes sempre acreditou muito na senhorita... e eu também.

            E dizendo isso, saiu. Me joguei na minha poltrona, fitando a que costumava ser a dele. Patético ele diria. A senhora Hudson tinha razão. Eu devia voltar a fazer o que nos deixava a ambos felizes. Levantando, comecei a subir as escadas, quando a porta se abriu.

            _ Com licença, aqui é a casa do senhor Sherlock Holmes? – perguntou o estranho, entrando.

            _ Costumava ser...

            _ Entendo... é que ele me mandou deixar um bilhete sobre uma lápide e não me pagou... eu gostaria de saber...

            Me virei violentamente para ele.

            _ Quando você o viu? – perguntei.

            _ Há algumas horas, antes do amanhecer.

            _ Entendo. – era tarde demais, ele provavelmente já havia saído de Londres. – Quanto ele lhe devia?

            _ Ele disse que como pagamento eu poderia ficar com a esposa dele. – respondeu o estranho simplesmente.

            Eu me senti corar.

            _ Sinto muito, mas, isso não posso lhe dar. Mas posso pagar em dinheiro se quiser.

            _ Não senhora... – disse ele me puxando pelo braço.

            _ Ah! – gritei. – Senhora Hudson! – chamei quando ele me chegou para mais perto.

            E, com a outra mão, ele retirou o capuz, me fazendo engolir em seco.

            _ Não será preciso incomodar a senhora Hudson querida. – disse Holmes, sorrindo.

            Eu senti vontade de fazer várias coisas. Finalmente jogá-lo pelo tamisa, acertá-lo com um machado, dar um tiro no seu pé. Contudo, a única coisa que fiz foi beijá-lo. Eu não sabia se havia perdido o juízo completo, então aproveitaria o que seria, talvez, a minha única oportunidade de fazê-lo. Todavia, quando nossos lábios se tocaram foi tão real, que percebi que nunca estivera tão lúcida em toda minha vida. Nos abraçamos fortemente em seguida. A senhora Hudson não atendeu ao meu chamado, com certeza estava envolvida naquilo tudo.

            Quando nos soltamos, um nó na minha garganta se formou. Eu poderia perguntar a ele como teve coragem de me fazer acreditar que estava morto, como foi capaz de não me escrever nenhum dia ou onde esteve durante todo aquele tempo, mas...

            _ Que bom que você está bem. – disse, repreendendo todas essas indagações.

            _ Você não quer me matar? – perguntou ele, curioso.

            _ Quero, mas já provei da sua morte por um ano e não gostei... vamos deixar isso para uma outra ocasião. – disse sem contar uma risada.

            _ Ótimo. – disse ele. – Então agora... – e puxou os grampos que prendiam meu cabelo. – Muito melhor. Então agora vamos puxar aquela placa novamente senhora Holmes, acho que já lhe dei férias suficientes.

            _ Não agora. – disse. – Lembra-se? Não tivemos chance de comemorar nenhum dos nossos dois últimos casos. – eu lembrei, sorrindo sugestivamente.

            _ Bergerac...

            _ Você tirou férias de mim por um ano Sherlock... esse é o preço que vai pagar pelo meu perdão. – adverti, matreira.

            _ Pois muito bem. – disse ele, me tomando nos braços. – Como eu disse, você nunca falha em pagar suas promessas.

            _ E eu prometo que continuará sendo assim, até o dia em que Lestrade conseguir trabalhar direito.

            Ele sorriu. E embora se considere o maior cérebro da Inglaterra, não sabe o quanto ser a difficille Anne Bergerac tem o seu lado bom.

FIM


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Notas finais do capítulo

Então pessoal... acabou... Espero que tenham gostado. Obrigada por terem acompanhado tudo... adooooro todos vocês!



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