Lá estava Emily, com seu pijama favorito ainda acordada. Estava sentada em sua poltrona florida ao lado do grande abajour velho. O sol estava quase nascendo e a menina ainda não tinha ido dormir, mesmo sabendo que tinha escola de manhã. O que estava fazendo? Pensando. Tinha passado a noite toda lendo e relendo o seu conto favorito, mas por volta das três da manhã já tinha se cansado, então ficou lá sentada pensando em coisas estúpidas e inúteis. Estava sem um pingo de sono por incrível que pareça. Para ela, dormir era um desperdício de tempo.             Quando se deu conta de que o sol estava para nascer, levantou-se e foi se trocar. Vestiu seu uniforme feio e sem graça. Ela odiava ter que usar essas roupas, mas sempre inventava algo novo, para não se misturar. Odiava ser igual aos outros. Dessa vez, colocou um casaco preto com grandes botões e um chapéu com laços.    

Você, caro leitor, pode até achar isso brega e esquisito, mas a menina adorava se destacar! Prosseguindo...     

Desceu então as escadas com ânimo para tomar café. Pão com chocolate. Sim, pão com um pedaço de chocolate dentro. Ora, não faça essa cara de nojo! É realmente bom, eu garanto. Tomou seu suco de laranja e pegou suas coisas, sem se esquecer do livro que havia pego na biblioteca. Deu um beijo no pai e um abraço na mãe e foi para a escola.     

Saiu andando pela rua sorridente e saltitante. Dois quarteirões depois estava na escola.      

Como vocês já devem saber, na escola nada de muito interessante acontece, bom, não nessa história. Para falar a verdade, é apenas a rotina de uma menina comum. Bom, comum dependendo do seu ponto de vista. Sempre achei Emily fantástica, dona de uma doçura inimaginável. Agora que isso já lhe foi revelado, pode parar de ler por aqui se quiser. Não leia forçado, faça-o de coração. Que seja, vamos pular para a parte que o sinal toca.     

O sinal tocou e a menina guardou seu material dentro de sua bolsa azul com fitas. Deixou a escola despedindo-se de Marianne, sua colega, e seguiu para a biblioteca.        

Chegando lá, cumprimentou o Sr. Assis,que respondeu com um alegre sorriso, e foi para a última prateleira, onde se encontravam os contos de terror. Ah, a menina amava histórias de terror! Decidiu pegar emprestado dessa vez Frankenstein, de Mary Shelley.       

Foi então para o balcão, mostrando o livro ao velho dono do local, que anotou o nome da menina com um doce olhar,que saiu saltitando porta a fora.        

Faltava apenas um quarteirão quando o inimaginável aconteceu.     Não lhe darei detalhes do que ocorreu, isso não é necessário. Só lhe direi que aqueles sorrisos, aqueles saltinhos em direção à escola e à biblioteca ficaram para trás. A menina nunca chegou a ler seu tão desejado conto de terror. Sr. Assis nunca mais teve seu dia alegrado com aquela pestinha que adorava ler. A mãe nunca mais teve seu bebê em seus braços e o pai nunca mais recebeu aqueles beijinhos açucarados. E eu? Bom, eu nunca mais vi a menininha dos meus olhos, aquela que eu amava e observava em segredo.  Nunca mais vi seus cachinhos dourados balançando ao vento, nunca mais admirei seu jeito de ser. Pode-se dizer que não fui mais feliz e até que eu nunca mais amei ninguém.