Highway To Hell escrita por Syrinx, HévilaChavez


Capítulo 13
Capítulo 8: Tijuana (Parte 2)


Notas iniciais do capítulo

Então, vou dividir em 3 partes o último capítulo pq eu vi que ia ficar mt grande e cansativo. A terceira parte e o epílogo já estão quase prontos, então n deve demorar mt pra sair. Demorei pra postar pq tive um vestibular pra fazer fora e eu estava viajando. E tbm teve toda aquela loucura do SiSU. :/
Bem, to escrevendo demais:
ENJOY! :)



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Sam simplesmente ficou parada ali, o corpo estranhamente entorpecido, observando o carro se distanciar com velocidade. Com as malas aos seus pés e os olhos fixos no exato ponto em que o carro tinha sumido de vista, ela tentou entender o que acabara de acontecer. Freddie tinha sido levado e a culpa era toda dela. Agora ela tinha uma missão a cumprir e, do jeito que a sorte não estava do lado deles, era mais provável que ele acabasse morto e ela presa. 

No meio de sua imobilidade, ela vagamente registrou seus olhos ficando úmidos e a sensação desagradável na boca de seu estômago. Medo. Sam estava apavorada. 

Balançando a cabeça, ela procurou afugentar qualquer pensamento pessimista. Ora, afinal ela era Sam Puckett. Tinha enfrentado uma gangue raivosa de motoqueiros e tinha sobrevivido para contar a história. Duas vezes. E não era um traficante e mafioso que a iria impedir de levar Freddie para casa. Ela respirou fundo e levantou o queixo, obrigando seu cérebro dormente a entrar em ação. Precisava planejar seu próximo passo. Rápido.

Imersa em pensamentos, Sam estava completamente esquecida do que se passava ao seu redor. Se tivesse prestado maior atenção, teria percebido os três homens que a observavam à distância, escondidos atrás de um dos muros do estacionamento, várias fileiras de carros separando-os.

Um deles, aparentemente o que estava no comando, sacou o telefone que vibrava em seu bolso da jaqueta. Parando apenas para verificar o número que já esperava encontrar no visor, ele destravou o celular e o levou até a orelha:

-Pam. - ele cumprimentou curtamente.

-E então, encontrou os dois? - a mulher do outro lado da linha perguntou sem rodeios. 

Para alguém que pouco se importava com a filha, Pam parecia preocupada demais. Ele sorriu minimamente. Talvez o instinto maternal vivesse em algum lugar escondido bem no fundo. E, agora que ela sentia que a filha estava em perigo, ele estivesse vindo à tona. Havia salvação para Pam, no final das contas:

-Sim e não. - ele disse lentamente e franziu a testa, ainda olhando para a garota desamparada a alguns metros de distância e lembrando da cena que havia acabado de presenciar.

-Por que, o que ela aprontou agora? - ela perguntou com desdém, mas ele percebeu a nota de preocupação na voz dela. 

Ele tocou a ponte do nariz com os dedos e respirou fundo. Não queria contar o que tinha acontecido para Pam, parte porque não queria ser o alvo da raiva dela, parte porque acreditava que era responsabilidade de Sam fazê-lo. Xingou-se por dentro. Odiava ainda se importar tanto com as duas mesmo depois de muito tempo.

-Olha, Pam, quando nós chegarmos aí você vai saber de tudo, ok? Preciso ir falar com sua filha agora. - ele se despediu, não querendo dar a chance de ela obrigá-lo a falar. Essa era uma das muitas habilidades da mulher.

-Você não se atreva a desligar... - ela ainda tentou, a voz ameaçadora.

-Tchau, Pam. - ele cortou, apertando o botão vermelho.
 
Assentindo uma vez para os dois homens ao seu lado, ele saiu de seu esconderijo e caminhou lentamente em direção a Sam. A primeira coisa que notou ao se aproximar dela é que a garota tinha crescido muito desde a última vez que a vira. A garotinha que ele havia conhecido há alguns anos se transformara em uma bela jovem mulher. Ele sorriu ternamente, sentia falta dela. Por um minuto ele esqueceu a decepção de vê-la numa situação daquelas ou o tempo que havia passado para os dois. Ela sempre seria como uma filha para ele.  

Sam, finalmente despertando de sua linha de pensamento, levantou a cabeça, alarmada pelo som dos passos. Tensionou o corpo, pronta para a briga, procurando a origem do movimento por entre os carros:

-Você não mudou nada, loirinha, ainda a mesma valentona de sempre. - ele disse rindo, ao observar a postura dela mudar.

Ela parou, rígida, ouvindo a voz que vinha de uma fileira de carros atrás dela. Só tinha uma pessoa no mundo que sempre a chamava de "loirinha" com aquele sotaque mexicano carregado. Ela virou-se na direção do som e parou, os olhos arregalados, encarando o homem à sua frente:

-Diego! - ela exclamou ao reconhecê-lo, e correu para seus braços abertos.

-Ah, você não sabe como é bom te ver! - ele disse, apertando-a contra ele. - Você cresceu tanto! Já fazem o quê, cinco anos?

Diego Rivera era um homem no meio seus quarenta anos. Alto, bronzeado, definido, os cabelos castanho claros e os olhos mel que encaravam de forma doce, mas firme. Apesar de não ser tão jovem, era um mexicano muito bonito, e essa foi uma das razões pela qual Pam o havia namorado alguns anos antes. Era um homem gentil e, mais importante, gostava muito de Pam. Quando se sentira pronta para levá-lo à Seattle, depois de ter se encontrado com ele em algumas de suas viagens a Tijuana, ela o apresentou a Sam. Como num passe de mágica, Sam se afeiçoara muito à Diego, logo ela, que era uma pessoa difícil de se cativar. Ele passara algum tempo com as duas, viajando até os EUA sempre que o seu trabalho permitia para visitar as duas. Faziam tudo juntos e se divertiam muito pelo tempo que ele podia ficar na cidade. Quando Sam tinha algum problema, além de Carly, Diego era uma das pessoas que ela procurava para pedir conselhos. Ela confiava nele e contava boa parte do que acontecia com ela, como o fato de odiar Freddie e depois tê-lo beijado. Secretamente, Sam já se pegara uma ou duas vezes desejando que ele fosse seu pai. 

Eventualmente, como acontecia com todos os outros, Pam também se cansou de Diego. Apesar de ainda gostar dela, Diego aceitou e não procurou Pam novamente. O que gerou uma das maiores brigas entre mãe e filha. Tão séria que Sam se mudou para o apartamento de Carly por algumas semanas, sem dar nenhuma notícia a Pam. Quando a amiga perguntava o motivo da briga, Sam desconversava, já que falar sobre o assunto doía.

Eles finalmente se separaram e ela sorriu, admirando seus carinhosos olhos negros. Um olhar que ela sentia falta e que era reservado somente a ela. Ela se sentiu relaxar sob aquele olhar:

-Eu senti tanta sua falta! Você não sabe como fiquei triste quando Pam me contou que tinha terminado o namoro! - ela confessou.

Ele balançou a cabeça, ainda sorrindo:

-Isso são águas passadas, loirinha. - e ele afastou com os braços, para olhá-la melhor - Mas olha só para você! É uma mulher agora! Mi niña cresceu! - e eles se abraçaram novamente.

-Tinha tantas esperanças de te encontrar aqui! Você não imagina como é bom ver você numa hora dessas! - ela disse, escondendo o rosto no pescoço dele - Levaram o Freddie, Diego! - ela disse, tentando conter o bolo que se formava em sua garganta. Ela tinha prometido que não iria chorar.

De repente, ele pareceu se lembrar do porquê estava lá. E parte da alegria em encontrá-la  transformou-se novamente em decepção:

-Sim, eu sei, eu vi tudo, Samantha. - ele afastou o corpo apenas o suficiente para olhá-la severamente - E devo dizer que estou muito desapontado com você. Esse golpe é tão velho, loirinha, não pensei que fosse cair tão fácil. Aquele garoto foi levado e Deus sabe o que podem fazer como ele. Queria eu ter impedido antes que você pudesse se meter em encrenca. 

-Espera aí, como sabia que eu estava aqui? - então a resposta veio tão rápido quanto a pergunta - Não diga, minha mãe te pediu para me seguir, não é?

-Sim. Quando ela ficou sabendo que você tinha fugido e que estava vindo para cá, ela me ligou. Pediu que eu deixasse meus homens atentos para qualquer sinal da sua chegada. Então, quando finalmente pudemos localizar você e seu amigo, viemos atrás de vocês, prontos para levá-los até sua mãe e a outra mulher, uma meio histérica, que diz ser mãe do garoto. - ele fez uma careta à menção de Marissa - Infelizmente, quando chegamos aqui, já era tarde demais, seu amigo já estava sendo levado. - ele enfiou as mãos nos bolsos da calça, suspirando pesadamente.

-É tudo minha culpa, Diego. O Freddie foi levado por minha culpa. - ela murmurou, os olhos arregalados, procurando algum conforto nos do homem que a segurava gentilmente.

Ele pôs as mãos nas bochechas dela carinhosamente, mas a olhou com firmeza:

-De quem é ou deixa de ser a culpa não é importante agora. O que temos de fazer é te levar para a sua mãe, ela está louca querendo saber onde você está. - ele disse, tomando-a pelo braço, pegando as duas malas com a mão livre e a guiando em direção à saída do estacionamento do hotel, onde um carro estava estacionado meio escondido.

Entrando em pânico com a possibilidade de ver sua mãe e, pior, Marissa, ela se debateu, tentando desvenciliar-se dele:

-Não, por favor, Diego, não faz isso comigo! Vão me matar quando descobrirem o que aconteceu! Principalmente a Louca, quando eu contar o que eu deixei acontecer com o Freddie! - ela se debateu um pouco mais, não ousando machucá-lo, mas o suficiente para fazer com que ele se esforçasse para contê-la.

-Samantha! Pare! - ele só a chamava assim quando estava frustrado com ela - Você sabe que confrontá-las, ainda mais na situação atual, é o mínimo que pode fazer! Além do mais, quanto mais você adiar, menos tempo teremos para pensar sobre o que fazer a respeito do Freddie. - ele procurou ser razoável - Agora vamos, nem que eu tenha que pedir que eles te carreguem. - disse, indicando os outros dois homens que os seguiam um pouco atrás. 

Ele abriu a porta para ela e deslizou no banco de trás ao seu lado, sem antes pôr as malas no bagageiro. Os outros dois homens assumiram os bancos da frente, e um deles, alto e com uma espessa cabeleira morena, deu a partida no carro. 

A viagem em si foi tensa para Sam. Os dois homens conversavam alegremente, mas no banco de trás o silêncio era mortal. Sam encarava a janela e se recusava a falar com Diego, mesmo sabendo que a culpa por tudo aquilo não era dele. Numa tentativa de quebrar a tensão, Diego pigarreou e lançou um sorriso malicioso na direção de Sam, apesar de saber que ela não veria, já que ainda olhava com obstinação a paisagem confusa de Tijuana passar pela janela:

-Então, aquele seu amigo... - ele começou como quem não quer nada - Freddie, não é? Por acaso ele não seria aquele garoto que você vivia maltratando? E que depois você deu seu primeiro beijo? - ele riu, lembrado-se das histórias que ela contava sobre o garoto.

Sam virou a cabeça rigidamente, fuzilando-o com o olhar, claramente indicando que não estava para conversa. Mas ele não se intimidou pelo olhar ameaçador dela:

-Sabia que vocês iam acabar juntos. Aquele ódio todo que você proclamava ter por ele nunca me convenceu. Mas agora vendo você assim, eu tenho certeza, loirinha, você realmente se importa muito com ele. - ele declarou, um sorriso paternal nos lábios.

Ante à declaração dele, ela relaxou, baixando os olhos e não ousando negar. Sim, ela gostava muito de Freddie, mais do que ousava dizer. Olhou suas mãos, elas tremiam involuntariamente. Não, não podia ficar nervosa. Tinha de ser forte por Freddie. Ela suspirou e sentiu a mão dele em seus ombros. Diego havia sentido o medo dela:

-Não se preocupe, loirinha, vamos trazer ele de volta. Eu prometo. - ele levantou seu queixo delicadamente, fazendo-a olhar dentro de seus olhos firmes - Sabe que eu faria tudo por você e sua mãe, não é?

Ela assentiu fracamente sem dizer nada, com medo que sua voz a traísse e ela entrasse em pânico. Realmente temia por Freddie. Dessa vez ela sozinha não daria conta de tirá-los daquela situação. Ela sorriu, só então lembrando-se de um detalhe importante. Sorte a dela que tinha os melhores reforços:

-Vai colocar a milícia no caso, não é? - ela perguntou sorrindo um pouco, permitindo-se ter um pouco de esperança. 

Ele olhou para ela, estranhando que ela soubesse:

-Vou. - ele confirmou - Como eu disse, tudo por vocês. - ele sorriu minimamente.

Ela fechou os olhos e se lembrou de uma vez, há tantos anos, quando Sam descobrira sem querer o que Diego fazia. Ele era um membro aposentado do exército mexicano, tendo sido treinado algumas vezes nos EUA e condecorado por seus méritos. Agora ele comandava secretamente uma das milícias em Tijuana, procurando pacificar a cidade e livrá-la dos cartéis. Era dessa forma que ele tinha conseguido espalhar homens em determinadas áreas da cidade, de modo que ele soubesse quando Sam e Freddie chegassem em Tijuana.

O barulho do carro desligando a trouxe de volta de seus devaneios. Diego já contornava o carro, abrindo a porta para ela quando ela se deu conta de que haviam chegado. O hotel era fabuloso. Rodeado de árvores frondosas e palmeiras, era um prédio bem largo e não muito alto, seis andares no máximo. Havia uma piscina iluminada na frente e uma pequena ponte de um lado ao outro dela. Perto das portas de entrada havia uma enorme fonte circular. No enorme letreiro pendurado lia-se: Hotel Lucerna Tijuana. 

Na recepção Diego parou e falou com uma funcionária de uniforme vermelho:

-Quarto 407, diga a Pam que a filha dela está aqui. - ele pediu de forma polida, mas apressada.

Ela discou os números rapidamente e após uma pequena conversa e um aceno de cabeça da recepcionista, Sam era guiada por Diego até os elevadores. A viagem de elevador foi curta, e ela teve que se espremer entre os três homens no elevador pequeno. As portas se abriram com um 'ding' característico e eles avançaram por um corredor pintado de um azul e amarelo suave. 

Na porta de número 407 eles pararam, e Diego bateu na porta. Antes que eles tivessem tempo de pensar em qualquer coisa, a porta foi aberta rapidamente, revelando Pam do outro lado. Por um milésimo de segundo, Sam acreditou ter visto uma sombra de preocupação no rosto da mãe se transformar em alívio, para logo depois virar seu permanente sorriso de desdém. A transformação da expressão de Pam foi tão rápida que, se ela não estivesse olhando, acreditaria que nunca aconteceu. Pam cruzou os braços e se encostou na moldura da porta, o sorriso sarcástico nunca deixando seus lábios:

-Então, você finalmente resolveu dar as caras? - ela perguntou, depois de analisar Sam por alguns segundos, os olhos azuis parecendo perfurar a filha. 

Sam abriu a boca para responder à altura, mas foi interrompida quando Pam foi empurrada para o lado bruscamente e uma Marissa mais do que preocupada entrou em cena. Seus olhos registraram Sam vagamente, enquanto ela vasculhava o corredor à procura de Freddie. Quando não o encontrou, ela se voltou para a garota à sua frente, os olhos acusadores. Sam jurou que podia ver a raiva e o desespero emanando em ondas da mulher:

-Onde está Freddie? Onde está meu filho? - ela exigiu num jato, a voz subindo várias oitavas. 

Sam respirou fundo, preparando-se mentalmente para a crise da Louca. Porém, quando ia respondê-la, Diego interveio:

-Acho que essa não é uma conversa para se ter em um corredor de hotel, minha senhora. - ele procurou ser razoável, guiando Marissa gentilmente pelos ombros para dentro do quarto. Ela protestou, é claro, exigindo que ele tirasse as mãos de cima dela enquanto mantinha os olhos firmes em Sam. 

Pam, por sua vez, fechou a porta e sentou-se lentamente na cama, os braços ainda cruzados. O sorriso tinha desaparecido e ela olhava de forma severa para a filha, numa de suas raras demonstrações de postura maternal.

-Bem? - Marissa pressionou, os olhos fechados e contando até dez, numa tentativa heroica de se acalmar.

Sam teve vontade, mas resistiu ao instinto de recuar e se encolher diante das palavras de Marissa. Bom, era agora, não é? Ela pensou, fechando os punhos com força. Se conseguisse sobreviver à ira da mãe superprotetora diante dela, talvez ela também conseguisse a missão impossível de trazer o filho dela de volta.

Ela pensou em como dizer aquilo. Já era horrível o suficiente em sua cabeça. Após alguns segundos de um insuportável silêncio, ela decidiu que uma resposta direta era a melhor abordagem, já que a paciência da Louca estava se esgotando e enrolar mais não adiantaria em nada:

-Freddie foi levado por traficantes de droga. - ela confessou num sussurro.

-O que foi que você disse? - Marissa rosnou, não tendo ouvido o que Sam dissera.

-Eu disse que o Freddie foi levado por traficantes. - Sam repetiu em voz alta, perdendo a paciência também.

O que aconteceu depois foi quase surreal. Marissa encarou a adolescente em absoluto choque. Que foi se transformando em raiva e desespero à medida que seu rosto foi mudando de cor. De sua normal palidez para um vermelho claro, que foi escurecendo até ficar tingido de uma estranha cor púrpura. Ela ficou parada que nem uma estátua, encarando Sam com os olhos arregalados, a única evidência de que ainda estava viva eram os rápidos fôlegos que ela tomava.

-Meu filho o quê?! - ela urrou de uma vez, fazendo Sam, desta vez, encolher-se um pouco.

A mulher avançou para Sam, sendo rapidamente contida por Diego, que a segurou pelos ombros, impedindo-a de atacar a garota. Quando ela viu que não poderia se livrar do aperto dele, ela se limitou a gritar, o dedo em riste na direção de Sam:

-Eu disse a ele que você não era coisa boa! Um delinquentezinha qualquer! - ela cuspiu olhando Sam com desprezo, ainda tentando se livrar de Diego.

Pam finalmente se manifestou, pulando da cama e indo em direção à Marissa pisando duro:

-Olha como fala da minha filha, entendeu? Ela pode não ser a pessoa mais correta do mundo, mas não vou deixar que a desrespeite! - ela alertou. Podia não ser a melhor mãe do mundo, mas quando mexiam com Sam a coisa mudava de figura.
  
Mas Marissa apenas riu amargamente, virando-se para Pam:

-E eu estou falando alguma mentira? Aposto que ela é a culpada pelo meu Freddie ter sido levado! Não seria uma surpresa! - ela declarou, depois estreitou os olhos, inclinando-se na direção da adolescente - Eu juro que se conseguir resgatar o meu filho você nunca mais vai chegar perto dele, eu fui clara? Nunca! - ela vociferou.

-Parem! - Diego gritou de forma autoritária - Se acalmem, também. Isso não é hora de discussão! Sam errou, tudo bem! Mas acho que se deveríamos gastar esse tempo pensando em como achar Freddie ao invés dessa gritaria sem fim. 

Marissa empurrou os braços dele para longe dela, endireitando a roupa e procurando recuperar o fôlego. Pam voltou a sentar na cama e Sam sentou-se em uma poltrona ali perto, cruzando os braços de um modo muito parecido com o da mãe:

-Agora Sam, será que poderia nos contar como tudo aconteceu? Tenho uma boa ideia de como foi e de quem fez isso, mas pode ajudar a descobrir alguma coisa a mais. - Diego explicou, voltando-se para ela de forma profissional.

Bufando uma vez, ela contou a eles o que tinha acontecido. Falou sobre o cassino, sobre o jogo de pôquer, mentindo uma vez quando disse que eles foram obrigaram a jogar e, por fim do que se passara no estacionamento. Quando terminou seu relato, ela percebeu que todos a encaravam mudos. Ela se mexeu desconfortável na cadeira, incomodada com o silêncio:

-E aí, ninguém vai dizer nada? - ela perguntou, ansiosa.

-Precisamos chamar a polícia isso, sim. Pelo que eu entendi esses incompetentes - e indicou Diego e os dois homens parados perto da porta com um gesto amplo - viram tudo acontecer e não fizeram nada para impedi-los de levar meu filho. 

Diego estreitou os olhos para Marissa, respirou fundo uma vez tentando reunir o máximo de calma e abriu a boca para se defender: 

-Tijuana é dividida em áreas, Marissa. - ele começou a explicar lentamente, como se ela fosse uma criança que não entendesse um problema simples - E a região do cassino é uma área de atuação deles. Ainda não conseguimos pacificar aqueles arredores. Portanto, se eu fosse visto por aquelas bandas e pior, começar uma briga com apenas três de nós, eles não só teriam um motivo para matar seu filho, como matariam todos nós. Seria só uma questão de tempo até que mais deles aparecessem.  

Ele continuou:

-E chamar a polícia é inútil, pelo que Sam contou, ele tem gente dele infiltrada lá. Seria muito difícil que eles fizessem algo para prejudicá-lo.

Ela abriu os braços, exasperada, não se dando por vencida:

-Bem, ele é um cidadão americano, podemos chamar a CIA, o FBI, alguém! - ela gemeu, sentando-se pesadamente na cama ao lado de Pam. 

Diego balançou a cabeça: 

-Levaria muito tempo, um tempo que nós não temos. Freddie tem menos de vinte e quatro horas. Temos que agir por conta própria. Pelo que você nos contou, Sam, só nos resta uma saída. - Diego declarou, sacando o telefone, a postura ficando tensa.  

-O que quer dizer com isso? - Marissa perguntou friamente. 

-Quer dizer que vamos precisar da única pessoa que pode ajudar quando se trata de Robert Klim. - ele explicou sem olhar para ela, pressionando os números apressadamente - O braço direito dele: Morgana. Ela pode nos ajudar com uma linha de ação e, com ela, teremos o elemento surpresa.

Antes que ele pudesse apertar o botão verde, Sam o parou:

-Espera, mas se ela é o braço direito dele, por que vai querer nos ajudar? - ela perguntou, franzindo a testa - Isso não faz o menor sentido.

-Eu não sei quais são os motivos dela, mas ela tem sido bem útil para nós até agora e isso é o bastante para mim. - ele deu de ombros, apertando o botão e saindo do quarto em direção ao corredor.

-Não acho que isso seja uma boa ideia. - Marissa balançou a cabeça, virando-se para Pam nervosamente - Chamar uma pessoa de confiança desses sequestradores para cá.

                                         ***

Uma hora depois, Sam, Pam e Marissa eram guiadas por Diego em direção ao restaurante do hotel, sentando-se em um escritório no segundo andar. Da sala, refrigerada e com um imenso janelão de vidro fumê, podia-se observar secretamente todo o movimento do restaurante. Chamava-se El Arcueducto e era especializado em comida mexicana. Ricamente decorado, mas havia um toque rústico especialmente mexicano. Na parede perto da entrada havia um pequeno palco onde um grupo de mariachis tocava alegremente. Sam encostou a cabeça no vidro frio e observou quando eles desceram do palco e deslizaram até a mesa de alguns jovens que cantavam e batiam palmas.

Foi quando vulto negro lhe chamou atenção. Ela primeiro viu os longos cabelos pretos movimentarem-se com agilidade por entre as mesas, até que, quando o vulto levantou um pouco a cabeça que até aquele momento estava abaixada, Sam percebeu que se tratava de uma mulher. Na verdade, era ela linda. Ligeiramente pálida, o que não condizia tanto com seus traços latinos. Não tinha a pele bronzeada como a maioria dos mexicanos que Sam havia conhecido. Os cabelos eram ondulados, negros como a noite e iam até mais da metade das costas. Mas o que mais a fascinou foram os olhos azuis elétricos, destacados pela maquiagem forte que usava. Perscrutava o ambiente de forma ávida, com os olhos concentrados, desconfiados, como se esperasse perigo a qualquer momento. Sam estranhou quando a viu rumar para as escadas.

Ouviram três batidas fracas, mas firmes. Os outros, despertando de uma conversa baixa mas nervosa, ficaram em silêncio, e Diego rapidamente se levantou, indo atender a porta do escritório. Sam virou a cabeça olhando de perto a mulher. Pode ver com mais clareza a jaqueta que ela trazia nos braços e o vestido preto, curto e meio gótico que ela usava, juntamente com a meia arrastão e as botas de salto que, surpreendentemente, não fazeram nenhum barulho contra as escadas de metal. Era jovem, não podia ter mais que três anos de diferença entre ela e Sam, embora a postura e as roupas a fizessem parecer mais velha.

Diego pôs o braço em suas costas, indicando para que ela entrasse. Sam viu quando ela enrijeceu ao toque dele e ele retirou a mão discretamente, entendendo que ela não queria contato. Ele pigarreou uma vez e, quebrando o silêncio, indicou com a mão a recém-chegada:

-Esta é Morgana Vega. A mulher de quem falei. 

Sam sentiu seus olhos arregalarem. Aquela era Morgana? Ela não tinha cara nenhuma de braço direito de chefe de cartél. Não sabia o que estava esperando, mas definitivamente não era aquilo. A mulher parecia mais uma daquelas cantoras góticas ou uma modelo que criminosa. Sentiu os olhos azuis dela analisarem a sala da mesma forma que tinham feito no andar de baixo para, um segundo depois, encontrarem os seus, e Sam a viu relaxar a postura minimamente.

Marissa foi a primeira a se manifestar:

-Mas essa é Morgana? - ela perguntou incrédula, aparentemente partilhando das ideias de Sam - Ela é só uma... garota, Diego, como será capaz de nos ajudar? - Sam percebeu que Marissa teve dificuldade em dizer o garota. 

Morgana cruzou os braços e encarou Marissa friamente:

-Como braço direito do meu pai, eu sei de muitos dos segredos dele. - ela disse secamente.

-Você é filha dele? - Sam estreitou os olhos para ela, depois riu sem humor - Mais um motivo para não confiarmos nela. - ela observou.

-Os meus motivos só interessam a mim. - ela rebateu - Mas até que seria divertido estragar os planos do Robert. - ela acrescentou com um sorrisinho cínico. 

Quando percebeu que ainda a encaravam com desconfiança, ela deu de ombros como quem pouco se importa:

-Eu vim aqui porque vocês precisam de mim. Não o contrário. Não tenho que perder meu tempo para ficar me explicando ou implorando para que vocês me deixem ajudá-los. - ela estava perdendo a paciência - Mas acontece que eu sou a única chance de vocês. Sei quais são os planos do meu pai e sei onde seu amigo está. Podem ir até a delegacia, mas duvido que serão de alguma serventia. Agora, se quiserem ajuda será sob as minhas condições. E a primeira é que não me façam perguntas idiotas. - quando terminou, ela olhou para cada um presente, certificando-se de que tinha sido clara.

-Parece argumento suficiente para mim. - Pam quebrou o silêncio e Morgana sorriu forçado.

-Então, estamos combinados. - Diego indicou uma cadeira da mesa para Morgana, fazendo com que ela sentasse antes que pudesse mudar de ideia.    

-Você mencionou saber onde meu filho está. - Marissa começou, indicando que Morgana poderia começar a falar.

Morgana empertigou-se na cadeira, tomando uma postura profissional, pensativa:

-Sim, eu recebi uma ligação de Robert há algum tempo e ele me disse que tinha conseguido alguém para atravessar a droga. Não me disse o local exato, porque ele não acha prudente que eu suje minhas mãos. Mas eu tenho uma boa ideia de onde ele está. Eu conheço seus métodos, não é a primeira vez que ele faz isso. Ele prefere locais isolados, amplos, onde tenha ao mesmo tempo privacidade e liberdade para fazer o que quiser com quem ele mantém refém. Diego, pegue para mim aquele mapa de Tijuana, por favor. - ela apontou para um mapa quadrado afixado na parede oposta.

Diego abriu-o sobre a mesa:

-Agora, sabendo que ele prefere ficar fora de vista e que não pode se arriscar em entrar em território que não lhe pertence, as únicas áreas prováveis seriam estas. - ela sacou um pincel de um porta lápis ali perto e marcou a área leste do mapa com um círculo.

A região era pouco habitada, Morgana explicou, havendo apenas algumas construções esparsas e antigas, sendo esquecidas devido ao crescimento de Tijuana rumo ao litoral e em direção à fronteira, portanto, perfeitas para se manter um esconderijo.

-Na ligação, ele me disse que faria questão de fazer um espetáculo caso ela - e indicou Sam com o queixo - não cumprisse sua parte do trato. - ela completou pensativamente - Espetáculo, espetáculo... - ela ponderou por alguns segundos, batendo uma unha roxa no queixo - Isso deve significar alguma coisa. 

Então seus olhos azuis arregalaram-se, uma chama de realização brilhando neles. Ela riu, triunfante:

-Ah, Klim, você é tão previsível. - ela murmurou para ela mesma. E para os outros disse - Eu já sei onde ele está. - anunciou.  

Marissa cruzou os braços, impaciente:

-Quer fazer o favou de compartilhar a informação? 

Morgana rolou os olhos, mas falou mesmo assim:

-Robert estava entediado e aborrecido hoje à noite. Por isso ele foi ao cassino. Ele sempre vai lá quando está entediado. Lá ele encontrou Sam e a fez cair no golpe antigo do jogo de pôquer. Normalmente ele só tira o dinheiro dos estrangeiros, mas como ele precisava de alguém para fazer a entrega, ele se utilizou disso. - ela se inclinou sobre a mesa, um olhar ávido no rosto - Quando está entediado, ele geralmente gosta de fazer algo grande, entenderam? Tenho pena do seu amigo, ele escolheu um péssimo dia para ser levado, Robert fará algo requintado. 

-Tudo bem, mas como isso nos leva à localização dele? - Sam exigiu, tentando não pensar no que poderiam estar fazendo com Freddie.

-Desde criança me especializei em prestar atenção a tudo à minha volta. Palavras, gestos, roupas, expressões, tudo. É assim que sei como ele age, tive anos para observá-lo. Daí que, como eu já disse, quando ele me ligou hoje, disse que faria um espetáculo. Espetáculo. - ela destacou a palavra - Ora, na zona leste de Tijuana há um teatro antigo em uma área abandonada. Tenho quase certeza que é para lá que ele foi levado.

Cinco minutos depois, Diego havia ligado para alguns de seus homens vasculharem sorrateiramente a área. Klim cuidadosamente tomava conhecimento de cada um de seus homens e seria perigoso se os de Diego fossem pegos perambulando em território inimigo. Depois da ligação, ele voltara para se juntar à mesa e agora fazia planos com Morgana de como abordar Klim. Ela dissera que era importante irem em algum momento em que ele estivesse no teatro com Freddie, pois nesses momentos ele aliviava a quantidade de homens de vigia ao redor da construção.

-Ele é confiante demais de sua presença. Acha que o fato de estar lá intimidará qualquer um que queira desafiá-lo - ela explicou.


       Sam, Pam e Marissa, sob a orientação de Diego, foram até o primeiro andar para jantar. Os outros dois saíram cuidar de alguns preparativos. 

Marissa, mesmo sob protestos, foi arrastada por Pam até uma mesa. Ela alegava que não podia pensar comida quando o filho corria risco de vida. Valdéz, o chef do restaurante e bom amigo de Diego foi especialmente designado para atendê-las. Pediram algumas das especialidades: tacos de bife com pimenta e burritos. 

Quando a comida chegou, Sam atacou os pratos, tentando não se importar com o olhar desaprovador que Marissa lhe lançava enquanto apenas bebericava um suco:

-O que é? Preciso juntar forças para mais tarde. - ela explicou defensivamente, a boca cheia de bife.


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Notas finais do capítulo

Bom, gente, eu particularmente fiquei em dúvida quanto a colocar novos personagens como o Diego, a Morgana e o Robert na história, então quero saber o que vcs acham deles, ok?
Comentários, dúvidas ou reclamações? :)