Graças à “chantagem emocional feminina”, eu seria obrigado a ir salvar Luke. Não queria olhar para sua cara novamente, porém precisava ter certeza que nada aconteceria a Annabeth. Não que nós fossemos daqueles namorados que ficavam grudados um no outro, mas eu meio que não podia a deixar ela ir sozinha. Se me perguntassem o porquê de eu estar indo junto, argumentaria que era culpa da curiosidade de saber qual era a coisa que Hades tanto cobiçava. Afinal, não é bom Annabeth saber que me tinha em suas mãos. Era provável que usasse isso contra mim.
Quando chegou a hora de partir, subi a Colina Meio-Sangue. Como sempre, o dia estava ensolarado, com nenhuma nuvem, e ventos refrescantes. Nenhum campista de fora da missão havia se levantado ainda. Nico já estava lá, juntamente com Rachel e Quíron. Eles pareciam estar em uma conversa séria, e fizeram caretas quando os interrompi.
– Hã, sem querer parecer pessimista, mas algum de vocês já sabe onde encontrar Cronos? – Disse, dando “bom dia” com um aceno. Nico assentiu.
– Ele escolheu um hotel na cidade de Scotchtown. Acho que está abandonado, ou algo do tipo – Disse, sem muito entusiasmo.
Annabeth apareceu atrás dele, como se estivesse prestando atenção no mapa o tempo todo. Eu ri ao ver sua expressão séria.
Assim que tudo ficou resolvido em relação à missão, fomos nos despedir das pessoas que estavam ali. Rachel deu um abraço em Nico, e depois em Annabeth. Quíron fez o mesmo, porém não me deu um abraço tão forte quanto da ruiva. Quer dizer, eu me senti estranho da forma como ela estava pendurada em mim. Annabeth ficou me encarando e depois revirou os olhos. Fomos em direção ao meu carro, e suspirei lembrando-me do amasso em cima do capô. Aquele Minotauro já havia me causado danos de mais. Quantas vezes são necessárias matar um monstro para que ele suma de uma vez por todas? Argh.
Sentei no banco da frente, Annabeth foi ao de passageiro e Nico atrás. Comecei a fazer uma verificação mental, tentando não esquecer nada que fossemos precisar.
– Percy, já fiz isso. Não se preocupe, pegamos tudo o que era necessário – Nico riu, e Annabeth segurou o sorriso.
– Tudo bem, vamos de uma vez – Revirei os olhos.
Liguei o rádio em uma música qualquer, abri o teto solar e as janelas, coloquei meus óculos de sol, e apertei o acelerador. Foi uma viagem extremamente calma, Nico foi escutando música durante o trajeto enquanto eu e Annabeth ficamos conversando.
Depois de alguns Km e pedágios absurdamente caros, avistei a Placa de “Bem vindos á Scotchtown”.
A cidade era um tanto quanto rural. Famílias voltando a pé da igreja, pequenos mercadinhos, sem sinaleiros nas ruas, casas antigas, somente um posto de gasolina... As pessoas nos encaravam como se fossemos os únicos visitantes á anos. Bom, nós provavelmente éramos. Fiquei observando o aspecto decadente do posto de gasolina que estávamos (por que Annabeth não podia esperar para ir em outro lugar), quando Nico resolveu pegar o mapa e me dizer onde ficava o maldito hotel.
Andamos alguns minutos até que chegamos a um estabelecimento. Na placa estava escrito “Pousada Feliz: aqui todos são felizes!” e mais para trás havia uma cerca de madeira caindo aos pedaços. A casa era muito velha, a tinta estava descascando e havia várias telhas faltando. Estacionei o carro, peguei Contracorrente e fui andando até a grama, enquanto os outros vinham atrás de mim.
– Tem certeza que quer entrar ai? Deve ter muitas aranhas – Sorri maleficamente, olhando para Annabeth.
Ela me encarou por alguns segundos então voltou para o carro, abriu o porta malas e pegou um spray anti-insetos. Nico revirou os olhos e eu ri.
– Ta, vambora – Disse. Demos passos rápidos em direção a porta. Tirei a tampa de minha caneta e observei se Annabeth havia pegado seu boné dos Yankees.
Dentro da casa estava escuro, procurei um interruptor para poder acender a luz e ver melhor como era. A lâmpada estava queimada, então continuamos a andar. Eu estava na frente, Annabeth no meio e Nico ia atrás, para proteger a reta-guarda. Havia uma porta no final do corredor, que dava para uma sala estranha. Lá a luz era um pouco melhor, então pude ver uma figura virada para a parede. Pendurado no centro, com vários cortes nas costas, estava Luke. Escutei um sussurro baixo atrás de mim, o que deduzi ser de Annabeth. Entramos em um cômodo logo ao lado da porta, e ficamos observando quem mais estava na sala. Pelo o que vimos, havia seis monstros, um par guardando a entrada, mais dois a saída e outro par cuidando para que Luke não fugisse. Ou seja, cada um de nós teria que matar, silenciosamente, dois monstros. Nico preparou sua espada, Annabeth colocou seu boné e eu entrei na sala.
A primeira coisa que vi foi uma quimera e uma fúria, responsáveis pela entrada. Avancei na quimera do lado direito, e com um único golpe, ela virou pó. Virei-me para o monstro da esquerda, porém Nico já havia matado a “amiga” da Sra. Dodss. Vi um monstro ser morto por Annabeth (eu não a via, mas era de se presumir) então avancei em outra fúria.
Dessa vez eu não consegui ser tão rápido. Na verdade, foram necessários vários golpes para que o monstro virasse pó. Eu ainda acabei com a minha blusa rasgada e com muito sangue jorrando de meu braço. Quando me dei conta, todos os monstros haviam sido exterminados, e meus companheiros estavam completamente bem. Nenhum arranhão, o que presumi ser o único a ter tido problemas.
– Hã, Percy, quer alguma ajuda? – Disse Nico.
– Só faça o favor de revistar se tem mais alguém na casa, obrigado – Falei. Eu achava estranho ser a pessoa para quem pediam ordens.
– Quis dizer com o machucado – Ele disse, parecendo indiferente.
Annabeth se interviu no meio.
– Tenho certeza que Percy vai ficar bem, venha me ajudar com Luke – Ela parecia estar muito concentrada com os machucados de outra pessoa, então resolvi ir eu mesmo verificar os cômodos da Pousada Feliz.
Havia cinco quartos, alguns melhores e outros não muito bons. Usei o bronze celestial de Contracorrente para iluminar o caminho, porém não havia mais ninguém no Hotel. Estranhei, afinal, como Cronos deixaria Luke sozinho com um bando de monstros sem nenhuma proteção a mais?
Voltei para a sala. Nico estava revirando a geladeira e minha namorada cuidava dos ferimentos do filho de Hermes. Dei um oi com a cabeça para ele, e comentei com Annabeth sobre o fato de ninguém estar na casa. Ela parou subitamente.
– Por Deuses – Como em um gesto natural, ela andava de um lado para o outro – Cronos nunca poderia ser tão burro, e mesmo assim o fez. Como poderia ele nos deixar entrar desse jeito?
Annabeth foi interrompida por Nico, que berrou de felicidade quando encontrou uma lasanha que havia vencido há um ano.
– Ah, cara, eu estou morrendo de fome. Vou fazer uma dessas, alguém mais vai querer? Vamos ver, quantos minutos eu coloco pra esquentar? – Ele gritava, com o humor totalmente mudado. Como se a comida pronta fizesse seu dia melhor. Nós dois reviramos os olhos.
Annabeth continuou a falar sobre como ela tinha superestimado Cronos, quando foi interrompida novamente por Nico. Só que dessa vez, era um grito de medo.
– CORRAM! – Ele berrou, desesperado. Quando ele saiu da cozinha, foi que eu pude ver um bomba dentro do microondas. Restavam-nos somente 20 segundos, antes que fossemos pulverizados. Puxei o braço de Annabeth e a estava levando até a porta, quando ela parou.
– Nós não vamos deixar Luke para trás! – Ela disse, correndo de volta para a sala e eu fui atrás dela.
Annabeth ajudou o filho de Hermes a sair do sofá e colocou o braço esquerdo de forma que ela estava apoiando todo o peso dele sozinha. Fui até lá e fiz o mesmo, de forma que o peso fora dividido. Fomos correndo até a saída, então Nico nos ajudou a levar Luke para fora. No exato momento em que saímos do Hotel, houve uma explosão de fogo grego e tudo em volta ficou destruído.
Nós quatro voamos alguns metros e caímos direto na estrada.