No dia seguinte as coisas continuam seguindo sua tradicional rotina, porém durante todo o caminho até a escola Cecília vai ouvindo toda a empolgação de Fabiana pelo dia anterior.

– Nossa amiga, nem acreditei! O Luis é muito melhor do que eu imaginava! Ele tem aquela carinha de santo, mas tem uma pegada!

Cecília apenas ri dos comentários da amiga.

– E aí, vão ficar hoje de novo? – pergunta.

– Sim! Depois a tarde vamos sair, dar uma volta pelo shopping e ir ao cinema.

– Nossa já está assim? Pelo visto essa ficada vai render namoro logo logo.

– Calma Cissa, ainda não sei, estamos nos conhecendo ainda. Mas quem sabe né? – diz rindo – E você, está melhor com relação ao débil do Mateus?

– Não chama ele assim Fabi, ele não tem culpa de eu ser sonsa.

– Você não é sonsa Cissa, ele que é um mané que olha apenas pra quantidade e não pra qualidade. A cada dia detesto mais ainda esse cara!

– Sou sonsa sim, mas quer saber? Não vou mudar o meu jeito por causa dele. Logo vou tirar ele da minha cabeça, ainda mais agora que terei uma ocupação.

– Ah é? Posso saber qual?

– Vou ajudar o Murilo a estudar. Hoje mesmo no fim da tarde vou a casa dele.

– Sério?

– É. Ele veio me pedir ajuda porque viu que sou boa aluna em quase todas as matérias.

– Quase todas? Em todas, isso sim!

– Mas ele pediu minha ajuda mais nas que tem cálculos e tal, ele se confunde muito, já havia percebido no dia do exercício em grupo que a professora nos deu. Ajudar ele vai me deixar com a mente ocupada, nem vou ter tempo pra pensar no Mateus.

– Verdade. Se eu fosse você daria uma força maior em física.

– Porque física?

– Esqueceu que o professor o detesta? Não vai perder uma oportunidade de ferrar o Murilo.

– Verdade. Bem, vou fazer a minha parte, vamos ver o interesse dele também. Ele é repetente, é bom não vacilar.

Aquela manhã estava sendo normal, porém Cecília queria que acabasse logo. Por mais forte que se mostrasse, por dentro estava péssima por ver Mateus e Patrícia ali tão perto dela. Agora mais do que nunca se aprofundava nos estudos para manter a mente ocupada, mas não estava sendo tão fácil, afinal o que mais queria esquecer estava bem ali, diante dela.

Enquanto terminava um exercício qualquer, reparou que alguém se abaixava ao lado de sua mesa. Era Murilo.

– Desculpa, sei que você já vai ter que me dar aulas hoje, mas tem como você me dar uma ajuda aqui também?

– Claro sem problemas.

Murilo mostra o exercício e onde está com dúvidas. Cecília calmamente explica onde está o erro, corrigindo e ensinando Murilo a como fazer.

– Prontinho, está feito.

– Você faz tudo parecer tão fácil. – diz Murilo olhando o caderno – Valeu.

– É fácil, só tem que prestar bem a atenção. Quando formos estudar eu te ensino umas técnicas de memorização.

– Tudo certo pra mais tarde então.

– Tudo sim, 18hs estarei te esperando na papelaria.

– Beleza então. Vou voltar pro meu lugar antes que sobre pra mim – diz apontando na direção do professor – Até mais tarde.

Murilo sai e Cecília continua a fazer seus exercícios. Enfim o sinal bate e Cecília arruma suas coisas saindo da sala seguida por Fabiana.

– Não ia me esperar?

– Pensei que fosse sair com o Luis.

– E vou, mas depois do almoço. Ir ao cinema com uniforme da escola é cruel! – brinca.

Logo atrás delas vinha Mateus e Patrícia. Cecília percebeu e apertou o passo, saindo logo de perto deles.

– Calma Cissa, você vai conseguir, vai conseguir – dizia para si mesma.

Fabiana não entendeu nada, até que viu o casal entre beijos e abraços logo atrás delas. Achou melhor não dizer nada, apenas colocou a mão no ombro da amiga e continuaram andando.

Chegando ao prédio onde Fabiana mora, elas se despedem.

– Tchau amiga, bom passeio.

– Obrigada Cissa. Boa aula e boa sorte lá com o Murilo.

Cecília se despede e segue o caminho até sua casa. Dá um sorriso frio e pensa:

“Sorte vai ser eu conseguir tirar o Mateus da minha cabeça, isso sim”.

Já em casa, após almoçar Cecília separa alguns livros e folhas de fichário onde contém as matérias que ensinará para Murilo.

Como o ajudando acabará por estudar também, decide aproveitar um pouco o tempo vendo um filme qualquer. Assim que o filme acaba, olha no relógio e começa a se arrumar. Toma um banho e coloca uma roupa básica, jeans claro e uma baby look. Prende o cabelo como faz todos os dias e coloca apenas um brilho incolor nos lábios.

Avisa a mãe que vai estudar com o colega de turma e sai.

A papelaria ficava cerca de uns dez minutos da casa dela, então imaginou que Murilo também não devia morar muito longe.

Logo chegou à papelaria e entrou. Murilo estava atendendo uma senhora e o filho. Assim que a viu sorriu, e ela fez um sinal dizendo que o esperaria do lado de fora.

A papelaria era enorme, vendia de tudo. Tinha uma vitrine onde deixava alguns dos produtos à mostra. Cecília ficou a olhando enquanto esperava por Murilo.

– Desculpa, mas cliente sabe como é né? – diz Murilo atrás dela.

– Que susto! – diz olhando agora para ele.

– Foi mal. E aí vamos?

– Claro, vamos sim.

No caminho Cecília puxa assunto.

– Você mora com seus pais?

– Só com a minha mãe.

– São separados?

– Não. Meu pai morreu há seis anos.

– Desculpa. – diz sem graça.

– Tudo bem, como você ia saber? – diz sorrindo.

Murilo ficava muito bonito quando sorria Cecília não conseguia entender o porquê na escola ele ser tão fechado.

– E você, mora com quem? – pergunta pra ela.

– Meu pai e minha mãe.

– Legal. Tem irmãos?

– Tenho um irmão, mas ele já é casado. Você tem irmãos?

– Não, filho único.

– Que sorte você tem! Ninguém pra te encher o saco – brinca Cecília fazendo Murilo sorrir.

– Às vezes sinto falta de alguém pra me encher o saco. Em casa somos só minha mãe e eu, ela trabalha o dia todo, quando chega mal nos falamos porque está cansada e vai dormir logo. Me sinto sozinho.

– Entendi. Tem esse lado chato também.

Enquanto falam, Murilo para em frente a um portão e tira uma chave do bolso, o abrindo.

– Pronto professora, chegamos. – brinca Murilo.