Eu achava que aquele Natal, vinte anos antes, seria como todos os outros: a enorme família Weasley comendo, rindo e falando sem parar, meus sobrinhos correndo para todos os lados com os presentes que ganharam e minha mãe sempre com alguma “convidada” especial para me apresentar. Eu ri internamente ao pensar em Julie, a convidada daquele ano. A pobre coitada não queria ser empurrada para ninguém, mas a sra. Weasley conseguia ser insistente quando queria. E no momento o que ela mais desejava era ver-me casado. Não é que eu fosse o típico eterno solteirão, ao menos não intencionalmente, mas a mulher certa ainda não tinha aparecido. Não até aquela noite.

- Hermione, entra logo, está muito frio lá fora. Roni, meu filho, que bom que gosta do seu suéter. Crianças, que saudades de vocês, meus netos. E quem é essa que eu não conheço?
- Essa é a Ana, sra. Weasley, uma amiga minha do trabalho. Faz pouco tempo que chegou à Londres e ia passar o Natal sozinha, então eu tomei a liberdade de convidá-la, a senhora não se importa, né?
- Oh, claro que não, onde come um comem dois... ou trinta, seja bem vinda! Além disso ninguém deve passar o Natal sozinha, fique à vontade, Ana.
- Obrigada, sra. Weasley, fico feliz pela Hermione ter me convidado e pode me chamar de Aninha.

Aninha era uma jovem de sorriso fácil, pele branquinha, olhos castanhos e cabelos encaracolados na altura dos ombros, também castanhos. Ao perceber quem estava sendo observada examinou a sala com o olhar até que encontrou os olhos do ruivo que a olhava desde que passara pela porta. Sentiu uma sensação estranha, como se já o conhecesse e ao mesmo tempo tinha certeza de que nunca o havia visto. Ela não sabia como isso era possível e parou de pensar no assunto quando Hermione se aproximou dela, sussurrando em seu ouvido:

- Nossa, daqui a pouco a sra. Weasley vai soltar fogos de artifício.
- Ahn? Por quê?
- Porque ela acabou de encontrar a mais nova nora dela.
- Ah é? Quem? – Aninha realmente não estava entendendo porque a amiga estava falando aquilo.
- Você.
- Eu? Hermione, nós mal chegamos e você já está bêbada?
- Claro que não, sua tonta. Aquele ali – e apontou para o ruivo, que ainda a encarava – é Jorge Weasley, o único filho solteiro da sra. Weasley.
- E onde eu entro nessa história?
- Você realmente não entendeu, né?
- Não. Explica isso direito, Hermione, você sabe que eu sou lerda.
- Realmente! Aninha, todos repararam no olhar que vocês estavam trocando e em como ele não para de olhar para você desde que chegamos.
- Você está viajando, Hermione!
- Não estou não. E eu conheço o Jorge há muito tempo, ele nunca olhou para uma
garota como ele olhou para você. E ainda está olhando.

Aninha simplesmente balançou a cabeça e foi pegar uma bebida. Ela estava atônita. Nem havia falado com o rapaz e já a estavam casando com ele. Tudo bem que ele era bonito e tinha o olhar mais intenso que ela já tinha visto, mas isso não significava nada. Claro. Estava tão perdida em seus próprios pensamentos que já tinha alguém na varanda para a qual foi.

- Feliz Natal, moça!
- Ah! – ela gritou de susto e derramou a bebida no chão, por pouco não derrubando o copo também – Por Merlin, você quer me matar do coração? – só então ela ergueu a cabeça e viu que esbarrou no ruivo em que estava pensando.
- Não, só queria vir à varanda, não tenho culpa se você não presta atenção em nada.
- Eu estava distraída, oras! Pensando...
- Em quê?
- Ahn? – um rubor cobriu sua face enquanto se fazia de desentendida.
- Em que você estava pensando, né? O que mais seria?
- Ah, nada demais...
- Nada demais, assunto interessante...
- Ah, mas... seu... seu...
- Cara lindo e gostoso que te deixa nervosa?
- Idiota!
- Você realmente é muito criativa.
- Ah, vou voltar para dentro.
- Vou com você – ele disse se dirigindo para a porta atrás dela.
- Não vai não. – ela parou
- Vou sim. – ele parou também.
- Mas olha quem está debaixo do visco! – era Gina, irmã mais nova de Jorge.
- Beija, beija, beija! – todos cantaram, os olhos neles.

Aninha estava vermelha e naquele momento seus tênis all star eram muito interessantes para ela. Jorge, por outro lado olhava para ela com um sorriso de lado, como se estivesse planejado tudo aquilo, Talvez tivesse mesmo.

- Ei, não precisa fazer isso se não quiser – ele disse baixinho no ouvido dela.
- Não, eu quero. – ela respondeu também baixinho – Quer dizer, se eu não te beijar todos vão me perturbar o resto da noite.
- Ok, então.

Ele, então, a beijou. Um beijo casto, inocente e com cerca de trinta pessoas olhando, mas ainda assim eles nunca esqueceriam daquele momento. Nem do olhar que se seguiu. Pelas próximas semanas se falavam cada vez mais, até que não tivesse um dia em que não se comunicassem, fosse por correio coruja ou pessoalmente, indo ao caldeirão furado ou algum outro pub, tanto na Londres bruxa quanto na Londres trouxa. Não foi com espanto que os amigos e familiares receberam a notícia de que estavam namorando. No Natal seguinte ele lhe deu um anel de presente e ela um sim.

Agora, vinte anos depois, estamos comemorando mais um Natal em família, na casa dos meus pais, com nossos filhos Lindsay e os gêmeos Mark e Kevin, que trouxeram as namoradas. A tendência era aumentar o número de Weasley's no mundo e estávamos conseguindo. Agora eram quase 50 pessoas. Mas só desde aquele natal, tantos anos antes, que não me senti mais sozinho. E em todos os anos eu dava um jeito de ficar com ela debaixo do visco. Ela demorou uns cinco anos para descobrir que eu pagava à Lillian, filha do Harry com a Gina, para colocar o visco na porta do cômodo em que nós estávamos, mas então já era uma tradição e ela não podia fazer nada.