A Bruxa De Liveway. escrita por belle_epoque


Capítulo 1
Capítulo 1 - Liveway


Notas iniciais do capítulo

Espero que vocês gostem ^ ~
...
Beijos,
EUQOPÉ-ELLE3



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Capítulo Um – Liveway.


– Chegamos - meu pai anunciou desligando o carro.

Havíamos nos mudados mais uma vez. Talvez fosse a terceira vez naquele ano, ainda bem que já estávamos no segundo semestre. Isso implicava dizer que não nos mudaríamos até janeiro. Desta vez era uma pequena cidade no norte dos Estados Unidos chamada Liveway. Número de habitantes? O suficiente para se contar nos dedos.

Que nostálgico” pensei comigo mesma “Mais que nostálgico: cansativo. Por acaso o seu pai é torneira para ficar pingando de lugar em lugar?” respondeu minha consciência.

Liveway era uma cidade cercada por florestas, aonde a energia elétrica mal chegara – o que significa que dava para ver bastantes estrelas no céu noturno. O índice de violência era muitobaixo, quase inexistente. Mas isso não impedia que a cidade tivesse o seu próprio hospital ou a sua própria delegacia de polícia. Precários, sim. Mas funcionavam.

Olhei pela janela; para a minha nova casa. Meu pai havia caprichado desta vez. As paredes eram revestidas em pedras cinzentas e lisas até a metade, onde começava uma madeira que a preenchia de modo horizontal. A porta da frente era uma porta de vidro que deslizava para o lado, do tipo que se põe em uma varanda ou no Box de um banheiro, (claro, meu pai não seria meu pai sem suas loucuras), as janelas eram largas e grandes e o telhado era alaranjado. Claro que ela contava com a mania de simetria que meu pai adquiriu com o tempo.

Saí do carro.

– Essa casa é linda - eu disse pegando a minha mochila de sua mão.

– Eu cresci nela - ele suspirou.

Fitei-lhe por um momento. Meu pai, Henry Malback, era um guitarrista famoso de uma banda que fez bastante sucesso nos anos 80. Agora estava aposentado, mas hora e outra fazia um trabalhinho. Sempre era lembrado em aqueles programas estilo “De volta aos anos 80”. Porém, agora era rico, ou “bem de vida” como gostava de me lembrar constantemente.

Era difícil acreditar que aquele homem de um metro e oitenta, de cabelos loiros, lisos e jogados para o lado, sobrancelhas grossas, olhos estreitos, lábios razoavelmente cheios, olhos azuis glaciais, aventureiro, que adora esportes, festeiro e que simplesmente ama torta de limão houvesse saído de uma cidade tão pequena.

– Pai, esse lugar não combina muito com você – eu admiti.

– Eu sei – ele disse sorrindo e encostando-se ao carro, ao meu lado. – Sua mãe disse a mesma coisa quando a trouxe para cá. Ela disse que era calmo de mais para alguém tão agitado como eu. Esta... Foi nossa primeira casa no nosso casamento, depois que ela ficou grávida de você, tivemos que nos mudar para uma maior.

Papai adorava falar da mamãe. Era uma pena que ela, com o corpo tão fraco que tinha, houvesse morrido enquanto se recuperava da minha gravidez. Claro que isso abalou mais o meu pai do que a mim mesma. O abalo foi tanto, que ele mal quis me olhar na cara durante um bom tempo. Até ele perceber que não era assim que ele a conseguiria de volta.

– Queria tê-la conhecido – eu disse.

– Você é uma parte dela e de mim – ele murmurou se afastando. – Acho que isso é o suficiente para você ter uma ideia de o como ela era.

Ele acariciou os meus cabelos, e entrou na casa. Suspirei e olhei ao meu redor. Eu vi estrada, árvores e poucas, quase minúsculas, casas. Entrei logo depois.

A sala também fora bem decorada. A sala fora pintada de branco, piso coberto por carpete branco, uma televisão escura, um sofá branco com as bordas em ébano, com uma poltrona fazendo conjunto, ambas viradas para a televisão. Havia belos quadros pendurados na parede. Muitos deles feitos por minha mãe, que pintava por hobbie. Sua alma artística fora algo que eu herdei também.

– É bonito, não é? – ele perguntou sorrindo. – Espere até ver o seu quarto.

Fiquei ansiosa, passei pelo arco negro e me deparei com a sala de jantar.

Uma sala esguia, o papel de parede era amarelo com a borda em vermelho, onde uma das paredes era completa por janelas. Uma enorme mesa com espaço para oito pessoas estava postada no centro com um lustre em cima. A cozinha ficou no mesmo cômodo, porém, em uma parte um pouco afastada.

Meu pai me guiou para uma porta no lado direito, ao lado da geladeira.

– Espero que você goste, porque eu achei a sua cara – ele disse com esperança.

Ele abriu a porta e eu tentei ver em que parte da minha cara estava ali. Talvez fosse a minha cara de cinco anos, pois eu me sentia vendo um conto de fadas. Tinha aquela cama de dossel, com um fino tecido azul turquesa jogado por cima, jorrando como babado pelas bordas, o edredom era róseo, o piso de madeira era escuro, o papel de parede azul turquesa com adornos sinuosos em dourado, ali tinha uma escrivaninha de madeira escura, computador e uma estante abarrotada com os meus livros.

Ele havia acertado que eu gostava de azul turquesa. Ao menos isso.

– É lindo – eu disse.

– Que bom que você gostou – ele disse dando tapinhas em minhas costas. – Todas as suas coisas já estão aí, mas vou deixar você desfazer as suas malas.

Ele me deixou sozinha no meu quarto novo. Abri uma porta ao lado do computador e achei um closet. Nossa! Um quartinho inteiro só para as minhas roupas! Como se eu tivesse um mar delas. Guardei algumas coisas que eu havia levado para a viagem. Guardei os meus livros, os meus produtos... Tudo o que eu levei na minha mochila.

Depois saí do quarto e olhei por aquela parede-janela que eu via na sala de jantar, lá atrás daria um belo jardim. Eu gostava de flores, de suas cores, de seu perfume... E, o mais divertido, de cuidar delas.

Meu pai estava guardando a sua guitarra vermelha e dourada em algum canto da sala de estar, que era de um tamanho acolhedor comparado às nossas outras casas. Em que a sala de estar era tão grande que acabava virando uma sala de jantar também. Meu pai sempre gostou de separar uma sala da outra, mas eu não via diferença.

Foi neste momento que ele ouviu umas pequenas batucadas na porta de vidro.

Era uma mulher rotunda, de braços e pernas grossas, com o rosto em formato de coração, cabelos em corte Chanel emoldurando e uns óculos de metal sobre o seu pequeno nariz. Em suas mãos pequenas e rosadas ela segurava algo coberto por um pano.

– Evelyn! – meu pai, que aparentemente a conhecia, exclamou abrindo a porta.

– Henry! – ela exclamou também, abraçando-o com força. – Ouvi dizer que você havia voltado.

– Sim, resolvi me aquietar um pouco – ele respondeu sorrindo lindamente para a mulher, e então ele resolveu se lembrar que tinha uma filha e se virou para mim. – Anabelle, essa é a Evelyn, estudamos juntos na escola. Evelyn, essa é a minha filha, Anabelle.

Dei um sorriso.

– Oh, prazer – eu disse educadamente estendendo a minha mão.

– Prazer querida – ela disse apertando a minha mão, mas seu olhar era o de quem via um animal morto. – Henry, por que essa menina está vestida de preto dos pés a cabeça? Por acaso alguém morreu?

Meu pai fez uma careta.

Na verdade, foi o meu namorado quem morreu. Ele tinha apenas dezesseis anos, e eu ainda não entendi como isso foi acontecer. Um ano depois eu ainda estou de luto. Bem, o garoto fora o meu primeiro amor, merece algum respeito certo? E até que naquele dia eu havia moderado bastante. Estava apenas com uma saia de pregas preta, uma camiseta estampada preta, e sapatos pretos. Geralmente eu ainda colocava um casaco com capuz para parecer semelhante à morte.

– Na verdade, meu namorado morreu – eu expliquei.

Ela levou a mão à boca ao perceber a besteira que falara.

– Desculpe-me querida, eu não sabia – pediu.

– Tudo bem – eu disse sorrindo duro, e então completei: - Querida.

Ela sorriu de volta.

– Bem, eu tenho uma das mais freqüentadas lojas aqui da cidade, - também deve ser a única, minha consciência completou - quando quiser... Mudar o seu estilo. Dê uma passada lá. Vou fazer um desconto especial para você.

– Obrigada pelo convite – eu agradeci. – Vou me lembrar alguma hora.

– Na verdade, essa me parece uma boa ideia – meu pai disse se sentando em seu sofá. – Eu queria que Anabelle arrumasse um emprego de meio-período, você pode arrumar um emprego na sua loja, Evelyn?

O sorriso simpático nos lábios pequenos e carnudos se desmanchou.

– Oh, não vai dar. Já tenho algumas pessoas trabalhando para mim, e infelizmente não preciso de mais nada – ela disse sorrindo para mim como quem se desculpa. – Mas eu sei onde estão precisando de alguém e acho que você é perfeita para o trabalho.

Meu pai sorriu. Ele estava doido para me ver ganhando o meu próprio dinheiro. Ele era aquele tipo de homem que não gostava de ficar me mimando ou deixar com que eu fique me apoiando em seu trabalho para ter as minhas coisas. Somente nesse ano que ele achou melhor eu trabalhar, fiz dezesseis. Para ele eu andava deprimida pela morte de David, então ele acha que seria bom eu trabalhar um pouco. Manter a mente ocupada.

– Parece interessante, - eu disse sorrindo. – E o que é?

– Não sei direito, mas ouvi dizer que a família Franklin está precisando de alguém para cuidar de algumas plantas raras – a mulher disse em tom de fofoca. – Disseram que é no antigo cemitério de Montecristo.

Cemitério?

Essa mulher é maluca ou está tirando com a minha cara?!

– Parece perfeito – meu pai concordou e eu lhe olhei horrorizada. – Anabelle vai adorar.

– Vou?- perguntei em tom de dúvida.

– Vai – ele insistiu querendo rir. – Afinal, você adora flores e plantas... E agora adora túmulos.

Eu percebi pelo seu tom de voz que ele estava debochando, como sempre faz.

Ela catou em sua pequena bolsa embaixo do braço por alguma coisa. Era um cartãozinho. O cemitério do Franklin.

– Ligue para eles, aposto que lhe darão o emprego assim que a virem – ela disse com um sorriso reconfortante, no entanto, suas palavras me pareceram terríveis. Ela estava querendo dizer que eu parecia um coveiro?

– Obrigada, querida – agradeci tomando o cartão de sua mão. – Se me derem licença, eu estou com fome e vou fazer o jantar. Você vai ficar para comer?

Bem, julgando por seu tamanho, aquilo que eu cozinhasse não seria uma grande diferença. Ela parecia comer tudo aquilo que surgia em sua frente.

– Na verdade, só vim trazer esses biscoitinhos para Henry – ela disse entregando o prato coberto em seu colo. – Está tão magrelo, coitado. – “Claro, até o ‘Seu Barriga’ era magrelo comparado a ela” minha consciência alfinetou. – Até mais querida.

– Até em breve, querida – eu respondi.

Ela saiu, e eu esperei ela entrar em sua caminhonete para mostrar o meu sorriso de desgosto para o meu pai. Primeiro, que tipo de mulher é essa que pensa que pode aparecer sem ligar antes e falar mal do meu estado permanente de luto. Quer dizer, permanente até eu achar um novo amor. O que parece que nunca vai acontecer.

– Anabelle, conte até dez – meu pai pediu.

– Vou fazer o jantar – disse pausadamente. – Espero que tenha comida na geladeira, se não, podemos chamá-la de novo e cozinhá-la. Com o seu tamanho ela poderia alimentar todos os mendigos e esfomeados do mundo. Admiro-me de ela não sair rolando para casa.

Eu o ouvi engolir em seco e fui para a cozinha.

Fiz a única coisa que eu sabia fazer. Hambúrguer. Ainda bem que meu pai tinha comprado a carne e o pão para tal. Ele não reclamava que eu só sabia cozinhar isso. Em todas as casas que tivemos, sempre tínhamos uma empregada, mas meu pai queria que eu me sentisse um pouco “isolada”, por isso iria ser só eu e ele nessa imensa casa.

– Isso está ótimo – elogiou enquanto comia.

– São somente carne e pão pai – eu respondi.

– Mas você está melhorando nisso – ele insistiu.

Eu reprimi meu riso e sorri para ele. Recolhi seu prato quando acabou e levei para a pia. Ele pegou o guardanapo e me ajudou a lavar a louça. Estávamos dividindo o trabalho agora.

– Espero que eu tenha feito a escolha certa – ele murmurou.

– Por que o senhor diz isso? – perguntei passando o seu prato, agora molhado.

– Porque talvez você não goste de cidades pequenas. Você cresceu nas maiores metrópoles: Nova York, Paris, Londres... Vir para essa cidade deve ser um desafio e tanto para você.

– É só me dizer que as pessoas não são iguais a essa tal de Evelyn que eu me sinto melhor e mais bem-vinda – respondi lhe dando uma piscadela.

– Ela é horrível, não é? – ele disse.

– Ela parece ser a típica fofoqueira de cidade pequena que se acha a mulher descente, mas que adora uma boa fofoca. Que nem aquelas mulheres das séries e novelas que eu vejo! Isso é empolgante – eu disse rindo. – Eu não fui muito com a cara dela. E o que ela tem contra o meu jeito de me vestir? Talvez eu queira virar gótica ou querer virar punk, e daí?

Meu pai me olhou de cima a baixa.

Deus queira que não” eu li em sua face. Acabei por lhe jogar água na cara.

– Você sabe que eu te apoio em qualquer decisão que você tome – meu pai disse me abraçando, e então se afastou: - Quer dizer, exceto você ficar grávida ou se casar aos dezesseis. Nesse caso eu sou contra-...

– Pai! – reclamei.

– Sou guitarrista, mas acima de tudo, sou sincero – ele disse. – Você é a minha princesinha. Minha princesinha dos túmulos, mas minha princesinha.

Fiz uma careta.

– Que horrível – reclamei.

– Que nada, você vai ver como vai ser legal – ele disse. – Agora vá dormir, já está tarde e suas aulas começam amanhã – gemi em protesto enquanto ele me empurrava para o meu quarto. – Boa noite, durma bem.

– Boa noite – eu disse enquanto recebia um beijo de sua testa.

Princesinha dos túmulos” meu pai era o pior.

Sentei-me na cama e peguei o telefone ao lado, no criado mudo. Peguei o cartão que a mulher havia me dado e conferi o número. Respirei fundo e disse a mim mesma que não iria fazer esse trabalho. Eu tinha medo de cemitérios. Eles eram assustadores, principalmente à noite.

"Combina com você... Humpf, aquela mulher nem lhe conhece"



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