A Face Oculta Da Lua escrita por Lady Salieri, Nami Otohime


Capítulo 11
Cap 8: A tarde dos esclarecimentos II (II)


Notas iniciais do capítulo

Cenas anteriores:
- Desculpa, Lyene, não quis te assustar.
- Tudo bem. Igual, posso dizer que estava bem concentrada aqui e me assustaria com qualquer coisa, o que me alerta para que eu trabalhe melhor isso, imagina se se trata de um inimigo...
Ele sorriu, melancólico:
- Eu caberia bem nesta lista em outro tempo, certo, alteza?



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Lyene arregalou os olhos, piscando rapidamente. Suas sensações em terremoto ameaçavam abrir o chão sob seus pés. Levou a mão à boca, extremadamente surpresa:

– Você se lembrou!... Mas quando?

Ele continuava sorrindo, com aquela melancolia que o tornava ainda mais belo:

– Melhor damos uma volta, o que você acha de conversarmos em um lugar mais apropriado? O parque me parece bem.

– Eu... Eu quero saber quando você se lembrou de tudo – ela não podia pensar em outra coisa.

– Eu estou de carro – disse ele – e tenho meia hora antes de retomar meus estudos porque estou em época de provas, e bem nervoso com isso, diga-se de passagem. Vamos?

Foram. Não demoraram a chegar, Lyene tinha mil coisas na cabeça, todas diferentes e inomináveis. Tentou várias vezes iniciar qualquer frase de modo a expor seus pensamentos, mas não conseguia ligar as palavras. Olhava-o e tudo com o que se deparava era um constante olhar sereno que a fazia sentir-se ainda mais desconcertada e ansiosa:

– Algum problema? – Ele disse quando parou o carro.

– Claro que há algum problema! Quero saber quando você se lembrou de tudo.

Desceram ao mesmo tempo do carro:

– Seria adequado que lhe abrisse a porta.

Ela permaneceu em silêncio, ignorando seu comentário. Seguiram andando em direção ao lago:

– Lembrei-me de tudo no mesmo dia em que você, no dia em que Takeo se transformou.

Ele pôde ver suas pupilas dilatarem:

– Não é possível! E pra quem mais você contou isso?

– Pra mais ninguém, eu sei que você não gostaria...

Ela levou a mão ao peito, um tanto aliviada...

– Obrigada. Mas... Como você não me disse nada antes? Achei que...

Ele abaixou a cabeça, olhando o caminho:

– Que voltaríamos a ser inimigos? Que eu não pudesse perdoar você?

Ela fechou os olhos, rememorando aquelas sensações tão pesadas:

– Claro... E eu te daria razão, apesar de não retirar absolutamente nada do que fiz ou disse.

Chegaram ao local onde queriam. Lyene encostou-se no tronco de uma árvore e ele avançou um pouco em direção à ponte:

– Eu não poderia fazer isso, princesa, não te perdoar... Você disse que não retiraria nada do que disse ou fez, mas penso em alguns momentos que talvez eu devesse fazê-lo, afinal de contas... Não tenho dúvidas do meu amor pela Serena, mas fico pensando até onde fomos para vivê-lo, e entre o doce desse sentimento, sinto o gosto amargo das conseqüências.

Lyene abaixou a cabeça. Sim, as situações eram outras, nada do que lhe parecia importante no passado importava naquele momento:

– Ah, meu caro... Eu não sei mais o que pensar... É difícil pra mim ver o seu lado, viver o seu lado... Era bem mais fácil quando eu o tinha como um alvo, quando você era meu obstáculo a ser eliminado... As coisas eram mais claras daquele jeito. Agora já não é possível remediar nada, a não ser que lutemos com a guardiã do portal do tempo, o que nem eu mesma aconselharia. Há que se olhar adiante, não? E olha que é bem difícil pra eu dizer isso, afinal, todos os meus poderes e meu dom se relacionam diretamente com o passado, me lembro daquela comunidade, onde hoje é a cidadezinha de Glastonbury*...

– Que diziam que você era a face donzela da Deusa tríplice.

– É...

– Eles tinham razão enquanto a face tríplice da deusa.

Ela suspirou:

– O povo que me presenteou A Solucionadora** que você trouxe pra mim... E que foi muito útil, já que Serenity me havia tirado meu posto, meu cristal e minha espada.

– Eu não entendi porque você perdeu seu posto.

– Porque eu roubei o cristal de prata, eu acho. Mas era a única forma de desestabilizar o negaverso, selando os 7 demônios.

Darien ergueu uma sobrancelha:

– Então foi você...?!***

Ela permanecia de cabeça baixa:

– Foi. Os celtas me disseram sobre a iminência de um ataque de Beryl. Minha estratégia era atacar o ataque surpresa, com armamento pesado, porque ganharia tempo. As preparações do ataque de vocês me pareciam uma situaçao bastante favorável. E de fato, foi.

Ele acenou vagarosamente com a cabeça em concordância:

– Realmente... Você teria mesmo ganhado tempo se não tivesse sido expulsa da guarda. A partir desta notícia que Beryl decidiu seguir com o plano.

– Eu fui vítima de uma grande armadilha, no final das contas...

Ela olhou-o enquanto as conexões se cruzavam em raios na sua cabeça, de várias direções. Esta notícia, o ataque de Beryl, a cabeça de Mihara decepada na entrada do Reino... A falta de um elo que tornava nítida a presença de alguém mais... As pupilas dos seus olhos voltaram a se dilatar quando ela percebeu onde essas conexões poderiam levá-la:

– A resposta sobre quem nos ataca agora está nesse dia, alteza! Como Beryl soube disso tão rapidamente? O ser que está a mando no negaverso no presente é o mesmo que matou a Mihara e roubou os cristais da passagem, tenho certeza!

– Eu te disse naquele dia que corria um boato de que Metallia tinha um informante infiltrado no milênio, mas eu nunca soube nem quem era, nem ao menos se isso era verdade.

– É, eu me lembro. Era verdade pra você, já que a espada estava na sua garganta, mas eu achei que se tratava de uma informação falsa para nos desestabilizar, já que eu tinha varrido o reino em busca deste espião... Mas agora considero muito fortemente esta hipótese. E já sei o que devemos fazer: devemos rememorar momento por momento em busca de pistas.

– Mas não deixa de ser extremamente doloroso, não?

– Mas é necessário, Endymion, é necessário. Precisamos nos reunir, eu, você e Takeo. Podemos casar os acontecimentos entre a Terra e a Lua.

Darien sentou-se no chão, de repente sentiu-se pesado. Seu olhar era pura reticência naquele instante. Por tanto tempo havia bloqueado todas aquelas memórias, e era fácil fazê-lo ao lado das meninas que consideravam aquela vida um sonho distante. Lyene, entretanto, provocava-lhe justamente o contrário. Ela personificava aquele passado glorioso pelo qual ele sentia-se culpado por haver sido destruído.

Sentiu a presença dela que se sentava ao seu lado:

– Não se culpe pelo passado, meu caro, ainda que eu tenha falado muito isso naquela época. A verdade é que, olhando do ponto de vista daqui, vocês terráqueos têm maneiras muito apaixonadas de amar. A História desta raça está cheia de amores que foram motivos para as mais variadas tragédias, desde a Grécia antiga, até o último filme em cartaz. Você não foi original nisso, príncipe Endymion, então se eu fosse você não me preocuparia tanto.

Darien sorriu. Ela havia mudado muito durante esse curto período de vida na Terra:

– Você amadureceu bastante...

Ela balançou a cabeça numa negativa:

– Não. Só não havíamos nos conhecido o suficiente. E não pense que não dói esses bons sentimentos...

Ela sorriu:

– Digamos que, no final das contas, antes eu achava você o pior ser do mundo. Agora talvez você seja o 2º pior ser do mundo...

Ele sorriu, ao mesmo tempo surpreso, mas muito satisfeito:

– Vou aceitar isso como um elogio, Lyene.

– E é um elogio, alteza. Do mais elevado tipo que já pronunciei para um terráqueo antes.

Ele sequer parara de sorrir. Vendo-a tão desarmada, era impossível não se lembrar de Serena, consolando-o com aqueles olhos azuis idênticos.

– Andrew estava certo sobre você, quando nos encontramos no fliperama pela primeira vez.

– Andrew é a única pessoa que me conhece sem me conhecer...

Ela levantou-se sorrindo e jogou uma pedra no lago, que deu três saltos antes de afundar na água:

– Acho que essa é verdadeira tarde dos esclarecimentos, meu querido. Aqui talvez selamos essa parte do passado. Mas você tem que entender que a minha inimizade contigo nunca foi pessoal, você só era aquele que estorvava o caminho para o qual o Milênio deveria seguir. E eu nunca soube fazer outra coisa senão proteger meu reino...

– Eu sei. Nisso você é e foi o oposto da Serena... Às vezes me pergunto se nunca te doeu que tivesse que ser ela quem sucederia Serenity, que por um golpe de sorte ela foi a primogênita e que você tenha tido que guardar esse segredo por toda sua vida...

Lyene virou-se para ele como se ele houvesse pronunciado a mais inverossímil das frases:

– Não! Não e que nem passe uma coisa dessas outra vez pela sua cabeça. Nunca fui ninguém menos que a protegida da Rainha Serenity, recorde que a Rainha da Lua só podia ter uma criança e qualquer outra seria representaria a escuridão, aquela que traria a desgraça para o reino. A única coisa que me doía, alteza, era o fato de a princesa Serenity não querer aquilo. Eu estava feliz como a comandante do exército e sentinela do reino. Dispunha do poder necessário para proteger o Milênio como queria, até me expulsarem, claro...

– Eu definitivamente não sei o que dizer... Só que estou disposto, nessa nova guerra, em ir até as últimas consequências...

Ela olhou para a frente, ainda de pé, os olhos faiscando em vingança pela iminente revanche.

– E eu não vou perder, alteza. Desta vez eu não vou perder...

– Nós não vamos perder, alteza – disse uma voz conhecida ao fundo.

Lyene virou o rosto e deu-se com Takeo. O ambiente, o fim de tarde lilás, a situação... Ela sentiu-se transportada àquele dia fatídico, em que não era capaz de formular um juizo que fosse. Takeo, como naquele dia, parecia brilhar em contraste com tudo aquilo... Com muito esforço ela manteve-se de pé, com a postura ereta. Terminou por desequilibrar-se, ligeiramente, devido a uma tontura provocada pelo esforço em firmar-se naquela realidade, indo em direção ao tronco onde estava inicialmente, de maneira a apoiar-se. A situação era banal e as coisas aconteciam naturalmente, ainda que para ela tudo passasse em um slowmotion pesado e irritante. Darien levantou-se, batendo na calça na tentativa de livrar-se de umas pequenas folhas. Olhou no relógio:

– Bom, já acabou meu intervalo. Agradeço a conversa, Lyene, imensamente. Querem que eu os leve à casa? Ou ao fliperama?

Ela acenou uma negativa com a cabeça, mas não disse nada.

– Então, nos vemos.

Darien moveu a cabeça em cumprimento a Takeo, que fez o mesmo, e saiu. Takeo virou-se na direção dele, e quando sua figura sumiu do seu campo de visão, virou-se outra vez para Lyene, que estava de cabeça baixa. Ficaram silêncio um tempo, até que Lyene deslizou as costas no tronco sentando-se no chão.

– Essas coisas me fazem sentir uma falta absurda de casa...

Takeo sentou-se ao lado dela. Foi para abraçá-la, mas ela se enrolou em si mesma quase aterrorizada pela possibilidade deste ato, diferentemente do que acontecera há poucos instantes, em casa. Ele parou no meio do caminho, suspirou e esticou-se, colocando as mãos detrás da cabeça. Sentiu-se pequeno e perdido, tal e qual o era quando criança:

– Eu nunca tinha sentido falta de nada depois que te encontrei, até agora. Eu te disse, no Milênio, que você era a minha casa e você continua sendo. Eu não me esqueci de nada daquele dia, muito pelo contrário, era como se pela primeira vez eu estivesse tomado de uma lucidez a respeito dos meus sentimentos que me assusta.

Lyene virou os olhos na direção dele, estava ligeiramente corada.

– Bom, mas você acha que está tudo esclarecido sobre aquilo, então não há o que ser dito. A não ser que eu quero continuar sendo a pessoa que sempre fui pra você, seja qual for esse lugar. É isso...

Suspirou entre um sorriso:

– Desculpa... Não sei bem o que dizer nessas situações, Mihara era bem melhor que eu...

– Nós três funcionávamos bem, certo? – Ela quase o interrompeu.

Takeo não sabia se sentia feliz ou triste com este comentário:

– E vamos funcionar ainda. Eu não perdi as esperanças de encontrá-la, você sim?

– Não! Claro que não! Tenho algumas anotações de estratégias para encontrá-la. Um mapa de Tóquio e alguns lugares sobre onde ela pode ter caído, uns dardos pregados onde cada um de nós nasceu, contando com o lugar onde as meninas moram. Está atrás da porta do meu quarto.

Takeo sorriu, endireitando a postura e virando-se para o lado dela:

– Eu também tenho algumas anotações. Temos que casá-las, a ver se alguma coincide...

Lyene devolveu o sorriso, animada pela possibilidade de empreender a busca pela amiga.

– Agora eu me sinto voltar pra casa de novo... - Takeo disse levantando-se.

Estendeu a mão para ela:

– Então vamos, senhorita problema, vou preparar alguma coisa bem gostosa pra gente comer pra dar energia para que comecemos a buscá-la.

Lyene deu-lhe a mão e ele puxou-a. E não soltou-a até chegarem a casa.

(FIM DO CAPÌTULO VII)



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Notas finais do capítulo

*Glastonbury: Lyene faz uma referência aos celtas. Glastonbury era a antiga ilha de Avalon.
**Solucionadora: Outro nome para a Fragarach, a espada que Lyene usa na fic.
***Então foi você...?! [que selou os 7 demônios]- fala do Darien: Na série dublada, Luna conta sobre os 7 demônios dos critais arco-iris, dizendo que "alguém" os selou. Só aproveitei pra cobrir essa ponta do anime hehe.