Aquele tinha sido um dia bastante estressante para Yuu Kanda. Tinha acabado de voltar de uma missão, a enfermeira não queria lhe dar alta, Jerry teve problemas na cozinha e queimou seu sobá, Chaoji, Lenalee e Miranda tinham enchido o samurai de perguntas sobre a missão e sua única saída era meditar em paz. Pouco depois de chegar à sala de meditação, Lavi sentou-se ao seu lado, estranhamente quieto – mais parecendo que estava dormindo sentado –, então por isso nem deu bola.

– Hey, BaKanda. O que ‘tá fazendo aqui? – Allen sentou-se do outro lado de Lavi, fazendo o ruivo ficar entre ele e Kanda.

– O que você acha, Moyashi. – Respondeu, uma pequena veia começando a ficar evidente em sua fronte.

– Waa, uma pena que tenha dado problema na cozinha do Jerry, né? Ele não conseguiu preparar meu salmão grelhado, arroz com bife e batatas, legumes no vapor, camarão com pão, frango assado, feijão com arroz integral e ovo estrelado e meus mitarashii dangos!! E ainda meus...

“Tsc, como ele fala!” – Kanda pensou, sua veia ficando cada vez mais evidente e sua raiva aumentando. – “Ele consegue ser mais irritante do que o Usagi, o Komui e o velho juntos!!”

– Oe, damare, Moyashi.

– ... Meu yakissoba, danoninho, leite com biscoitos, Nescau Cereal, meu Todinho!, meu Clube Social de Pizza, Polenguinho de Requeijão, Ruffles de Mel e Mostarda...

– O que raios você está fazendo aqui?! – Ele estava se controlando para não desembainhar sua espada e cravá-la no alvo pescoço do Walker.

– Só enchendo você mesmo. – Ele riu de forma convencida. – Não tenho nada melhor pra fazer, sabe.

– Então vá arrumar algo pra fazer que não me envolva! – Kanda falou ríspido.

– Você é um grosso mesmo, BaKanda.

– E você é um desocupado irritante, Moyashi!

– Rude.

– Idiota!

– Mal humorado!

– Querem os dois parar com isso?! – Lavi se pronunciou meio irritado por estar literalmente no meio da briga dos dois. Ele se levantou e foi para algum lugar não tão importante no momento.

Allen revirou os olhos e saiu da sala logo em seguida, um pouco emburrado. O moreno apenas respirou fundo, fechou os olhos e voltou a meditar em silêncio, dando graças a Deus por estar sem nenhuma companhia irritante. O albino foi dar uma volta e acabou por ir para a parte externa da Ordem. Sentou-se na grama fofa e recostou-se em uma árvore.

– Aquele grosso. – Resmungou baixinho. – Não sabe conversar com alguém de forma civilizada.

O Walker estava se sentindo triste. Mesmo que acontecesse quase o tempo todo, ele não gostava de brigar nem de discutir com o moreno. Aquilo o machucava e o deixava triste por perceber cada vez mais que o japonês com certeza não gostava ou considerava ele alguma coisa, talvez nem como “colega de um trabalho que eu certamente não faço porque gosto”.

Desde alguns meses atrás, ele tinha acompanhado Kanda em muitas missões, tiveram de enfrentar numerosos e cada vez mais fortes akumas, se alojar nos mais diversos – sendo isso um ponto positivo ou, geralmente, não – lugares que o Supervisor Komui arranjava para eles e, nesse meio tempo, o Walker tinha começado a perceber o quanto tinha passado a se importar com o colega, desenvolver um sentimento afetivo por ele, talvez até mesmo estar apaixonado.

Ele parou e refletiu durante alguns segundos. Mesmo que brigassem tanto assim, ele já tinha conseguido tomar a atenção do samurai para si algumas vezes, já tinham conversado sem tentarem se matar sobre as coisas mais aleatórias possíveis e Kanda já tinha sido o único a suportá-lo em certos dias em que estava muito chato para qualquer um. Um resquício de esperança começou a surgir nele e o albino decidiu voltar e encontrar o moreno para lhe dizer o que sentia.

– Oe, Kanda, voltei. – A cabeça do garoto apareceu pela porta da sala, um sorriso estampado em sua face.

– Humph. – Kanda não precisou abrir os olhos para ver quem tinha chegado. – Se veio me atormentar, pode ir dando meia volta.

– Falando assim até parece que eu vivo disso! – Allen aproximou-se do outro, olhando-o de cima.

– Se quer tanto ficar aqui, então senta logo e cala a boca.

– Ah BaKanda, deixa de ser chato!

– Então não fique me atazanando o juízo!

– Você não tem senso de humor nenhum.

– Você que não é bom da cabeça, pra ficar aqui me incomodando.

– Eu estou tentando ter uma conversa normal com você, mas me parece que você não tem inteligência suficiente para isso, seu burro!

– Como é, Moyashi?! – Agora o moreno tinha se levantado e encarava o outro de frente, faíscas saindo do olhar de ambos.

– Você é um bruto sem sentimentos!

– Você é um Moyashi irritante, idiota, que se acha “o bom” e que devia virar logo um Noah pra eu poder ter o prazer de te matar! – O samurai falou, agarrando a gola da camisa do Walker e trazendo-o mais para perto de forma bem ameaçadora, fazendo parecer que ele realmente queria que aquilo acontecesse, por mais que não fosse verdade.

– E você é um burro, egoísta, prepotente, mal humorado, insuportável, cabeça dura eéporissoqueeugostodevocê,BaKanda. – A voz dele diminuiu gradativamente até sumir em um sussurro, mas suficiente para o mais velho ouvir, enquanto seu rosto ia ganhando uma coloração avermelhada.

O mais velho encarou-o por alguns instantes, mas continuou a segurar a gola de sua camisa. Ele nunca pensou em encarar o que realmente sentia pelo colega, mas também nunca esperou que este se declarasse para si. Em um momento impulsivo, ele trouxe a face do Walker para mais perto da sua e beijou-o.

Allen estava confuso e surpreso no primeiro momento, mas logo fechou os olhos e correspondeu ao maior. Ele levou seus braços ao pescoço de Kanda, sentindo o moreno aprofundar o beijo e puxá-lo com a mão livre pela cintura. Quando o ar se fez necessário, os dois garotos se separaram e encararam um ao outro.

– E-eu... Gosto de você, BaKanda. – Allen falou com o rosto vermelho, porém com uma expressão determinada.

–... É o quê, Moyashi?! – Fez-se de desentendido. Então o garoto o correspondia?

– É... – O Walker começou a se sentir estúpido por ter contado ao colega. – Mas isso- isso não quer diz...

– Oe. – Ele interrompeu o outro, o que fez Allen olhar para cima. Ainda estavam naquela posição tão próxima e suspeita para qualquer um que os visse ali e estivesse descontextualizado.

– H-hai?

– Eu não vou muito com a sua cara, Moyashi. Mas, acho que pode dar certo. – Seus orbes azuis encontraram os claros do outro.

– O q-quê, você diz, ‘a gente’? – O rosto do menor voltou a ganhar a coloração vermelha.

– É, pode ser. – Agora aquela situação estava deixando Kanda meio desconcertado. – Mas não fica achando qu...

Sua fala foi cortada por Allen que o beijou novamente, agora com mais vontade, certeza e de forma mais intensa. Logo que se separaram, ambos acharam que seria melhor não se exporem daquela maneira e foram para algum lugar menos propício à aparição de alguém da Ordem àquela hora. Depois daquele encontro, Allen passou a ir mais vezes na sala de treinamento para irritar Kanda.