Pesadelo do Real escrita por Metal_Will


Capítulo 5
Capítulo 05 - Inquietação




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"A minha suspeita é de que o universo seja não apenas mais estranho de quanto supomos, porém mais estranho do que podemos supor"

~ J. Haldane

Capítulo 05 - Inquietação

 Ainda sem tirar os olhos da tela, Monalisa continuava a contemplar aquela estranha e única palavra em fonte 28 no seu e-mail: "dedaLus".

 "O que significa isso?", pensa a garota, levando automaticamente uma de suas unhas à boca pelo nervosismo. Primeiro, teve dois sonhos estranhos e agora a mesma papelaria que visitara naquele dia envia um e-mail com apenas uma palavra cujo sentido ela desconhecia. Era natural que seus batimentos cardíacos aumentassem. Agora não havia mais motivos para duvidar: algo de estranho estava ocorrendo.

 Ainda chocada, ela desliga seu computador, muito embora o apagar da tela e o silêncio da escuridão de seu quarto não colaborasse muito para aliviar seu medo. Talvez medo não seja a palavra certa, talvez estranhamento, confusão. Sim, confusão. Não tinha a menor ideia do que estava acontecendo em sua vida. Será que estava enlouquecendo? Será que deveria avisar seus pais?

 A última opção foi logo descartada. Seus pais eram pessoas ainda mais céticas e achariam que tudo não passaria de uma fantasia de criança. No máximo, iriam levá-la a algum psicólogo para tentar entender o que estava acontecendo. Monalisa os conhecia bem. Sem chance. Mas a quem poderia recorrer? Ah, sim, claro. Suas amigas, Cibele e Luana. Ela acompanhou as duas na visita à papelaria. Na certa elas também devem ter recebido alguma coisa, talvez o mesmo e-mail sem sentido. Quem sabe as duas não poderiam ajudá-la? É. No momento, era o que poderia fazer. A mocinha volta para a cama e tenta dormir, coisa que demora para acontecer. Ainda não conseguia tirar os últimos acontecimentos da cabeça. Primeiro o sonho do suicídio. Depois, o sonho com um gato falante. Agora, um e-mail misterioso. Precisava descobrir o que estava por trás disso ou pelo menos tentar descobrir.

 Ela finalmente consegue adormecer e não tem mais nenhum sonho depois daquele. Parece que só estava autorizada a sonhar com coisas estranhas uma vez por dia. De qualquer maneira, a noite passa depressa e logo o despertador toca. Era hora de encarar suas atividades diárias, e, mais importante que isso, tentar descobrir o que estava se passando na sua vida.

 Monalisa se levanta, toma um banho rápido, coloca seu uniforme e segue para a mesa do café. Seus pais já estavam praticamente terminando a primeira refeição do dia, enquanto ela ainda ia preparar seu leite com chocolate.

- Filha, anda rápido. Não está atrasada? - pergunta seu pai, quase engolindo a xícara junto com seu café, enquando acompanhava as notícias do dia pelo seu Smartphone.

- Não, pai, é meu horário normal - responde a mocinha, sem muito entusiasmo. Anos vivendo a mesma rotina e seu pai ainda não decorou os horários dela. Monalisa saía de casa às seis e quinze, enquanto seu pai saía por volta de dez para as seis, que, por sinal, era o horário que o pequeno relógio na parede da cozinha estava marcando.

- Sério? Então sou eu que estou atrasado mesmo - diz ele, engolindo o pão e levando mais algumas bolachas para comer no caminho - Estou indo, meninas. Até mais

- Até - responde a mãe de Monalisa, que também não era de falar muito. Mãe e filha comem em silêncio por mais alguns instantes até a garota terminar e se levantar. Ela vai ao banheiro, escova os dentes, pega sua mochila e se despede da mãe.

- Estou indo, mãe - diz ela, sem olhar para trás.

- Tudo bem - responde a mãe, também sem olhar nos olhos da filha - Tenha um bom dia.

 E essa foi a manhã da família. Poucas palavras, poucos gestos, como sempre acontecia. Sim, sempre fora assim. Monalisa não se lembrava com detalhes de sua infância, mas imaginava que as coisas sempre ocorriam dessa forma, embora para ela isso fosse indiferente.

 Seu único interesse no momento era investigar os últimos mistérios. Ao chegar no colégio, Monalisa procura suas amigas, mas parece que nenhuma delas havia chegado ainda. É o problema de se chegar muito cedo no colégio, sem contar que aquelas duas sempre chegavam em cima da hora. Ela fica de bobeira pelo pátio até o sinal tocar, ainda sem tirar aquele e-mail misterioso da cabeça, mas teria que aguardar até o intervalo se quisesse comentar algo com elas. Se as duas também tivessem recebido a mesma mensagem, talvez pudesse compartilhar seus problemas.

 Ao chegar na sala, nem Cibele e nem Luana haviam chegado. O jeito era sentar e esperar. Não demora muito para que sua vizinha de carteira, Ariadne (ou a mesma garota que aparecera em seu primeiro sonho estranho) chegasse.

- Bom dia..Monalisa, né? - cumprimenta a ruivinha simpaticamente.

- Bom dia - responde Monalisa, ainda meio temerosa de conversar com a garota.

- Ufa. Essa escola está mais adiantada que a minha anterior. Preciso colocar um monte de coisas em dia - Ariadne continuava falando, enquanto se sentava e retirava seu material. Monalisa apenas concordava com o que ela dizia, com seu jeito monossilábico de se comunicar.

- Você não é de falar muito, né? - repara Ariadne.

- Ah...é o meu jeito mesmo - responde Monalisa.

- Entendo. Você é do tipo que fica mais tempo pensando, né?

- Acho que sim

 Logo a aula começa. Luana e Cibele chegam em cima da hora, mais precisamente depois que o professor entra na sala. Monalisa só consegue falar com elas na hora do intervalo, mas os resultados não foram tão satisfatórios.

- Um e-mail da papelaria? - repete Luana - Não. Não recebi nada. E olha que eu fiquei na internet até uma meia-noite.

- Pelo que estava registrado no meu computador, o e-mail foi mandado antes da meia-noite - fala Monalisa - Vocês tem certeza?

- Estou com meu iPhone aqui - diz Cibele - Deixa eu ver...e-mail...e-mail...

 Ela acessa seu correio eletrônico, mas não encontra nada que se parecesse com uma mensagem da papelaria. No máximo, havia o spam de um site de loja de roupas.

- Nada? - pergunta a loirinha.

- Nada, Mona. Não sei se a Luana recebeu alguma coisa depois...

 Luana também vê seu e-mail usando o aparelho de Cibele, mas também não tinha novidade nenhuma.

- Também não recebi nada - fala Luana - Acho que o problema é com você mesmo, Mona

- Mas - Monalisa não se conformava - Por que só eu? E...como eles descobriram meu e-mail?

- Você não deixou nada com eles? Não preencheu nenhum formulário? - pergunta Cibele.

- Não. Eu só vi aquela loja antes, mas a primeira vez que entrei foi ontem com vocês

- Sei lá - diz Luana - Hoje em dia, todo mundo acha o e-mail de todo mundo. Essas propagandas são mesmo chatas, viu?

- Mas não era uma propaganda.

- Não? - estranha Cibele - Então o que eles queriam com você?

- Eu não sei. Era só uma palavra estranha. Era "dedaLus" ou algo assim...

- Quê? - pergunta Luana - Que raio de palavra é essa?

- "dedaLus" - repete Monalisa - Era só isso. O que pode ser?

- Tem certeza de que era da papelaria, Mona? - pergunta Cibele - Talvez seja algum trote...alguém pegou seu e-mail por aí e mandou para provocar. Sei lá.

- Por que alguém faria isso?

- Ah, é que você não percebe...mas os meninos vivem de olho em você - comenta Luana.

- Eu já falei isso com ela, Lu. Mas a Mona é exigente demais - ri Cibele.

 Monalisa apenas suspira. Não teria nenhum resultado ali. Até cogitou comentar de seus sonhos com as amigas, mas sabia que só iriam achá-la mais maluca do que já achavam. Parece que estava sozinha nessa.

 No final da aula, Monalisa pega seu caminho de volta, dessa vez sozinha. Teria curso de inglês à tarde, então iria almoçar em algum lugar próximo de lá. No entanto, sua mente não estava preocupada com isso. Queria mesmo era achar uma resposta para tudo aquilo por que estava passando. Sonhos, mensagens estranhas. O que fazer?

 Tinha certeza de que o e-mail era da papelaria. Não existem muitas papelarias Tenório por aí. Mas a questão era saber o significado daquilo. Se ainda fosse uma propaganda, seria compreensível, mas uma palavra daquelas? Sem contar que a papelaria aparecia em seu sonho e era exatamente a papelaria Tenório. Se existia uma resposta, com certeza estaria lá.

 Monalisa para no meio do cruzamento. Se ao invés de atravessar a rua, ela virasse, iria direto para rua da papelaria. Tinha tempo? Na verdade, não. Precisava ir para seu curso, embora ela nunca tivesse faltado. Talvez...bem, por que não? Ela decide tirar a história a limpo na fonte de seu problema. Não conseguiria dormir tranquila enquanto não entendesse o que estava ocorrendo.

 Ela segue para a papelaria e, ao contrário do sonho, conseguia se aproximar normalmente do estabelecimento. No meio do caminho, ela se arrepia ao ver um gato preto. Também era igual ao sonho e estava sentado exatamente no mesmo muro. Apesar disso, ele não fala nada e pula assim que Monalisa volta os olhos para ele. Tudo bem. Não podia esperar que ele falasse de verdade, não é?

 Por fim, ela consegue chegar à lojinha, onde seu Tenório varria o chão tranquilamente. A garota entra na loja e se aproxima lentamente. O velhinho a cumprimenta.

- Oh. Boa tarde. Você é a garota que veio aqui ontem, não é?

- Boa tarde...sim, sou eu mesma - responde Monalisa.

- No que posso ajudar?

- O que foi aquele e-mail?

- E-mail? Do que está falando?

- Por favor, não precisa mentir. Por que o senhor me mandou um e-mail tão estranho?

- Desculpe, mocinha, não sei do que está falando...eu nem sei mexer direito nessas coisas de computador.

- É mentira! - Monalisa se exalta, mas retoma o ponto de voz imediatamente - Err...desculpe, não quero ser rude, mas é muito estranho. Recebi um e-mail dessa loja com a palavra "dedaLus", mas não tenho a menor ideia do que isso significa. E tenho tido sonhos estranhos cada vez que passo na frente dessa loja...e coisas esquisitas estão acontecendo e...

- Por favor, se acalme. Não quer um copo de água?

- Não é água que preciso. Eu...só quero saber o que quer dizer tudo isso?

- Eu sinto muito...realmente não sei do que está falando...

 Impossível. Como ele poderia não saber? O e-mail era daquela loja. Não havia dúvida disso. Por que aquilo estava acontecendo? Seria algum pesadelo? Por que ele não admitia? Por quê? Monalisa começou a sentir um desespero interno, até que ouve um som familiar. Era um miado. O miado de um gato.

- Oh..você está aí - diz seu Tenório, ao visualizar o mesmo gato preto que estava lá fora - Hoho. Esse gato não é meu, mas sempre dou um pouco de leite para ele.

 O senhor se abaixa para acariciar o gato e Monalisa lembra-se imediatamente do seu sonho, mais precisamente das palavras do gato "descubra a senha". Senha. Seria isso? "dedaLus" poderia ser uma senha? Mas senha para quê? Ela já havia dito essa palavra para seu Tenório, mas não houve reação alguma. No entanto, tinha um detalhe a mais: ela percebeu que dedaLus tinha apenas a letra L maiúscula. Se é assim, talvez apenas falar não bastasse. Talvez...

- Seu Tenório...o senhor teria lápis e papel aí?

- Hoho. Isso é uma papelaria. Que outro lugar melhor para ter lápis e papel?

- Por favor, poderia me emprestar...qualquer pedaço de papel, qualquer coisa que dê para escrever...preciso muito disso.

- Você parece nervosa, mocinha - diz o senhor, pegando uma caneta esferográfica azul e o pedaço de um papel que usava para os clientes testarem a caneta - Por favor, se acalme. Aqui está.

 Ela olha para o gato que apenas a observa com indiferença. Monalisa não sabia se aquilo daria certo. Era quase certo que não. Se nem isso bastasse, não sabia mais o que fazer. Talvez devesse aceitar que estava ficando louca e procurar algum psicólogo. Mesmo assim, tinha que tentar. Aquilo precisava mudar alguma coisa. Por fim, ela escreve, com as mãos trêmulas, a palavra dedaLus, exatamente como estava no e-mail com apenas a letra L maiúscula. Imediatamente, ela mostra o papel para seu Tenório, mesmo achando que não iria funcionar.

- Essa é a palavra que estava no e-mail, seu Tenório. Por favor, o senhor tem que me falar o que significa

 No fundo, ela já estava acreditando mesmo que estava ficando louca. O velhinho para por alguns instantes, coloca a mão no queixo e, enfim, emite as seguintes palavras:

- Entendo...então finalmente você usou a senha, Monalisa...

 O que ele disse? Ela ativou a senha? Então era isso mesmo? Ele sabia o que estava acontecendo? Ele sabia até mesmo o nome dela. Ela finalmente começou a nutrir alguma esperança sobre tudo aquilo.

- Quer dizer que...o senhor sabe o que...

- Sobre o que está acontecendo com você? É claro que sim - ao contrário de poucos instantes atrás, a voz dele parecia mais confiante e firme. Aliás, ele parecia ter mudado completamente de personalidade.

- Mas por que...

- Imagino que esteja cheia de dúvidas. Mas precisamos conversar sobre isso com calma. Mesmo porque...a partir de agora tudo vai depender de você...

- Como?

- Por favor, venha comigo - diz o velhinho.O que houve? Parece que a senha foi mesmo ativada. Mas, ainda assim o que ela significava? Aliás, o que tudo aquilo significava? Talvez seu Tenório tivesse mesmo as respostas. Ela saberia logo, logo.


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Notas finais do capítulo

No próximo capítulo, a verdade vem à tona. Prepare-se para ler muuuito. XD Até lá!