Amante Conquistado escrita por leel


Capítulo 3
Capítulo 3




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Vishous estava largado no sofá da pequena sala de estar do Buraco. Tinha um cigarro enrolado em uma das mãos, e na outra um copo de Gray Goose. No sistema de som, Notorius B.I.G. ribombava no volume máximo. Sua vida estava fodida, como sempre fora. Bem, por algum tempo ele tivera uma pausa, mas agora as coisas pareciam ter se ferrado de vez. Não bastava ter descoberto que, de agora em diante, chamaria a Virgem Escriba de “mamãe”. Ele também tinha que lidar com a tarefa que ela lhe impusera – ser o Primale e garantir a continuidade da linhagem de guerreiros a que ele pertencia. Era uma avalanche de novidades com a qual ele não estava conseguindo lidar. Não queria aceitar mais imposições do que já suportara, mas também se sentia no dever de não deixar sua espécie definhar. Como se ser filho de Bloodletter já não tivesse sido o bastante. Como se viver naquele campo como um animal já não fosse sua cota de sofrimento pela vida inteira. Ainda tinha de lidar com seu lado mais sombrio – aquele ao qual dava vazão nas noites de diversão em sua cobertura – assim como lidava sua mão amaldiçoada e com o pesadelo recorrente que o afastara das lutas. Poderia ainda falar de seu maldito dom de prever o futuro, mas esse pelo visto não era mais motivo de preocupação. Por enquanto. Ah, sem contar com Butch. Vê-lo casado com Marissa era demais para ele. Claro que a felicidade do tira era a sua também, mas os sentimentos estavam todos ebulindo dentro de si. Sentimentos que ninguém poderia saber sem complicar ainda mais as coisas. Serenidade era algo que ele não conhecia. E era o que mais gostaria de ter. Abriria mão de tudo por um pouco de tranqüilidade em seu coração. Queria experimentar essa sensação desconhecida. Se ao menos pudesse sair e lutar para gastar sua energia e concentrar-se em outra coisa. Mas as ordens de Wrath foram bem claras. Havia ainda suas atividades na cobertura, mas não se sentia no espírito para isso. O jeito era encher a cara de Gray até se cansar. V. levantou-se para trazer a garrafa para perto de si, quando seu celular tocou. Atendeu um Phury ofegante. “Cara, estamos com um problema gigante aqui. É melhor você vir”. “Já estou colando aí”. Desligou o aparelho e trocou de roupa antes de se desmaterializar. *** Phury desligou o celular e olhou em volta, admirando o verdadeiro cenário de guerra que o beco em que estavam havia se tornado. Sangue de redutor por toda parte. Butch caído de um lado e Rhage, aturdido, do outro. No meio da confusão toda, a humana amiga de Butch jazia desacordada. Phury levantou-se e foi ver como os outros estavam. Butch estava ainda mais mal do que antes da onda magnética que jogou a todos longe. Segurou-o pelos ombros e ajudou-o a levantar-se. “Já chamei V. Logo ele estará aqui, voltaremos para casa e ele fará aquela mágica com você”. “Eu espero que sim. Acho melhor eu me sentar ali. Estou me sentindo muito fraco”. Phury acomodou o tira sentado junto a uma parede e foi ver Rhage. “Irmão? Tudo bem?”. “Ah, tudo. Só dói quando eu rio”. E soltou uma gargalhada que era mais de nervoso do que qualquer outra coisa. Levantou-se, ainda um tanto atrapalhado, e juntou-se ao outro vampiro. “Cara, o que foi aquilo?”. “Não sei. Tudo o que me lembro é que aconteceu assim que coloquei a mão nela”. “Ela está viva?”. “Não sei. E não vou tocá-la de novo para saber”. Rhage abaixou-se e olhou Alysia mais de perto. Ela parecia estar respirando. Mas olhando melhor, talvez não. Droga. Não bastasse todos os problemas que já tinham, a encrenca ainda ia procurá-los. E a encrenca, nesse caso, vinha na forma de uma humana abusada que explodia nas horas vagas. Que beleza. Ao ficar de pé, viu Vishous materializando-se no beco. “Minha nossa! O que aconteceu aqui? E quem é aquela civil?”. “Não é uma civil, é uma humana. E não sabemos se está morta”, respondeu Rhage. “Como vocês conseguiram deixar uma humana vê-los?”. “Não sabemos”, Phury disse. E colocou Vishous a par do que acontecera. Com as mãos na cintura, abanando a cabeça, V. mal podia crer no que ouvia. “E agora? O que iremos fazer?” Rhage interveio. “Não podemos deixá-la aqui. Se estiver viva, é claro”. “Irei descobrir isso agora”, V. respondeu. “Não, V.! Está louco? Essa confusão só começou porque a toquei”, gritou Phury. “Vocês estão se esquecendo de uma coisa”, disse Butch, com a respiração entrecortada. “Ela me abraçou antes desse clarão. Meu palpite é que isso só aconteceu porque ela se sentiu ameaçada”. Vishous olhou para o tira sem entender. “A moça foi colega do tira”, Rhage disse, divertido. “Essa é boa. Além de tudo, ela ainda o reconheceu?”. “Sim. E disse que estava me procurando”, Butch suspirou. “Quem diria”, disse V., aproximando-se de Alysia. Agachou-se junto a ela e conteve a respiração. Deus do céu, ela era linda. Não tinha uma beleza clássica nem traços delicados, mas um rosto cheio de personalidade. O queixo um tanto quadrado, com uma covinha. Maçãs do rosto marcadas. Um nariz harmonioso, que completava o conjunto. E uma boca deliciosamente carnuda. E os cabelos. Fios fartos, volumosos, acobreados. Dava para ver, pela pouca luz que havia no beco, que havia reflexos dourados nos fios. Lembrava vagamente o tipo de cabelo que Phury tinha, só que os tons eram outros. Afastou com cuidado uma mecha do cabelo para sentir-lhe a pulsação. Respirou aliviado ao constatar que estava viva. Viu que ela tinha um rosto sereno, mesmo estando sem sentidos. Não pôde controlar a inveja que sentiu dela naquele momento. A moça era tudo que ele não era. Exalava toda a tranqüilidade que ele não tinha. “Está viva”, disse V., sem tirar os olhos dela. “Não sei se isso é bom ou ruim”, Phury respondeu finalmente. Vishous ergueu os olhos, ensaiando uma reprimenda. Mas nada disse. “Será que ela irá lembrar-se quando acordar?” Rhage quis saber. “Não tenho idéia”, V. falou. “Mas não podemos arriscar deixando-a aqui. Precisamos levá-la, já que as circunstâncias não são nada comuns. Além disso, viu o que não devia. Veremos com Wrath o que pode ser feito”. “Ele não vai ficar nada satisfeito”. “Não mesmo”. *** Rhage buscou a Escalade e estacionou na entrada do beco. Phury ajudou Butch a acomodar-se no carro. E Vishous ficou encarregado de Alysia, já que pelo menos com ele, não havia nenhuma reação exagerada da parte dela. Quando o vampiro a ergueu e aconchegou-a nos braços, foi invadido por uma suave corrente elétrica e por uma sensação totalmente nova para ele. V. sentiu paz, pela primeira vez na vida, doce como um amanhecer. O que ele sentia era como se estivesse sendo curado pelo contato dela. Imaginou que fosse algo parecido ao que ele proporcionava a Butch, quando dissipava a energia negativa dos redutores do corpo dele. Instintivamente apertou-na nos braços, com a cabeça aninhando-se em seu ombro. Foi então que ele sentiu o cheiro delicioso que vinha de seu corpo. Alysia cheirava a um campo repleto de flores, banhado pelo sol da manhã. Vishous queria ficar ali para sempre, banhado naquela bênção que era o toque do corpo dela contra o seu. Forçou-se a caminhar para a parte de trás da Escalade. Não queria deixá-la ali, mas não havia lugar melhor para colocá-la. Estavam em quatro, e de maneira nenhuma aqueles brutamontes caberiam na traseira do carro. Pensou em algo para dar-lhe um pouco mais de conforto. “Rhage, empreste seu casaco”, pediu. “Estenda-o na parte de trás da Escalade”. Hollywood fez o que o irmão pedia e Vishous deitou Alysia sobre ele, envolvendo-a com a parte que sobrou do casaco. Estavam prontos para partir. No caminho para a mansão da Irmandade, Vishous não conseguia deixar de pensar no que a amiga de Butch lhe provocara. O que ela tinha de tão especial para provocar aquele caos todo naquele espaço de tempo tão curto? Ele tinha a urgência de tocá-la de novo e sentir mais uma vez toda aquela paz cheirando a flores. Virou a cabeça, espantando os pensamentos. Ele nunca sentia nada. Em sua vida, não havia espaço para essas emoções tão... Mundanas. “Ela é uma boa detetive”, disse Butch, olhando para trás. “Como disse?”. “Alysia. Ela é uma das melhores do Departamento. Jamais imaginei que pudesse pensar no meu desaparecimento, depois desse tempo todo”. Vishous deu um largo sorriso, mostrando as presas. “Você tinha uma fã e não sabia”. “Pouco provável. Quem me conhecia mais de perto não me achava muito atraente, por causa do meu gênio e da minha bebedeira. Ela teria de ser muito irracional para vir atrás de mim. E se tem uma pessoa que gosta de pensar logicamente, essa pessoa é Alysia”. Vishous abaixou a cabeça. Deu um sorriso de lado. Ele gostava disso. Ergueu a cabeça e viu Butch com a cabeça encostada no vidro do carro, prostrado pelo mal-estar. “Já estamos chegando”, disse, colocando a mão no ombro do tira. Butch grunhiu, concordando. *** Alysia estava em um doce torpor na traseira do Escalade. Meio acordada, meio dormindo, pensava no sonho estranho que acabara de ter. Um homem cujo rosto não conseguia vislumbrar, de braços fortes e atitude firme, a carregava através de um lindo campo de flores iluminado pelo sol. Ela sentiu como se algo finalmente se encaixasse, depois de muito tempo vivendo sem fazer sentido. Sentia que não havia nada a temer. Estava tranqüila, mas mais corajosa. Era bom. Virou-se um pouco de lado, puxando o casaco para junto de si, e voltou a dormir, torcendo para o sonho continuar.


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