Amante Conquistado escrita por leel


Capítulo 1
Capítulo 1




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Alysia tinha seu olhar perdido enquanto o café esfriava. O vapor que saía da xícara desenhava formas que se desfaziam no espaço, tanto quanto os pensamentos que vagavam em sua mente.

Era policial do Departamento de Polícia de Caldwell, Nova Iorque, e conhecida por sua tenacidade e persistência. Nada parecia atingi-la. Exceto talvez pelo desaparecimento de seu colega, Brian O’Neal, mais conhecido como Butch. Este era um fato ainda a ser superado.

Não que fossem colegas próximos. Butch não era o tipo que se aproximava de ninguém. Mas a verdade é que desde que ele simplesmente evaporara de seu apartamento, há cerca de um ano, Alysia não conseguia deixar de pensar no que teria acontecido com o tira. Ninguém desaparecia como acontecera com ele. Ou o sujeito ganhara na loteria largando tudo para trás... Ou o pior acontecera. Fora assassinado e o corpo sumiu sem deixar pistas.

Só isso poderia explicar o fato de que a espelunca que ele chamava de lar estivesse intacta. Nada de arrombamento, nada de roupas ou objetos faltando, nada de nada.

Claro, por um tempo ele foi procurado. Mas não durou muito, já que o tira fora expulso do Departamento por ter agredido o filho de um senador, de modo que, passado algum tempo, ninguém mais se preocupou em encontrá-lo.

O que Alysia não conseguia deixar de imaginar é que Butch deveria ter uma família. Alguém deveria sentir a falta dele, e esse alguém, fosse quem fosse, merecia respostas. E era por isso – e por seu instinto de policial que não largava um caso que lhe despertasse a curiosidade – que ela continuava a busca solitariamente.

Alysia não era muito velha no ofício – ainda tinha a energia típica dos novatos, embora já vislumbrasse o conformismo dos mais velhos. Beirava os trinta anos, e no fundo receava acontecer com ela o mesmo que aconteceu com Butch: morrer ou desaparecer e ninguém (ou quase ninguém) sentir falta dela.

“Acho que não preciso perguntar em que anda pensando, Alysia”.

Quem interrompia a avalanche de divagações era Jose de La Cruz. Cara, o homem tinha um tino... E conhecia as pessoas como ninguém. Alysia gostava dele. Era um dos melhores tiras do departamento.

E também era a pessoa mais próxima de Butch ali.

“Não consegue esquecer o tira, não é?” José disse, com um sorriso algo triste.

Alysia devolveu o sorriso, enquanto tomava um gole de café.

“Você sabe que não vou conseguir. Quantos tiras não tem casos que nunca são resolvidos e nunca lhes saem da cabeça? Butch é o meu”.

“Alysia, você precisa superar isso. Nunca vamos saber onde O’Neal se meteu”.

“E você superou, Jose?”.

Outro sorriso triste.

“Sabe que não, Alysia. Nunca vou esquecer Butch, ou me conformar com o desaparecimento dele. Mas precisamos seguir em frente. Temos de seguir. Ou isso nos consumirá também”.

Alysia suspirou.

“Quem sabe se tentássemos mais um pouco...”.

“Alysia, não”.

“Jose! Ele deve ter uma família. Alguém nesse exato momento chora por ele. Esse alguém, quem quer que seja, não merece saber? Não merecemos também? Ele era nosso colega!”.

“Disse bem: era. Ninguém aqui no departamento irá concordar com isso. Não depois do jeito que ele foi expulso. Não que o cara que quase teve o nariz arrancado pelo Butch não merecesse. Mas você sabe como são essas coisas”.

Alysia se calou. Sabendo bem como política e polícia se misturavam, não teria muitas opções para seguir em frente com a investigação. Apoiou por um instante a cabeça no balcão, levantando-se em seguida.

“Melhor ir andando. Ainda tenho umas coisas para fazer naquele caso do arrombamento daquela livraria, a Tichy’s.”.

“A mesma velha merreca de sempre”.

“É isso aí”.

***

No fim do dia, Alysia resolvera passar mais uma vez no prédio onde Butch alugava seu apartamento. Não havia mais nada dele por lá – o senhorio, vendo que o inquilino não voltaria mais, esvaziara o lugar dos poucos pertences do tira. Não havia tampouco nada que Alysia pudesse fazer, mas passar ali era como renovar a promessa de encontrá-lo. O zelador do prédio já conhecia a policial e sempre trocavam algumas palavras. Tudo já havia sido dito, mas conversavam, quase como que por costume.

Chegando em casa, Alysia se ressentia de não encontrar ninguém esperando por ela. As luzes todas apagadas. Alysia acendeu-as, mas a solidão era quase palpável de qualquer maneira. Jogou a bolsa num canto e atirou-se no sofá, jogando para longe os sapatos e caindo sobre as almofadas, bufando de tédio.

Estar sozinha era recorrente em sua vida. A mãe desaparecera logo após seu nascimento, e o pai enlouquecera depois disso, sendo praticamente incapaz de cuidar da filha. Não tinham parentes próximos, e sabe Deus como Alysia sobrevivera aos primeiros anos da infância. Logo era ela quem estava cuidando do pai, que estava cada vez mais ausente. Quando morreu, logo após a maioridade dela, Alysia ficou de fato sozinha. Não que já não estivesse acostumada.

O fato de a mãe ter desaparecido era o motivo óbvio que levara Alysia a entrar para a força policial – as coisas são às vezes tão claras, não são? Buscar respostas para os outros, porque ela nunca encontraria as dela. Depois de tornar-se policial, tentou investigar o paradeiro da mãe. Mas adivinhe só? Não encontrou nada que a levasse a seu passado.

A vida às vezes era um maldito clichê, não era?

Cansada de pensar no próprio passado, agarrou a almofada e ligou a TV. Talvez encontrasse reprises de algum filme clássico da década de quarenta, sua favorita.

Adormeceu no sofá, enquanto assistia Casablanca pela milionésima vez.

***

“COMO É QUE É?” Alysia quase gritou, enquanto levantava e derrubava a cadeira na sala de seu chefe.

“Você não ouviu errado, Alysia. A partir de agora, você está de férias”.

Ela não podia acreditar no que estava ouvindo.

“Como assim, férias? Não marquei nem fui avisada de nada!”.

“Ordens superiores”, seu chefe prosseguiu. “Sabemos que você ainda anda fuçando no caso daquele tira, o Butch. Estou concordando com isso porque você é um dos meus melhores detetives, e não posso me dar ao luxo de perder mais alguém”.

A essa altura, Alysia andava de um lado para o outro, sentindo-se encurralada. Injustiçada.

“Chefe, você sabe que isso não é certo”.

“Não é certo você continuar com essa investigação paralela que está prejudicando a sua produtividade e não vai levá-la a lugar algum. O caso já foi encerrado, e você sabe disso. Essas férias irão lhe fazer bem. Vá viajar, areje a cabeça”.

“Mas chefe...”.

Supere isso, Alysia. Será melhor para nós dois. Não encare isso como uma punição. Eu a quero bem e a admiro. Quero você de volta ao time com todo o seu foco. É minha última palavra”.

A policial agarrou a bolsa e saiu da sala, furiosa. Pisava duro pelo corredor, mal reparando nos olhares que os outros detetives lhe dirigiam de suas mesas, e quase atropelou Jose no caminho.

“Uau... calma aí, detetive”.

Alysia olhou furiosa para ele.

“A culpa é sua, Jose! SUA! Obrigada por nada, ouviu?”.

Virou as costas e saiu intempestivamente, deixando Jose com um olhar estarrecido.

Ia perguntar-se o que dera naquela mulher. Mas a pergunta era desnecessária: ele já sabia. 


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