Amz escrita por MissBlackWolfie


Capítulo 8
A Clair de sempre.


Notas iniciais do capítulo

Só tenho q dizer: odeio Carlos... aff



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Eu ansiava por ler as folhas marfim que tinham sido arrancadas do diário, a minha curiosidade era traiçoeira, me fazia desejar confrontar Carlos. Fato por mim evitado a todo custo durante anos, eu temo por meus sentimentos me traírem, que meu tigre me impedisse de ver a razão, permitindo entregasse ao desejo ardente por aquele ser sem escrúpulo.

Eu não poderia deixar que Carlos vencesse, conseguisse tirar de mim a única doi que realmente desejei na vida, uma certa esperança de algo desconhecido por mim, uma possível aventura que parecia direcionada a mim.

Não quero ser somente um objeto de divertimento dele, algo deixado claro por ele, eu queria ser mais, ter algum significado na sua vida, ter verdadeiramente o seu amor. Imediatamente meu dragão destruiu essa ilusão dizendo: “Isso é impossível. Ele é um monstro sem coração.” É verdade, ele não era saudável para mim.

-Vamos pegar as páginas amanhã de manhã. – Disse Ernesto se colocando de pé e estendendo a mão para mim. - Não vou deixar você sozinha com ele.

Aceitei sua ajuda e me coloquei de pé ao seu lado. Tenho certeza que meu irmão viu a insegurança no meu rosto. Ele sem duvida sabia dos sentimentos conflitantes por Carlos, mas como ele era cavalheiro não iria comentá-los. Agradeci mais uma vez ter um anjo como ele na minha vida, não sei o que faria sem ele.

-Acordamos bem cedo e vamos para o quarto dele. Porque ele dorme mais que a cama. O cara deve ter um pacto com Morfeu, porque nunca vi dormir tanto.

-Agora vamos nós dormirmos. – Abri minha boca num bocejo, ele abriu os braços na minha frente – Por que você esta fazendo isso?

-Para você não me engolir. Abriu o maior bocão. – E riu, mas parou ao perceber que eu arqueie minha sobrancelha em sinal reprovação a sua piada. - O que foi?

-Extremamente sem graça a sua piadinha. – e sai caminhando para meu quarto.

-A não foi tão sem graça assim, foi? – Ele me acompanhou.

Ficamos alguns minutos discutindo animadamente o conteúdo da gracinha de Ernesto, enquanto arrumávamos para dormir. Eu estava extremamente cansada, meus olhos suplicavam para serem fechados, meu corpo implorava por um descanso. Assim atendi aos seus anseios e deixei os sonhos me embalarem para bem longe dali.

Ouvi Ernesto chamar meu nome, algumas vezes, mas eu senti que estava tão longe na minha inconsciência, eu não queria voltar. O tom da voz dele começou a ficar irritado, falou mais algumas vezes.

Em seguida começou a me sacudir pelos ombros, mas eu fingia estar dormindo. Adorava irritar meu irmão, ele às vezes caia nas minhas armadilhas. Mas lembrei o que a gente tinha como missão hoje: recuperar as folhas do diário das mãos de Carlos.

Imediatamente abri meus olhos, que fez Ernesto tomar um susto, levando seu corpo um pouco opara trás quase caindo. Eu tive que rir da sua cara de assustado. Ele se levantou do meu lado e saiu do quarto.

Aproveitei a sua ausência para trocar de roupa e ir ao banheiro. Fui para cozinha, ele me entregou uma goiaba e caminhou para fora da cabana. O acompanhei, que já andava em direção a casa do Fonseca com passos firmes, enquanto isso eu comia a minha fruta.

Notei que o céu ainda continha algumas estrelas perdidas, contudo já dava para ver alguns raios do sol invadindo as nuvens. Perguntei mentalmente por quanto tempo eu havia dormido talvez umas duas horas, não mais do que isso. Contudo meu corpo parecia já recuperado, bastante disposto para qualquer situação. Sem duvida eu não estava normal, o que estava acontecendo comigo?

Paramos na porta da cozinha, não escutamos nenhum barulho de movimentação dentro da casa, eles ainda estavam dormindo. Encaramos nos por alguns segundos, não sabíamos como fazer apara recuperar as páginas. Tínhamos que pensar algo rapidamente, afinal o sol já estava se erguendo, daqui a pouco o Alex e Estela vão acordar, atrapalhando nosso plano.

-Ernesto. Vamos fazer logo alguma coisa. – as palavras saíram da minha boca como um jato. Comecei a ficar apreensiva, meu corpo começava apresentar os sinais.

-Calma. Eu estou pensando.

De repente na minha mente consegui enxergar meu tigre me aconselhando: “Você sabe uma maneira de conseguir tudo que deseja de Carlos.”. Minha respiração parou por alguns segundos, meu corpo todo se enrijeceu com a sugestão, sim eu sei muito bem como conseguir, porém tenho medo de me perder no meu sentimento nutrido por Carlos.

Então a minha fera emotiva continuou a falar: “Use arma dele contra ele mesmo.”. Pela primeira vez esse felino deu uma ideia plausível. Senti meu dragão concordando, mas ainda desconfiado, talvez ele saiba como aquilo poderia ser perigoso.

-Já sei o que fazer – Tentei ser firme no meu tom de voz, mas fui traída pela minha incerteza que o plano do meu tigre ia dar certo. – Vou ao quarto dele, tento pegar as folhas. Sem fazer barulho. Você me espera do lado de fora no corredor.

Meu irmão não gostou daquela ideia minha, entretanto contra gosto ele falou rapidamente para mim:

-Bem não temos muito tempo para pensar outra coisa. Então vamos.

Ele passou seus dedos na minha mão, segurando firmemente, nos conduzindo para dentro da casa. Tentamos dar passos apresados, ao mesmo tempo contidos, pois não queríamos fazer nenhum ruído.

Enquanto subíamos as escadas escutei minha pulsação cardíaca diminuir, quase que enfraquecida. Meu corpo percebeu primeiro do que a minha consciência o que eu estava preste a fazer, o nervosismo começou mostrar seus sintomas. Eu entraria no quarto de Carlos sozinha e indefesa.

Minhas pernas congelaram, fiquei como uma estatua mármore, não mexia sequer um centímetro nem para frente e nem para trás. Ernesto que me conduzia pela mão, percebeu minha paralisação, quando tentou continuar andando, contudo ficou parado. Virou o rosto para verificar o que estava acontecendo. Ele dever ter visto como eu estava pálida, pois eu sentia que estava suando frio pela nuca e têmporas, de repente o meu sangue tinha sumido do meu corpo. Ele se aproximou de mim.

-Clair o que você esta sentindo? – Vi uma ruga de preocupação formar entre seus olhos. Ernesto apertou meus dedos com calma continuou. - Você parece um papel de tão branca.

-Eu não sei se vou conseguir ser forte. – sussurrei sentindo minhas pernas falharam, rapidamente fui amparada pelos braços do meu irmão.

-Olha aqui. – Ele me lançava um olhar severo. - Você não esta sozinha. Eu estou aqui, nada vai dar errado.

Mas o medo entorpecia meu corpo por completo, cada pedaço parecia congelar, a minha garganta não conseguiu proferir nenhum som, quanto mais alguma palavra. Puxei o ar para meus pulmões, em uma tentativa de achar algum rastro de força para continuar com plano.

Então apareceu a coragem, impulsionada pela esperança de descobrir uma nova vida. Sim, eu tenho uma certeza incompreensível dentro de mim que minha vida iria mudar, tudo graças a esse mistério. Isso me deu motivação para entrar no quarto de Carlos.

Pacientemente meu irmão esperou eu fazer minhas deliberações internas, ele sabe o quanto elas são importantes para mim. Quando ele viu que eu tinha recuperado a cor no meu rosto e que minha temperatura corporal estava normalizada, deduziu que eu já tinha decidido continuar a nossa missão.

-Podemos continuar andando? – ele disse calmamente.

-Sim. – Abri meus olhos para encará-lo.

-Vou ficar na frente do quarto do Alex, atento da movimentação lá dentro. - Ele falava bem vagarosamente – Você entra no quarto do Carlos e pega as folhas. Qualquer coisa você grita, não levarei mais de um minuto para lhe encontra. Ok?

Afirmei positivamente com a cabeça. Estávamos no meio da escada, voltamos a subir. Eu já podia ver a porta do quarto de Carlos, que ficava de frente para os degraus. Meu corpo ainda estava letárgico, entretanto eu tentaria despertá-lo o suficiente para executar meu objetivo: as paginas arrancadas. Pois eu preciso descobri o que Sarah escreveu naquelas paginas, roubadas por Carlos. Mesmo que isso me fizesse ficar a sós com aquele meu pesadelo mais desejado.

A porta do quarto de Alex ficava ao final do corredor, devirei ter uns cinco metros de distancia do quarto do seu filho. Sem dúvida, com o silencio matinal que ainda pairava no ar, era certo que ainda todos dormiam ali e que se eu gritasse Ernesto me escutaria. Eu repetia isso mentalmente a todo segundo, tentando convencer a minha razão que eu não estava em perigo.

Chegamos ao topo da escadaria, olhamos mais uma vez um para outro. Meu irmão sibilou que estava tudo bem, saiu de caminhando de costas, ainda olhando para mim até uns dois metros de distancia. Eu estava parada no ultimo degrau, respirei fundo e coloquei a mão na maçaneta.

Coragem Clair você consegue.” Ouvi meu dragão sussurrar na minha mente. Foi um alivio saber que ele estava alerta, com toda sua racionalidade como minha grande aliada.

Abri a porta bem vagarosamente, ela me ajudou não produzindo nenhum barulho. Eu deslizei o meu corpo para dentro do quarto na pequena fresta aberta por mim. Os tímidos raios de sol encostavam na minha pele, lutavam bravamente contra cortina que não tinha sido totalmente fechada. Logo fui tentando acostumar a visão com a pouca claridade. Comecei a vasculhar o armário, abri as portas calmamente, minhas mãos buscavam entre as mudas de roupas, em caixas de sapatos. Qualquer espaço eu procurava e nada achava.

Eu tinha que ir para outro lugar daquele quarto, para continuar minha busca. Quando de repente meu olhar focalizou a cama, onde Carlos dormia de bruços, ressonando baixo. Só consegui admirá-lo, cada pedaço da sua pele, cada respiração, tudo parecia me convidar a ficar ao seu lado.

Nunca o tinha visto tão sereno e calmo, a forma que ele emanava paz, me vez querê-lo em meus braços. Por aquele Carlos eu poderia me apaixonar sem restrições, entregar todo o amor que eu possuo por ele. Meu tigre rugiu alto dentro de mim, ele nunca esteve tão satisfeito.

Não contive meu desejo, preciso chegar perto dele, meus pés me levaram a ficar ao lado da sua cama sem racionalizar as consequências daquele ato. Pude ver seus lábios entre abertos, deixando espaçar ressonar do seu sono tranquilo.

Aquele quadro pacifico dele, tão diferente do Carlos monstro que normalmente me assombra em todos esses anos. Mais uma vez me senti atraída pela sua presença, sem pensar em nada, me agachei ficando mais próxima dele.

Minhas mãos passaram percorrer de leve, com a ponta dos dedos pelo seu corpo, que usava somente um short azulado. Suas costas esguias subiam e desciam com sua respiração ritmada pela inconsciência dos sonhos.

Enquanto meus dedos continuavam sua exploração silenciosa, meus lábios queriam fazer uma busca também, aquela que sempre sonhei nos meus sonhos mais secretos: o gosto daquela boca, de sua pele. Aproximei nossas bocas, senti a respiração tocar minha língua, havia somente centímetros uma da outra. Eu não iria resistir por muito tempo em encontrar seus lábios com os meus. Como seria essa sensação?

Enquanto a tentação desenhava em minha mente essa possibilidade, trazendo nas minhas lembranças os meus sonhos com ele. Carlos se mexeu na cama, colocando o corpo de lado. Esse repentino movimento dele vez eu sair do estado hipnótico que me encontrava, fazendo-me cair para trás de susto.

Nesse exato momento me assustei com meu dragão esbravejando para eu manter o foco da minha busca primordial: “as folhas do diário”.

Prontamente me levantei, um pouco atrapalhada, tendo uma coisa certa; não posso ficar ali por muito tempo ou se não trairia a minha razão. Ainda nervosa cruzei o quarto indo de encontro com sua escrivaninha de estudo, respirei fundo tentando me controlar, em seguida procurei entre alguns livros e envelopes que repousavam lá em cima, mais uma vez não encontrei.

Ao lado tinha uma cômoda bege clara com algumas gavetas, comecei abrir vagarosamente uma a uma e vasculhar seu conteúdo. Remexi roupas e mais roupas, nada era encontrado.

Olhei para Carlos, ainda dormia, bufei por não encontrar nada. Eu já estava começando a perder a esperança, quando eu abri a penúltima gaveta que faltava. E lá estava o meu tesouro, o que tanto busquei.

As páginas marfim pareciam brilhar como ouro, eu passei as pontas dos dedos com cuidado nelas para certificar que eram reais. Sim, elas agora estavam ao alcance das minhas mãos, peguei delicadamente cada folha.

Então quando eu terminava de tirá-las dentro da gaveta, vi uma mão a fechando abruptamente, quase pegando as pontas dos meus dedos, soltei um pequeno grito de susto.

Eu me assustei com aquela atitude, senti em seguida uma mão tapando minha boca e outra firme na minha cintura, que me virou com velocidade e agressiva, empresando-me contra a cômoda, pude perceber dois pares de olhos verdes raivosos em mim.

Meus olhos encaravam o meu medo: Carlos tão próximo a mim, mantendo nossos corpos tão perto um do outro. Todo receio que tinha sentido antes de entrar o seu quarto parecia ter se intensificado dez vezes mais, tinha sido pega no flagra.

Meu sangue sumiu por completo das minhas veias, como se tivesse congelado, sem duvida estou muito pálida, o suor frio escorria pela minha coluna e um fio cumprido caiu pela lateral do meu rosto.

A minha respiração começou a faltar em meus pulmões, minhas pernas falharem, quase cai, somente o toque do monstro impedia do meu corpo encontrar o chão. Carlos aproveitou o meu estado quase catatônico para tirar as folhas da minha mão sem esforço algum, eu não consegui fazer nenhum movimento para impedi-lo. Mais uma vez ele anulava as minhas forças, me dominava.

-Você quer ler o que está escrito? – Sua voz era sombria e sarcástica, seus olhos analisavam os meus enquanto sussurrava próximo ao meu rosto. – Vem pegar. Sei que você também quer me pegar, estou te esperando. Vem!

Ele deu alguns passos para trás, sacudindo as folhas, novamente me convidando para pega-las. Comecei a piscar saindo do meu transe, contudo ainda não conseguia raciocinar com clareza, um turbilhão de emoções conflituosas impediam qualquer gesto meu. Vendo meu estado deprimente de fraqueza, ele se aproximou de mim rindo.

Inutilmente tentei fugir, dando um passo para o lado, mas eu estava ainda entorpecida pelo medo do que ele poderia fazer comigo e o que eu poderia fazer também, embolei as minhas pernas e quase cai. Contudo ele foi bastante rápido me pegou em seus braços e colou nossos corpos mais uma vez, senti o baque desse encontro ríspido. Confesso que gostei dele estar tão próximo a mim, meu felino suspirou com isso.

Em seguida ouvimos alguns passos do lá de fora, eu sabia que era Ernesto, imediatamente pensei em gritar. Porém eu não conseguia, minha garganta estava seca, não conseguia falar nada. De repente Carlos foi para trás de mim, colocando um dos meus braços nas minhas costas, o torcendo e sussurrou no meu ouvido.

-Ernesto está ai fora? – Não consegui responder, ele apertou mais o meu braço. - Responde Clair.

Assenti com a cabeça, agora minhas lágrimas rolavam freneticamente em meu rosto, reforçando mais uma vez o quanto frágil fico na presença daquele monstro. Eu me sentia a pior pessoa do universo, eu era desprezível por me arruinar dessa maneira na frente daquele ser.

Ele começou a me arrastar para fora do quarto, alertando para eu não gritar, se não me machucaria ainda mais. Meu choro agora era descontrolado, os soluços escapavam de dentro de mim. Quando passamos pela porta, só vi um vulto de Ernesto, porque meus olhos estavam encharcados de dor e vergonha.

-Clair!- Ouvi Ernesto gritar.

-Nem pense em chegar perto, se não eu a derrubo de escada abaixo. – Vociferou Carlos sacudindo de leve meu corpo em direção a escadaria.

-Não precisa fazer isso. – Ernesto parecia desesperado.

-Então nem sonha em dar mais um passo. – A voz de Carlos era calma e sombria.- Na verdade você vai é andar para o final do corredor.

Então começamos todos a andar pelo corredor da mansão, parecia estávamos sincronizado, ouvia a respiração acelerada de Ernesto. O conhecendo bem ele deveria estar bufando de raiva, doido para matar Carlos.

-Agora saco de músculos entra no banheiro e me dá a chave. – Carlos com tom de voz assustadoramente calmo. - fica encostado na parede.

-Não mesmo. – Ernesto respondeu quase como um rosnado.

-Você quer ver Clair sofrendo? – Senti Carlos torcer meu pulso que estava preso atrás de mim. Eu soltei um grito de dor.

-Para! Não precisa fazer isso. Tome a chave. - ouvi o tilintar do metal.

-Joga no chão. Eu não confio em você. - Ouvi o barulho metálico encontrando o chão. – Agora entra para o banheiro.

-E a Clair? – Cada vez mais o tom do meu irmão era raivoso.

-Ela já vai acompanhá-lo. Agora Clair pega a chave.

As minha lagrimas pareciam não ter fim, elas saiam dos meus olhos sem parar. O pânico agora dominava completamente o meu ser. Nunca tinha imaginado tamanho domínio que Carlos exercia sobre mim, consegui me fragilizar daquela maneira, me deixando completamente a mercê de sua vontade.

Quando me agachei, eu pude sentir os espasmos musculares que meu corpo estava sofrendo. Cambaleei um pouco, quase caindo, mas ainda tinha as mãos de Carlos ao meu redor.

-Você poderia ser menos patética? – Carlos falou no meu ouvido – Você foi ao meu quarto para me ver e me desejar.

Senti-o beijar o meu pescoço sensualmente e soltar uma risada maliciosa. Eu não consegui ter nenhum tipo de reação. Fechei meus olhos, tentando achar algum estado estupor, eu queria fugir de alguma maneira daquilo tudo, pois era muito doloroso. Ele sabia seu poder sobre mim e se divertia com isso.

Logo em seguida, eu senti Carlos me jogando contra o chão frio do banheiro. E ouvi trancando a porta com a chave. No mesmo momento as mãos de Ernesto me envolveram ao meu redor, me colocando em seu colo. Meu mundo terminou de desabar ali nos braços do meu irmão, a dor rugiu feroz em meu peito.

-Eu sou fraca. - Eu disse com a voz embargada pelo choro.

-Não fala nada. - Ele afagava meu cabelo. – Você é mais forte do que imagina só basta acreditar nisso.

Meu pranto pareceu aumentar com as palavras de consolo do meu irmão, só ele para acreditar em mim, isso me envergonha tanto. Eu não posso mais me enganar, o amor que sentia pelo monstro do Carlos, era um sentimento real e traiçoeiro, ainda irá destruir a minha pouca sanidade. Mas não posso mais negar para mim mesma o que está enraizado no meu peito, um amor ilógico e doentio. Sentimento insano, ele é consciente disso e me manipulava facilmente.

Toda essa certeza gerou um ódio imenso de mim mesma, eu comecei a me bater, quero me punir por ser tão idiota. Isso assustou Ernesto, que tentou me conter apertando mais o abraço.

-Clair não faça isso com você – Sua voz era repleta de carinho. – Olha para mim. Vamos embora daqui. Vamos seguir nossas vidas de forma normal. Não nessa loucura doentia que vivemos. Mas agora eu preciso que você reaja.

Ao ouvir as palavras do meu irmão-anjo, abri minhas pálpebras. Ele estava certo, eu não posso deixar que Carlos arranque de mim a única oportunidade de ter uma vida saudável longe dele. Mirei meus olhos para Ernesto, que me deu um beijo na minha testa.

-Você esta mais calma?- Assenti com a cabeça. – Podemos sair daqui?

-Sim. – Passei a mão no meu rosto para retirar as lagrimas que ainda estavam empoçadas no meu rosto. – Desculpa minha fraqueza.

-Clair lembre-se estamos sempre juntos.

-Eu sei.

Fiquei mais alguns minutos no colo do meu irmão, sendo amparada por ele, comecei a reunir forçar para continuar, não poderia parar agora. Dessa forma terminei de enxugar minhas lágrimas com as pontas dos meus dedos e falei para meu irmão que podíamos ir embora.

Ernesto me tirou do seu colo delicadamente, repousando meu corpo no chão, deu um pulo e pousou de pé estendendo a mão para mim, definitivamente eu não tentaria tal movimento, porque sem duvida eu cairia. Apenas aceitei sua ajuda e me coloquei de pé de maneira mais estabanada possível.

Rapidamente analisamos as possibilidades de sairmos dali. Meu irmão analisava a porta do banheiro, viu que os parafusos estavam frouxos e madeira estava velha. Ao perceber a sua ideia através do seu olhar para mim, comecei a buscar algum objeto para servir de alavanca para levantar os parafusos.

Achei uma escova de metal, nunca entendi como alguém penteava os cabelos com aquilo, mas agora ela poderia ser útil, uma alavanca. Entreguei para Ernesto, que usou de forma eficaz, como pensada por mim, colocou entre os metais, como uma alavanca, conseguindo tirar as duas peças em pouco tempo.

Em seguida usou aquele instrumento para forçar a madeira para abrir uma pequena fresta para nossa passagem. Depois de muita força e gotas de suor de Ernesto esgueiramos nossos corpos pela fenda aberta, posso dizer que meu irmão teve dificuldade para passar em um espaço tão pequeno.

Quando nós dois estávamos no corredor, podemos sentir o cheiro de algo queimando. Olhamos um para outro de forma apreensiva. O que poderia está queimando? Corremos em busca daquele cheiro. Sentimos que vinha da cozinha. Ao chegar até lá nos deparamos com a seguinte cena.

Carlos com uma grande tigela de porcelana branca na sua frente, onde o fogo brincava furiosamente queimando algo. Ao nos ver ele pegou uma faca que estava no faqueiro ao seu lado e nos ameaçou.

Meu cérebro deveria estar exausto de tantas emoções que eu havia vivido nesse período de menos de 24 horas, pois demorou alguns segundos para assimilar o que estava sendo queimado. Mas minha inquietação vibrou irritada, não estou acostumada com sua presença, contudo ela foi clara dessa vez: o meu objetivo estava virando cinzas na minha frente.

-Ernesto! Ele está queimando as folhas do diário. – Agora eu estava gritando desesperada.

O primeiro reflexo do meu irmão foi ir de encontro a Carlos que nos apontou uma faca grande. Meu irmão recuou e me colocou atrás dele de forma protetora. Nas suas costas eu dei um passo para o lado para poder ver tudo que estava acontecendo na cozinha.

-Eu não estou brincando. Eu vou furar vocês dois. – Por incrível que pareça Carlos parecia se divertir nos ameaçando.

-Calma ai, Nero. Por que você fez isso? – Perguntou Ernesto rosnando novamente.

-Porque ela é minha propriedade. – Carlos disse apontando para mim.- E nada e ninguém vão tirá-la do meu domínio.

Ao ouvir aquelas palavras saindo da boca de Carlos, fez paralisar todo o turbilhão que girava na minha mente por um segundo. Elas pareciam como uma cobra deslizando para dentro de mim me envolvendo, contaminado com a sua ideia absurda de que eu pertenço a ele. Eu estava abismada e meu rosto mostrava isso claramente.

Meus olhos prenderam-se no chão por alguns instantes precisava ter um tempo para organizar essa certeza de Carlos. Enquanto isso ouvia a discussão acalorada entre Carlos e Ernesto, que gritavam enlouquecidos um ao outro. Porém suas vozes ficaram inaudíveis para mim, pois elas foram abafadas pelos meus pensamentos.

Aquelas palavras, para mim, eram inimagináveis serem ditas por aquele monstro, mas algo parecia destoar naquela cena. Mudei o foco da minha visão para os olhos de Carlos, em conjunto meu cérebro fez as conexões necessárias. Assim pude ver a resposta que estava buscando: ele queria que eu ficasse a mercê do seu desejo e que fosse submissa a sua vontade. A minha vida seria resumida a servi-lo, e mais nada.

Ao queimar aquelas folhas ele estava destruindo meu único sonho real de mudar todo o meu destino. De eu ficar longe dele e da sua família corrupta. Ele estava certo eu seria dele, como objeto de herança, ele sabia que eu não iria resistir por muito tempo e a certeza disso foi presenciada por mim hoje em seu quarto, quando eu quase o beijei. Eu amo esse ser inescrupuloso e desatável, que sabe brincar com meu desejo e sentimentos. Usa minha frágil autoestima como sua maior arma.

As labaredas do fogo tomaram agora minha visão, elas pareciam arder dentro de mim, queimando minha esperança de uma nova vida. Eu queria pertencer aquela historia escrita por Sarah, fazer parte daquela família, ser a sua filha esperada e amada, ser alguém diferente do que sou. Sei que nada a mim foi prometido, mas sim imaginado e desejado. Contudo toda aquela loucura era minha, e Carlos conseguiu acabar com tudo rapidamente, fazendo tornar tudo cinzas.

Meu corpo e minha mente imploravam para eu sair dali, correr para longe, talvez para o infinito. Para não ter qualquer lembrança do meu sonho sendo consumido pelas chamas. Meu intimo precisava da solidão, ansiava pela uma única companhia: o mar. Nadaria até meu corpo fatigar, eu só queria embora, fugir para qualquer lugar, mesmo que esse fosse a morte.

Queimei dentro daquela tigela, consegui ouvir os gritos da dor de ter perdido a minha felicidade. A frustração desejar algo de maneira intensa e isso é arrancado de você, sem nenhuma piedade, faziam eu querer ir embora. Meus devaneios foram interrompidos quando senti Ernesto saindo da minha frente e caminhando em direção a Carlos, que ainda empunhava a faca na nossa direção.

-Você acha que é o dono dela? – Ouvi Ernesto dizer ameaçadoramente para Carlos.

-Não dê mais nenhum passo. - Carlos disse com raiva, contudo eu podia ver receio no rosto dele. - Eu não estou brincando Ernesto.

-Eu não vou permitir que você ouse tocar nela. - Ernesto estava apontando com dedo indicador em direção a Carlos. – Nem nessa e nem em outra vida.

Se não conhecesse a boa índole de meu irmão, eu começaria ter medo dele, pois nunca o tinha visto com tanto ódio e fúria. Seu corpo estava todo tenso, as veias do pescoço saltadas, punho fechado ao lado do corpo, parecia estar se preparando para o confronto. Ele não temia a faca que era apontada para ele, as palavras de Carlos dissolveram qualquer instinto de conservação de meu irmão.

Ao ver Ernesto, meu anjo, me defender com tanta veemência, só pude sentir o gosto ruim da vergonha. Ele estava ali disposto lutar por mim, arriscar sua vida pela minha honra.

Mas eu e Carlos sabíamos que era inútil, a verdade era que sabíamos o que o futuro tinha me reservado. Poderia fugir dele por alguns meses ou anos, mas eu seria inevitável, um dia eu seria tragada por esse amor irracional e doentio.

Novamente todo meu ser implorou para sair dali, era muito doloroso ver meu irmão lutar por uma causa tão perdida como eu. Nunca escondi nada de Ernesto, assim eu sabia que também ele estava ciente desse sentimento louco que eu nutria por aquele monstro.

Agora havia outro grito de fuga dentro de mim, a minha inquietação, que ficou tão calada por toda a minha angustia, agora suplicava para eu sair dali. Assim obedeci a vontade da minha alma e da minha inquietude de escapar dali. Virei meu corpo e comecei a correr sem rumo e direção.

Ernesto me chamava em plenos pulmões, mas eu não consegui respondê-lo, minha vergonha encobria qualquer possível coragem, que ainda restava dentro de mim. Havia agora dentro de mim uma nova meta: fugir. Ir para bem longe daquele lugar, daquela cena, sem dúvida daquela vida covarde que eu teria para sempre.

Eu estava ciente que essa minha atitude era infantil, não mudaria em nada o meu futuro sombrio. Contudo minha alma ansiava por algum tipo de paz, mesmo que ela seja breve. No meio da minha corrida senti minha inquietude pulsar loucamente, algo parecia que ia rachar dentro de mim. Oxigênio começou a me faltar, precisava respirar um ar limpo, sem as impurezas da minha realidade obscura junto à família Fonsecas.

Durante a minha travessia os rostos das pessoas na rua, pareciam meros borrões de tinta, as minhas lagrimas ajudavam ter essa sensação. Algumas vezes eu esbarrava nessas figuras, em outros momentos eu caia. Porém nada me fez parar, continuava a correr e correr. Talvez eu queria ter a ilusão que encontraria um lugar mágico, na verdade eu ansiava por ele, como seu eu soubesse o caminho, lugar onde não houvesse Carlos a me perturbar.

Minhas pernas estavam interligadas com o pulsar frenético do meu peito, toda agonia por mim sentida as faziam trabalharem mais e mais, impossibilitando qualquer cãibra. E minha inquietude parecia estar mais acelerada ainda. Essa parecia não se conformar com toda aquela situação, dessa sentença da minha vida.

Todos os traçados realizados pela minha mente durante toda essa pequena aventura, que começou com o encontro com Lisa, passando pela leitura do diário de Sarah, mais as revelações de Alex e tendo como fim as páginas queimadas por Carlos, sendo que minha esperança tornando-se cinzas perante meus olhos. Assim todos esses traços estavam borrados e manchados pela minha impotência diante a minha vida por mim imposta pelo destino.

As gotas grandes e pesadas que caiam dos meus olhos, molhando todo meu rosto e depositando no meu colo, eram o reflexo do tamanho da minha dor de toda essa certeza, ela estava me sufocando. Tentava respirar, eu estava arfando, não tinha mais força para continuar. E nem era preciso, nesse momento senti meus pés tocando areia quente e acolhedora da Praia dos Desejos.

Meu coração me levou inconscientemente para aquele meu santuário. Ele sabia que ali seria um lugar perfeito para ter minha fuga particular. Meus pés usaram o ultimo vestígio de força e me levaram para beira do mar.

Quando senti a água me tocando meu corpo não resistiu a sua quentura tão acolhedora naquele momento, por fim cai de joelhos naquele chão molhado e branco. Soltei um grito que estava preso no fundo do meu âmago, era a dor mostrando toda sua força do meu desespero pela minha condenação.

Meu choro agora era agonizante, soluços altos sacudiam meu corpo ainda tremulo de nervoso e esforço pela corrida. Aquela angustia enchia o meu peito de uma forma asfixiante. Na verdade eu não queria respirar, pensar, muito menos viver. Eu era um monstro como Carlos, pois eu nutria sentimentos apaixonados por ele, talvez eu seja bastante parecida com ele.

Porque só isso explica eu ter esse maldito amor entranhado no meu coração, praticamente uma maldição. Era como uma erva – daninha sugando toda vitalidade da planta hospedeira, no meu caso ele ia me consumir.

Minha inquietação pulsante agora gritava junto comigo, ela estava inconformada, mexia como quisesse se jogar no mar, me levar para um outro lugar. Eu iria atender sua vontade, afinal não havia nada ser perdido, nem a mesmo a minha vida, essa já não existia.

Comecei a gatinhar para a água, que é tão morna, fazendo meu corpo se entregar sem a menor resistência. Era isso que minha alma clamava ser acolhida daquela maneira abrangente e aconchegante. Deixei-o ser levado pelas ondas. Minha inquietação começou a se acalmar, sua pulsação começou abaixar.

Fechei meus olhos, eu queria sentir aquele estupor, que minha sanidade tanto pediu, inteiramente. Esvaziá-la de toda essa loucura inútil que eu vivi nessas 24 horas, de todas as perguntas e esperanças por mim construídas. Rezava para que a maré me levasse para qualquer lugar, talvez encontrasse a morte. Seria que eu teria essa sorte?

Ao final desse pensamento senti alguém me puxar meu braço esquerdo, tirando do meu mundo encantado. Eu já ia protestar pela sua intromissão quando meus olhos a viram, aquela que me salvaria. Lisa estava me puxando em direção a praia, eu estava atônica. Mas dentro de mim a inquietação retornou mais agitada, parecia uma criança pulando diante do seu brinquedo preferido, cobiçando brincar com ele de qualquer maneira.

Senti meus lábios desenharem um sorriso, ela continuava a me puxar sem olhar para mim. Contudo isso não me incomodou, estava tão eufórica porque teria as minhas repostas para as minhas perguntas geradas desde nosso primeiro encontro. E quem sabe recuperaria a minha esperança de ter outra vida bem longe de Carlos.

Durante os minutos que ainda estávamos no mar, eu percebi como meu corpo tinha sido levado para bem longe da beira da praia. Enquanto isso tentava organizar minhas idéias que pareciam pular freneticamente na minha mente. Todas as peças que foram montadas dentro do meu quebra-cabeça mental estavam sendo expostas para saber o que deveria questionar a Lisa.

Chegamos próxima área da arrebentação das ondas, as pontas dos meus pés já tocavam a areia, com certa dificuldade fiquei de pé. A mão de Lisa ainda estava no meu braço, que apertava com bastante força, talvez com medo que eu me atirasse novamente ao mar.

Enquanto caminhávamos dentro da água senti minha inquietação pulsar tanto que estava doendo fisicamente, tinha sensação que era um bicho enjaulado louco para ganhar a liberdade. Será que eu já não tinha feras suficientes dentro de mim?

-Você está bem? – Os olhos lilás de Lisa esquadrinhavam todo o meu corpo.

Só consegui balançar a cabeça de forma afirmativa. Incrivelmente a minha garganta se fechou, havia muitas coisas acontecendo dentro de mim. Não conseguia achar alguma força para falar. Mesmo sabendo que eu estava quase enlouquecendo por tantas questões misteriosas que circulavam Lisa e Sarah. Mesmo assim não conseguia falar, soltar uma palavra sequer. Abri boca, mas nenhum som saia.

Meu peito agora doía muito pela inquietação que pulsava muito mais forte. Sentia um calor percorrendo todo meu corpo, sendo irradiado para cada membro meu. Aprecia estar crescendo sem parar, coloquei a mão sobre meu peito, em uma tentativa desesperada de não me romper. Porque era essa sensação que eu sentia, algo queria sair. Lisa me observava com uma atenção e preocupação.

-Você está sentindo uma inquietação ai dentro? – Seu tom era calmo e sereno. Agora estávamos na beira da praia.

Mais uma vez consegui somente assentir com a cabeça. Então ela colocou sua mão que estava livre no meu peito. Imediatamente toda a angustia que estava me machucando pareceu se dissipar. A pulsação da inquietude estava baixando, foi acalmando cada segundo. Contudo ela continuava ali ainda, agora controlada e calma. Minha respiração foi regulando, o ar entrava e saia livremente dos meus pulmões.

-Seu coração é puro e bom. – Lisa ainda continuava com a mão repousada no meu peito.- Qualidades necessárias para encontrar o caminho que você precisa trilhar. Claro se você quiser fazer essa escolha para sua vida.

-Eu quero. – Minha voz saiu rouca, pigarreei tentando recuperá-la. - Eu preciso ir embora daqui.

Minha inquietude começou a pulsar, mas agora estava regulada, não me incomodava. Na verdade ela me fazia sentir como nunca havia me sentido antes, completa e forte. Como nada pudesse me atingir, apesar da minha frágil pessoa, tanto no aspecto físico quanto psicológico. Tinha impressão que uma nova Clair estava surgindo a partir dessa inquietude.

-Estou certa que você é aquela que estava faltando. – Lisa abriu um lindo sorriso para mim. – Estou muito feliz de finalmente eu ter te encontrado.

-Eu também estou feliz de ter encontrado outro caminho para mim. – Minhas lagrimas agora eram de felicidade. – Você irá me levar para este novo lugar?

-Acredito que sim. Mas serei precavida e lhe darei a peça final para você ir ao encontro das minhas meninas.

Ela tirava do seu pescoço um colar de prata, que tinha um pingente transparente em forma de gota, dentro dele tinha um liquido azulado. Ela pediu consentimento através do gesto para por em mim aquela jóia, eu permiti. Quando a gota entrou em contato com minha pele, a pulsação acelerou um pouco, me fazendo respirar profundamente.

Lisa olhava para mim de maneira admirada, seus olhos lilás tinham um brilho encantador. Em seguida ela me deu um abraço bem apertado, do tipo que Ernesto sempre me dava. Ela era uma estranha, não sabia nada sobre sua historia, contudo eu já tinha um sentimento por ela nunca por mim experimentado: materno. Acredito se eu tivesse a minha mãe eu teria esse mesmo carinho que estava sentindo agora por Lisa.

Seus braços eram tão acolhedores e protetores. Eu queria ficar ali para sempre, poderia escurecer e amanhecer e ali eu estaria. De alguma maneira estranha, como toda essa história, sentia-me ligada a Lisa, como se eu a conhecesse de muito tempo.

-Essa confusão que você esta sentindo dentro de você vai passar. Eu prometo. - Ela disse no meu ouvido, eu apertei mais o nosso abraço. – Eu tenho observado você a distancia e sei que você é a nossa última menina. Você tem sentindo algo estranho ultimamente?

Afastei-me dos seus braços e encarei suas duas contas lilás. Não esperava por aquela pergunta. Na mesma hora minha mente me fez viajar em suas lembranças, que passavam rapidamente como vários flashes.

A cena de eu e Ernesto na praia, eu o puxando e seu comentário sobre minha força, depois surgiu outra imagem eu dando um soco nele na rua, quando encontramos Lisa. A inquietude que eu comecei a sentir depois do encontro com ela. E como essa pulsava toda vez que eu descobria uma peça nova sobre essa misteriosa história. Definitivamente eu estava estranha, algo dentro de mim estava mudando. Ou eu estou enlouquecendo.

-Algumas coisas estão estranhas. – As palavras saíram da minha boca sem serem pensadas. –Acho que eu estou ficando louca.

-Não querida. Tudo vai ficar bem. – Ela afagou os meus braços. – Você vai encontrar o seu caminho, que sempre esteve a sua espera. Achará sua força e cumprirá sua missão.

Soltei uma risada nervosa com a contestação da minha insanidade. Porque eu sou a Clair sem-graça e frágil de sempre, não posso ser forte e bonita como Lisa. Muito menos pertencer a sua família, que deve ser igual a ela, incrível.

De repente a vi se afastar de mim, minha reação foi pegar sua mão. E lhe lancei um olhar desesperado, que dizia: Aonde você vai?

Seus olhos foram de encontro com os meus, ela agora passou a mão pelo meu rosto. Meu dragão racional começou a berrar, para não a deixar ir, afinal não podíamos voltar para aquele inferno na casa dos Fonsecas. Não havia mais essa opção para nós. Eu e ele estávamos desejosos pela proposta de Lisa, mesmo não sabendo o que era. Contudo era a fuga que tanto eu pedi.

-Clair, você não precisa de mim para ir à ilha e encontrá-las. – Lisa começou andar em direção a rua. Mas eu puxei de novo sua mão. – Te encontro aqui ao entardecer. Venha com Ernesto. Tenho certeza que ele encontrará o que tanto espera na ilha.

As palavras dela sobre meu irmão me assustaram, fazendo-me soltar seus dedos, e ela correu para o meio das pessoas. Logo uma pergunta começou a latejar na minha cabeça: Como ela sabia que meu irmão estava esperando por algo?

Isso tudo só pode ter sido um sonho, ou uma alucinação oriunda do meu afogamento. Nada disso tem lógica, não pode ser real. Comecei abrir e fechar os olhos rapidamente passar uma mão pelo meu cabelo e a outra na areia. Para verificar se eu estava mesmo ali na praia e que tinha vivido aquela louca experiência. Sim tudo era de verdade, Lisa esteve mesmo ali.

Entretanto ela me convidou para ir embora com ela, para uma ilha desconhecida, e encontrar, provavelmente, aquelas meninas descritas pelo diário de Sarah e descritas por Alex. Contudo o mais maluco de tudo, que isso parece ter algum sentido para mim, como esse fosse meu destino, por mim esperado e desejado.

Já havia lido em algum livro, que a nossa vida muda em um segundo, mas que nunca sabemos qual foi. Porém, eu estava ciente do meu, foi no momento que eu encontrei a dona daqueles olhos lilás.

Eu não consigo sentir medo dessa loucura, na verdade eu tinha certeza: vou embora com ela, e Ernesto irá comigo. Preciso encontrá-lo e contar tudo que aconteceu.

Minhas pernas pareciam ter ganhado uma nova energia, pois elas pareciam estar descansadas, nem mesmo lembravam o quanto tinham trabalhado há pouco. Elas começaram exercer a minha vontade: encontrar com meu irmão.

Agora eu não esbarrava mais nas pessoas, deslocava com a mesma destreza que Lisa, minha inquietude parecia estar fazendo isso comigo. Eu estava me divertindo com isso, afinal sempre fui desastrada e descoordenada. A medida que meus pés tocavam o chão, sentia a minha inquietação ganhando força, e surgindo uma nova Clair. Mas a pergunta que me fazia era se essa nova eu estaria sempre presente. Ou só apareceria quando Lisa estivesse perto de mim?

Não importa nada disso agora, a única meta agora é encontrar Ernesto e contar do meu encontro com Lisa. Quando eu percebi já estava na frente da mansão do Fonsecas. De repente ouvi em minha mente meu dragão falar: “Entre silenciosamente, para não chamar atenção de Alex e Carlos.”. Mais uma vez ele tinha razão, eu deveria ser cautelosa. Afinal eu não sei como a situação acabou depois que fugi.

Passei pelo portão bem lentamente, fui me esgueirando entre as plantas do jardim. Ao passar pela casa grande, pude ouvir os gritos de Estela com Alex, e em uma das janelas vi Carlos. Meu tigre rugiu, meu coração apertou. Era inegável meu amor doentio por ele. Agora vejo que a nova Clair só existe perto de Lisa.

Eu não tinha tempo para lidar com esses sentimentos conflitantes sobre aquele monstro. Gostaria nunca ter que confrontá-los, talvez a minha ida para esse lugar longe dele eu poderia enterrá-lo como uma má lembrança da minha antiga vida. O felino apaixonado que existia dentro de mim, não gostou dessa minha idéia, enquanto meu dragão racional riu dele e concordou com essa minha idéia.

Eu avistei a cabana, vi Ernesto na janela chorando. Somente vendo-o assim imaginei o quanto ele estava preocupado comigo. Como eu tinha sido egoísta de ter pensado em fugir, deixando-o para trás. Prometi para mim mesmo que nunca deixaria meu irmão. Sempre estaremos lado a lado, como nossa mãe pediu.

Quando eu atravessei a porta senti o abraço do meu anjo, que por acaso era também meu irmão. Quando seu rosto tocou o meu ombro, senti as lagrimas que estavam em seu rosto. Isso fez meu peito doer, ele não merecia sentir aquela dor e medo.

-Desculpe. – Foi a única palavra que poderia dizer a ele.

-Nunca mais faz isso comigo- Pude sentir seus soluços do seu choro. - Pensei que você tinha ido embora para sempre.

-Ernesto, eu nunca senti tanto nojo de mim. Porque eu sei que um dia serei de Carlos. – Agora as gotas salgadas caiam dos meus olhos e molhava seu ombro. - Eu me odeio tanto por isso, não queria sentir nada por ele, mas eu o amo. Sinto-me suja, e a vergonha que me corroeu quando vi você me defendendo com tamanha veemência. Não pensei em nada, somente sair dali. Desculpa.

-Eu nunca vou deixar ele te machucar. – Ernesto agora me encarava, eu tentei desviar de seus olhos, mas ele segurou meu rosto com suas mãos. – Clair, ele não a ferirá nunca. Eu não vou permitir.

-Não precisa me prometer nada. Afinal não vamos ficar aqui por muito tempo. - Comecei enxugar as minhas lágrimas com a palma da minha mão. Ernesto enrugou a testa não compreendendo o que eu estava falando. – Nós vamos embora daqui.

-Para onde? E quando? E como? – Ele começou a ficar agitado, vendo que estava me fazendo sorrir. - O que a senhorita esta pensando?

-Eu encontrei Lisa, que me falou que posso ir para um lugar longe daqui, e que você pode ir comigo.

-Lógico que eu vou. Qualquer lugar é melhor que esse manicômio penitenciário. Afinal essa família é uma quadrilha de doido.

-É verdade. – Fui obrigada a rir do meu irmão.

-Me conte tudo que você falou com Lisa. – Ernesto agora estava sentando comigo em nosso sofá velho.

Minha boca foi relatando as minhas memórias sobre aquele encontro, e tudo que eu senti nele. Ernesto não falou nada durante meu relato, estava atento a toda história. Os traços que seu rosto demonstrava a sua reação a todo meu relato. Ao final quando chegou à parte que seu nome foi citado, observei seu rosto um assombro.

-Eu vou achar o que tanto eu espero? – A voz dele não era mais que um sussurro. – Isso não é possível.

-Ernesto. O que interessa que eu vou com Lisa. Eu não quero mais ficar aqui. – Meu dragão soltou fogo satisfeito com minha decisão.

-Sim. Vamos embora com ela. Mas deixa-me ver esse pingente. – Quando ele encostou-se à gota, o liquido tremeu um pouco. Assustando meu irmão. – Muito esquisito, mas muito bacana.

-E como acabou sua briga com Carlos? – Ronronar do meu tigre me irritava toda vez que eu pronunciava aquele nome.

-Quando você saiu correndo, eu fui atrás de você, entretanto ouvi Alex chamando aquele verme. Resolvi voltar para ouvir o que eles estavam conversando. Então escutei Alex falando que eles precisavam achar Lisa para encontrar a ilha. Por que não há um mapa de papel, na verdade ela é a única que conhece caminho. Entretanto eles também falaram que tinha outro modo de encontrar, seria através de um coração puro e bom, único capaz de levá-los para essa tal ilha.

-Lisa afirmou que eu tenho esse tipo de coração. E ainda tem o colar que me dará instruções de como encontrar a ilha. – Minha voz era abafada de medo, pois será que eu seria capaz de encontrar esse lugar? E o que Alex faria comigo quando soubesse dessa minha capacidade?

Sem duvida Ernesto percebeu minha voz indo embora, e o pavor instaurando dentro de mim. Ás vezes sentia que meu irmão pode me ver por dentro, cada emoção e sentimento dentro da loucura que existia dentro de mim.

-Não precisa se preocupar. Nós vamos embora. Não tenha medo, por favor. – Ernesto passava a palma da mão no meu braço.

Definitivamente a Clair forte, não existia sem a presença de Lisa. A velha e antiga Clair era mais enraizada, sua presença era inegável. Sua fragilidade era irritante, mas onipresente. Quero encontrar logo a mulher dos olhos lilás que me fez ter novamente esperança e encontrar novamente a Clair que eu quero ser.


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Notas finais do capítulo

Ih: vamos fugir???