A menina acordou após algum susto. O sonho fora realista  ao extremo. Ao acordar, sua pupila dilatou-se, deixando-a momentaneamente cega. Ela se levantou, puxando o cobertor grosso para baixo, e livrando suas pernas que estavam enroladas nele.

   Uma batida na porta a surpreendeu. Olhou para o teto, respirando fundo.

   Ele era bem marrom, descascado em algumas partes, mostrando a camada de branco por baixo. Algumas partes do teto eram lascadas, fazendo Camila tremer ao imaginar uma dessas caindo em sua cabeça.

- Sim? – perguntou virando a cabeça em direção à porta adornada de prata.

   Seu irmão entrou vestindo apenas um pijama claro, apertando um de seus muitos bichos de estimação, Queijo. Ele era um gatinho bobo.

- Bom dia! – sussurrou caminhando em direção à cama de Camila, deixando o bichano aturdido com o barulho das armas disparando.

   Queijo correu para se esconder atrás de um móvel velho.

- Bom dia!

- Fiquei com medo dos tiros... – disse Rubens sem terminar a frase, sendo interrompido por mais uma rodada de gritos.

   Talvez, eles pudessem estar em outro lugar. Talvez, só talvez, essa guerra acabasse antes que toda a espécie deles ter morrido.

   Camila andou até o outro lado do quarto sujo, e olhou-se naquele espelho tão velho que já apresentava algumas manchas. Essas manchas deixavam-na mais antiga.

   Sua pele branca era macia e suave. Seus olhos castanho-claros brilhavam de uma maneira espetacular e surreal. Seu cabelo estava meio embaraçado por causa da noite de sonhos conturbados, mas mesmo assim.

   Será que ainda terei alguém para ser minha alma gêmea? Pensou ela passando a mão pelos fios que estavam grudados uns aos outros. Quero dizer, Bernardo não era real. Era só mais um personagem louco de minha cabeça...

- Fique aqui comigo então. – disse ela, voltando para a janela e a abrindo para espiar melhor.

   Uma rodada de gritos, tiros, passos e os guardas se aproximaram mais da casa abandonada em que eles viviam.

   Camila apoiou seus braços no peitoril da janela e pôs-se a sonhar.

   Nunca vou achar o tal brilho azul. Nunca encontrarei Bernardo, King, Zion, Vitória, Lonlye, Caph ou... Norbert. Nunca saberei quem era o garoto que havia me dado a rosa azul que até hoje almejo...

   Camila surpreendeu-se, quando um bando de guardas passou correndo de costas e carregando armas grandalhonas.  Sem dúvida era algum tipo de briguinha básica de rua.

   Talvez essa coisa de alma-gêmea fosse pura ilusão...

   Em um dos guardas, uma luz azul bebê piscava fortemente. A "briga" acabou com um dos guardas ferido. O homem da luz azul estava com um quepe militar, e quando percebeu que alguém o encarava, virou-se na direção da pessoa, que no caso era Camila, e sorriu mostrando seus belos dentes brancos.

   O coração de Camila bateu mais rápido do que nunca, e ela se sentiu feliz. Pela primeira vez, em muito tempo.

   Ela queria descer para falar com o homem que piscava em azul, mas seu irmão estava desprotegido, e seria uma crueldade o deixar ali.

   As brigas sempre aconteciam na frente da casa de Camila e por isso, ela agora ficaria de olho em todos os guardas bonitos ou de quepe que passassem por sua casa, para caso encontrar o homem que piscava em azul.

   Talvez esse Bernardo nem exista de verdade...

   É um grande prazer revê-la. Sussurrou alguém em sua mente.

   Um nome veio em sua mente: Bernardo.

   Ou talvez exista, e ele seja minha metade da laranja, pensou ela sorrindo, e disposta a encontrá-lo, custe o que custar.