Hidden escrita por jduarte


Capítulo 23
Vetada


Notas iniciais do capítulo

mais um capítulo! Estamos chegando aos cem reviews!
Gente, muito obrigada mesmo.
Beijos,
J.D. Vezzelli.



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   Fiquei mais umas horas riscando o chão com linhas infinitas e imaginárias, até que o sono veio, e eu me rendi. Acordei no dia seguinte sentindo a cabeça latejar em certos pontos e o barulho de asas lá fora. Passos ecoavam pelo corredor, e pareciam apressados. Havia uma gritaria lá fora, e meu coração se apertou por causa disso.

   Enfiei a cabeça pelo espaço que havia na porta, e vi de relance o mutante com rastafári sendo arrastado pelos punhos, por ninguém mais, ninguém menos do que Norbert e... King?

   Faltou ar para mim. O que ele estava fazendo aqui?

- Podemos colocá-lo na solitária. – disse Norbert, e depois começou a sussurrar. – Mas já está ocupada pela... mutante poderosa.

   Dizendo isso, ele revirou os olhos e bufou.

- Ok. – disse King depois de um tempo. – Acho que já podemos a libertar.

   Meu coração deu um pulo no peito, e eu afundei no chão de cimento novamente. Queria sair dali o mais rápido possível, mas teria paciência.

- Tanto faz. Vi morrer do mesmo jeito. – murmurou o boboca do Norbert.

- Cale a boca, seu nojento! – praguejou King.

   Por mais estranho que possa parecer, Norbert ficou quieto. Mais quieto do que uma pessoa que tivesse saído do aposento.

   Ele bufou alto, remexeu em um bando de chaves que bateram umas nas outras, fazendo um barulho extremamente irritante e contínuo.

   Logo após, ouvi uma delas ser colocada nada gentilmente na fechadura, e ser girada com brutalidade. Um corpo caiu no chão, e eu rastejei rapidamente até ele, e coloquei dois dedos alguns centímetros abaixo da orelha, a fim de ouvir os batimentos.

   Havia pulsação. Mesmo sendo lenta e bem pouca, havia uma pulsação. Dei palmadas em seu rosto, e esperei.

   Seus olhos azuis claros se abriram para mim devagar, e ele passou a língua na boca pálida e seca. Sua pele, era muito mais clara que a minha, e seu cabelo, apesar de estar preso com uma bandana azul – que devo acrescentar, combinava muito bem com sua pele –, caia um pouco no rosto.

- Você está bem? – perguntei.

   Ele assentiu de leve.

- Qual é seu nome? – perguntei novamente, tirando um fio de cabelo que ousava cair sobre sua testa suada.

- Z-Zion H-Hertz – disse ele depois de um pouco de silêncio, e ainda por cima, gaguejando.

   Eu ri.

- Ok, Z-Zion H-Hertz, - tentei fazer graça. Ele deu um sorriso de lado. – o que fez para estar aqui?

   Ele gemeu virando de lado. Zion falou algo, mas fui incapaz de entender.

- O que?

- Eu tentei matar um dos guardas um tal de...

- Norbert? – chutei.

   Ele se surpreendeu e eu ri.

- Como sabia disso? – perguntou Zion.

- Às vezes tenho vontade de matá-lo também. – confessei levantando do chão, e caminhando até a porta e me despedindo.

   King tomou meu braço direito, e Norbert o esquerdo. Norbert não tinha a aparência muito diferente da de Bernardo, mas a diferença é que, ele tinha o cabelo mogno com pequenos fios de cobre que ficavam escondidos pelo cabelo cortado no estilo militar. Seus olhos eram verdes, frios e pareciam congelados no tempo. Quase como se ele ainda vivesse no século passado.

- Você não tem vergonha de ser o que é? – perguntei a Norbert.

- Não. – essa foi a resposta seca e grossa de Norbert direcionada a mim.

- Porque você nos odeia tanto? Porque não podem nos tratar como seres iguais? – perguntei novamente.

- Seres iguais? Por algum acaso estamos em uma daquelas séries familiares que, quando o homem começa a tratar as pessoas muito mal, vêm uma, que surge do meio do inferno, para tentar o converter? – ele ria cínico. Seu sorriso amarelo foi substituído pela carranca de sempre. – Bem, fique sabendo que não estamos em um desses programas. E eu não sou esse cara. Bernardo pode até cair na sua, mas não eu.

   As palavras deles machucaram-me lá no fundo. Perfuraram meu coração como se fossem um monte de farpas de madeiras bem pequeninas e afiadas. Que, quanto menores, mais dolorosas.

   Fiquei um tanto desconfortável depois do discurso comovente desse verdadeiro energúmeno.

- Se você não se importa? Tenha um pouco de respeito pelos que são, pelo meu ponto de vista, parecidos com você. Pois, um dia, você vai precisar de uma mão, e a pessoa que você sempre tratou mal, vai virar o rosto pra você. – disse eu totalmente convencida de que meu discurso tenha causado alguma coisa em Norbert.

   Na verdade, apesar de toda a sua camada de machismo e idiotice – que, devo admitir, eram tão espessas que iam até quase o fundo de sua alma -, ele tinha algo de bom. Bem lá no fundo. Bem lá no fundo mesmo!

   Ele pareceu meio confuso, ou pensativo - não pude distinguir –, mas logo após consertou a feição de abalado para a ‘dane-se-o-mundo’. Tenho certeza absoluta que, se alguém – eu quis dizer: humano – nos visse agora, andando de braços dados, pensaria: ah, como eles são felizes! Andando de braços dados na frente de todos. Eu bateria na cara dessa pessoa e diria: Eles são tão meus amigos que, eu estou usando uma coleira, e algemas. Somos tão felizes!

   King pigarreou.

- Se não se importam de eu intrometer-me na conversa profunda dos dois, - ele disse cínico. – Todos os guardas, em exceção a alguns, – consertou King quando eu lhe lancei um olhar perguntando: como é que é? – tem uma pedra no lugar do coração. Muitos perderam suas famílias, outros entraram logo após que saíram da prisão. E, se vocês não sabem, outros foram obrigados pelo próprio país!

   Ouvir aquilo, fez com que eu pensasse: talvez eles fossem felizes. Talvez, só talvez, eles tinham um lugar permanente na Terra. Só talvez.

- Tanto faz. Quem se relaciona com sua gente, - Norbert disse ríspido dirigindo suas palavras pérfidas a mim. – acaba virando um monstro também.

   Eu abri a boca em choque. Ele NÃO podia estar falando de Bernardo! Seu babaca nojento!

- É eu estou falando do seu precioso Bernardo! – provocou.

   Travei a mandíbula sentindo o sangue subir e minhas veias saltarem de meus olhos, e minha força – que parecia estar esquecida em algum lugar de meu corpo – voltar à vida.

   Peguei nu lugar estratégico em sua coluna e sussurrei:

- Se falar mais uma vez mal de Bernardo ou de qualquer pessoa aqui de dentro perto de mim, eu quebro a sua coluna e faço você ficar paralítico! Ouviu? Ou quer que eu repita? – perguntei com brutalidade apertando ainda mais a coluna.

   Norbert soltou um grito sufocado, e seu rosto começou a ficar vermelho. King assistia tudo sem mexer um único músculo.

- Eu... Ouvi. – sussurrou Norbert com falta de ar.

   Lhe soltei esperando que ele berrasse, mas não. Ele me olhou com os olhos verdes apavorados e se endireitou dizendo:

- Espero que o que tenha acontecido aqui, fique aqui, e somente aqui.

   Recomeçamos a andar, mas dessa vez sem nenhum dos dois me dando o braço, ou me apertando. Pelo contrário. Estavam longe demais, quietos demais, andando devagar demais... Tudo demais.

   Não liguei, mas preferia eles falando, e andando, e enchendo o meu saco, do que mais quietos do que uma porta.

   Andamos pelo corredor pedregoso inteiro, até chegar em um portão de ferro com grades largas e feias.

   O cheiro daquele lugar era horrível, e meu estômago se contraia com as ânsias de vômito. Era uma dor incomum, ruim, e extremamente desconfortável. Daquelas que mal começou e você berra pedindo para parar.

   Junto com a ânsia, se misturava a fome tórrida. Minha barriga tinha vida própria e parecia gritar por comida de verdade. Não aquela pasta de dente cinza que servem no café, almoço e – oh, droga – jantar também.

   Caminhamos por uns bons cinco minutos até chegarem em o que? Mais um portão de ferro! Agora, definitivamente, eu preferia estar em uma prisão. Lá pelo menos eu teria comida de verdade!

   Agitei as mãos perto de meu rosto, sentindo o calor dali invadir-me por completo.

- Onde estamos? – perguntei agitando as mãos ainda mais.

- Numa caldeira. – respondeu Norbert seco.

- E porque diabo teriam uma caldeira dentro de um castelo? – rebati já irritada por causa do calor infernal que estava ali.

   Algo bateu fazendo eco sobre nossas cabeças, e todas as pessoas que eu não havia notado, olharam para cima. Um fragmento mínimo do teto, caiu em cima de meu ombro, e King foi o único a perceber.

- Rápido, tire-os daqui! – berrou.

   Eu estava sem saber o que fazer. Mais alguns fragmentos caíram, e meu instinto foi destrancar todas as celas dali e mandar todos para fora. Pessoas corriam enquanto os fragmentos que caiam ficavam ainda maiores, até que caiu uma placa gigante na minha frente, quase tampando minha visão com a poeira.

   Segurei um bebê que estava ali, e corri dispersando-me do grupo que já havia saído. Onde eu peguei o bebê, caiu uma pedra grossa, fazendo que o lugar sumisse debaixo dela. Encolhi-me para passar pela fresta que sobrara da saída, quando mais um monte de pedras caíram do lugar que estávamos. Corri com a criança adormecida em meus braços.

   Enquanto corria, senti um pequeno movimento em meus braços e olhei para baixo. Lá atrás, ainda ouvia vários barulhos das rochas caindo. A criança abriu para mim um sorriso meio desdentado, e arregalou os olhinhos cor de violeta para mim. Seus cílios eram grandes em uma grande quantidade, seu cabelo era praticamente da cor de um carvão e as mãozinhas pequenas espalmaram meu rosto de leve.

   Apertei a criança ainda mais, e sussurrei beijando o topo de sua cabeça:

- Vai ficar tudo bem. Eu prometo.


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Notas finais do capítulo

gente, perdão, não ficou nada legal esse capítulo, mas foi o que minha mínima mente criativa e sem noção conseguiu criar.
Beijoooos,
Ju!