Em Comum

            Quinn Fabray observava-se no espelho enquanto se arrumava para retornar ao McKinley High pela primeira vez após a gravidez e as Regionais. Estava com uma aparência cansada e amadurecida, seus olhos castanho-esverdeados tinham um brilho diferente do tradicional frio que povoara ali. A loira passou a mão no ventre onde há uma semana Beth estava lhe dando trabalho com contrações e dores, deu um pequeno sorriso, afinal, tudo valera a pena... Toda a frustração, toda a rejeição e tudo que passara valera a pena.

            Beth tinha nascido e ia ter uma família decente, talvez, uma família melhor do que a dela própria. Os olhos de Quinn marejaram e por alguns instantes ela quase se arrependeu do que fizera, entendera o que era ser mãe quando viu os olhinhos de Beth piscarem ansiosamente para ela após passar todo o sofrimento do parto. Ela era um pouco dela e de Puck.

            Aliás, maldito Puckerman!

            Ele dissera que a amava e naquela semana que ela estivera fora para recuperar-se, ele teve a capacidade de voltar novamente com Santana. Aliás, outra maldita era a Santana que a abandonara nas horas em que ela mais precisava... Não podia falar nada de Brittany, Brittany era um caso a parte do qual Quinn nunca esperava muito.

            - Quinn! Estamos atrasadas! Você não vai descer daí nunca? Não tente se suicidar, eu tirei todos os comprimidos do banheiro! – A voz de Mercedes pode ser ouvida no andar debaixo, a loira deu um sorriso agradecendo a Deus por ter colocado-a em sua vida. Senão fosse Mercedes, ela sequer imaginaria onde estaria agora. Quinn desceu as escadas rapidamente, ajeitando a roupa durante o caminho, aterrissou no térreo com um sorriso otimista de “bom dia”, a outra lhe observou impressionada e comentou:

            - E o seu uniforme?

            - Mercedes, eu não sou mais uma cherrio. Não faz sentido voltar a usar aquele uniforme... – Quinn respondera com a voz melancólica enquanto sentava-se à mesa e apanhava um prato de ovos e bacon que a Sra. Jones acabara de fazer antes de ir trabalhar. Se tinha uma coisa boa em largar as Cherrios, essa coisa chamava-se “comer a vontade”.

            - Achei que depois da gravidez você quisesse voltar, você sempre comentou isso... E odeio admitir, mas a “cherrio maldosa” ás vezes faz falta, você era a única capaz de calar Rachel Berry. – Mercedes respondera confusa enquanto terminava de arrumar a bolsa, Quinn tomou um gole de suco e pareceu pensar por alguns instantes, a menção do nome de Rachel Berry pareceu deixá-la extremamente acordada. Em seguida, pigarreou e disse segura de si:

            - Meu lugar é no Glee Club, mas não nego que gostaria de voltar a ser cherrio um dia. Sabe, eu sinto falta, aquilo era a minha vida antes de ela ser destruída pelo maldito Puckerman e seu “confie em mim”!

            - “Maldito”? Desde quando você comete blasfêmias como essa Quinn Fabray? – Mercedes perguntou beirando a ironia e a brincadeira. Quinn deu um sorriso sarcástico para a amiga e terminou de comer pensativa.

            Tinha tanto que ela queria fazer... Queria voltar a ser a Quinn Fabray de antes, mas não pela reputação e sim, para provar a Lima que podia dar a volta por cima e que não seria uma gravidez indesejada aliada a rejeição de todos que a transformaria numa perdedora.

            Também tinham tantos que ela gostaria de tirar algumas satisfações... Puck, Santana, Rachel... Aliás, Berry era a sua maior preocupação. Estava magoada com a garota, ela lhe dissera uma vez que não a odiava e mesmo assim, tivera a capacidade e o egoísmo necessários para contar a Finn a verdade e destruir sua relação com ele. Queria discutir, queria humilhá-la, mas uma vozinha em sua cabeça dizia que as coisas não seriam resolvidas nessa forma dessa vez.

            - Se a senhorita fazer o favor de comer logo, temos mesmo que ir. Nesse momento estamos realmente MUITO atrasadas! – Mercedes disse preocupada enquanto olhava para o relógio e interrompia os pensamentos da loira, Quinn engoliu o resto de bacon que restava no prato, apanhou os livros e cadernos e saiu correndo com Mercedes para fora da casa.

            Quinn nunca caminhara para chegar a escola, antes da expulsão de casa acostumara-se a ir e voltar com o carro que os pais lhe deram. Mas Mercedes ás vezes fazia questão de caminhar, no começo ela odiou, mas agora entendia o porquê da amiga gostar tanto. O ar matinal de Lima era muito bom, as pessoas acordando, os pássaros cantando, até mesmo os resmungos a agradavam... Ela pegava-se tirando fotografias mentais enquanto caminhava.

            Mas naquele dia estava tudo diferente. A loira estava caminhando lado a lado com Mercedes, sem dizer uma palavra e parecendo completamente perdida em seus pensamentos que constantemente iam direto para Rachel Berry. Não conseguia entender como a anã começara a penetrar em sua mente daquela forma, só sabia que era incômodo, tão incômodo como a própria Rachel Berry.

            - Você tá estranha, o que foi? – Mercedes quis saber displicentemente, mesmo assim, assustou Quinn que estava entretida demais em suas conclusões e acabou tropeçando pelo caminho. A loira encarou Mercedes com um ar preocupado, a outra apenas lhe sorriu e aquela foi a deixa para fazer a pergunta que estava remoendo-a por dentro:

            - Você acha que a Berry me odeia?

            - Não acho que ela te odeie, mas por que a pergunta agora? Você nunca se preocupou com ela e nem a chamou pelo nome ou sobrenome... – Mercedes questionou curiosa enquanto observava Quinn corar furiosamente, realmente... Por que estava preocupando-se com Rachel Berry? Porém, a loira deu de ombros e respondeu:

            - Não me preocupo com ela, aliás, nunca me preocuparia. Só queria saber se foi o ódio que a levou a destruir tudo que eu tinha com Finn.

            - Você sabe bem a minha opinião sobre isso... Já te disse que foi você quem destruiu tudo com Finn ao contar uma mentira daquelas pra ele, Rachel e sua boca incontida junto com a paixão maluca dela pelo Finn apenas aceleraram uma constatação que viria mais tarde. – Mercedes respondeu sabiamente ao virarem a esquina que dava para o McKinley High.

            Quinn observou o colégio de longe e sentiu frio na barriga. Suas mãos começaram a tremer levemente e ela temeu entrar ali, agora era uma perdedora, as chances de levar raspadinhas na cara dobraram após o parto. Antes, ao menos respeitavam, mas agora... Com certeza seria a vítima preferida. Claro, era a “ex cherrio e ex grávida”.

            - Acho que ela mentiu para mim ao dizer que não me odiava, só o ódio pode explicar o que ela fez... – Quinn murmurou mais para si mesma do que para Mercedes, mas a outra sorriu e deu uma gargalhada gostosa. A loira ficou observando-a sem entender com uma expressão de impaciência na face, Mercedes rapidamente se recompôs e disse:

            - Ela não te odeia Quinn, existe uma linha tênue que divide o ódio do amor.

            - Amor? Pelo amor de Deus Jones! Você tá maluca!? – Quinn disparou inconformada e logo em seguida, emburrando. Não sabia por que as palavras “Berry” e “amor” na mesma frase provocaram aquela reação nela, mas era uma coisa impensável e impossível. Mercedes gargalhou mais uma vez diante do desespero de Quinn e em seguida, consertou:

            - Não digo esse tipo de amor... Mas sim em relação a admiração, ela te admira Quinn, ela quer ser você, nunca pensou nessa possibilidade?

            - Ah claro... Ela quer ser um ex-cherrio, sem homens e que acaba de ter um filho e dá-lo para a doação? Ah me poupe Mercedes. – Quinn respondera revoltada entrando no colégio e sentindo todos os olhares voltarem-se para ela novamente. Odiava ser dramática como Berry, mas temeu por sua vida naquele momento.

            Mercedes e ela entraram no estacionamento e observaram alguém ser jogado na lixeira pelo time de futebol. Quinn esperava mesmo que não fosse Kurt, aliás, ficaria muito irritada se fosse qualquer um do Glee Club, eles agora eram a sua família e ela sentia-se parte integrante daquilo. Mercedes pareceu pensar muito no que ia dizer, porque quando falou, sua voz saiu insegura:

            - Bem... Eu não sei explicar... Mas Rachel sempre ficava te observando cautelosamente enquanto você passava. Sem mencionar que faz sentido, afinal, ela acabou ficando com Finn e Puck após você também ficar com os dois.

            - Não faz sentido Mercedes Jones! Rachel Berry é maluca, mas nem tanto. Afinal, como ela poderia ser que nem eu? – Quinn perguntou melancólica, nesse momento, Rachel passara por elas com a cabeça baixa e caminhando rapidamente, parecia ter percebido que era o tema da conversa das duas. Quinn ficara curiosa enquanto observava, Mercedes pigarreou para chamar a atenção e perguntou:

            - Como assim?

            - Como eu... Escondendo-se atrás de uma reputação que ao ser destruída, levou minha vida junto. Ninguém quer isso. – Quinn justificou-se desinteressada observando a cabeça de Rachel Berry sumir ao entrar no banheiro feminino. Mercedes deu um sorriso maldoso e respondeu:

            - Estamos falando de Rachel Berry, ela é louca ou essa semana fora fez você se esquecer disso?

            Quinn não teve tempo para rir, nesse exato momento, algo gelado acertou em cheio seu rosto. Ouviu risadas em volta de si e Mercedes xingar alguém, a loira negou a ajuda que lhe ofereceram e seguiu para o banheiro sentindo-se derrotada e angustiada.

***

            - Você tem que tirar primeiro do cabelo, ou vai acabar endurecendo... – Uma voz conhecida foi ouvida atrás de Quinn, a loira se virou com o rosto completamente encharcado de raspadinha de uva. Rachel Berry a observava com um sorriso triste, parecia estar achando pena dela. Quinn que já estava irritada o bastante por ter sido tão bem-recebida disparou irritada:

            - Não preciso de você me dizendo o que fazer Berry... O que veio fazer aqui? Rir da minha cara?

            - Por mais que você ache que isso faz sentido, eu não vim rir de você, estava aqui antes e chorando até agora pouco. E não era por você. – Rachel respondera com aquele tom formal que era usado quando ela estava magoada ou irritada. Quinn não conseguiu definir como ela estava naquele momento.

            A loira encarou-a por um bom tempo, o sinal tocou e elas permaneceram se encarando como se nada tivesse lá fora. Uma batalha de olhares repleta de hostilidade e também, de mútua compreensão. As duas estavam no mesmo barco agora. Quinn baixou os olhos, bufou impaciente e disse:

            - Eu não preciso saber dos seus problemas Berry.

            - E eu não sei o que estou fazendo aqui conversando com você Fabray. – Rachel respondera melancólica revirando os olhos. Pelo espelho, Quinn notou rapidamente que ela limpava algumas lágrimas que continuavam a cair de seus olhos. Por alguns minutos, Quinn parou de lavar o rosto e encarou-a tentando entender como e por que estavam há mais de cinco minutos dentro de um aposento sem que ela disparasse algum apelido ou xingamento.

            Realmente a gravidez a transformara e ela estava começando a odiar aquela mudança.

            - Você deveria lavar o cabelo, quando endurecer, você vai xingar Deus e o mundo antes de descobrir uma forma de tirar o cheiro de uva daí. Da última vez, demorei uma semana para fazer meu cabelo voltar ao normal. – Rachel dissera vagamente enquanto continuava a observar Quinn lavar-se pelo espelho, a loira jogou o papel que usava no lixo e virou-se irritada para a outra.

            - Primeira coisa: eu não xingo Deus e o mundo. Segunda coisa: eu não preciso de qualquer ajuda sua.

            - Você também era a presidente do Clube de Celibato e depois apareceu grávida. Você precisa da minha ajuda. Se tem alguém que sabe lidar com raspadinha de uva no cabelo, esse alguém sou eu. Então sente aí e me deixe ajudá-la, não vou ferir seu orgulho, prometo. – Rachel disse com aquele tradicional tom de voz mandão que arrancou um sorrisinho sarcástico de Quinn, a loira permaneceu em pé, mas Rachel puxou uma cadeira e a empurrou em cima dela. A morena fez um zumbido estranho com a boca e murmurou decepcionada:

            - Vamos ter que ficar aqui um bom tempo, se você tivesse me deixado ajudar da primeira vez, talvez as coisas estivessem mais fáceis.

            - Cinco minutos não iam mudar o estado do meu cabelo Berry, pare de ser dramática! – Quinn dissera furiosa ao sentir as mãos de Rachel Berry tocarem seus cabelos, a morena deu uma risadinha e disse:

            - Está pedindo para eu parar de ser dramática? Depois de tantos meses no Glee nunca reparou que eu sou a rainha do drama ali? É mesma coisa que pedir para você ser boazinha Fabray...

            - Eu estou tentando ser boazinha desde a gravidez, mas você realmente me irrita gnomo! – A loira dissera friamente, inexplicavelmente, o fato de Rachel deduzir que ela não poderia ser uma pessoa melhor a irritou. Parecia que todos estavam duvidando da transformação que ela sofrera. A morena pareceu desembaraçar alguns fios, lavou-os na pia e suspirou. Quinn achou que ela não fosse responder nunca, talvez as palavras tenham sido duras mesmo ou Rachel era tão dramática a ponto de achar que um silêncio podia falar por si. Mas a morena pigarreou e disse sentida:

            - Eu não queria te irritar Quinn, eu só achei que as coisas tinham mudado entre nós.

            - Rachel... – Quinn começara a falar assustando-a, era a primeira vez que chamava a morena pelo primeiro nome. – ... desculpe eu só estou irritada com tudo que está acontecendo comigo. Primeiro a gravidez, depois tudo o que eu passei com meus pais e agora, Puck e Santana. Eu só estou tentando assimilar as coisas, me desculpe, mesmo.

            - Você realmente gostava dele, não é? – Rachel perguntou enquanto continuava a desembaraçar os cabelos da loira e lavá-los na pia. Quinn deu um pequeno sorriso que não passou despercebido por Rachel, em seguida, seu rosto fechou-se em uma expressão fria e ela respondeu insegura:

            - Eu me sentia bem com ele, só isso.

            - Puck costuma fazer isso com as meninas. – Rachel comentou insegura, Quinn arqueou a sobrancelha e deu uma gargalhada, a morena pareceu ficar envergonhada por alguns segundos, mas logo a acompanhou.

            - Esqueci que você teve suas aventuras com ele.

            - É, aventuras... Mas nada além disso! – Rachel disse enquanto corava e Quinn a observava pelo espelho, notara que a morena parecia tão mais mulher e por incrível que pareça... Mais atraente. Quando sua mente pensou isso, Quinn chacoalhou a cabeça e um pouco de água respingou na roupa de Rachel, que nesse dia, era um suéter azul com um urso polar na estampa.

            As duas calaram-se, parecia que quando o assunto chegava a coisas que tinham em comum, ficava desconfortável. Ainda mais quando se tratava dos garotos pelos quais haviam brigado. E quando os olhares encontravam-se através do espelho, ambas desviavam enquanto coravam... Quinn não sabia o que estava acontecendo ali, mas era algo que nunca imaginaria que acontecesse entre ela e Rachel Berry.

            - Pronto, terminei. – Rachel dissera sorridente lavando as mãos na pia e entregando uma toalha que tinha dentro da bolsa para Quinn. A loira apanhou e agradeceu com um sorriso, secou-se e disse:

            - Você sempre vem prevenida?

            - Depois de semanas levando algumas no rosto, você chega a conclusão que é o alvo preferido então começa a ter roupas reservas no armário e toalhas dentro da bolsa... – Rachel responde tranquilamente, evitando contato com Quinn enquanto fechava a bolsa. A loira estendeu a toalha e disse:

            - Obrigada mesmo, sabe... Eu sempre te tratei tão mal e agora, você me ajuda.

            - É o mínimo que eu podia fazer depois do que provoquei entre você e o Finn ano passado, eu já te disse que não te odeio. Só estava me sentindo mal por ter contado a ele sobre você e Puck. – Rachel dissera sincera ainda evitando contato com Quinn, a loira percebera que algumas lágrimas estavam rolando pela face da morena e subitamente, preocupou-se. O que importava o que tinha acontecido entre ela e Finn ano passado se Rachel Berry, a estrela de Glee sempre animada e desconfortavelmente chata, estava chorando? Era anormal oras, ao menos Quinn tentava se convencer que era isso que a incomodava.

            - O que foi Berry? Algum problema? – Quinn perguntou verdadeiramente curiosa tentando levantar o rosto de Rachel gentilmente e surpreendendo-se com o próprio gesto, a morena virou a face e deu um sorriso triste. Quinn pode ver outra lágrima cair quando ela lhe respondeu:

            - Não, eu estou bem. Bem... Te vejo no Glee Club mais tarde.

            Rachel estava quase saindo da sala, deixando uma Quinn Fabray segurando sua toalha rosa completamente atônita. Mas a loira recobrou o juízo e perguntou brincalhona:

            - Então você realmente não me odeia? Mesmo depois de tudo?

            - Eu nunca te odiei Quinn, pode ter certeza disso. – Rachel respondera vagamente antes de sair, mas Quinn teve certeza que vislumbrou ali um sorriso banhado em lágrimas.

            A loira olhou-se no espelho, sua expressão estava mais leve e tinha um sorriso nos lábios. Mas logo seus olhos arregalaram-se em espanto diante da constatação que passara em sua cabeça.

            Não era o motivo pelo qual Rachel Berry agira daquela forma que importava e sim, se ela realmente a odiava. Quinn ficou confusa enquanto se observava, o que raios estava acontecendo com ela?

***

            Rachel saiu do banheiro perguntando diversas vezes para si mesma se aquilo acabara de acontecer. Ela conseguira ficar mais de dez minutos no mesmo local que Quinn Fabray sem receber nenhum apelido ou piadinha, as duas haviam conversado, como se fossem boas colegas.

            Talvez Quinn tivesse mudado de fato, talvez a ex-cherrio queria mesmo mudar a idéia que os outros tinham dela e melhor... Talvez Quinn Fabray finalmente perceberia certas coisas que durante anos passaram em branco para ela.

            A morena respirou fundo enquanto caminhava pelo corredor que nesse momento, estava vazio. O primeiro período já tinha começado e ela não tinha vontade nenhuma de ir para sala... Seu rosto estava ardendo e seus olhos estavam vermelhos devido ao choro que não conseguira conter.

            Finn tinha terminado com ela, dito coisas terríveis e mesmo não gostando do rapaz como gostaria, tudo havia machucado-a. Poderia estar sendo dramática como todos diziam que ela era, mas era ficara magoada, não é bom ouvir de um cara que até então era seu namorado que ele se enganara a seu respeito e que você não o fazia feliz.

            Mas diante da pequena conversa com Quinn, seu término com Finn perdia completamente a importância. Seu coração estava acelerado e deu graças por Quinn Fabray não ter percebido que suas mãos tremiam enquanto lavava o cabelo loiro dela. Rachel respirou fundo, limpou as lágrimas e aprumou a postura. Tinha Glee Club hoje, acabaria vendo Finn novamente, mas por outro lado, rever Quinn no Glee depois de tanto tempo lhe deu um pouco mais de fôlego para continuar.

***

            Quinn não conseguiu se concentrar durante as aulas. As pessoas apontavam para ela e riam quando o professor dava às costas a sala, Santana tinha um sorriso vitorioso nos lábios e Brittany a cumprimentou com tanta melancolia que ela chegou a ficar preocupada. A ex-cherrio não conseguia tirar Rachel Berry de sua cabeça, muito menos as lágrimas que a vira derramar e principalmente, o sorriso.

            Agora que tirara o uniforme de Cherrio, que agia como uma perdedora e que assumira os riscos da sua péssima reputação, ela conseguia ver coisas e perceber pessoas que antes passavam diante de seus olhos e Rachel era uma delas. E isso a perturbava, afinal, estava falando de Rachel Berry, quem até há pouco tempo ela chamava de “anã” e “gnomo” e que povoava as dezenas de desenhos pornográficos que fizera no banheiro.

            Estava confusa, perdida e odiando a si mesma por se importar com Rachel Berry. Mal tinha noção do que estava escrito no quadro a sua frente, só sabia que se tratava de alguma coisa relacionada a Álgebra. Tentou prestar atenção, não podia coroar a sua falta de reputação com péssimas notas.

            O sinal tocara anunciando o fim da aula, Quinn deu um pulo de susto arrancando mais risos debochados dos alunos da sala. Apanhou os livros rapidamente e saiu pelos corredores de cabeça baixa, tentando ignorar qualquer comentário. Conseguiu chegar a sala do Glee Club intacta e sorriu diante da própria vitória, mas o sorriso logo desapareceu.

            Do outro lado da sala estava o troféu do Campeonato que Sue Sylvester ganhara com as Cherrios, um campeonato vencido sem que ela estivesse presente. Quinn observou séria e aproximou-se do troféu, estava para tocá-lo quando ouviu vozes atrás de si.

            - Eu preciso conversar com você Rachel! Eu acho que fiz uma besteira e... – Finn vinha correndo atrás de Rachel tentando argumentar alguma besteira que fizera, Rachel estacou quando viu Quinn na sala, a loira apenas revirou os olhos e continuou ali.

            - Eu não quero conversar com você, não depois de tudo que você me fez ouvir! – Rachel rebateu insegura virando-se para encarar Finn, ser observada por Quinn naquele momento podia ser extremamente vergonhoso. O rapaz puxou o braço de Rachel com o máximo de delicadeza que conseguiu e pediu:

            - Por favor, me escuta por nós e tudo que nós vivemos.

            - O “nós” acabou há bastante tempo! – Rachel exclamou um tanto quanto furiosa e fazendo Quinn virar-se novamente para discussão, os olhos dela estavam ardendo em fúria e Finn parecia estar com medo. Quinn também estaria, ela nunca vira Rachel reagir daquela forma (exceto quando alguém desafinava nos ensaios).

            - Não, não acabou... – Finn começou a argumentar, mas encontrou a expressão entediada de Quinn o observando. – Será que dá para você sair Quinn? É bem pessoal o que estamos fazendo aqui...

            Quinn arqueou a sobrancelha parecendo não entender a ação de Finn, deu um sorrisinho falso e continuou observando.

            - Não, eu não vou sair daqui. Acho que quem tem que sair é você, Berry já deixou bem claro que para você não existe conversa! – Quinn disse venenosamente enquanto observava Finn, o rapaz empalideceu e ficou encarando-a incrédula. Não eram todos os dias que Fabray defendia alguém, ainda mais Rachel Berry. Rachel também ficara boquiaberta e murmurou um “obrigada” que Quinn correspondeu com um sorriso, só não sabia porque sorrira.

            A pequena discussão foi interrompida pela entrada dos demais membros do Glee Club. Assim que viu Quinn, Puck empalideceu e foi sentar em um canto acompanhado de Santana e Brittany, Mercedes carregou Quinn para o lado oposto onde Rachel sentara-se sozinha, Kurt sentou próximo a Quinn e Tina e Artie ficaram logo a frente. Mike entrou junto com Mr. Schue e sentou ao lado de Finn que parecia deprimido.

            - Bom dia a todos! – Mr. Schue exclamou animado enquanto distribuía as partituras, mas sem receber um murmúrio de resposta. Todos pareciam tristes e deprimidos, da mesma forma como quando o Vocal Adrenaline os amedrontou às vésperas das Regionais. – Muito bom te ter de volta Quinn!

            Quinn deu um sorriso sincero para o professor, aprendera a gostar de Mr. Schue aos poucos e no final de tudo, ele fora muito importante. Ele passou distribuindo as partituras da música que iriam ensaiar naquele dia, era um dueto, com certeza Finn e Rachel pegariam os solos.

            - Finn e Rachel, vocês podem liderar o pessoal? – Mr. Schue questionou todo sorridente, nem sequer percebeu o abismo que estava separando os capitães naquele momento. Rachel levantou-se desanimada e Finn parecia duro como uma pedra, o piano começou e as vozes também... Mas tudo parecia fora de ritmo naquela sala.

            Quinn ficou incomodada, esperava uma recepção melhor no Glee Club. Não aquele desânimo que nada comparava-se ao Glee Club que ela deixara. Mr. Schue fez uma careta de desaprovação, revirou os olhos e mandou parar a música.

            - O que está acontecendo com vocês? Desde as Regionais não conseguimos cantar uma música direito, onde está aquele Glee Club que explodiu nas apresentações? – Mr. Schue questionou olhando para todos decepcionado e também irritado, Quinn engoliu em seco, ao menos daquela vez não tivera culpa, estivera fora na última semana. Todos se entreolharam e Quinn percebeu que um clima pesado estava sob o grupo.

            Mike e Tina não se olhavam.

            Santana e Brittany pareciam distantes uma da outra, mesmo estando tão perto fisicamente.

            Finn e Rachel achavam que a distância entre eles era normal.

            Puck ficava encarando Quinn que apenas fuzilava-o com os olhos, forçando-o olhar para Santana que lhe ignorava enquanto observava Brittany.

            Artie olhava furioso para Mike.

            Enquanto Mercedes e Kurt permaneciam sorridentes observando tudo.

           - Mr. Schue... Creio que estamos com alguns problemas de relacionamento dentro do Glee. – Kurt disse com a voz ligeiramente irônica, Mercedes deu uma risadinha ao seu lado, mas calou-se quando recebeu um olhar repreensivo de Mr. Schue.

            - O que você quer dizer com isso Kurt? – O professor perguntara enquanto fazia uma careta incrédula e observava melhor a sala, seus olhos faiscaram entendimento e ele pareceu compreender o que ocorria.

            - Prefiro não contar toda a história para evitar represália. – Kurt respondeu sério e todos na sala o repreenderam com o olhar. Mr. Schue baixou a cabeça e colocou a mão na testa, pensativo. Após alguns minutos, levantou os olhos e disse:

            - É isso! A tarefa de vocês para próxima semana e encontrar uma música que fale sobre seus sentimentos.

            - Quantas vezes vamos ter que fazer isso? – Puck perguntou indignado, todos fizeram cara de concordância, menos Quinn que murmurou acidamente:

            - Até certas pessoas entenderam que todos possuem sentimentos nessa sala.

            O silêncio perpetuou na sala diante da fala da ex-cherrio que até então estava calada, Puck ficou pálido novamente e não ousou responder. Rachel observava a cena de longe, Quinn parecia tão magoada com Puck que parecia transbordar diante dos olhos de todos. Mr. Schue pigarreou e continuou:

            - Puck, dessa vez vai ser diferente. Para acabar com esse clima, o trabalho é em dupla. Quero que vocês procurem músicas que retratem como ambos estão, ou seja, quero que vocês procurem pessoas que se sintam da mesma forma que vocês estão se sentindo...

            Alguns ruídos de indignação foram ouvidos, Quinn permaneceu sentada imóvel sem demonstrar qualquer reação. Estava sentindo tanta coisa que seria impossível escolher apenas uma, era uma bomba de sentimentos prestes a explodir, tinha desde a raiva até a mágoa dentro de si.

            - Sem reclamações, estou sendo bastante simpático em deixá-los fazer em dupla! Não tem sentido continuar dessa forma, quero que saiam por aquela porta e me tragam algo decente na semana que vem... – Mr. Schue disse duro antes de apanhar suas coisas e sair da sala, todos ficaram se olhando, esperando quem ia ser a primeira dupla a ser formada.

            Mercedes e Kurt alegaram que não tinham nada a ver com o problema, portanto, cantariam juntos. Finn correu para Rachel que pareceu correr dele direto para Quinn, a morena aproximou-se acanhada e perguntou:

            - Tem idéia do que quer fazer?

            - Ah para você vir me perguntar isso... Com certeza tem alguma coisa em mente para nós duas! – Quinn dissera simpática impressionando a todos na sala que esperavam uma resposta áspera. Santana franziu a testa tentando entender o que se passava ali, Brittany a observava tristemente enquanto brincava com uma mecha do cabelo.

            - Estava lembrando a nossa conversa agora a pouco, temos algumas coisas em comum no momento e estou cansada de fazer os trabalhos do Glee Club sozinha, talvez esteja na hora de eu ser mais extrovertida e menos estrela... – Rachel argumentou parecendo insegura, a insegurança dela arrancou um sorriso gentil de Quinn que respondeu:

            - É, acho que podemos fazer juntas mesmo.

            - Então tudo bem, combinamos algo para amanhã então? – Rachel perguntou entusiasmada com os olhos brilhando de excitação, Quinn quase pode ver as milhões de ideias que deviam estar passando pela mente dela naquele exato momento. Quinn acenou afirmativamente para Rachel e a morena levantou-se para sair da sala rapidamente, porém, Quinn segurou-a pelo pulso para avisá-la de que estava esquecendo a bolsa.

            Ao tocar na pele de Rachel Berry, Quinn Fabray sentiu uma onda quente arrepiar os pelos de seu braço e seu estômago remexer enquanto o coração acelerava. A loira ficou encarando a outra completamente séria e sem saber o que falar, até que Rachel pigarreou e Quinn conseguiu formular uma frase:

            - Sua bolsa... Esquecendo, sabe?

            - Ah sim, estou esquecendo minha bolsa? – Rachel repetiu parecendo achar graça da situação, Quinn acenou com a cabeça soltando o pulso de Rachel e sentindo sua respiração e seu juízo voltarem ao normal. A morena acenou e saiu da sala, agora com a bolsa em mãos.

            Porém, Quinn ainda tinha mais a dizer. Saiu porta a fora atrás de Rachel pelo corredor, a morena estava quase no fim dele quando parou assustada.

            - Quem é você e o que fez com Quinn Fabray?

            - Ah não enche Berry, eu preciso te falar uma coisa, sobre mais cedo... A respeito do ódio e tudo mais. – Quinn se explicou um pouco ofegante e irritadiça, Rachel acabou rindo e fez sinal para que ela continuasse.

            - Uma pessoa me disse que do ódio para a admiração é apenas um passo, acho que foi isso que aconteceu com nós duas... Esse é meu pedido de desculpas, não espere coisa melhor.

            - Mas isso não é em relação ao amor, Fabray? – Rachel questionou inocentemente, mas aquelas palavras acabaram provocando rubor em ambas. Quinn sorriu desconcertada a uma Rachel que encarava os próprios pés, pigarreou tentando achar as palavras.

            - Bem, ah... marcamos algo amanhã então...

            - É... bem... Posso ir agora? – Rachel questionou e ao receber a resposta afirmativa, saiu quase correndo dali. Quinn escorou-se na parede e ficou encarando o chão, ainda sentindo o frio na barriga e o rubor tomar conta da sua face.

            Na sala do Glee Club, Santana ignorava tudo que Puck lhe falava a respeito do trabalho. Estava divagando de Brittany para Quinn e de Quinn para Rachel Berry. Estava tudo começando a fazer sentido naquele momento. Seus olhos encontraram os de Brittany, ela não sorriu como costumava fazer, apenas virou-se para Artie e continuou a falar sobre o trabalho... Santana bufou com raiva, Brittany sequer imaginava como aquela indiferença estava machucando.

            Finn estava olhando para tudo abobado procurando entender a proposta que Tina lhe passara enquanto Mercedes e Kurt trocavam olhares cúmplices desde a hora que Quinn saíra correndo da sala, parecia que finalmente, as coisas estavam começando a ser percebidas.