Inner Outer Space escrita por matt


Capítulo 28
Destruição


Notas iniciais do capítulo

"A energia de uma estrela inteira desapareceu de mim."



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                É indescritível a sensação de ter de volta memórias perdidas. Especialmente quando são memórias indubitavelmente verdadeiras, notavelmente trágicas e surpreendentemente maravilhosas. Memórias que poderiam estar perdidas para sempre, mas felizmente estavam bem guardadas no capacete de uma alienígena. Memórias que me revelaram que essa alienígena é quem eu mais amo no universo.

                Kasumi não me soltou após a revelação. Seus braços continuavam em torno do meu pescoço quando voltei a mim. Nossos olhos não se desprendiam um do outro. Poderíamos ficar assim pra sempre, não fosse o desejo maior de expressar o amor que sentíamos um pelo outro. E não fosse Neth.

                - Jyhl... – ele continuava extremamente atordoado – Por favor... Diga que isso foi apenas uma troca de informações do SPIPA.

                - Sim, irmão, foi só isso – ela respondeu. Seu olhar denunciava outras intenções.

                - Ah... Que alívio... – ele não percebeu? Será que olhares assim não são facilmente perceptíveis na forma real deles? Ou ele é só um irmão muito alheio?

                - Só que desta vez é outra coisa – Kasumi continuou, para logo em seguida, voltar a me beijar. Mas dessa vez, foi mesmo um beijo. Um beijo completamente apaixonado, que eu retribuí com a mesma intensidade. Extremamente provocativo, eu tinha que admitir, mas a sua intenção era compreensível.

                - Kasumi... – murmurei, após algum tempo. Queria dizer para ela o quanto eu a amava, queria perdoá-la por tudo, para depois, abraçá-la novamente. No entanto, ela selou minha boca com um dedo.

                - Eu sei. Mas temos coisas mais importantes a fazer agora, Me-kun.

                Pela primeira vez depois do êxtase, parei para pensar. E notei que a nossa situação provavelmente tinha piorado bastante.

                - ...Que chance nós temos, agora? Seu irmão não vai aceitar isso nunca.

                - Eu não disse que tinha tudo planejado? – a expressão em seu rosto era a mesma que ela usava sempre que dizia isso: vaga, incerta e... triste – Confie em mim, tá?

                E se desprendeu de mim, para dar de frente com um irmão de olhos incrivelmente arregalados, rangendo os dentes.

                - Neth. Faça o que quiser conosco, agora, mas nada mudará os fatos. Eu amo o Matt. E não há nada que você possa fazer contra isso.

                - J... Jyhl... Você... – era esquisito ver um ser de um nível tão superior ao meu sem palavras por qualquer coisa que fosse. Eu me senti estranhamente superior naquele momento.

                Só naquele momento.

                - ...Droga – sua expressão mudou instantaneamente, adquirindo o mesmo tom calmo e arrogante de antes – Então as suspeitas de A estavam mesmo corretas.

                - Sim, senhor – Ana respondeu – Quer que eu tome providências agora?

                - Não será necessário. Eu mesmo o farei, só mantenha a segurança.

                Neth voltou seu olhar para sua irmã mais uma vez. Arregalou os olhos. Nesse exato momento, a forma humana desapareceu das feições de ambos, e o SPIPA surgiu sobre suas cabeças. Kasumi ficou paralisada.

                - Ei! O que você tá fazendo? – me assustei.

                - Não se preocupe, terráqueo – ele disse, sem tirar os olhos da irmã – Jyhl não terá um destino tão horrível quanto o seu.

                - O que você pretende, seu desgraçado?! – gritei, logo antes que Ana aparecesse por trás de mim. Antes que eu percebesse, segurou meus braços e deu um chute rasteiro, me fazendo cair de joelhos.

                - Tente não se mover, ok, Matt? – ela disse, com a voz estranhamente dócil. Virei para encará-la e encontrei um sorriso. Um sorriso que eu acreditei amar durante uma semana inteira. E que por algum motivo, ainda conseguia me hipnotizar.

                - Você... é só uma... máquina... – eu me esforçava para superar o transe daqueles olhos claros artificiais com a raiva que sentia. Meus olhos sempre se voltavam para aquele rosto, contra a minha vontade de olhar para Kasumi, presa por alguma força invisível.

                - Que horror, Matt! – fez cara de choque - Eu sou a Ana! Você disse que me amava há tão pouco tempo...

                Ela se ajoelhou na minha frente, passando sua mão direita pelo meu rosto.

                - Não é mais isso que você sente?

                Continuei tentando evitar contato direto com ela. Ao perceber minha repulsa, segurou minha mão direita, levando-a ao seu seio esquerdo.

                A mudança de apelo foi excessivamente brusca. Porém, apesar do maior desgosto, a nova estratégia da andróide estava surtindo mais efeito. Fiquei completamente rubro, enquanto ela me dirigia olhares que confundiam incômodo, súplica e prazer. Minha consciência simplesmente não respondia.

                - Não é isso que você quer sentir?

                ...Sentir?

                Finalmente eu compreendi.

                - ...Você não tem um coração – sussurrei.

                - O quê? – perguntou.

                - Eu senti os batimentos cardíacos de Kasumi antes de amá-la de verdade. Eu sei que ela pode sentir algo por mim com isso. É isso que eu quero sentir.

                Olhei com triunfo para os olhos dela.

                - Enquanto eu não sentir as batidas do seu coração, eu sei que não preciso sentir nada por você... “Ana”.

                Ela ficou sem palavras. Afastei seus braços de mim. Porém, assim como ela havia surgido na minha frente, reapareceu por trás, segurando meus braços mais uma vez.

                - Apelos emocional e carnal não funcionaram, senhor.

                - Só o deixe imobilizado, sim? – Neth respondeu – Eu não posso ter interferências físicas agora.

                - Sim, senhor.

                Por mais que eu lutasse, não conseguia mover nenhum dos meus membros. Estava inutilizado.

                - Matt, Matt... – o alien balançou a cabeça, mantendo o foco na irmã – Eu não imaginei que você pudesse ser tão problemático.

                - Deixa a Kasumi em paz!! – gritei. Ana apertou meus braços com mais força.

                - Você insiste em chamá-la por esse nome... Não seria mais apropriado chamá-la pelo nome real? Ou apenas pelo seu nome do C.E.M.? Ora, nem sei por que estou insistindo nisso, se eu não mais considero sua opinião. Todo o potencial que eu via em você se dissipou, terráqueo. Você, que quase provocou uma gigantesca regressão evolutiva da nossa espécie perfeita, não merece mais nenhum tipo de compaixão. Eu até pensei em selecionar alguns terráqueos que merecessem viver, para que você fosse “feliz” enquanto estivesse conosco. Bom, graças à sua ação, terei prazer em destruir de uma vez aquele planeta inútil. Quem deveria ter deixado “Kasumi” em paz era você, verme.

                O SPIPA de Kasumi anunciou: “um minuto para carregamento total do Raio D”.

                - Sobre você, Jyhl... – ele não tirava os olhos da irmã, ainda paralisada – Como ousa prejudicar a nossa tão sonhada perfeição? Mesmo você sendo minha irmã... Eu não posso simplesmente ignorar esse fato. Eu guardaria suas memórias caso fossem importantes fontes de pesquisa... Mas será melhor se estiverem completamente apagadas.

                - FILHO DA...!!! – Ana chutou minhas costas antes que eu terminasse a frase. Uma dor imensa se propagou na forma de um grito.

                - Sua personalidade não mudará o rumo de nada, terráqueo. Jyhl pagará seu preço, e você, o seu.

                “Raio D totalmente energizado.”

                - Ora, teremos tempo para ver um espetáculo antes de tudo, irmã – Neth tornou a andar para a parede transparente na extremidade da sala – Considere isso seu castigo.

                O rosto de Kasumi, inexpressivo, involuntariamente se virou para a varanda da sala, que se retraiu automaticamente. O canhão, cuja ponta já estava visível, revelou-se completamente. Só sua extremidade já era monstruosa, mas o conjunto completo da arma era indescritivelmente maligno. Apesar da escuridão do espaço no exterior, era possível ver o contraste do canhão com pontas da nebulosa que envolvia a base do C.E.M. completamente. Porém, era impossível dizer suas dimensões a olho nu.

                - A, traga-o aqui – Neth ordenou.

                - Devo deixar de me chamar Ana, senhor? – ela disse, já me guiando para a mesma parede que os dois.

                - Por favor.  E mais tarde, farei modificações na sua aparência. Não quero mais vestígios da Terra.

                - Sim, senhor.

                - Ativar Raio D.

                Minhas esperanças se esvaíram num segundo. Uma forte luz começou a brilhar na ponta do canhão. A intensidade do brilho aumentava cada vez mais. Fechei meus olhos para me proteger, sem mais reações a meu favor.

                - Contemplem! O raio com a energia de uma estrela inteira!

                A energia de uma estrela inteira desapareceu de mim. À medida que o brilho aumentava, meu brilho interno diminuía. O sentido da minha vida, que recentemente havia surgido mais uma vez, estava perdido. Só havia o desespero. Ah, eu ia morrer depois, de qualquer jeito.

                Meus pais... Minha irmã... Meus amigos... Minha família... Todos os seres humanos... Toda a vida na Terra...

                Kasumi...

                Eu não pude fazer nada...

                Desculpem-me...

 

 

 

               

 

               

 

 

 

                -...Por que ainda está aumentando?

                A voz de Neth me fez erguer a cabeça. O brilho não me permitia parar de forçar as pálpebras fechadas, mas o tom de preocupação perceptível em sua fala me alertou.

                - O raio não dispara! O que está acontecendo?!

                A parede de vidro foi coberta por uma camada metálica preta, que me possibilitou abrir novamente os olhos. Eu continuava preso pelos braços de A. Porém, Neth abandonara sua pose vitoriosa, que foi substituída por uma confusão absoluta.

                Kasumi... sorria?

                - Você acha mesmo que eu fiquei tanto tempo chorando sem fazer nada, irmão?

                - ...O que você fez, Jyhl?! – apesar da nata inexpressividade que a forma original dos dois exibia, ele estava perceptivelmente em fúria. Ao voltar a cabeça para a irmã e paralisá-la mais uma vez, parecia prestes a cometer um assassinato.

                - Eu não me ocuparia em tirar minha memória agora se fosse você... – ela disse, ignorando a paralisia, com o mesmo tom de deboche com o qual eu já tinha me acostumado – Em pouco tempo, você não poderá mais ficar nesta sala.

                - O que você fez?! O quê?!!

                - “Ora”, Neth, eu apenas me aproveitei da sua falta de atenção para usar uma habilidade que apenas nós dois possuímos no universo.

                - Senhor! – A interrompeu – O nível de temperatura está subindo rapidamente!

                - ...Não me diga...? – Neth alterou sua fúria para algo semelhante a medo.

                - Na verdade, irmão, eu já desconfiava do verdadeiro propósito do C.E.M. desde que Joana surgiu na Terra, só estava esperando uma confirmação sua. Depois que você a disse, eu coloquei o plano em prática.

                Ele não se moveu. Parecia mais paralisado que a irmã.

                - Enquanto as memórias da A eram mostradas ao Matt... – ela continuou – eu abaixei minha cabeça para que você não percebesse. Eu já conhecia as propriedades do Raio D antes, então foi relativamente simples. Você disse agora mesmo que ele possui a energia de uma estrela inteira.

                Com essas palavras, as intenções de Kasumi ficaram assustadoramente claras em minha mente.

                - Sim, Neth, eu usei manipulação atômica no Raio D, para que essa energia seja utilizada não para destruir... Mas para criar uma estrela aqui, onde está agora a base do C.E.M.!

                O terror tomou conta de todos na sala.

                - A nossa “raça perfeita” não tem nenhuma chance agora, hein, irmãozinho?

 

 

 

 

 


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Notas finais do capítulo

Primeiramente, peço mil perdões novamente pelo atraso (duas semanas do prazo estipulado, desculpem Ç_Ç)

Sobre o capítulo... Wow... A esperteza (e loucura) da Kasumi se superou mais uma vez o.o
Parece mesmo que IOS está chegando ao fim... Creio que dois capítulos encerrarão a história. Obrigado pelo apoio até aqui! =D
(eu vou tentar escrever o próximo mais rápido x_x)

PS: Se alguém quiser uma explicação sobre a manipulação atômica que a Kasumi fez, tem no review da Anne L =3
(considerando colocar no próximo capítulo, será necessário? ._.)