A Little Bit Longer escrita por Clara B Gomez Sousa


Capítulo 42
Desventuras Em Série




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-Poupe-se de agradecimentos. E... Praticamente a culpa é minha. Eu comecei tudo isso. Eu te magoei. E... É só o meu dever. Sou seu quase pai, não é mesmo? – Sorri e ele saiu.

Eu estava me sentindo ótimo. Tudo (quase) havia voltado ao normal. Bom, claro, eu estava no hospital, havia sido molestado por três pessoas e esfaqueado, mas, ao menos estava vivo. Mamãe voltou para meu quarto, e disse, afagando meu cabelo:

-Você e Scooter se acertaram?

Assenti, e ela completou, mais séria:

-Não vai fugir do castigo por ter fugido de casa, saiba disso...

-Como se o que eu passei não tivesse servido de lição... Eu NUNCA mais fujo de casa, acredite. – Falei. Ela me deu um beijo na testa, e se sentou ao meu lado. Eu parecia meio inquieto.

-Tem algo que quer me contar? – Ela disse.

-Tem. – Disse. Olhei para um lado e para outro.

-O quê foi? – Puxei-a para mais perto de mim, para conseguir chegar a seu ouvido, e cochichei algumas coisas. Ela arregalou os olhos, e quase chorou quando me afastei dela.

-Isso é verdade? – Mamãe perguntou. Eu assenti, e ela caiu em prantos, me abraçando. Também me emocionei, e meus olhos ficaram marejados.

-Eu vou ligar pra polícia assim que voltarmos. – Ela disse, quando nos soltamos.

-Peraí, polícia?! – Exclamei.

-É, veja o que aqueles monstros fizeram com você! – Não retruquei. A verdade é que eles me ameaçaram lá na clareira, dizendo que, se eu denunciasse, eles voltavam e acabavam comigo. Daquela vez pra valer.

Fiquei mais uns dias no hospital. Tive que subornar os médicos que me atenderam para que não contassem o que me fez ir para a emergência. A Dra. Barbie tinha me atendido também, mas eu nem precisei suborná-la. Ela era legal e prometeu que não iria contar. Que sabia que aquilo devia ser um segredo. Tive que me perguntar por que ela sabia daquilo.

Quando ganhei alta, a primeira coisa que pensei foi “Cadê as minhas roupas?”. Sério, eu juro que foi. Minhas roupas, minha carteira, meu celular... Daí lembrei que a mulher me revistou na clareira, e tomou minha carteira, meu celular, minha identidade... Etc, etc.

E pra falar a verdade eu não fazia idéia de onde estavam as minhas roupas. Acho que eles levaram, sei lá. Mas a minha mãe me trouxe roupas minhas pra vestir, eu não ia ter que usar pijama sem a parte de trás de hospital.

Ainda era meio doloroso andar, só um pouco, por causa do tombo e tal. Mas pra mim, sentar ainda era o desafio. Minhas partes traseiras ainda estavam doendo um tanto quanto bastante. O motivo vocês devem saber. Sabe, ser penetrado nas partes de trás não é nada... Confortável.

-Ainda vai ligar pra polícia? – Perguntei pra minha mãe, quando eu colocava o agasalho preto de moletom que ela me entregou. É, eu ainda estava com frio, pra falar a verdade tinha pego uma gripe. Meu nariz estava um pouco avermelhado.

-Vou. Calma, aquele homem e aquela mulher não vão te atormentar mais. – Sorri sem emoção, sem mostrar os dentes, demonstrando certa preocupação.

Assim que chegamos em casa, ela cumpriu a promessa e ligou para a polícia. Não me contive e perguntei se eu tinha que ficar lá. Ela disse que não, que só ia fazer a ocorrência. Liguei para Gabby quase que naquele mesmo segundo, dizendo que já estava em casa, e se podíamos sair para eu esfriar a cabeça. Ela aceitou na hora, e nos encontramos na Papa Louie’s Pizzeria.

-Então, sua mãe já ligou pra polícia? – Ela me perguntou, quando terminei de pedir uma pizza média e duas Coca-Cola’s para a garçonete. – Quer dizer, quem fez aquilo com você tem que ir pra aonde o sol nasce quadrado!

-Já. – Respondi, com indiferença.

-É bom que você esteja bem – Ela disse.

-Pra falar a verdade, nem tanto. – Abaixei a cabeça para tossir umas duas ou três vezes. – Eu fiquei com um baita resfriado.

-Você entendeu o que eu quis dizer. Você podia ter morrido...

-Ah, agradeça ao Scooter, ele quem me encontrou. – Disse, num sorriso. Percebi que Gabby não prestava mais atenção em mim. Quer dizer, ela olhava para o meu rosto, como se estivesse hipnotizada.

-Gabby? – Perguntei. – Tudo bem?

-Você... Você é tão... Tão...

-Tão... – Ela tocou meu rosto delicadamente, e colocou os dedos por baixo das pontas do meu cabelo que tocavam minhas bochechas, e começou a acariciar meu rosto. Seus olhos castanho-avermelhados penetrantes e brilhantes me hipnotizaram. Junto com seu sorriso torto, seus lábios rosados perfeitamente contornados, como se alguma força divina tivesse os desenhado. Aquele rosto era como uma pintura. Seu rosto liso, sua pele corada, suas bochechas rosadas, seus cabelos ruivos curtos... Eu sentia alguma coisa por ela, algo forte, algo intenso, mas não sabia dizer o que era.

-Eu... – Falei, tentando arrumar meus pensamentos. – Gabby, eu... – Eu estava muito confuso. Eu conhecia Gabby desde quando tínhamos nossos sete, oito anos! Se eu sentia algo por ela, por que só fui sentir naquele momento? Uns sete, oito anos depois?

Por quê... Seria uma ilusão? Só por causa que eu estava mais tempo com ela? Não, claro que não!

Sacudi aqueles pensamentos de que o que eu estava sentindo era ilusão para bem longe, e voltei a me concentrar em Gabby. Começamos a aproximar nossas faces, o olhar que ela me passava era tão sereno, inocente... Ela olhava para meus olhos, e depois se concentrava em focar meus lábios.

Aí aconteceu. Um beijo? Não, a garçonete chegou com o nosso pedido, tirando o clima. Enquanto ela colocava a pizza na mesa, a única coisa que rolava na minha mente era “FUUUUUUUU!!!”. Tentei resgatar o clima, mas o mesmo já tinha sido acabado totalmente. Droga.

-Han... A pizza está boa? – Perguntei, enquanto colocava ketchup num pedaço da pizza de mussarela.

-Como sempre. – Ela respondeu. Fui cortar a pizza, o pedaço da pontinha, mas minha mão deslizou, o pedaço que eu tinha acabado de cortar voou em mim, e eu acabei com uma espécie de triângulo de ketchup na camisa. Gabby caiu na gargalhada.

-Ah, pô, beeelo apoio moral que você ta me dando! – Falei, rindo, tentando limpar um pouco da sujeira.

-Eu?! Você também tá rindo!

-Eu sou eu!

-E eu sou eu!

-Ah, você entendeu... – Murmurei. Percebi que não daria pra salvar a camisa e dei de ombros, depois voltei a comer. Ela fez o mesmo, mas não paramos de conversar. Sobre um assunto BEM distante sobre o que acontecera comigo na tarde anterior.

A verdade era que eu estava com vergonha de mim mesmo. Eu já bebia, maravilha, já tinha Aids, maravilha², agora tinha sido molestado, beleza! Tá sussa (Deus, que gíria velha)! Se o mundo soubesse dos dois últimos itens, eu estava acabado.

-Você vai contar sobre aquilo? – Ela me perguntou. Sabia que ela se referia á Aids, se fosse ao que tinha acontecido, ela teria mexido as mãos.

-Provavelmente, não. – Abaixei a cabeça. – Eu estou com vergonha.

-De quê?

-Com medo. O que as pessoas iriam pensar? – Cheguei um pouco perto dela e abaixei o tom de voz. – Que eu sou só mais um daqueles tarados que transam sem se proteger?! Eu nem transei antes na vida!!

-Digamos que.. – Ela cochichou em meu ouvido a palavra. – passa Aids.

-Mas eu só fui... Só aconteceu essa vez!

-Não, não aconteceu só dessa vez. – Ela disse. Parecia séria, e preocupada. – Não foi a Jasmine que te contaminou, não é mesmo? – Ela completou. Eu estava boquiaberto.

-C-como sabe?! – Eu estava perplexo.

-Eu ouvi você falando sobre isso com a sua mãe. Seu cochicho é muito alto!

-Ok, o quê você ouviu? – Falei.

-Tudo. – Ela respondeu. – Por quê não contou pra mim?

-Por que eu... Eu... – Olhei pra baixo. – Não sei...

-É por quê você não confia em mim?! É isso?!

-Não, claro que não!

-Justin, eu não sou idiota.

-Não, claro que não! Eu só achei que... Que...

-Que eu iria contar pra mais alguém? Você acha que eu sou desse tipo?

-Não, eu não disse isso! – Falei.

-Se você acha mesmo isso de mim, então eu... Eu vou embora. Sayonara. – Ela se virou e foi embora.

Suspirei e terminei de comer a pizza, para depois pagar a conta. Quando eu estava indo embora, percebi que ela esqueceu o celular dela. Coloquei-o no bolso e fui embora. Eu ia devolvê-lo a ela quando ela não estivesse mais tão irritada. Quando entrei no carro, algo me forçou a abrir os rascunhos dela e a ler o que ela escrevia.

-Aqui... – Murmurei, logo ao achar a pasta. Tinham vários arquivos, todos com o nome “Ignorance”. “Ignorance 26/4”, “Ignorance 29/7”, coisas do tipo. A minha curiosidade foi mais forte que eu, e eu quis saber o que ela estava pensando no dia que eu soube que tinha Aids.

“Ignorance 26/4

 Estou com um mal pressentimento. Sei lá, como se... se algo grande estivesse prestes a acontecer com alguém que eu conheço. Bem, meu dia não vai lá aquelas maravilhas, meu pai (*%¡$@!!) me deixou de castigo por um mês por que eu dei uma escapada de casa para a rampa de skate que iria inaugurar ontem. Fuu.”

Então era por causa disso que ela não podia ir comigo para aquela rampa! Ela estava de castigo, e eu nem me toquei! Ok, ok, ham... Tudo bem, aquilo era estranho. Não a parte do castigo, quer dizer, continuava sendo, mas...

Pressentimento? Só podia ser a mente feminina mesmo... Ou mais, só podia ser a Gabby mesmo...


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