Donna Koe De, Donna Kotoba De? escrita por Anna H


Capítulo 9
Midnight-Lightening


Notas iniciais do capítulo

Depois de um ano, HA.



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Acordei no meio da noite com um clarão atravessando a janela – havíamos deixado as cortinas abertas. Por alguns segundos não entendi o motivo da luz, mas logo veio um trovão e ficou óbvio. Estava chovendo outra vez.

                Eu abracei Shinya, tentando estupidamente protegê-lo do barulho, o qual pareceu não incomodá-lo nem um pouco, afinal.  Ele enrolou-se numa bola dentro de meus braços, com frio, e eu o apertei contra meu peito para aquecê-lo, além de puxar o pesado cobertor. Do modo que estávamos, meus lábios tocavam a curva de seu pescoço pálido, e eu não resisti beijá-lo. Carinhosamente, deslizei os lábios pela pele alva de seu ombro, ouvindo apenas a chuva bater com força na janela e a respiração dele.

                Lentamente, ele relaxou. Virou-se contra mim e me abraçou. Por um momento, achei tê-lo visto sorrir.

                Eu não podia me impedir de amá-lo.

                Acordei com carinhos em meu rosto. Ele estava próximo, com um sorriso suave nos lábios, tocando minha bochecha com os dedos longos e finos. Não entendi de imediato porque ainda estava ali – nos dias de semana Shinya saía de casa antes mesmo de o sol ter vontade de aparecer. No entanto, estávamos os dois ali, deitados na cama, em uma plena segunda-feira..

                Ele pareceu perceber minha pequena confusão, pois seu sorriso tornou-se mais aberto. Apoiou-se com os cotovelos no colchão e, com as mãos, perguntou-me que dia era hoje.           

–... Já? – perguntei, olhando-o nos olhos e, inconscientemente, movi as mãos enquanto falava. Ele acenou levemente com a cabeça, dando um sorriso que me roubou o fôlego

                Era dia 13 de novembro. Fazia dois anos desde que o havia encontrado no portão de meu prédio. 24 meses desde que havia dito em voz alta o quanto ele se tornara necessário para mim mesmo naquele curto espaço de tempo. 104 semanas desde que ele havia sorrido para mim e me abraçado. 728 dias desde que ele havia concordado em ser meu.

                Nem de longe havia sido o suficiente para que me cansasse dele ou o fizesse menos encantador aos meus olhos.

Um raio de sol escapava por entre as nuvens e entrava pela fresta aberta da cortina, batia em seu cabelo claro, fazendo-o parecer branco e realçava a alvura de sua pele.

Às vezes, sem me dar conta, acreditava que talvez ele fosse algo como um anjo.

                Sentei-me na cama, puxei-o para entre minhas pernas e o abracei fortemente. Sentia seu rosto em meu pescoço, a ponta gelada do nariz e a respiração quente.

                Shinya pediu, quase implorou para que eu faltasse ao trabalho, ficasse em casa ou saísse com ele. Beijei-lhe as faces e os lábios e prometi que voltaria o mais cedo possível, e então faríamos o que quer que ele desejasse. Deixei-o em casa parecendo emburrado e de braços cruzados no peito.

                Segundas-feiras eram um saco. Sempre foram. Esta só parecia pior porque meu namorado estava em casa, emburrado, provavelmente ficando com raiva, e eu queria estar com ele. Talvez por esse motivo, o dia pareceu arrastar-se de uma maneira absurda e insuportavelmente lenta.

Eu o comprara uma caixa de chocolates e um cachecol que combinava - ou ao menos eu achava - com um casaco que ele aparecera usando na semana anterior; havia pedido à mulher de uma das lojas que fizesse uma caixa bonita, com laços de fitas claras.

Julguei que ele estivesse em casa - geralmente estava- quando eu finalmente retornasse da editora. Mas não estava. A casa ficava estranhamente escura sem ele, mesmo que eu soubesse que era o simples fato de as luzes estarem desligadas. Não tinha a televisão ligada em um canal qualquer, o cheiro do jantar vindo da cozinha ou a cabeça clara aparecendo atrás do sofá enquanto ele lia um livro ou alguma revista.

De imediato, busquei pelo bilhete que geralmente deixava antes de sair, mas não o encontrei. Abri gavetas, procurei na cozinha, na sala e subi para o quarto. Nada.

Talvez ele tivesse esquecido. Ou estivesse preso em alguma fila, no medico, virando a esquina.

Não.

Ele teria enviado uma mensagem de texto para o meu telefone celular.

Eu não sabia o que pensar. Nenhuma das idéias que cruzaram minha mente fazia sentido. Simplesmente eram absurdas demais ou de algum modo, eu teria sido avisado.

O pânico se instalara.

Enviei mensagens, telefonei para hospitais, central da policia, tudo o que consegui imaginar. Cheguei ao ponto de ligá-lo, nem que fosse para que ele simplesmente atendesse ou desligasse na minha cara.

O toque dele vinha de dentro de casa, tão próximo de mim que me assustei ao ouvi-lo. Por um breve momento, talvez um décimo de segundo, acreditei que ele estava ali. Mas, por mais magro que ele fosse, jamais caberia dentro de uma gaveta.

De súbito, uma nova idéia me atingiu. Fechei a gaveta e subi até o segundo andar, dirigindo-me ao quarto de casacos. Hesitei antes de ligar o interruptor, mas hesitação nenhuma mudaria o fato de que eu sabia que ele estava vazio. Dos incontáveis casacos que davam utilidade àquele quarto, restavam apenas os meus e três dele.

Sem esboçar uma única reação, retirei-me dali para o nosso quarto, encontrando o outro armário também apenas com as minhas coisas. Nas gavetas também não restava muito dos pertences dele.

Sentei-me na beirada cama que ocupava praticamente todo o espaço do cômodo. Sentia-me tudo menos firme e meus dedos tremulavam em meus joelhos ao que a conclusão à que eu chegara depositava uma bigorna gelada sobre meu peito e atava um doloroso nó em minha garganta. Era real.

Ele havia ido embora.



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