Kagamine Rin estava sozinha em seu quarto, entediada. Olhava ao redor em busca de algo que a intertesse, mas de nada adiantou. Suspirou fundo. Pensou em ligar para as amigas, mas desistiu. Miku e Luka provavelmente estariam gravando mais um CD. Deitou-se na cama e se pôs a olhar para o teto.

As horas não passavam. Os segundos eram um verdadeiro martírio. Fechou os olhos, tentou dormir, nem que fosse por alguns instantes. Sem sucesso. Fora acordada por um barulho insistente.

Olhou ao redor. Não havia nada capaz de produzir aquele som. O Barulho foi se transformando em uma cantoria. Uma bela voz masculina saia... De seu espelho!

De longe, nada enxergou, mas ao ficar frente a frente com o espelho, viu um garoto que poderia ser seu irmão gêmeo. Loiro, olhos azuis, aparência de seus 15 anos e um sorriso divertido.

- Q-Quem é você? – Rin perguntou com um certo receio.

- Me chame de Kagamine Len – Respondeu com aquela voz melodiosa.

- Seu sobrenome é igual ao meu! – Ela disse surpresa.

- Claro. Eu sou seu reflexo – Falou com naturalidade.

- Como assim, meu reflexo?! Você é um garoto!

Ele a olhou pensativo.

- Não sei te explicar bem... Que tal algo como... Metades de uma laranja? – Falou dando um sorriso.

Rin bufou impaciente.

- Não faz sentido.

- Como se alguma coisa fizesse – Respondeu.

Sua cabeça já estava mais que embaralhada, mas pelo menos tinha conseguido uma companhia.

- Aquela voz era sua?- Perguntou-lhe.

- Era...

- Nossa, você canta muito bem – Falou com sincera admiração. Nunca havia ouvido uma voz tão incrível.

- Não tanto quanto você.

Agora sim, ela conseguiu ficar mais surpresa.

- Já tinha me ouvido cantar?!

- Eu sempre estive ouvindo – Disse parecendo se divertir com as respostas.

- Você anda me observando faz muito tempo – Não era uma pergunta.

- O que esperava? Sou seu reflexo. Nada mais natural que eu sempre esteja te observando.

- Então por que nunca o vi antes? – Perguntou.

- Por que só agora que fui chamado.

Ela protestou.

- Mas eu não te chamei!

- Não em voz alta... – Len disse simplesmente.

Rin foi pega de surpresa mais uma vez. Lembrou-se de seus pensamentos de poucos minutos atrás... Clamando por uma companhia. Parecia que seus desejos haviam sido atendidos.

- Eu te conheço mais do que você mesma – Ele disse sem mais e sem menos.

- Não duvido! Agora só falta me dizer que coelho da páscoa existe e que eu ganhei na loteria!

Riu daquele jeito tão divertido e contagiante. Como alguém assim podia ser seu reflexo?

- Estou falando sério. Por isso vamos dispensar a conversa de “Quem sou eu”.

- Mas eu não sei nada de você! –Reclamou.

- No fundo você sabe...

- Quer parar de dizer coisas que eu não entendo?!

Ele riu novamente. Assim começaram a conversar. O diálogo durou até altas horas da noite. Apesar de tudo aquilo parecer irreal, Len era uma companhia agradável que lhe entendia melhor do que ninguém.

- Você devia ir dormir – Ele disse finalmente, depois de tantas horas de conversa.

- Quero continuar a falar contigo!  - Ela protestou.

- Amanhã conversamos... – Disse.

- Mas amanhã eu já vou ter acordado!

- Você não está sonhando - Revirou os olhos.

- Veremos... – Ela bocejou.

De tão exausta que estava, deitou-se na cama e adormeceu sob o olhar protetor de Len.

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Rin acordou cedo no dia seguinte, coisa que normalmente não costumava a fazer. Olhou para os lados como se procurasse por alguma coisa, ou melhor: por alguém.

- Tudo normal... – Falou passando pelo espelho.

- Bom dia pra você também – Uma voz melodiosa e masculina falou.

- Len! – Ela exclamou feliz.

- Eu disse que não era um sonho...

Rin sorriu radiante. Conversar com ele era tudo o que mais queria.

E assim foi. Dia após dia, os dois conversavam até tarde. Rin ficava trancada no quarto o dia inteiro junto com Len. Ele preocupava-se por ela não sair mais de casa, recusar os telefonemas das amigas e dedicar-se somente a conversar com ele.

- Rin, você pode sair de casa! – Falou preocupado.

- Mas eu quero ficar aqui com você – Ela protestou.

- Você pode estar comigo em qualquer lugar! Eu estarei em tudo e qualquer coisa que refletir a sua imagem, mas pelo amor de Deus volte a ser sociável pelo menos! – Ele disse.

- Pare de ser exagerado – Ela fez beicinho – Tudo bem, eu vou sair com a Miku hoje, se é o que você tanto quer.

Len sorriu aliviado com o comunicado. A cada dia que passava se tornava mais difícil convencer a garota de sair do quarto.

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Os dias se transformaram em meses. Apesar de Rin ter sua vida social de volta... Ainda tinha um impulso maior: Ficar na companhia de seu reflexo.

Isso era algo que a garota não dispensava, mesmo que não estivesse em casa. Mas, ainda que estivesse junto dele... Ela estava infeliz. Não podia abraçá-lo ou senti-lo. Apenas via aquela imagem. Um peso foi se formando em seu peito e a vontade de tocá-lo era cada vez maior. Parece que Len também compartilhava seus sentimentos... Mas o que poderiam fazer? Ele era apenas uma projeção.

- Eu não agüento mais isso – Ela disse em um dia.

- Está na hora de você me mandar embora - Ele a olhou com tristeza.

- Não! Nunca faria isso! E-Eu... Não posso! - Sentiu novamente aquele forte aperto.

- Nem você nem eu vamos agüentar mais essa situação! Não se pode... Amar o próprio reflexo – Meio que disse para si mesmo.

Rin tinha lágrimas nos olhos.

- Não quero saber se é certo ou errado. Eu só sei que... Me apaixonei pelo meu reflexo... E não quero desistir disso.

Len a olhou com um misto de ternura e surpresa.

- Está na hora...

- Espere! – Ela interrompeu – Será se podíamos... Cantar juntos pelo menos por essa vez?

Nunca tinham feito algo assim. Mas parecia ideal para uma despedida. Ele sorriu e assentiu.

- Assim seria ótimo.

Então os dois lançaram aquelas belas vozes ao vento, com uma suavidade e leveza que parecia ser possível somente em sonho.

“Doresu hiza de saite tiara wa nage sutete

Mitsume au hitomi to hitomi ga hibana wo hanatsu

Kodoku na tamashii ga honoo age hikare au

Sono namida sukue nai nara marude hitori asobi

Toki yo tomare ima wa

Anata ni yoi shirete

Yureru kodou hitotsu hitotsu wo kizami tsukete tai”

(Cendrillon – Len/Rin Version)

Ao terminar, Rin olhou para o espelho, mas não havia mais nada. Seu reflexo tinha desaparecido.

- Len... – Ela chamou pousando sua mão no espelho.

Durante um minuto ela ficou imóvel.

- Oe, ninguém te avisou que ficar se olhando muito é narcisismo?

Ela virou-se para ver de onde saia aquela voz. Então lá estava ele, em carne e osso, parado em sua frente com aquele sorriso divertido.

- LEN!

Correu para abraçá-lo. Enfim pôde sentir como era tocá-lo. Sua pele era macia e quente como sempre havia imaginado. O apertou mais forte. Desejava não soltá-lo nunca mais.

- Rin...

Ele não fez cerimônia. Estava tão ansioso quanto ela. Foi se aproximando devagar até que finalmente a puxou e a beijou. Começou tímido, mas aos poucos ganhou intensidade. Aquele elo invisível que os envolvia parecia contribuir.

Separaram-se finalmente, muito corados.

- E-E agora... Para onde vamos? – Ela perguntou sorrindo.

- Só sei que para qualquer lugar que você for, eu irei! Afinal, sou seu reflexo – Len respondeu.

- Não... Não é mais – Rin o empurrou para a saída, sorrindo novamente.

Agora não eram mais o reflexo um do outro. Eram muito mais do que isso.

       FIM