Sete Vidas escrita por SWD


Capítulo 83
Vida 6 capítulo 2




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– Obrigado, Jay. Acho que estou prendendo você. Como você mesmo disse, é noite de sábado. Deve ter feito seus planos. Pode deixar que eu me viro. Arranjo um lugar para ficar.

Arranjo um lugar para ficar? Como assim? Jan, esqueceu que tem uma casa?

– Tenho?

– Bobo. O Clif já está vindo. Não diga nada que soe estranho. Chega de chamar a atenção por hoje. Ele nos deixa em casa.

Um Chevy Impala 2008 pára em frente aos dois e, de dentro, sai um sujeito ainda mais alto que o Jay. Dean começa a se sentir um anão. É verdade que era mais baixo que o irmão, mas mesmo seu irmão não era tão alto quanto esse Jay. E o tal de Clif não era somente mais alto, era também mais largo. Um verdadeiro armário.

Jay se acomoda no banco de trás e, face à hesitação de Dean, sai e praticamente o empurra para dentro do carro. Tudo sem tirar da face um generoso sorriso. Dean olha com atenção para o rosto de Jay, buscando as diferenças entre ele e Sam. Em resposta, recebe uma piscada de olhos e um sorriso ainda maior.

‘Puxa, esse sujeito não cansa nunca de sorrir?’

Jay era fisicamente mais parecido com Sam do que Jan com Dean. Jan era exatamente o que se podia esperar de uma escalação de elenco para um filme com criaturas sobrenaturais na era pós-saga crepúsculo. Um ator bonitinho para atrair também o público feminino. Será que não encontraram nenhum que tivesse cara de homem? Dean achava que merecia ser interpretado por um Clint Eastwood, não por um Jan qualquer.

Clif pára na frente de uma espaçosa casa de dois andares num bairro residencial do que parecia uma área nobre da cidade. Qual cidade? Não reconhecia nada. Tinha certeza que nunca estivera antes naquela cidade. O frio que fazia denunciava que estava no norte do país. A casa, apesar da diferença de estilo, lhe lembrou a de sua infância, em Lawrence. A súbita lembrança de sua curta convivência com a mãe foi o suficiente para entristecê-lo.

– É aqui?

Em resposta, foi empurrado entre risos contra a porta para que saísse. Dean não podia acreditar que um homem daquele tamanho insistisse em agir com uma criança grande. Já começava a acreditar que essa era a forma que o Trickster encontrara para torturá-lo nesta realidade. Em segundos estava fora do carro. Estranhou quando Jay também saiu do carro e, mais ainda, quando Clif acenou e simplesmente seguiu em frente.

– Ele foi embora e deixou você aqui.

Jay apenas riu e seguiu em direção à porta de entrada. Dean viu quando Jay tirou o chaveiro do bolso, abriu a porta e entrou, deixando a porta aberta. Dean entra desconfiado na casa. Jay tinha seguido direto para a cozinha e estava tirando coisas da geladeira. Aparentemente para fazer um sanduíche.

– Jay! Eu tinha entendido que você estava me levando para a MINHA casa. Afinal, nós estamos na minha ou na SUA casa?

– Você não costuma ser tão engraçadinho. Estamos na NOSSA casa.

– NOSSA? Nós moramos juntos? Peraí, eu tinha entendido que nós éramos apenas COLEGAS DE TRABALHO.

– E somos.

– Somos colegas de trabalho e MORAMOS JUNTOS? Isso não é meio estranho?

– Estranho por quê?

– Sei lá. Eu pelo menos acho estranho. Se ainda fosse com UMA colega de trabalho. Uma bem gostosa. Uma GAROTA. Mas justo com você?

– O que tem eu?

– Sei lá. Você e seus abraços. Seus sorrisos. É estranho. Não é como se fôssemos eu e Sam. Sam e eu somos irmãos e, mesmo assim, vivemos passando por situações constrangedoras. As pessoas não acreditam que somos realmente irmãos quando nos registramos em motéis de estrada. Fica sempre um clima. Sempre pintam sorrisinhos e insinuações. Eu não ligo porque SEI que somos irmãos. Não preciso ficar dando satisfação para ninguém. Já você e eu ...

– Somos bons amigos, o que há de estranho nisto?

– Somente amigos?

– Tá bom. Vou entrar no seu joguinho. Você acha que nós somos exatamente o quê.

– Bem, são dois homens morando juntos. Dois ATORES. O que qualquer pessoa pensaria?

– O que qualquer pessoa PRECONCEITUOSA pensaria? Exatamente isso que você insinuou. O que qualquer pessoa BEM RESOLVIDA pensaria? Que é muito chato morar sozinho numa cidade estranha, longe da família. Você acha mesmo que o normal seria eu e você sozinhos, em casas enormes como esta, sem ter a quem recorrer caso passasse mal à noite? É isso que é normal? É isso que você quer? Queria estar sozinho nesta casa neste minuto?

– Não, você está certo, Jay. Desculpe. O Jan tem sorte de ter você como amigo. NÃO. FIQUE AÍ ONDE ESTÁ. Chega de abraços por hoje.

– Estou preparando um sanduíche para você.

– Obrigado, Jay. Desculpe. É que não estou acostumado a ter amigos. Estes anos todos fomos só eu e meu irmão.

– Jan, não quer conversar sobre essa história de ser na verdade o Dean?

– Depois. Agora, quero tomar um banho quente. Preciso relaxar um pouco. Onde fica ..?

– Que tem alguma coisa estranha acontecendo com você, tem. Mas, seja o que for, acho que um banho quente vai ajudá-lo a se sentir melhor.

Jay toma a frente e conduz Dean para uma ampla suíte no segundo andar. Antes de descer para continuar a preparar os sanduíches, Jay põe a mão sobre o ombro de Dean como quem diz ‘seja o que for, pode contar comigo’. Dean põe a mão sobre a mão de Jay, agradecido pela compreensão.

Dean não se lembrava de já ter entrado num quarto tão amplo e tão luxuoso. Dean olha para o imenso closet lotado de roupas. De todos os tipos. De smokings impecáveis a confortáveis moletons. Muitas roupas de grife, algumas que deviam custar pequenas fortunas. Tênis caríssimos. Sapatos. Uma dúzia deles. Balançou a cabeça, inconformado. Para que um homem precisa de tantos sapatos? A TV LED de tela imensa, o MP3 player de design sofisticado. Não havia dúvidas que o que motivava Jan a morar com Jay não era simplesmente rachar as despesas de aluguel.

Ao bater os olhos na gigantesca cama de casal desarrumada, Dean não consegue evitar o choque. Sai para o corredor e se detém por um instante em frente à porta que ficava bem em frente à do quarto de Jan. Como imaginara, era a do quarto de Jay. Não perde tempo reparando na decoração. Seus olhos se fixam na cama de casal, tão grande quanto a do outro quarto. Estava imaculadamente arrumada. Acabara de conhecer o Jay, mas duvidava que a primeira coisa que fizesse ao acordar fosse arrumar a cama com tamanho esmero.

Voltou para o quarto de Jan. Olhou novamente para os dois conjuntos de dois travesseiros e os dois edredons largados de qualquer maneira sobre a cama. Agachou-se e examinou o par de chinelos de tamanho descomunal largado de qualquer maneira num canto próximo à porta de saída. Nenhuma dúvida sobre a quem pertencia. Encontrou um segundo par de chinelos masculinos sob a cama, este claramente do seu número, do lado da cama voltado para o banheiro da suíte.

Respirou fundo, passou a mão pelos cabelos curtos e abriu a água quente da banheira de hidromassagem.

Começava a sentir um início de dor de cabeça.

Dean descera a escada decidido a dizer para Jay que ia se mudar naquela noite mesmo para um hotel. Não precisava ficar dando explicações. Ia caçar o Trickster e obrigá-lo a devolvê-lo à sua própria realidade. Quando deixasse o corpo, Jay teria o seu Jan de volta e os dois podiam levar a vida que bem entendessem.

E Jan não era propriamente ele. Lembrava da realidade em que era gay. Por mais que detestasse admitir, era ele no espelho, era reconhecido por todos como sendo Dean Winchester, as histórias de vida dos dois tinham pontos de contato. Na realidade em estava agora, ocupava o corpo de um sujeito que apenas se parecia com ele, e, mesmo assim, nem tanto. Um sujeito que tinha outro nome, outra história de vida. Não sabia o nome nem a história de vida de Jan, o ator, mas sabia que ele não era Dean Winchester. Dean Winchester era um personagem de ficção.

– Vou pegar seu sanduíche. Fiz como você gosta. Está se sentindo melhor? Mais relaxado?

– Jay. Pensei bem e acho melhor eu ir para um hotel. Vai ser melhor para nós dois, acredite.

– Fica, Jan. Por favor. Não tem porque você ir embora.

‘- Que diabo, esse maldito olhar de novo. Não, você não vai me fazer voltar atrás. Você já é bem grandinho, sabe muito bem se cuidar sozinho. E se não sabe, não é problema meu. Eu tenho obrigações para com o Sam. Com o meu irmão. Não com o amante de uma versão alternativa minha.’

– Fica, estou pedindo.

‘- Droga, esse olhar parece ter o poder de corroer a minha vontade. O que está acontecendo comigo, afinal?’

Ainda estava decidido a dizer se veriam no dia seguinte, no estúdio, mas o que saiu de sua boca foi:

– Fico. Por esta noite. Amanhã voltamos ao assunto.

Ainda confuso, Dean pega o sanduíche. E pensar que menos de 24 horas antes, comia ratos. Mordeu o sanduíche com gosto. Estava realmente muito bom. Jay sorria, com olhos sonhadores fixos em Dean. Dean fingiu que não percebeu aqueles olhares.

Por mais que se sentisse bem perto de Jay, Dean aprendera a confiar em seus instintos. E seus instintos lhe diziam que havia algo muito errado com aquele sujeito. Que Jay não era aquele sujeito legal que parecia ser.


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Notas finais do capítulo

27.03.2011PS.: O verdadeiro Clif Kosterman, segurança e motorista dos dois atores, embora mais alto que Jensen Ackles, não é mais alto que Jared Padalecki.