Sete Vidas escrita por SWD


Capítulo 135
sete vidas epílogo vida 5 capítulo 4




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– Idmon, você? O que faz aqui?

– Como passou pelas defesas da casa?

– Muita coragem a sua ..

– Agora você morre, desgraçado!

Com o gesto de pedir tempo no basquete, Idmon paralisa todos em volta da mesa. Mesmo Zetes, que começara a desvanecer volta a parecer sólido. Idmon olha um a um e dá um sorriso de canto da boca. Para ele era a celebração íntima de uma vitória impossível como se o nerd esquisitão ganhasse o amor da garota do capitão do time de football. Quantas vezes se sentira inferiorizado e excluído frente aos antigos companheiros, embora também tivesse origem divina. Como lhe doera saber que permaneciam jovens e desejáveis e ver-se cada vez mais envelhecido e fraco. A injustiça de tudo aquilo. Ele é quem sempre fora o mais capaz. Mas ali, naquele momento, via que a relação entre eles mudara e que eles finalmente o olhavam com respeito e, até mesmo, medo.

O Idmon que se aproxima da mesa, puxa uma cadeira e senta, com a cadeira virada ao contrário, não lembrava em nada o homem que já se mostrava muito velho ao final do seu primeiro milênio de vida. E isso fora há alguns milênios atrás. Aquele velho não mais existia. Tinha rejuvenescido e não somente no corpo. As vestes rústicas e o visual despojado que impunham respeito e exalavam santidade e sabedoria também ficaram para trás.

Como Zetes intuíra, na falta de um elemento melhor de comparação, podia se dizer que ele agora realmente parecia um membro radical de uma alguma tribo gótica. Um bad boy magrelo de pele muito branca vestido de negro. Já completamente integrado ao século vinte e um.

Tatuagens, piercings, body modification e muito metal nas roupas muito justas. Mas a nova aparência não era apenas uma questão de modismo. Apenas Autólico, instruído nos mistérios de Hermes Trismegisto, tinha o conhecimento para reconhecer a real função de cada elemento. As tatuagens eram proteções míticas. Os piercings eram objetos de poder ou amuletos de proteção. As transformações corporais eram mensagens não verbais para as criaturas não humanas que sabia que encontrariam. Os metais nas roupas tinham função de ataque ou de defesa. Prata, ferro frio, cobre, bronze e ouro reunidos em padrões alquímicos. Não parecia, mas o bruxo viera armado da cabeça aos pés.

A sua prolongada velhice moldara seu estilo de vida nos últimos milênios. Era um velho e, por mais que se revoltasse contra essa condição, não podia mudá-la. O jovem que fora e o que ainda existia dentro dele lutavam, mas não tinham como vencer o peso da idade. Embora passasse a imagem de eremita, nunca deixara de se manter informado das transformações culturais por que passara o mundo. Mas, uma coisa é saber e outra, completamente diferente, é viver. E era isso que ele estava fazendo agora. Voltando a viver. Se redescobrindo. Se reinventando. Queria viver. Não era justo que o mundo acabasse justamente agora, quando ganhara sua segunda chance.


– Podem dar-me um minuto de sua atenção. Afinal, se não me engano, foram vocês mesmos que me procuraram em Karya para me convocar para essa reunião. Pois bem, aqui estou.

– Idmon, você não é mais bem-vindo em minha casa. Não depois de sua agressão a Eufemo e Autólico. Não depois lançar esse feitiço sobre nós. Liberte-nos e SAIA.

– Peço desculpas pela invasão, Palemon. Quanto a paralisá-los, quis apenas evitar uma cena de violência desnecessária. Não vim para brigar com vocês. Vim me oferecer para lutar ao lado de vocês. Mais uma vez.

– Lutar a meu lado? Nunca. Você me roubou! Literalmente roubou minha juventude.

– Já era tempo de você provar do próprio veneno, Autólico. Ou acha que não roubou anos de vida de milhares de pessoas? Mais até do que tirei de você. Nunca parou para pensar que o gado, as terras, os imóveis e o dinheiro que roubou eram, em muitos casos, anos de trabalho duro daquelas pessoas. E junto destes anos de trabalho, você roubou sonhos, projetos de vida, o futuro e o passado de muita gente.

– Não! Roubei algumas reses de quem tinha grandes rebanhos, algum dinheiro de quem tinha grandes fortunas.

Algumas reses? Não seja hipócrita e não insulte a inteligência dos presentes. Mas, digamos que fosse assim. Ainda assim estamos empatados. Eu roubei alguns anos de vida de quem tinha um estoque potencial de muitos milhares de anos. Além do mais, está chorando por uma juventude que não mais desejava e que não vai lhe fazer falta. Mas, você está certo ao dizer que roubei de você. E eu, ao contrário de você, não sou um ladrão. Não me orgulho do que fiz. Eu pretendo compensar você pelos anos que lhe tirei. E também você, Eufemo. Temos um acordo? Um tratado temporário de paz?

– ..

– Vou interpretar esse silêncio sepulcral como um sim. Vou libertá-los do encantamento e quero que me escutem. É importante que escutem porque existe muita coisa em jogo. O que eu tenho a dizer é mais importante que essa nossa briguinha.

.

.

– Está dizendo que VOCÊ está por trás da minha volta?

– É uma longa história, Jasão. Mas é importante que vocês saibam de cada detalhe. Vocês me conheceram como seguidor de Hécate, mas Hécate não é a única senhora do submundo. Todos aqui sabem que existem outros deuses, outros panteões e sabem também que existe uma guerra prestes a ser declarada entre a tropa que permaneceu leal e os remanescentes da derrotada tropa que eras atrás se insurgiu contra o Poder hoje dominante. Mas os lados não estão mais tão claros e as coisas vão se precipitar muito em breve com a libertação do Primeiro dos Caídos do submundo em que foi aprisionado.

– O arcanjo Lúcifer?

– O serafim Lúcifer. Lúcifer tem agentes neste plano e no acima deste. Criaturas infernais, humanos e anjos estão em ação neste momento, conspirando para libertá-lo.

– Anjos dando as cartas no mundo. Não entendo a atitude de nossos pais. Retiraram-se e deixaram o campo livre para os soldados do deus hebreu. Não que nossa geração tenha feito diferente, diga-se de passagem. Mas, eles eram fortes. Eram deuses. Se fosse para cair, que caíssem lutando.

– Não foi bem assim. Nossos pais não tinham uma mensagem que incendiasse a imaginação dos homens e gerasse neles fé inabalável. Fé é a verdadeira fonte do poder dos deuses, seja de que panteão façam parte. Além disso, eles eram muitos e competiam entre si pela devoção pelo mesmo pequeno grupo de verdadeiros fiéis. E estes logo rareariam. Nossos pais não se importavam realmente com os homens. Viviam em função de seus próprios desejos. A fé da humanidade no Olimpo desabou num piscar de olhos e lhes foi impossível resistir à ascensão de uma nova ordem.

– Um Deus único que não reconhece nenhum outro poder. Que se fortaleceu conquistando cada vez mais fiéis. Seus anjos mataram ou afugentaram os antigos Poderes. Fomos deixados em paz porque nunca fomos vistos por eles como ameaças.

– Essa paz não vai durar. Em muito pouco tempo, a profetizada batalha final entre as facções de anjos que se auto-reconhecem como o Bem e o Mal eclodirá. O mundo será destruído e nós seremos destruídos com ele.

– É isso que dizem suas visões do futuro? Que estamos todos condenados?

– Infelizmente sim. E aqui, olhando para vocês, vejo claramente o fim que espera cada um de vocês. Nada muito agradável e seria extremamente indelicado revelar-lhes antecipadamente.

– Se é inevitável, o que propõe que façamos? Sentamos e esperamos o fim? Lutamos? Fugimos como nossos pais fizeram?

– Mudamos esse futuro.

– Como? Sabemos que ganhou de seu pai Apolo o dom de ver o futuro, não o de alterá-lo ou enxergar outros futuros. Até onde sabemos, o Livro do Destino não pode ser mudado.

– Como falei, existem outros deuses. Teremos ajuda da senhora da destruição, a deusa-demônio indiana Kälï que ..

– Espera aí. A deusa da destruição quer salvar o mundo? Então, é melhor ela arrumar antes um novo epíteto, porque este soa suspeito. Como sabe que ela não conspira para trazer o fim de tudo?

– Os anjos tampouco vão poupá-la e ela sabe disso. Suas artes permitiram que eu tivesse acesso a uma outra realidade. A realidade de onde vieram as duas metades que se fundiram para trazê-lo de volta a vida, Jasão. O menino ghoul e o espírito desencarnado de um homem ainda vivo, Dean Winchester.

– Eu sabia que Dean Winchester veio de outra realidade, mas o ghoul ..

– Também veio, mas por um portal que eu abri seguindo as instruções de Kälï. Era preciso trazer o espírito de Dean Winchester para dentro do corpo do ghoul e isso só seria possível se o corpo do ghoul apresentasse semelhança genética com o dele. Caso contrário, ao chegar aqui Dean Winchester ocuparia o corpo de um dos Winchesters desta realidade, onde ele próprio não existe. Ele ocuparia o corpo ou de Adam ou de Samuel.

– E qual a ligação do ghoul com Dean Winchester. Tenho as memórias dele e Dean jamais havia encontrado um ghoul anteriormente. Ele imaginava que a ligação viesse do garoto Dean Milligan. A semelhança entre eles ..

– Levou o ghoul a atacar a família do garoto em busca de vingança. O menino ghoul veio do futuro de Dean Winchester. De alguns meses depois que ele deixou esta realidade e voltou para seu próprio corpo. O menino ghoul era do grupo que matou e devorou parcialmente o Adam Winchester daquela realidade. Ao fazê-lo, seu corpo guardou o registro genético que os Winchesters herdaram do Jasão de sua própria realidade. Isso gerou o vínculo necessário e aparentemente mais forte. Talvez por serem da mesma realidade. Se existe algum vínculo com Dean Milligan, não sei dizer.

– Dean não entendia o porquê de ter reconhecido Adam como seu irmão, já que nunca soube da existência deste irmão - ou ainda não sabia; nem de como podia lembrar ter vivido coisas que nunca viveu, como o funeral do irmão.

– Essas memórias vieram do ghoul e se misturaram com as dele. O irmão mais velho do menino ghoul, que era o líder do seu clã, foi morto por Dean Winchester. Ele estava espreitando na floresta e ia atacar Dean e Samuel enquanto eles cremavam o corpo do irmão. Mas eu o fiz atravessar um portal que o trouxe para essa realidade e o deixou no norte do continente americano, próximo ao lugar onde sua ex-esposa guardava seu coração vivo.

– E você manipulou o ghoul para que ele devorasse meu coração e assumisse a minha forma?

– Não eu. Quem fez isso foi nosso outro aliado na tentativa de impedir essa guerra e a destruição do mundo: Loki.

– Loki, o aesir? Ele é um trickster, um deus trapaceiro. Não dá para acreditar em uma palavra que ele diga.

– Os iguais se reconhecem. É por isso que precisamos de você, Autólico. Não foi você mesmo que se auto proclamou o homem mais esperto do mundo. Precisamos que vigie Loki e se antecipe a qualquer traição vinda dele.

– É assim que pretende se mostrar confiável, bruxo? Apresentando-nos a deuses ainda menos confiáveis que você.

– Numa guerra nem sempre podemos escolher nossos aliados.

– Numa guerra precisamos confiar em quem temos ao nosso lado no campo de batalha ou corremos o risco de sermos apunhalados pelas costas.

– Nunca fui um guerreiro. Talvez seja melhor discutir estratégias de guerra diretamente com Loki.

.

Os olhos de todos se voltam para o homem que se materializa bem ao lado de Idmon. Com curiosidade e desconfiança, já que todos conheciam a reputação do senhor das mentiras do panteão dos deuses nórdicos. Mas, principalmente, porque conheciam a profecia que diz que Loki participará do Ragnarök do lado das forças da destruição. Já Jasão reconhece o homem como o enfermeiro do Hospital Distrital de La Grande que coletou seu sangue para salvar Sam Winchester. E como o Trickster que infernizara a vida de Dean Winchester na sua realidade e nesta.

– Dean Winchester conhecia você apenas como o Trickster e suspeitava que fosse um deus pagão. Então, você é Loki. Faz todo o sentido. Pessoal, eu e ele nos conhecemos. Foi ele quem me entregou o feitiço que me transformou de ghoul em humano, depois de enganar Dean Winchester e fazê-lo deixar o corpo. Esse verme não merece confiança.

– Quanta ingratidão. Depois de todo o meu esforço para trazê-lo de volta à vida. E eu fiz porque você Jasão é o único que pode mudar o futuro e salvar essa realidade.


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Notas finais do capítulo

05.02.2012
Aqui fecho uma ponta solta que me incomodava desde que comecei a escrever vida 5. Como o Dean foi retirado de sua realidade antes do fim da terceira temporada, ele não podia reconhecer Adam como irmão. A primeira participação de Adam Milligan em SPN aconteceu no episódio 4x19 (Jump the Shark).