O Rei Negro escrita por Oráculo Contador de Histórias


Capítulo 19
Sinônimo de perigo




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/810800/chapter/19

No lado oeste de Calendria, estão localizadas as terras da família Reindhar, responsáveis por administrar os recursos financeiros do reino desde os primórdios. Uma longa e tortuosa estrada de terra cruza os limites da cidade, alcançando uma bela campina até finalmente dar acesso aos portões de uma enorme mansão em tons de vermelho; sobre eles, vale dizer, está o brasão da família, constituído pela letra R feita de rubi e várias pétalas douradas moldadas com ouro. Naquela tarde, os portões se abriram para a passagem de uma luxuosa carruagem preta com detalhes dourados, puxada por dois cavalos sob o comando de um inexpressível cocheiro.

Minutos mais tarde, dois homens acomodados em poltronas de mogno conversavam no interior de um escritório fechado, sem nenhuma intromissão.

—Sabe que isso é loucura, Merlin o matou na batalha da Tempestade Eterna. Até hoje aquele é um lugar inóspito, um túmulo inviolável. Mesmo se houvesse como ressuscitar os mortos, ninguém menos capaz do que o regente poderia fazê-lo. De onde você tira essas insanidades, Walther? – indagou Leonel Reindhar de cenho franzido, descansando as costas no encosto alto e confortável.

—Eu o vi, Leonel. E posso afirmar que é ele. – respondeu Di Blanco com um sorriso falso e seu tom de voz suave – São os mesmos olhos!

—Se meus olhos ficassem verdes de repente, acharia que sou um Eichen? Minha filha tem olhos verdes, ela é uma Eichen? – debochou, embora com uma expressão rígida – Quer me convencer a entrar em uma briga com os elfos por causa de um moleque qualquer que foi salvo pelo caduco do Alabas, o mesmo que por vezes lutou quase até a morte contra o Eichen?

—Alabas abandonou seu posto de comandante não por velhice, mas para aliviar sua própria consciência com a ajuda daquela raça maldita que sempre apoiou os vermes de Emberlyn! Ele sabia muito bem o que estava fazendo, Leonel e duvido que estivesse fora do seu juízo mental.

—Aliviar a própria consciência? De que? Por Nymira! – bufou o homem impaciente.

—Bom... Por matar tantas pessoas, talvez tivesse chegado ao ponto de simpatizar com suas vítimas. – respondeu Walther dando de ombros.

Leonel o encarou por alguns instantes. Seus olhos azuis que outrora não demonstravam interesse, agora avaliavam o outro lorde como se finalmente tivesse encontrado algo que valesse a pena.

—Está escondendo alguma coisa, Walther. – proferiu convicto.

—Do que está falando? – indignou-se o nobre, segurando na peça de prata presa ao antebraço esquerdo.

—Chega de truques! – disse Leonel categórico – Eu sempre achei estranho a mudança de opinião do rei Ederith III a respeito do ataque. E depois daquilo, Alabas nunca mais foi o mesmo. – o homem calvo, porém disciplinado e imponente tombou ligeiramente a cabeça para o lado – Se quer minha cooperação, saiba que tem um preço. Por que Alabas protegeria Gabriel Eichen, se ele de fato está vivo? O que houve na Cidade Sombria, Walther?

Do lado de fora, pelos corredores da mansão Reindhar, não circulava ninguém. Já no átrio, uma mulher loira que tinha por volta dos trinta e cinco anos, segurava pelo braço um homem sem camisa, maltrapilho e sujo, embora fosse jovem e bem afeiçoado.

—Não vai me dar as costas assim, Raregard!

—Sinto muito, milady, mas eu preciso retornar para o meu dever. – respondeu ele sem encará-la.

—Seu dever é fazer o que eu mando! – rosnou e se precipitou em lhe falar no ouvido, para tanto ficando na ponta dos pés – É isso ou eu te envio para morrer na Cidade Sombria, você escolhe.

—Não tenho medo de morrer lá ou aqui, milady. Agora se me permite...

—Não, eu não permito! – o segurou mais forte – Posso mandar te açoitar de novo, como fiz da última vez.

—Se eu fizer o que está me ordenando, meu destino será bem pior do que o chicote. Por que faz isso? Sendo quem é, qualquer lorde cairia aos seus pés. – murmurou ele inconformado.

—Não estou interessada em lordes frouxos. Eu quero você, imbecil do caralho. – replicou baixinho.

—Sou apenas um escravo. Como os outros, a senhora deveria ter nojo de mim.

—Para a sua sorte, não sou como os outros. Ou já teria mandado cortar seu pau! – disse entredentes – Se parar de teimar comigo e me obedecer, só tem a ganhar.

Passos vindos do corredor fizeram a mulher se afastar rapidamente do emberlano. Quando chegou ao átrio, Walther notou que os olhos dela realmente eram verdes como Leonel outrora dissera. Desprezando esse detalhe, ele sorriu:

—Boa tarde, Katherine!

—Ah, boa tarde, lorde Di Blanco. – respondeu a mulher num sorriso falso, voltando-se para Leonel que também já estava ali – Papai, preciso visitar um alfaiate no centro.

—Mas isso é desnecessário, basta mandar que tragam qualquer um até aqui. – respondeu Leonel com certa indiferença.

—Só que isso não me daria a maravilhosa oportunidade de me libertar um pouco dessa casa. – explicou sem esconder uma pitada de sarcasmo – É isso ou vou enlouquecer. – concluiu ela com um sorriso ácido.

O lorde Reindhar olhou de relance para Walther, que fingia não estar entendendo nada e, a contragosto, dirigiu-se friamente ao emberlano.

—Coloque uma roupa limpa e leve minha filha ao centro. – então enrugou a testa e se aproximou do homem cabisbaixo – Antes, se lave. Está fedendo.

—Agora mesmo, milorde.

Raregard passou por Katherine, que o notou em sua visão periférica, porém manteve-se neutra.

—Já está ficando tarde, devo me retirar. – disse Walther – Foi um prazer revê-la, Katherine.

—Igualmente, milorde.

—Hum... – esboçou um meio sorriso, voltando-se para Leonel – Espero que nossos negócios prosperem.

—Vão prosperar. – respondeu Reindhar sem pestanejar – Até logo, Walther.

Pouco tempo mais tarde, após a saída de sua filha e quando já estava sozinho em seu escritório, ele afastou um pouco as cortinas com a destra e ficou a observar pela janela o pôr do sol. Então suspirou, contraindo os músculos da face num claro sinal de desaprovação.

—Já falei para não usar truques comigo, Arano.

Vindo do canto mais escuro, uma figura de estatura baixa em vestes negras surgiu. Tinha várias adagas presas a cintura, além de outros itens fáceis de carregar. Seu rosto, até então oculto pelo capuz, foi descoberto e era desagradável de olhar; repleto de cicatrizes, faltava parte do nariz e uma das pálpebras estava costurada. O olho de Arano era cor de avelã, estava focado em Leonel e seus dentes podres constituíram um horrível sorriso.

—Queira desculpar Arano, milorde. Ele é um ladino que não abdica de seus hábitos, milorde. – sua voz era rouca como a de um velho, embora seus despenteados cabelos castanhos revelassem que certamente estava na casa dos quarenta.

—O que vem a calhar nesse momento. – comentou o lorde se afastando da janela – Tenho uma missão para você e, como sabe, não falamos sobre valores.

—Arano sabe disso, milorde. O milorde sempre foi muito generoso...

—Quero que vá até Aurora e assassine alguém. – disse o homem sem mais rodeios – Essa pessoa estará cercada de gente poderosa, a começar pelo rei Yliel.

—Ooooh... – abismou-se o pequeno sujeito, começando a roer suas poucas unhas – Arano se sente desafiado... Arano gosta dessa missão... E quem é o... aaaaalvo? – indagou arrastado, quase perdendo a pouca voz.

Distante dali, nos arredores do palácio real de Aurora, Gabriel estava sentado sobre a grama em posição de lótus. De olhos fechados, meditava conforme tinha aprendido e antes que uma ventania descontrolada surgisse, abriu os olhos repletos de um verde intenso.

PAFT!

Ele sentiu a nuca arder com um tapa e perdeu completamente a concentração, procurando irritado o autor daquilo.

—Eu devia imaginar. – disse zangado.

—Como se atreve a nos trancar nas masmorras, imbecil? Eu devia te arrebentar, sabia? – queixou-se Heler, se jogando ao lado dele – O senhor Nicolas tá uma fera! É melhor ele não te encontrar hoje.

—Não tive escolha. Se Merlin notasse vocês, a Vila dos Farrapos correria perigo e o senhor Nicolas se meteria em mais problemas, sem falar na Ada, é claro. – justificou-se enquanto esfregava a nuca.

—Ah, tá! Porque você ir falar com o mago Merlin foi realmente muuuuuuito inteligente, né, idiota?! Fala sério, o que você tem na cabeça?!

—Eu precisava disso. Queria entender como funciona a cabeça daquele velho e o quão poderoso é.

—Deu certo? – questionou ela sarcástica.

—Não como eu esperava. – respondeu deprimido – Ele destruiu minha espada como se fosse feita de vidro e nem tocou nela pra isso. Ficou falando sobre me levar de volta ao meu mundo e que se eu aceitasse, todos ficariam seguros e os emberlanos seriam libertos.

—Obviamente, é mentira. – constatou a garota desanimada.

—É. Mas... E se...

—Se ele quisesse libertar os emberlanos, já teria feito, Gabriel. Não sonha. – cortou Heler, esfregando as costas dele.

—Foi o que eu pensei. Sabe, Heler, eu realmente não sei o que fazer. No fim, aquele velho tem razão quando diz que enquanto eu estiver aqui, todos correrão perigo. Não sou capaz de lutar e me sinto uma formiga no meio de tudo isso.

—Você não tá sozinho nessa. Acha que a gente não entende o perigo? Nós acreditamos em você, Gabriel. Vê se relaxa um pouco, tá?

—Não consigo relaxar nesse mundo, Heler. – suspirou – E eu agradeço por estar aqui comigo. Você e o pessoal. Mas quero que volte para a vila, volte para o seu pai que deve estar te esperando nesse exato momento.

A garota tombou a cabeça para trás, observando as incontáveis estrelas no céu.

—A taverna deve estar um caos. – riu – Papai... – então sacudiu a cabeça – Pode parar, vamos ficar aqui com você!

—Depois do Grande Dia de Nymira, você, o senhor Nicolas e a Ada vão voltar para o Sul. Por favor, Heler... É tudo o que eu posso fazer para protege-los nesse momento. – admitiu com certa aflição.

—Tá... Tá bom, a gente volta depois da festa. Além do mais, precisamos dar um jeito de levar a Ada para o povo dela.

—Não, mantenha ela na vila por enquanto.

Heler franziu o cenho.

—Ué...

—Nova Emberlyn não é segura. E assim que eu tiver meios, vou ajuda-la a procurar seus pais. – explicou e não havia qualquer hesitação em sua voz ou postura.

A garota o observou com admiração e deixar escapar uma risada.

—Hum? O que foi? – estranhou ele.

—Tá cada vez mais parecido com seu eu da vida passada.

O rapaz instantaneamente fechou o semblante e desviou o olhar, tendo no âmago uma sensação desagradável.

—Eu não pretendo sair por aí dizimando famílias inteiras, nem me tornar um tirano.

Diante disso, Heler deu um longo suspiro e tornou a encarar as estrelas.

—Se todo tirano fizesse o que ele fez por uma pequena vila no meio do nada, não seria assim tão ruim. – cutucou – E se todo tirano tentasse...

—Já chega, Heler. – cortou impaciente e irritado – Não quero que o defenda pra mim. Eu vi e ouvi o Eichen, não me pareceu uma boa pessoa se quer saber. Aliás, é irritante quando lembro que sou a reencarnação dele ou sei lá o que.

—É mesmo? O que viu? – questionou desafiadora, tornando a fita-lo.

Gabriel hesitou. Não queria falar sobre aquilo de novo, não queria nem mesmo se lembrar daquela experiência tão desagradável.

—Me conta! O que você viu? Eu te contei sobre ele quando nem sequer sabia direito sobre você.

—Contou porque quis.

O punho da garota viajou impetuosamente contra o ombro dele.

—Ai! Que droga, Heler!

—Por que você faz isso? Não confia em mim? Ainda não provei que estou do seu lado?

—Não é isso, poxa! – retrucou enquanto esfregava o braço – É difícil ficar me lembrando disso. Toda vez que eu vejo o Eichen, ele parece um monstro irado e assustador. Além do mais, quando resolveu falar comigo, disse que se eu desse a ele o controle do meu corpo, Eastgreen seria inundada por desespero e sangue.

—Ele é um mentiroso e um idiota. – resmungou aborrecida, até que arregalou os olhos e estalou os dedos – Tive uma ideia!

—Tô ouvindo... – disse sem se importar muito, ainda sentindo a dor do soco.

—Faz ele aparecer agora.

Houve um instante de silêncio onde Gabriel a encarou como se tentasse discernir o que tinha escutado.

—Foi mal, acho que não ouvi direito. Pode repetir?

—Ele disse que você poderia dar o controle do seu corpo, certo? Então faz isso, traz ele. Quero que ele diga na minha cara essas maldades, porque não combina com o rei que eu conheci.

Outro instante de silêncio, até que por fim o rapaz gargalhou como se tivesse escutado a melhor das piadas. Irritada, Heler fechou o punho e preparou outro soco, mas ele rapidamente gesticulou com as mãos para que esperasse.

—Calma... Calma... Ai, minha barriga...

—Eu vou te arrebentar...

—Essa foi a coisa mais ridícula que eu escutei desde que cheguei neste mundo. Só pode estar brincando.

—Não estou brincando! Quero falar com ele e entender o que aconteceu. Tenho certeza que muitas respostas estão aí dentro, em algum lugar. – apontou para o coração dele.

—Sabia que eu comecei a treinar com a princesa Aelin? E quando fomos medir minha aura, eu quase a machuquei sem sequer me dar conta? Desculpa, Heler, mas não vou fazer o que está dizendo. Eu nunca me perdoaria se essas mãos – as exibiu abertas – te machucassem. Não confio no Eichen e talvez você tenha razão, ele com certeza deve ter muitas respostas, porém não vou correr esse risco.

—Ele jamais me machucaria. Você jamais me machucaria! – apelou ela o segurando pelos ombros – Me deixa falar com ele!

—Quem garante que vou conseguir tomar o controle de volta caso algo saia errado? – questionou reciproco – Sem falar que estamos em Aurora. Uma decisão séria dessas nunca deveria ser tomada sem o conhecimento do rei Yliel.

—Bom, já que é assim, vou lá dentro chama-lo. – disse simplesmente, quase se levantando quando foi puxada pelo braço – Me larga!

—Eu não quero! Trate de ficar quieta, pentelha!

—Não fale como se fosse muito mais velho do que eu! Eu sou a mais velha!

—Não importa, fique quieta e cale a boca! – esbravejou, mas se arrependeu na mesma hora quando viu o punho dela aterrissando em sua direção. Para se defender, juntou os braços e cobriu o rosto – Ai! Para! Idiota! Desculpa! Idiota!

—Seu atrevido! Você é o idiota!

PAFT! PAFT!

Gabriel e Heler esfregaram no alto de suas cabeças, ambos gemendo de dor.

—Chega dessa palhaçada, idiotas! – repreendeu Nicolas – Por que, pela maldita Tormenta, estão brigando?

—Esse imbecil não quer me deixar falar com o eu dele da vida passada. – explicou ela como se fosse a coisa mais natural do mundo.

—Espera... – o mercador sacudiu a cabeça – Espera, espera... O que???

—Ele disse... Bom, na verdade o outro eu dele disse que existe a possibilidade de assumir o controle do corpo dele... Acho que é por aí...

Nicolas olhou para Gabriel num ar de total preocupação.

—Isso é verdade, pirralho?

—Valeu, Heler! Genial! – repreendeu antes de responder o mais velho – Sim, senhor Nicolas. Mas não vou deixar isso acontecer.

O mercador segurou o rapaz pelo braço e o arrastou em direção ao palácio real, ignorando todas as queixas do mesmo. Preocupada, Heler tentou se interpor, mas foi empurrada para o lado.

—Que droga, senhor Nicolas! Solta ele! O que tá fazendo?

—Cale a boca, pirralha! Isso não é brincadeira... – bradou absolutamente sério.

A mesa de jantar estava farta e Sylie estava empenhada em empurrar algumas colheradas a mais na boca de Leeta, que resistia dentro do que conseguia.

—Não sou uma criança, Sylie!

—Está muito pálida, precisa se alimentar bem.

—Essa é a minha cor natural! – protestou.

A rainha Erilla riu de maneira comedida, até notar – e foi a primeira que o fez – uma aproximação estranha vinda do corredor.

Nicolas chegou ao local e jogou Gabriel no chão como a um saco de batatas, mesmo com os protestos de Heler. Todos ficaram perplexos, sobretudo o rei Yliel que imediatamente questionou:

—O que significa isso?

—O garoto e o Rei Negro mantiveram contato. Existe a possibilidade dele assumir o corpo a qualquer momento, aliás, não temos como saber quem está no controle agora. – explicou olhando diretamente para Yliel – Eu não sou ninguém, majestade. Sou menos do que um calendrino e para os elfos, sou menos que nada. Porém, não posso ficar calado quando uma coisa dessas está acontecendo bem debaixo do meu nariz. Eu já tinha aceitado o fato de que este aqui é a reencarnação do Gabriel Eichen, porém sem lembranças e sem maldade. E agora isso.

—Espere um pouco, Nicolas. – pediu a rainha calmamente, dirigindo seu olhar para Gabriel que já tinha se levantado – Isso é verdade? Sua alma e a dele podem decidir quem assume o controle?

Irritado e constrangido, o rapaz bateu nas vestes. Então a encarou e respondeu:

—Sim, senhora. Mas ele me disse que se isso acontecesse, Eastgreen seria banhada em desespero e sangue.

—Estamos todos correndo perigo aqui. – disse o mercador incisivo – O Rei Negro ameaçou a todos e não temos nenhuma garantia de que não tentará nada.

—Eu posso garantir que ainda estamos na presença daquele que renasceu. – afirmou Yliel, se levantando da mesa e se aproximando deles – Muitas coisas precisam ser esclarecidas, Nicolas.

—Tranque-o até que essas tais coisas sejam esclarecidas, majestade. – apelou o mercador.

—Isso não, senhor Nicolas! – vociferou Heler – Ele não é uma ameaça!

—Mas é claro que não é! – afirmou em alta voz a princesa Leeta, ficando frente a frente com o mercador – Ninguém vai jogá-lo em uma cela! – concluiu irritada.

Gabriel se lembrou da vez em que Leeta ficou irritada quando se conheceram. Era sempre assustador, mesmo que ela estivesse a favor dele.

—Alteza, esse... – Nicolas respirou fundo para usar melhor as palavras – garoto... Fez a besteira de confrontar o mago Merlin. É questão de tempo para que Calendria tente alguma coisa contra Aurora, porém se o inimigo também vier de dentro, ainda mais se tratando do Rei Negro, todos correrão perigo.

—Gabriel Eichen não tem motivos para machucar os elfos. – disse ela sem pestanejar – Se está tão preocupado com a sua segurança, é melhor que parta. – concluiu friamente.

Irritado, o mercador olhou para Ada, Gabriel e por fim Heler, que o fitava de volta numa mistura de irritação e aflição.

—Ada... Heler...? – questionou, porém não recebeu resposta – Claro, vocês ficam com ele. – então encarou outra vez Gabriel – Se machucá-las... Eu nunca vou te perdoar, Rei Negro. Nunca!

Nicolas partiu ignorando os protestos de Heler. Gabriel fez menção de ir atrás e tentar impedi-lo, porém se conteve. Houve silêncio durante um breve período, até que ele voltou-se para todos e disse:

—Hoje, eu não sei se consigo estar no controle disso. Como já sabem, não me lembro de nada acerca da minha vida passada, não entendo o motivo de tanta ira e embora sejamos dois lados da mesma moeda, não nos conhecemos. O que o senhor Nicolas e o mago Merlin disseram é verdade, todos estarão em perigo enquanto eu estiver por perto, seja por causa de Calendria ou por causa do Rei Negro.

—Sabemos muito bem o que estamos fazendo. – interviu Leeta – Se Calendria quiser lutar, que venha. Se o Rei Negro tentar se apoderar do homem que eu amo, encontraremos um jeito de impedi-lo.

Yliel arqueou a sobrancelha e Erilla esboçou um sorriso genuíno, gesto que foi repetido por Aelin e Sylie. Sael estava boquiaberto, enquanto Ada parecia entender um pouco do peso nas costas daquele que ela considerava seu rei. Heler parecia prestes a desabar em lágrimas, fosse por causa de Nicolas ou pelo que estava presenciando ali.

—Majestade, você tem me chamado de amigo desde que nos conhecemos. – disse o rapaz voltando-se para o rei – O que tem feito por mim, eu jamais esquecerei. Confesso, diante de todos, que me atrevi a colocar meus olhos em sua filha, a princesa Leeta. Porém, no atual momento, não posso fazer o que eu tanto quero, não posso pedir a mão dela aos dois. – ele olhou também para a rainha – Não sabemos qual será o próximo passo de Calendria, nem o que acontecerá a respeito do Eichen. Porém, quando tudo isso acabar, eu certamente o farei.

Yliel olhou para Erilla, que sorria. Porém ele, sério, caminhou até Gabriel e o encarou repleto de imponência. Leeta ficou apreensiva sobre a reação do pai, assim como Aelin, Sael e Sylie.

—Quero ver até onde vai sua determinação, amigo. Saiba que eu jamais entregaria minha filha para alguém incapaz de protege-la. Depois que o Grande Dia de Nymira terminar, teremos muito trabalho a fazer. A propósito, já pedi que sua nova espada fosse forjada.

—Obrigado, senhor.

Gabriel olhou para Leeta e esta sorriu, gesto que ele correspondeu. Então avistou Ada e Heler, ambas abraçadas. “Se machucá-las, eu nunca vou te perdoar, Rei Negro. Nunca!” Essas palavras ecoavam em sua mente num loop infinito.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "O Rei Negro" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.