Com amor, Julieta! escrita por Ascrônicasdeamanda


Capítulo 3
Em seus olhos...


Notas iniciais do capítulo

Será que todo amor merece ser perdoado? Deixo pra você essa reflexão antes de ler. Boa leitura ♥



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/808166/chapter/3

Romeu

Parei de ler a carta assim que cheguei no fim. Senti comigo um aperto no peito e tentei segurar as minhas lágrimas. Levantei o rosto em direção ao céu. Lá não tinha nenhuma estrela, nenhum raio de luz da lua, contava apenas com a presença de nuvens opacas, densas e escuras. No ar persistia uma tensão implacável que a qualquer momento tudo ao meu redor e explodiria em uma tempestade fria que seria capaz de destruir tudo, todos e a mim mesmo. O que eu posso te dizer sobre tudo isso que você leu comigo? O que eu posso te dizer para que você acredite que eu realmente estou arrependido? Uma gota densa de chuva atinge o meu rosto, fazendo a minha consciência voltar para toda aquela situação. Não tinha fuga, muito menos escapatória…

Dobrei a carta e coloquei ela de volta no meu bolso, rezando para que ela não se perdesse dali, já que é a única coisa que me sobrou de Julieta.

Resolvi andar apressadamente. Eu não sabia se aquela figura assustadora ainda estava próximo de mim. Não sei se o que mais me assustou foi o fato de ele ter aparecido simplesmente do nada ou se foi pelo fato de ele parecer um personagem saído diretamente de "Orgulho e Preconceito" com aquelas roupas e com o jeito de falar.

Confesso que na hora eu quase me permiti tentar dar uma risada, mas, pelo bem da minha sobrevivência, achei que o medo seria um ótimo companheiro para toda aquela situação delirante.

Acelerei os meus passos e continuei caminhando. Continuando pela estrada úmida e escura, deixei que os meus pensamentos tomassem o controle novamente. Toda essa situação é extremamente absurda, o tipo de situação que só existia naqueles livros…

Uma das coisas que despertou a minha paixão pela Julieta foi o seu amor pela leitura. Conheci ela na biblioteca da nossa antiga universidade. Julieta era o que a gente costumava chamar de "cheiradora de pó de biblioteca". Ela passava horas imersa em todas as suas leituras com uma paz inabalável, exceto quando eu estava lá…

Troquei o meu primeiro olhar com ela quando eu achei que seria uma ótima ideia entrar na seção de obras colecionáveis. O que eu não sabia era que existiam vários protocolos de cuidados com os livros, que estavam praticamente caindo aos pedaços ou se desintegrando em pó.

Entrei na seção sem os óculos de proteção, sem a máscara respiratória e, aqui o meu maior erro, sem as luvas de manuseio. Percebi que os olhos azuis penetrantes de Julieta me observavam fixamente, com uma grande seriedade, da mesa em que a mesma estava sentada. Resolvi que seria uma perfeita ideia tentar impressionar ela passando a imagem de que eu sabia exatamente o que eu estava fazendo - uma grande mentira. Até aquele momento, eu sabia poucas coisas sobre ela. Sabia que ela passava horas com os livros e consegui a informação de que ela era do curso de Letras da universidade. Era apaixonada pelos livros, por qualquer coisa que tivesse açúcar e que sua especialização era em Italiano.

Dentro da seção estava o livro que a universidade tinha orgulho em sustentar para todos que quisessem ver - a segunda edição, do ano de 1918, do livro "A Divina Comédia", de um autor, com uma beleza um tanto rústica, chamado Dante Alighieri.

Julieta nesse momento me encarava intensamente. Resolvi me aproximar do livro e abrir para ver o seu conteúdo. A primeira página estava escrita inteira em italiano, com desenhos feitos à mão que representavam a aparência do autor em vida. Suas informações de tradução e editores... Nada daquilo me importava muito.

Então, em um ato de puro romantismo e uma loucura completamente desnecessária, arranquei a página do livro e saí correndo para a porta da sala. A bibliotecária já tinha percebido o que eu tinha feito e tentou me acompanhar na minha corrida em fuga aos gritos, berros e tudo que uma garganta de 60 anos pode oferecer ao mundo. Julieta estava parada, pálida e incrédula observando toda a situação segurando a sua bela edição de "Alice no País das Maravilhas", imaginando que a insanidade não era um privilégio apenas dos autores literários.

Rapidamente entrei em uma das salas vazias que serviam como ambiente de estudos, entrei atrás da porta, ofegante, ouvindo os passos acelerados da bibliotecária atrás de mim. Os passos iam ficando lentos a medida que se aproximavam da porta. Esperei até que ela entrasse completamente na sala. Ela entrou. No escuro, eu era capaz de escutar os sons dela tateando os objetos do ambiente tentando, sem sucesso, me encontrar. Esperei que ela fosse até o final da sala... Esperei por mais alguns segundos…

Quando tive a certeza que ela mantinha uma distância segura de mim, saí correndo de trás da porta, atravessei a mesma com uma rapidez que não proporcionou a mínima chance da bibliotecária entender o que estava acontecendo. Bati a porta com tamanha força que o barulho ecoou pelos outros cantos da biblioteca. Consegui ouvir por trás da porta o barulho dos saltos batendo freneticamente pelo chão, ela estava correndo. Com agilidade, tranquei a porta girando a trava automática. Olhei para Julieta, ela ainda estava estática observando toda aquela situação humilhante. Pedi perdão mentalmente, porque era a única forma que eu tinha pensado com os meus dois neurônios de impressionar ela.

Corri apressadamente em sua direção com a folha rasgada na mão. Me coloquei na frente de sua mesa, ofegante…

Achei que conseguiria ao menos dizer o meu nome, mas o nervosismo me impediu. Então, comecei a me aproximar dela. Eu me aproximava por cima da mesa e ela apoiava o encosto da cadeira para trás para tentar se afastar. Eu só queria entregar aquele pedaço de papel velho pra ela. Chegamos a um ponto em que eu não conseguia mais me aproximar e nem ela de se afastar, ambos com o risco de cair.

Meus olhos encontraram os dela e, por deus, posso jurar ter visto algo angelical vindo daqueles dois anéis de azul vivo e profundo. Seu olhar era gélido e acolhedor ao mesmo tempo. Eu sentia que ela era capaz de ler através da minha alma todos os meus segredos sem piscar. Seu olhar era sereno com um misto de inocência e ambiguidade. Levei a minha mão ao rosto dela. Sua pele era macia e aveludada. Era tão branca que eu poderia desenhar vários caminhos e carinhos com a ponta dos dedos. Estávamos com os rostos tão próximos que eu conseguia sentir sua respiração quente e acelerada.

O tempo ao nosso redor havia parado. Existia apenas eu e ela conectados naquele ponto do universo pelos nossos olhares. Eu era incapaz de interromper aquele momento pois não sabia se aqueles poucos segundos seriam os últimos que eu teria com ela. Fiquei surpreso quando percebi que ela retribuiu ao meu toque colocando a sua mão junto à minha. Seu olhar era penetrante, capaz de me estilhaçar quantas vezes fosse capaz. "Ela tinha olhos de cigana oblíqua e dissimulada".

Infelizmente, todo esse momento foi interrompido com o som de chutes na porta da sala de estudos. Ambos voltamos para a nossa realidade. Me afastei rapidamente, roubei sua caneta e anotei o meu telefone na parte branca da folha arrancada.

— Julieta, pode parecer extremamente estranho e uma loucura, mas se existe com você algum sentimento sobre mim, te peço que me mande alguma mensagem. Se tudo isso for um grande delírio meu, te peço que rasgue esse papel e queime cada um desses pedaços.

Devolvi sua caneta e saí apressadamente. Vi apenas que ela estava encarando fixamente a folha. Saí parecendo um louco, mas usei os poucos neurônios que me restavam. Eu sabia que ela não iria rasgar e muito menos queimar aquele papel. Aquele livro fazia parte da vida dela e eu também gostaria de fazer. Espero que ela também interprete isso dessa forma e não pense em mim somente como um louco destruidor de papel…

 

Trazer essas memórias à tona me trouxe um pouco mais de esperança para continuar a minha caminhada. Eu sentia que, no final daquela estrada, encontraria a minha Julieta novamente para implorar o seu perdão...

Continua no próximo capítulo…


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

E aí? Me diz o que achou?



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Com amor, Julieta!" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.