The Hurting. The Healing. The Loving. escrita por Minerva Lestrange


Capítulo 18
Capítulo 17




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Passos pesados o levaram até a conhecida porta de metal blindado. Podia notar o corpo fisicamente cansado e alguns hematomas repuxando aqui e ali: um corte profundo acima dos olhos, um ricochete de bala no braço humano e alguns socos, na barriga e na mandíbula. 

Notando como o corredor frio e meio úmido se fechava cada vez mais ao redor dele, percebeu que os passos eram de si mesmo, obedientemente encaminhando-se até um dos braços da H.Y.D.R.A. O pródigo filho à casa torna, diria Zemo, mas naquele momento os pensamentos sobre o Barão se embaralhavam à ordem primordial em sua mente. Completar a missão. Retornar. 

Suas armas haviam sido deixadas para trás, logo na entrada do antigo prédio, e a porta se abriu num ranger pesado de ferro contra ferro revelando a forma conhecida do rosto da Enfermeira, como a chamavam: ela estava sempre sustentando um sorriso gentil complementado por brilhantes olhos azuis, mas tinhas mãos firmes e cruéis. 

Por isso, assim que seus braços se encontravam seguramente amarrados junto à cadeira, ela se aproximava com as agulhas e o preparava para receber a Terapia.

— Olá, James. Você demorou dessa vez. 

Não a respondeu. Nunca a respondia. Podia sentir seu corpo sujo e alguma adrenalina da luta anterior percorrendo-o, marcando-o, fazendo com que desejasse continuar a missão. Era como um animal que, não fosse contido por eles, seguiria sem restrições o instinto de matar da mente programada apenas para uma coisa. 

A Enfermeira afastou sua camisa e fixou eletrodos no peito, conectando-o à máquina exatamente sob a claraboia no centro da sala abafada. A Terapia era necessária a cada missão de campo completa e em intervalos periódicos, mesmo que suas tarefas fossem mais corriqueiras. Havia períodos em que a organização decidia, simplesmente, afastá-lo das missões, onde a tranquilidade forjada era quase satisfatória. 

Apesar do instinto inicial, deixar de matar o tornava mais calmo. 

Esse não era o caso, contudo. Era sua terceira missão sem Terapia. Imaginava que os senhores estavam enfrentando problemas com as autoridades, pois nunca havia acontecido esse tipo de deslize, mas notou que certas coisas pareciam um caos no mundo lá fora. O presidente dos Estados Unidos estava morto, o conflito no Vietnã não aparentava um fim e outros países se movimentavam na direção de regimes autoritários invés de progressistas. 

Para ele, tudo estava mudando muito rapidamente. 

Não se reconhecia no espelho, ainda que parecesse exatamente como o garoto que deixara o Brooklyn para lutar na Segunda Guerra Mundial, exceto pelos cabelos caindo com displicência ao redor do rosto, mais compridos do que jamais consideraria, a mandíbula tensa e os olhos azuis vazios. Era a imagem que melhor reconhecia de si mesmo depois de algum tempo, pois não havia nada que o ligasse àquele garoto daquelas memórias soltas. 

Nunca havia. Especialmente depois da Terapia. Sua mente era construída por ecos do passado, fragmentos de memórias que nunca se complementavam e informações desconexas, que pareciam pertencer a outro alguém. Observou a Enfermeira se afastar e voltar com uma bandeja repleta de materiais hospitalares, inclinando-se para amarrar seus braços com as cintas abertas.

Era como se os cabelos loiros muito claros e perfeitamente presos num coque profissional refletissem a iluminação do lugar e, por um momento, se concentrou nos movimentos. Por mais que o tratassem como um animal e voluntariamente se dirigisse à sede da H.Y.D.R.A. para a Terapia, detestava que o prendessem como o prendiam, ainda que a mulher à sua frente sorrisse de maneira tranquila. Ela estava, notou, pois aquele era um procedimento perfeitamente comum: Bucky já era o Soldado Invernal há tempo o suficiente para confiar em sua submissão.

Agora, sua mente trabalhava em consciência, notando como as feições angelicais da Enfermeira russa escondiam sua letalidade. Não era forte nem resistente como ele, mas isso de nada valia ao homem que era ali, na frente dela. Estreitando os olhos quando ela se aproximou para ajeitar a máquina ao redor de sua cabeça, aproveitou que as tiras de segurança foram fechadas com muita displicência e soltou o braço de metal, fechando os dedos com facilidade em torno do pescoço fino.

Não se lembrava desse episódio, ou que a fria Enfermeira pudesse se assustar tanto, uma vez que tinha a sala cheia de colegas, médicos e agentes de segurança, prontos para agir. Estava preparado para qualquer medida de contenção, porém, tão cansado quanto da submissão. Qualquer tipo de passo para além da inércia soava tentador e, aquilo... Sua mão se fechando ao redor da pele macia do pescoço dela, soava natural: o construíram exatamente para isso. 

Observou a Enfermeira perder o fôlego e levar as mãos ao seu pulso de metal tentando se soltar. Ambos conheciam as probabilidades de isso acontecer, entretanto. 

— Pare de brincar com a minha mente... 

Travou a mandíbula ao ordenar baixo, os olhos acompanhando a perda de cor do rosto dela, os músculos tensos por não poder se mexer, afrouxar, mas também pela provisão de outra morte. Era a única coisa que conhecia, afinal de contas.

— Por favor... – A enfermeira sussurrou, esperneando em suas vestes cinzas e tradicionais, os olhos azuis presos nos dele como se quisessem dizer algo. – Bucky, por favor...

— O que disse? 

Estreitou os olhos para a mulher, notando a atipicidade daquele nome. Ninguém nunca o chamava de Bucky, por quê a Enfermeira o fazia? Não conhecia qualquer Bucky. Ela resfolegou tentando falar e, misericordiosamente, afrouxou os dedos para permitir. Finalmente, era capaz de permitir algo, não apenas ser permitido. 

— Bucky, não... – Novamente, aquele nome. Porém, estranhou que mais ninguém da sala percebeu o que ocorria exatamente em seu centro, como se fossem invisíveis ou não se importassem, o que jamais seria o caso. Todos seguiam suas tarefas de maneira metódica em suas estações de trabalho e, por um momento, até pensou que fosse uma tarefa, que seus superiores apareceriam assim que a matasse e, enfim, poderiam dar continuidade à Terapia. Porém, ela lhe chamou novamente. – James!

Virou os olhos afiados para a Enfermeira, notando que não havia realmente falado nada e, assim que os abriu, piscando pesadamente, não era ela quem se encontrava à sua frente, cabelos loiros e feições angelicais, mas Wanda, quase que totalmente sufocada por seus dedos. Assustado, recuou imediatamente com um ofego assustado ao passo que a ruiva levava as mãos à garganta tentando retomar a respiração. 

— Wanda! – Antes inclinada sobre ele, ela caiu de joelhos entre a mesinha de centro e o sofá onde dormia, tossindo. – Merda.

Mais rápido do que poderia descrever, se colocou imediatamente sentado e segurou os ombros dela, de forma aflita tentando ampará-la. Wanda apenas gesticulou sem condições de falar, os cabelos caindo numa profusão bagunçada sobre o rosto impedindo-o de ver as feições provavelmente apertadas.

— Precisa de alguma coisa? Diga alguma coisa! – Entendeu que não pelo gesticular dela, que ainda se mantinha no exercício de respirar, embora só pudesse imaginar como o interior da garganta dela estava macetado por seus dedos metálicos. Sem se importar com as boas maneiras, segurou o ombro dela e afastou os fios vermelhos, constatando sob a pouca luz as marcas pesadas e já muito avermelhadas do que acabara de fazer. Consciente ou inconscientemente, não sabia dizer. – Deus...

Quis se levantar e simplesmente sair correndo, pois, não aguentava mais ser o Soldado Invernal, lidar com memórias de toda uma vida que o moldara, mas que, ao mesmo tempo, não era dele. Não sabia como continuar depois de tudo sem representar um perigo para quem estava à sua volta, ainda que inconscientemente, e episódios como aquele deixavam isso claro. 

Toda a instabilidade do Soldado, ciente do que aquela Enfermeira era capaz de fazer à sua essência, agora se externava em sua respiração, também instável, também buscando por alguma direção. Mesmo sua cabeça ainda parecia um tanto aérea, tanto pelo sonho quanto pela reação rápida que tivera ao enxergar Wanda sob a camada do pesadelo, bem ali na sua frente. 

Se estivesse usando as próprias mãos e não o braço de metal, tinha certeza de que guardaria em sua mente até a textura da pele do pescoço. Por mais inacreditável que pudesse parecer, recordava perfeitamente da temperatura quente da pele da Sra. Stark, assim como o martelar assustado de seu coração antes de sufocá-la.

Com Wanda praticamente entre suas pernas, ainda no chão entre o sofá e a mesinha, fixou os olhos nas marcas novamente, mais e mais escuras até se tornarem perturbadoras e decidiu se levantar. Não queria continuar encarando seu objeto de vergonha. Porém, no instante em que fez menção, a ruiva ofegante levou a mão ao seu braço, os dedos frios envolvendo seu pulso direito com firmeza. 

— Não. – Franziu o cenho, acompanhando cada feição do rosto de olhos fechados por um momento, concentrada na própria respiração. – Não faça isso. 

Com surpresa, viu uma das garrafas d’água da geladeira surgir em névoa vermelha sobre a mesinha, aparentemente do nada, mas Wanda logo o soltou para alcançá-la e beber um grande gole. Então, notou, sentindo todo o seu interior tremer.

— Porquê não fez nada? – Murmurou, compreendendo melhor o que acabara de acontecer, a indignação crescendo em cada poro seu enquanto a acompanhava se recuperar aos poucos. – Porque não usou seus poderes pra me impedir, me afastar, me machucar de volta ou…?

Ainda que fosse um super soldado, com os poderes que tinha, Wanda poderia fazer dele o que quisesse. Sua força, suas habilidades, seu braço de metal seriam totalmente inúteis se a ruiva, a Feiticeira Escarlate, decidisse fazer algo contra ele. Ela podia afastá-lo, podia machucá-lo, podia deixá-lo completamente à mercê de seu controle mental – como fizera na Anomalia com milhares de pessoas ao mesmo tempo -, podia simplesmente matá-lo. 

Bucky tinha consciência de que estava completamente em desvantagem em relação a alguém como Wanda Maximoff, mas, ainda assim, eram as marcas de seus dedos que estavam nela, não o contrário, e simplesmente não compreendia porquê. 

— Você disse… Pare de brincar com a minha mente. – Ela apertou a garrafa entre os dedos, os olhos fixos num ponto qualquer do piso à frente enquanto pensava. – Sei que respondia à violência de alguém, posso... Construir uma imagem de como ela era em minha própria mente pela forma como se sente sobre. Então, eu entendi... Não posso fazer isso, manipular sua mente. Pode ser que seu cérebro interprete como uma violência também. 

— Não.

Discordou instintivamente, no que ela levantou os olhos de maneira firme, embora o tom de voz não denotasse tanta firmeza, caindo para um tom ainda mais suave para tentar fazê-lo compreender o que queria dizer.  

— Bucky, sua mente é... Complexa. 

— Não. – Negou novamente e, dessa vez, se levantou e se afastou inconformado. – Não desse jeito. Poderia ter impedido que isso acontecesse, poderia ter se defendido! 

Wanda não se mostrou sequer abalada pela exaltação nem se levantou, apenas seriamente o acompanhando com os olhos enquanto andava de um lado a outro. Mesmo no chão, com as marcas de seus dedos na pele dela, ainda não aparentava alguém que não tentaria se defender caso se sentisse ameaçada, pois nunca denotava esse tipo de vulnerabilidade. 

— Manipular sua mente de forma arbitrária é perigoso. Pode levá-lo de volta a lugares que sei que não quer. – A observou se colocar de pé sem pressa, não sabia se porque estava atordoada ou algo do tipo. – Há poucos meses, deliberadamente brinquei com a cabeça de uma cidade inteira e deixei todos eles traumatizados. Estou exausta, insegura e não sei até que ponto posso pressionar uma mente como a sua. 

A olhando com cuidado podia reparar todas as nuances do cansaço e da insegurança, não apenas quanto aos próprios poderes. Tinha a impressão de que todas as tentativas de começar uma vida que ela tivera foram frustradas e isso a vinha pressionando interna, mentalmente, de maneira a torná-la instável, mas também o levava a momentos como aquele. 

Bucky não queria ser responsável por machucá-la, por marcar mais alguém com seus dedos, como fizera a Sra. Stark e a incontáveis pessoas ao longo dos anos e, se ela tivesse se defendido, minimamente que fosse, nada daquilo teria acontecido novamente. De certa forma, ainda era como um efeito do que a Enfermeira podia fazer a ele.

— Bem... – Fechando os dedos de metal, percebeu que não usava as costumeiras luvas. Estava acostumado ao braço que Shuri preparara para ele e chegara a um nível de desprendimento em que realmente não se importava em possuir uma peça de metal em seu corpo. Porém, naquele momento, era simplesmente angustiante olhar. – Parabéns pelo recém conquistado altruísmo.

Sorriu amargamente, passando por ela para alcançar as luvas deixadas sobre a mesinha de centro, rapidamente se sentando para colocar as botas pesadas sob a aparente incredulidade dela. Não queria nada com ele que remetesse ao Soldado Invernal e o olhar assustado de Wanda enquanto a sufocava não conseguia sair de sua mente, assim como provavelmente as marcas de seus dedos no pescoço dela. 

— O que vai fazer? 

Voltou a se levantar pegando a jaqueta enquanto ela cruzava os braços para acompanhar cada movimento seu. Já era capaz de sentir sua cabeça começar a doer, tanto pelo acontecido quanto pelo pesadelo anterior. A preocupação sobre Wanda inicialmente o havia feito deixar de lado o detalhe da vividez de tudo o que acontecera no sonho, mas a H.Y.D.R.A. ainda ali, no fundo de sua mente, estava clara e permanentemente intrincada em Bucky e em tudo o que tentava ser. 

Apertando os olhos por um instante, já mais próximo da porta de saída da cabana, voltou a olhá-la, um retrato de desentendimento sobre ele.

— Novamente... Sinto muito pelo... 

Mal entendido? Acidente? Alucinação? Não encontrou uma palavra apropriada para descrever, então apenas suspirou, farto e em negação, e se dirigiu para a fora, fechando a porta com firmeza atrás de si.


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Notas finais do capítulo

Ei!!!

Voltando com mais um capítulo, que acho que diz muito sobre o ponto em que ambos estão, pessoalmente, falando. A meu ver, tanto Wanda quanto Bucky se sentem inseguros sobre quem são, no que diz respeito aos seus poderes - ainda que Wanda tenha aquela pose de que pode fazer qualquer coisa (e ele enxerga isso nela, tanto é que estranha totalmente o fato de não ter feito nada). Enfim, segue a mesma vibe do capítulo dos Stark, mais ou menos!

Me deixem saber se estão gostando da história e desses dois, amo poder elaborar mais sobre meu ponto de vista também! ♥

Até breve.



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