Yearbook escrita por nywphadora, nywphadora


Capítulo 1
Capítulo Único




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Último ano do colégio.

A maioria das pessoas ficava nostálgica durante aquele período, pensando sobre como a sua vida mudaria quando fosse arrumar um emprego ou ingressar na universidade. Sobre como perderia contato com as amizades que foram feitas durante o ensino médio.

Mas Lavender só pensava em como queria se livrar daquela merda.

É claro que ia aproveitar a formatura e ficar emocionada com as homenagens, mas no final das contas, ela não sentiria falta nenhuma daquela parte da sua vida. Os adolescentes eram cruéis, ela passou por situações difíceis, que só conseguiu superar por causa de seus amigos. E não precisava do colégio para conviver com eles, aquela amizade não acabaria fora dos muros de Hogwarts.

Estavam sentados na escada que dava para o terraço. Obviamente aquela região era proibida para alunos por questões de segurança, mas não é como se eles obedecessem essa regra. Era o lugar mais sossegado do colégio para ficar, e eles só precisavam não ser descobertos pelo zelador rabugento. Não é como se eles fossem para o lado de fora mesmo, então que mal tinha?

Quando Lavender chegou ao cantinho deles, Dean e Parvati pareciam estar preenchendo algum tipo de formulário, enquanto Seamus jogava algum jogo de tiro para celular, deitado todo torto e usando a mochila dura como travesseiro.

— Qual é a boa? — ela perguntou, segurando a vontade de jogar a mochila em cima de Seamus só por implicância.

— Estamos pensando no que vamos pôr no anuário — Dean respondeu.

— Dean está querendo pôr marchinha de carnaval — disse Parvati risonha.

Ele ajeitou-se para olhar diretamente para a amiga recém-chegada e ignorar a indiana ao seu lado.

— Pati acha que pôr "quem sabe de mim sou eu, aquele abraço" seria arrogância. Mas, francamente, quem mais sabe falar português nessa escola?

— As pessoas conhecem o Google Tradutor — Seamus resmungou, ainda focado na tela do celular.

— Então eu devia mudar para "comi o cu de quem tá lendo" — Dean retrucou.

Lavender riu da brincadeira, apesar de ter certeza de que as coisas deviam ter uma sonoridade muito mais interessante em português do que em inglês.

Dean era brasileiro, filho de mãe brasileira, mas se mudou para Londres muito novo, quando sua mãe se apaixonou por um londrino, que era o padrasto dele. Apesar disso, a família nunca tinha abandonado a sua brasilidade, e era inevitável ser amiga de Dean e não aprender nem que fosse um pouco de português brasileiro, e claro, levar algumas zoadas por ser natural de um país colonialista — afinal, onde estava o ouro que a Inglaterra levou dos portugueses, que levaram do Brasil?

— E você? Já pensou em alguma coisa? — Parvati dirigiu-se a ela.

Ela apenas negou com a cabeça. O que escreveria para o anuário nem tinha sido um tópico que tivesse cruzado a sua mente em algum momento nos últimos dias. Estava mais preocupada pensando se entraria para o ensino superior ou já procuraria um trabalho, sobre como gostaria de passar o resto da sua vida. E, em relação a isso, só uma coisa esteve martelando em sua cabeça: aquele crush que tinha pela melhor amiga há anos.

— E se eu pusesse "viver e não ter a vergonha de ser feliz", mas, em vez de "happy", eu substituir por "gay"? — Dean perguntou repentinamente.

— Muito criativo — opinou Parvati, observando conforme ele começava a escrever na folha de caderno.

— E você? — Lavender perguntou a ela, desviando a sua atenção.

— Estava pensando em pôr algum mantra para nos ajudar nessa nova jornada. Talvez Om Gam Ganapataye Namaha — ela respondeu.

— O que significa? — perguntou Seamus.

— É um mantra para pedir por segurança e prosperidade, para remover os obstáculos do nosso caminho, nos ajudar a alcançar os nossos objetivos. Eu acho que seria simbólico — deu de ombros.

Todo mundo ao seu redor parecia estar nostálgico pelo final do colégio, e Lavender não conseguia sentir isso da mesma maneira que os outros.

— Vou pesquisar na internet — disse Seamus — Deve existir um daqueles posts de BuzzFeed estilo "mensagens de anuário mais engraçadas".

— Você vai pesquisar na internet? — Dean mostrou-se indignado — É a sua chance de deixar a sua marca, e você vai copiar da internet?

— Eu vou me inspirar, é diferente — ele defendeu-se.

Procurando pelo celular, Lavender achou várias fotos sobre mensagens de anuários que eram hilárias ou muito criativas. Tinha uma em específico que a aluna punha os minutos e segundos de um episódio de uma série para deixar uma mensagem — "eu devia ter queimado esse lugar quando tive a chance" —, e foi assim que ela teve a ideia.

Ia se declarar para Parvati usando o anuário. A questão era: que momento de qual série ia usar? Precisava ser algo que viram juntas, algo que tinha significado para elas. Ela nem sabia se a mensagem seria entendida, mas não tinha nada a perder. Era o último ano.

— A maioria das pessoas vai pesquisar frase pronta do Pensador! — Seamus e Dean ainda estavam discutindo.

— Já vou indo — Lavender levantou-se do seu lugar.

Precisava ir para casa maratonar algumas séries e fazer algumas pesquisas. Talvez o Google pudesse facilitar a sua busca.

— Lav — escutou o seu nome ser chamado e virou-se — Vamos sair pra comprar os vestidos de formatura na sexta?

Se ela não fosse assexual, imaginava que já teria pirado há muito tempo com as vezes em que teve que trocar de roupa perto da amiga.

— Pensei que você fosse usar saree — ela demonstrou a sua confusão.

Assim como Dean não esquecia suas raízes, Parvati sempre fazia questão de usar saree (um vestido tradicional indiano) em comemorações mais formais. Era muito privilégio poder fazer parte daquele grupo e aprender tanto sobre culturas diferentes.

— E eu vou. Conheço um lugar que vende — Parvati respondeu-lhe.

— Tá bem então.

Permitiu-se fantasiar enquanto voltava de metrô para casa. Os quatro podiam ir morar juntos, seria bem interessante. Ou então ser vizinhos. Dean e Seamus morariam juntos em um apartamento, e ela e Parvati estariam na porta ao lado.

Parvati com certeza ia querer entrar na universidade, talvez biologia ou biomedicina. Dean passava grande parte do tempo desenhando, então talvez tentasse viver da sua arte, ou cursar história da arte. Era difícil imaginar Seamus fazendo algo que não envolvesse videogames.

E quanto a ela... Tentou pensar em quais matérias se dava melhor na escola, que tipo de assuntos a interessavam. Assuntos que não envolvessem tarot e horóscopo, no caso. Se bem que... talvez ela pudesse estudar os astros, cursar astrologia ou astrofísica. Conseguia se imaginar fazendo isso, apesar de não ser uma carreira muito comum.

Ela não precisava acertar de primeira, sabia disso. Tinha tempo para escolher o que fazer da sua vida.

Fez uma lista de quais séries elas tinham assistido e então tentou puxar de memória os momentos românticos mais marcantes, algo que pudesse remeter a relação delas.

Estava reassistindo Teen Wolf quando a cena perfeita veio à sua mente. Ela e Parvati tinham assistido tanto aquela série, era uma de suas favoritas. Elas simplesmente shippavam todo mundo da série, fosse um casal canon ou não, então não sentiram decepção pelos finais escolhidos. Geralmente elas eram bem sincronizadas em relação a seus gostos pessoais, o interesse pelo misticismo e as diferentes formas de adivinhar o futuro eram algumas dessas coisas.

Just try to find some way to remember me, okay?

Mesmo que não planejasse se afastar dos amigos, não era algo que ela pudesse controlar. As pessoas se afastavam depois do colégio. Ir para a faculdade ou ir trabalhar, eram caminhos diferentes a serem seguidos. Algumas pessoas mudavam de cidade, iam para centros universitários diferentes, trabalhavam desde o raiar do dia até o pôr do sol para conseguir ter independência dos pais. Era uma vida diferente e cheia de incertezas.

E se fosse o caso de se afastarem, Lavender só queria que Parvati se lembrasse dela, da forma que fosse.

Remember how you were the first girl I ever danced with?

Era... o quê? O segundo ano? Ou terceiro da educação básica? A escola tinha organizado algum tipo de festa e Lavender tinha ficado sem par para a dança. Então Parvati tinha aparecido com um saree para chamá-la, parecendo uma deusa hindu — não existia uma deusa com o nome Parvati no hinduísmo? Ela não se lembrava.

Or how I had a crush on you freshman year. Sophomore year? Junior year?

Não tinha sido fácil nem muito menos rápido entender aqueles sentimentos. Como ela podia sentir o coração bater mais rápido perto de uma única pessoa no universo, a ponto de nenhuma outra importar?

Mas definitivamente as coisas foram piores quando Dean e Parvati tiveram um breve relacionamento. Ela teve que fingir estar tudo bem e então entrou em um relacionamento em que não queria estar para tentar esquecê-la, ou talvez porque queria sentir que era uma adolescente normal como todas as outras. Talvez elas pudessem ter encontro duplo e ainda seriam as melhores amigas do mundo, certo?

Remember how you saved my life?

Preferia não se lembrar daquela parte da sua vida.

A adolescência era uma merda, e os padrões de beleza impostos pela sociedade eram sufocantes.

Ela não era magra, nunca foi e nunca seria. Apesar disso não interferir na sua saúde, não importava para as outras pessoas, elas não estavam preocupadas com seu bem estar, só queriam esmagá-la em um padrão inalcançável porque, de alguma forma, ser ela mesma incomodava.

Era isso. Era a frase que estava procurando. O momento. Não era explicitamente um "eu te amo, namora comigo", mas tinha significado.

Anotou no bloco de notas "Teen Wolf S06E01. Minute 00:39:14".

Nas bios do Twitter costumavam pôr direção ou serviço de streaming, mas resolveu deixar do jeito que estava.

Algumas semanas depois, a festa de formatura seria naquela noite. De manhã, ninguém conseguia prestar atenção em outra coisa.

— Saíram os anuários — Parvati surgiu do nada, assustando Dean, que soltou um palavrão em português alto e claro.

Ela logo apressou-se a abrir e virar as páginas.

— Vou pedir assinatura de todo mundo. Vai que algum dia alguém fica famoso? — ela brincou.

Lavender sentiu um gato brincar com o seu estômago como se fosse uma bola de lã.

— Lav foi tão misteriosa, nem contou qual a frase que escolheu — Dean comentou, olhando o anuário por cima do ombro, o que era fácil por ser muito alto.

Seamus e Lavender eram os baixinhos do grupo.

— Quem olha até pensa que somos uma turma unida — o irlandês comentou, ao ver uma foto bem grande da turma de formandos, que dividia duas páginas.

— Isso é maldade, Lavender Brown! — Parvati exclamou — Eu vou ter que reassistir um episódio inteiro para saber o que você quis dizer?

— Aha! Tá vendo? Ela copiou a ideia da internet — Seamus jogou na cara de Dean, que o ignorou abertamente.

— Você conhece a opção de skipar? — perguntou o garoto, irônico.

Parvati puxou o celular do bolso, provavelmente para entrar na Netflix do celular, fazendo o coração de Lavender errar uma batida. Não pensou que ela ia ver isso na escola. Esperava que fosse em casa, quando ela não estivesse por perto para ver sua reação.

Aproveitou para pegar o anuário das mãos de Dean. Precisava de um livro pesado para fingir distração, ou esconder o rosto vermelho, se fosse necessário. Seamus ficou ao seu lado para observar o trabalho de edição, enquanto o brasileiro curioso ia ver o que era dito no episódio. Ele tinha roubado a mesma ideia que ela, fazendo referência a um episódio de Brooklyn 99.

— É aquele episódio que o Jake Peralta fala sobre brasileiros — ele contou a ela em voz baixa —, mas até ele descobrir...

Ela riu, mas então escutou Dean arfar, os olhos fixos na tela do celular. E não era porque tinha escutado a confissão do namorado. Parvati parecia ter ficado estática enquanto o ex claramente estava se segurando para não surtar, sem muito sucesso.

— Você quebrou ela — Dean anunciou.

Observou-a apreensiva, pensando se tinha tomado a decisão certa, ou se devia ter deixado as coisas como estavam antes.

— Você... — Parvati fechou os olhos, parecendo ficar irritada por um instante — Você esperou 10 anos pra me dizer isso?

Sentiu o rosto queimar de vergonha.

— Eu não sabia... como fazer... — murmurou.

— Eu não acredito que o meu radar falhou — comentou Dean, parecendo indignado consigo mesmo.

— Eu não sou bi — o lembrou.

— É, isso faz sentido.

Parvati guardou o celular no bolso e então aproximou-se dela. Pondo as mãos nas bochechas dela, a puxou para um selinho, sem se importar em onde estavam e com quem.

Nada disso importava.

— Te vejo às sete — disse ao se afastar e ir embora.

Agora Lavender que tinha ficado estática, tentando raciocinar o que tinha acabado de acontecer.

Um pensamento aleatório veio. Que plantas ficariam legais no apartamento?


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