Fragmentada escrita por Ariane Munhoz


Capítulo 1
Ainda que me estilhace, eu permito que você se vá.




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You... pull me through

When I’m alone in the dark and the fear is my truth

Yeah all the things that you are

Beuatifully broken, alive in my heart

All that you are – Googoo Dolls

 

Estavam de volta ao início. E lá embaixo, as luzes pareciam tão pequenas como se fossem estrelas grudadas ao chão.

Seus olhos permaneceram assim, fixos contra a escuridão na qual mergulhava, a sensação gritante de vazio que lhe invadia o peito enquanto não mais a sentia. O elo com a qual havia se acostumado, a sensação quente de conforto de saber que sempre que caísse, sua rede estaria ali.

Agora não mais.

Abraçou o próprio corpo, sentindo pela primeira vez que talvez o frio fosse assim: cruel, insípido, doloroso como a sensação de cortar-se com vidro.

Estava fragmentada e não sabia se poderia recolher os cacos do próprio coração novamente.

Silêncio.

— Em que está pensando? — Era como se não a sentisse ao seu lado. Como se algo muito importante tivesse se perdido.

A conexão de suas almas.

— Que não sei em quê está pensando. — Sua voz a traiu, falhou ao dizer essas palavras. Os dedos passearam pelo pescoço, um hábito que jamais perderia de buscar o colar que já não mais carregava embora soubesse exatamente onde ele estava.

— É tão ruim assim não saber? — Não precisou olhar para ela para saber que sorria pequeno ou que franzia o cenho ao falar. Os olhos esmeraldinos permaneceram fixos no chão, imaginando se aquelas pessoas que caminhavam pelas ruas tinham a mínima ideia do que acontecia acima de suas cabeças agora.

— É ruim não senti-la comigo como antes — confessou em seu total egoísmo. Um traço de sentimento que não conseguia abandonar apesar de tudo.

A outra mulher acenou positivamente com a cabeça, os fios negros passeando diante dos próprios olhos, teimosos em saírem do penteado de trança que costumava usar.

— Entendo o que quer dizer.  — E não disse mais nada.

O vento soprou mais forte. Um nó se formou em sua garganta. Não choraria novamente. Não queria. Ela não merecia sofrer com suas lágrimas outra vez. Não quando era a causadora daquilo.

— Sinto muito — sussurrou, ganhando a atenção da outra mulher, cujos olhos pequenos e negros se voltaram em sua direção — por não ter sido o bastante. Por ter falhado.

— Você não falhou — respondeu com sinceridade. — Não é porque as coisas não aconteceram como desejávamos que significa que falhamos, não é? Foi bom, foi lindo. Fizemos valer a pena.

Mas mesmo enquanto falava isso, a outra mulher sentia o próprio coração em frangalhos. Não era como se não tivessem tentado remediar a situação milhares e milhares de vezes. Como se não tivessem tentado remediar o irremediável ou contornar a verdade que se fazia presente.

Amavam-se, isso era um fato. Mas machucavam-se na mesma proporção. Como polos opostos que estão destinados a se anularem, perseguidas por um destino que havia se mostrado nada mais do que cruel para ambas.

— É, fizemos. — Sua voz a traiu novamente, o traço de que em breve choraria ali.

— An... —

— Não — interrompeu-a antes que a mão estendida lhe alcançasse. Sentia que se permitisse aquilo, jamais sairiam do ciclo vicioso e seriam tragadas novamente para o olho daquele furacão. — Eu não sou forte o bastante para afastá-la se me abraçar ou se tentar me consolar.

Os olhos brilhavam com as lágrimas presas a eles, duas esmeraldas que haviam se apagado, perdendo totalmente as esperanças para mergulhar em desespero.

A mulher recolheu a mão como se tivesse levado um tapa, mas sustentou o olhar do Anjo Guardião.

— E agora? — perguntou, ainda que temesse a resposta.

— Agora seguimos em frente — respondeu, cheia de incertezas a respeito daquilo, o coração comprimido dentro do próprio peito ressoando no interior de seus ouvidos como se gritasse que estava cometendo um erro terrível, um erro sem volta. Ela também achava isso.

— Como...? — Não se deu conta que os próprios olhos marejavam em lágrimas, e que as derramava embora sempre tivesse sido mais forte.

Não sei, seus pensamentos tentaram tocar os dela, mas era como se um muro invisível a repelisse. E aquilo doeu tanto que a rasgou por dentro. Todavia, a mulher pareceu compreender e deu um passo para trás.

— Vou sentir sua falta, meu anjo.

Meu. Como se ainda fosse dela. Como se ainda tivesse a chance de ser. E como queria sê-lo. Por que a vida era tão injusta? A que tipo de maldição havia se submetido para perder aquilo que mais amava?

— Eu também... vou sentir a sua. — A voz embargada não disfarçou as lágrimas que correram por seu rosto. Deu as costas sem querer que ela as visse por tempo demais mesmo sabendo que também chorava pela dor do que haviam perdido. — Akai ito... se lembra?

O fio vermelho. Que unia duas almas apesar de todas as dificuldades.

— Se... for pra ser vai ser — concluiu. Não esperou uma resposta antes de afastar-se.

Só queria que ela fosse feliz. Fosse ao seu lado ou não.


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