— Eu vou parecer um idiota.

— Não mais do que o normal, então… - James Sirius deu de ombros da porta do quarto de Albus, os óculos tortos no nariz.

— Qual seu problema em respeitar meu quarto? - Albus arremessou uma almofada no irmão. - E ninguém está falando com você-

— Eu estou fora do seu quarto, tá okay! - ele frisou, indicando como estava milimetricamente fora da soleira da porta. - Só estou dizendo que não vai parecer nada diferente do que é…

— Por mais que eu deteste admitir, Jay tem um ponto - disse Rose arqueando uma sobrancelha, apenas para irritar o primo.

— Quando foi que as pessoas passaram a desrespeitar o direito do aniversariante de ser tratado como um Deus?

— Quando descobrimos que seu ascendente em leão faz de você um porre se dermos essa corda no dia do seu aniversário. - respondeu Scorpius, deitado no tapete do quarto do melhor amigo. - Qual é, Albus, você queria algo diferente, arranjamos!

— Diferente, não humilhante!

— Não é humilhante! - Rose protestou, abrindo o guarda-roupa de Albus e procurando algo nos cabides

— Depende! Se ele estiver pensando em cantar, então é sim! Você já ficou perto do banheiro quando ele está cantando no chuveiro?!

— Agora meu aniversário virou o dia mundial de me ofender, por acaso?!

O aniversário de Albus era um evento desde sempre porque: 1) ele amava ser aniversariante, só sabia falar daquilo e fazer planos semanas antes do dia, e, 2) todo ano ele procurava um jeito diferente de comemorar a data.

Havia tido festas em casa, em pizzarias, boliches, na casa dos avós,  numa viagem para Paris com Rose, Victoire e Teddy - quando ele fez dezesseis - e numa boate em seu aniversário de maioridade.

Mas, no ano anterior, Albus passara o aniversário no hospital, tomando soro, por fazer quase uma semana que ele não colocava uma refeição no estômago, completamente devastado depois de um término terrível de seu namoro de longos treze meses de duração.

Um namoro que Rose e Scorpius tinham sido contra desde o princípio, porque Luke McLaggen era nove anos mais velho e o tipo de pessoa que carregava todos os avisos de que iria destruir a vida de Albus, como realmente acabou fazendo, traindo com - ao menos - duas pessoas e deixando toda a família de Albus de cabelos em pé diante da possibilidade de ele ter contraído alguma IST - porque, bem, era de McLagen que estavam falando.

Assim, tudo que Albus viera falando desde agosto daquele ano era sobre como ele gostaria de um aniversário diferente. E deixara nas mãos dos melhores amigos a incumbência de planejar o que devia ser “a épica noite dos vinte um anos de Albus Potter”. E ali estavam eles, anunciando terem convidado todos os amigos para um bar karaokê.

—Só para não perder o hábito, sabe como é. - James arremessou a almofada de volta. - Seu presente deve chegar amanhã, o correio atrasou. Mas já vou avisando que Alice e eu queremos inaugurar com você, de noite.

Não era, exatamente, mais uma surpresa, porque Albus havia testado a paciência de James até o limite para que ele admitisse que comprara um PlayStation 6 para o irmão. James tinha sido a primeira pessoa a apoiar o interesse de Albus em tornar-se streamer profissional de videogame, tendo comprado o primeiro tripé que Albus usava para gravar os vídeos de seu canal no YouTube - que alcançara dois milhões de inscritos no começo do ano.

— Um presente foda e ainda uma audiência ótima para o canal… todo mundo ama quando vocês dois aparecem nos vídeos. - ele sorriu. - Mas voltando ao karaokê, sem chance, Rose! Sem a menor chan-

— Que tal essa? - ela segurou um cabide com uma camiseta cáqui de linho na frente de Albus.

— Meu Deus, não! Ele não usa isso tem uns quatro ano, Rose! - Lily invadiu o quarto do irmão, abrindo o guarda-roupas - Vai parecer um avô com essa roupa, num karaokê! Se vão fazer programa de velho, pelo menos se vistam que nem gente do século XXI, fazendo favor! Essa calça, essa camisa… o sobretudo preto e os coturnos… nada de sapatênis dessa vez, Albus!

— Sai daqui, sai! - Albus empurrou a irmã para fora do quarto, não desgostando da combinação, porém tampouco interessado em dar o braço a torcer. - Ninguém vai em karaokê, não vai ter programa de velho!

Mas três horas mais tarde, ele estava dividindo um uber com a prima e o melhor amigo, a caminho do Três Vassouras, o pub karaokê mais famosinho de Soho. Lysander mandara uma foto já no lugar, enroscada no pescoço de Hugo e usando uma blusa de lantejoulas fúcsia. Antony Zabini e Hector Asimov também já estavam a caminho. Tudo no look fazia Albus sentir-se hipster demais, mas não de um jeito ruim… na verdade, ele precisava admitir, estava até animado.

Era verdade que estava ignorando todos os prazos de publicidades que devia fazer para seu trabalho com a Internet, porém ele não ligava. Mesmo que karaokê não fosse seu primeiro pensamento para planos de aniversário, tudo prenunciava uma noite incrível, uma celebração mágica.

Ao menos foi o que ele sentiu ao ver o gigantesco bolo com temática de signos que Lys havia encomendado para ele, decorando a mesa que Rose e Scorpius tinham reservado para o grupo de amigos deles. Evangeline e  Peter o parabenizaram, estendendo pacotes de presentes, e Hugo sorriu meio tímido para o primo.

Era a primeira vez dele no grupinho de amigos de Albus, não como primo, muito menos como o irmão mais novo de Rose, mas como o namorado de Lysander, e isso ainda o deixava um tanto reservado - e fazia Rose divertir-se.

— Albus Potter do lixo ao luxo de um ano para o outro!! - Hector ironizou, abraçando o amigo. - Eu prometo bater em você se deixar outro McLaggen estragar seu aniversário alguma outra vez nessa vida!

— E eu imploro que vocês me batam se eu sonhar em me envolver com outro tipinho daqueles! - ele responde, fazendo os amigos rirem. 

— Estou registrando isso, Al! - comentou Scorpius, estendendo uma bebida de gim para ele.

Albus sorriu, aceitando o copo e esquadrinhando o lugar. Estava bastante cheio, pessoas muito mais escandalosamente vestidas do que ele, cantando e dançando, atentas a quem tomava o microfone. Eles riram, brincaram e beberam. Hector sumiu algumas vezes, todas elas retornando para emitir seu relatório a Albus sobre a qualidade - após uma primeira conversa - dos garotos interessantes disponíveis.

Albus costumava dizer que Hector era seu filtro, o controle de qualidade que o permitia não gastar tempo com pessoas de quem ele não iria gostar.

— E aquele bonitinho ali, te dando mole, Al? - perguntou Lysander, indicando com a cabeça um rapaz de cabelo crespo a espera de sua bebida no balcão. Ele sorriu educadamente quando Albus o olhou.

— Nossa, gato! - resmungou Hector - Devia ir lá.

— Claro! - ironizou - É exatamente a minha cara chegar flertando com estranhos! Aliás… - ele ponderou, encarando o rapaz por alguns instantes - ele me parece familiar…

— Olha aí! Seu momento, Al - troçou Zabini, fazendo Albus estender o dedo do meio ao amigo, que gargalhou.

— Sem chance!

Mas Rose e Lysander encheram a paciência de Albus até que ele admitisse estar levemente interessado no rapaz de jaqueta escura e cabelo Black Power que o tinha sorrido, fazendo os amigos soltarem uma quantidade considerável de piadinhas maldosas. Perto das dez da noite eles cantaram parabéns, logo depois de Scorpius e Rose performarem uma cantoria invejável de "You are the one that I want" no karaokê.

O pub juntou-se aos parabéns de Albus, mesmo que a maioria ali sequer soubesse quem era o aniversariante. Eles partiram o bolo e estavam dançando quando o nome de Albus soou alto na chamada do karaokê.

—Nossa próxima dupla é… - o funcionário leu de um Tablet - Albus Potter e Rigel Thomas-Finnigan!

Houve uma salva de palmas e assobios de incentivo, mas Albus apenas olhou confuso para os amigos, que pareciam segurar um riso. Ele estava genuinamente confuso, porém bastou que olhasse para Rose, com seu sorriso malicioso dançando o rosto, para que entendesse que não havia qualquer confusão.

E sim sua prima tramando contra ele.

— O rapaz da jaqueta escura? Você estava certo, ele é familiar… é o Rigel, que joga no time do James. Boa sorte, Albie.

Albus não sabia se queria brigar com Rose - não seriamente, é claro -, esconder-se para não ter que cantar em público, ou apenas virar outra dose daquela bebida de gim que Scorpius arranjara mais cedo. 

O funcionário do karaokê insistiu em chamar por Albus, porque Rigel já estava subindo os dois degraus que levavam ao palquinho do karaokê, e o público do pub passou a entoar chamadas animadas de “Albus, Albus” em meio a palmas. Que tinham começado por Hector e Scorpius, com sorrisos maldosos no rosto.

— Eu mato vocês! - gemeu ao levantar-se para ir ao encontro do karaokê.

— Alguém filma isso, por favor! James Sirius vai adorar ver! - Hugo comentou, fazendo Lysander rir e puxar a câmera do celular.

Ele não costumava ser uma pessoa ansiosa, ao contrário. Albus era dramático e um bocado intenso, mas definitivamente não era ansioso. Naquele momento, porém, caminhando até o palco do karaokê, sendo olhado por uma quantidade considerável de pessoas, Albus podia sentir a temperatura aumentar alguns graus e a palma de sua mão suar como uma tampa de chaleira.

— Sabia que você era você! - foi o primeiro comentário de Rigel quando Albus chegou. - Albus Potter!

— Hey, uhm… você joga com meu irmão, né? No time da faculdade? - cumprimentou educado, secando a mão na calça antes de cumprimentar o garoto que - Deus - ele nunca reparara em como era estupidamente bonito. 

Tinha que ser obra da meia luz do pub, Albus saberia se seu irmão tivesse um colega tão gato! Rigel já não tinha ido na casa deles? Albus não conseguia puxar uma memória da presença do rapaz.

— Ah! Bem vindo, sr. Potter! - o funcionário disse, animado, conferindo a música que Rose inscrevera para eles cantarem. - Uhm… Taylor Swift, 22. Preparados? - ele selecionou a música no aparelho.

— Me pergunto quem foi o gênio que nos colocou para cantar. - resmungou, aceitando o microfone que lhe era estendido.

— Algo me diz que sei quem foi. - riu Rigel - Feliz aniversário, a propósito. 

A piscada que Rigel deu fez o estômago de Albus girar no próprio eixo.

— It feel like a perfect night, to dress up like hipsters, and make fun of our exes… Ah-ah, ah-ah

Albus demorou a entender que música já tinha começado e que Rigel assumira a primeira estrofe. Então emendou a segunda, tão no susto quanto era esperado de um amador de karaokês. A voz de Rigel era aveludada, ele tinha graves bonitos e Albus sentiu-se como uma gralha por cantar em seguida.

— It feel like a perfect night, for breakfast at midnight, to fall in love with strangers. Ah-ah, ah-ah

— Yeah, we're happy, free, confused and lonely at the same time. It's miserable and magical, oh yeah. Tonight's the night when we forget about the deadlines. It's time, oh-oh! 

Não fosse Rigel ter gesticulado, em meio a um sorriso, para que Albus se juntasse a ele no refrão, ele teria ficado perdido encarando o pomo de adão do rapaz subir quando ele segurava notas longas.

— I don't know about you, but I'm feeling 22. Everything will be alright if you keep me next to you! You don't know about me, but I'll bet you want to. Everything will be alright if we just keep dancing like we're 22, 22.

Eles cantaram juntos, Rigel segurou Albus pela ponta dos dedos para que ele desse um giro quando a música falou sobre eles continuarem dançando como se tivessem vinte e dois, e o garoto não teve qualquer reação além de continuar, no automático, cantando e ignorando o gelado em suas entranhas pela proximidade daquele homem.

— Yeah, we're happy, free, confused and lonely in the best way. It's miserable and magical, oh yeah. Tonight's the night when we forget about the deadlines. It's time, oh-oh!  — Albus cantou na segunda parte, tentando agir como se fosse habitual cantar, de surpresa, em um karaokê com um desconhecido conhecido em quem ele estava interessado.

— I don't know about you, but I'm feeling 22. Everything will be alright if you keep me next to you! You don't know about me, but I'll bet you want to. Everything will be alright if we just keep dancing like we're 22, 22. 

Rigel parecia ser o rei do karaokê, confortável, afinado, animando o público do pub com um carisma que exalava de seu sorriso de dentes perfeitamente brancos. Ele assumiu, sem o menor problema a parte que antecedia o refrão pela última vez, fazendo algumas pessoas juntarem-se a eles na cantoria.

— It feels like one of those nights, we ditch the whole scene. It feels like one of those nights, we won't be sleeping. - sem aviso, ele voltou-se para Albus e cantou olhando fixo demais nos olhos verdes do garoto. - It feels like one of those nights. You look like bad news, I gotta have you. I gotta have you.

Se houve um sorriso malicioso em meio àqueles versos, Albus não teve tempo de processar, porque Rigel imediatamente indicou que Albus devia juntar-se a ele naquela elevação para a última parte. 

Eles cantaram o último refrão com uma animação que Albus não sabia que tinha, puxando pulinhos e uma dancinha inventada na hora. Rigel assumiu a primeira voz e Albus fez a segunda, rindo e tentando entender o que estava acontecendo, de fato.

A música acabou e houve uma explosão de palmas, gritinhos e assobios. Albus pode ver Rose berrar da mesa deles, enquanto Hector fazia um gesto malicioso. Rigel agradeceu as palmas, devolvendo os microfones deles, já que Albus não parecia consciente do que devia fazer. Ambos estavam um tanto ofegantes por aquela enorme quantidade de energia que tinham colocado para cantarem juntos.

— Você é uma ótima dupla de karaokê, Albus! - Rigel comentou quando eles desceram do palco, vendo duas garotas subirem para escolherem uma música.

— Você que fez magia harmonizando com meu grasnado. - Rigel riu e fez o baixo ventre de Albus repuxar um tantinho. - Eu… estou numa mesa com me-

Uma parte dele queria continuar alguma conversa com Rigel, só não sabia exatamente como e, definitivamente, não perto de Rose, Scorpius e Lysander, com seus sorrisos maliciosos e piadinhas sacanas.

— Uma noite perfeita para roupas hipsters e falar mal dos exs, sei como ele. - ele brincou, dando um empurrãozinho em Albus. 

— Para se apaixonar por estranhos, você sabe. - complementou, encarando Rigel e sentindo o rosto arder. Albus não flertava descaradamente daquele jeito!

Rigel deu um risinho, entendendo o sinal de Albus, e mordiscou a boca de um jeito divertido, como segurando um riso. 

— Você não me conhece, mas aposto que quer. - continuou ditando a letra.

— Você é bom de apostas, já te disseram isso. - Rigel gargalhou.

— Que vai fazer amanhã?

— James me intimou a inaugurar meu videogame de aniversário. - admitiu com um risinho, dando de ombros. - Fazer umas coisas de trabalho.

— Bem, senhor “You-look-like-bad-news”, e eu estou intimando-o para uma cerveja aqui, para cantar uma ou outra música.

— Eu aceito. - Albus riu. - Mas eu não canto.

— Isso a gente ainda vai ver. 

Rigel piscou uma outra vez, fazendo as entranhas de Albus revirarem.

— Say you remember me — cantarolou baixinho, apenas para ver o sorriso malicioso e contido de Rigel brotar enquanto ele se despedia. - even if it’s just in your wildest dreams. Até amanhã, Rigel.

— Feliz aniversário, Albus. - ele gritou de volta, quando Albus já estava a uma mesa de distância e alguém cantava outra música da loirinha.

“Ocean blue eyes looking in mine. I feel like I might sink and drown and die”

Albus já sabia o que escolheria para o karaokê do dia seguinte. Definitivamente ele não ligava muito de parecer um idiota, ele estava muito feliz, livre e confuso com Rigel dando em cima dele para importar-se com aquele tipo de coisa.

— Obrigado pelo aniversário diferente. - murmurou para Rose assim que as piadinhas dos amigos sossegaram.

— Feliz vinte e um, Albie. - ela riu, lançando-se em um abraço apertado no primo.