A ironia em amar você escrita por SS Saibot


Capítulo 4
Bonitinho, mas detestável.


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura!



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Muito pouco se podia dizer sobre Isabella, a garota que definitivamente não era romântica.

Ela continuava não sendo, óbvio, mas já não via problema em bisbilhotar um garoto como se fosse uma stalkear. Pura tensão sexual, diria ela se você perguntasse algo sobre.

Mas, por via das dúvidas, é melhor que não pergunte. Mesmo. 

— Alunos que não completaram dezoito anos não podem esquecer a autorização para o passeio a Universidade de Maryland no dia quatorze de fevereiro. Tomem nota disto para que não ocorram problemas de última hora. Também não esqueçam suas anotações referentes a Orgulho e Preconceito, com sorte poderemos discuti-la com o doutor Creevey. Quem ainda não leu o livro, pode pegá-lo na biblioteca — dizia o professor Langford enquanto a turma recolhia suas coisas e se dispersava.

Isabella bem que tentou solicitar o exemplar de Jane Austen após o almoço, mas descobriu que todos os disponíveis já haviam sido pegos pelos seus colegas de turma. Teria que ir até a biblioteca de Baltimore e, com sorte, o exemplar disponível ainda estaria lá.

Não que ela estivesse procurando uma desculpa para ver o garoto da biblioteca. Não mesmo. Ela só, bem, precisava mesmo daquele livro e não queria incomodar sua amiga, Ângela, que tinha dois exemplares em diferentes edições dele em casa.

Além disso, também estava muito sedentária ultimamente. Uma boa caminhada a ajudaria a ficar mais disposta.

Já estava decidida. 

Apressou-se na saída da última aula, ainda endireitando no corpo a saia godê preta que usava sobre grossas meias roxas estilizadas, e foi direto para a biblioteca. Sua bolsa estilo carteiro pesava em seu ombro direito e seu nariz estava avermelhado pelo frio que fazia na cidade, tornando o percurso de quinhentos metros até a biblioteca, penoso como quilômetros.

Querendo ir embora o mais rápido possível, pois tinha um trabalho a fazer na casa de uma de suas colegas ainda naquele dia, seguiu para a prateleira que vinha visitando já há muito tempo e sorriu ao perceber que iria interferir na sua fresta de espio ao tirar o exemplar de Austen de lá.

Quando ela agarrou o exemplar de Orgulho e Preconceito para tirá-lo do lugar, porém, sentiu outra mão puxá-la do lado oposto. Fez um pouco mais de força e o livro chegou a escorregar alguns centímetros em sua direção, mas logo foi brutalmente puxado e ela se viu soltando o objeto e dando um grande passo para trás com o sobressalto que teve.

Consternada, Isabella contornou a prateleira e entrou no corredor seguinte, sem nem pensar no que estava fazendo.

— Escuta aqui, eu...

O garoto da biblioteca estava a encarando, um sorriso vitorioso nos lábios e o exemplar de Jane Austen nas mãos. Ela cogitou engolir suas palavras, mas elas regurgitaram e logo suas mãos foram para a cintura, pronta para uma briga em nome do romance — que podia muito bem ser com aquele cara gostoso — mas que, no momento, era por uma causa maior: suas boas notas.

Faltava muito pouco para ela bater o pé no chão como uma garota mimada e ela não tinha lá muita certeza se queria passar essa impressão para aquele pedaço de pudim com calda de damasco, mas era tarde demais. 

— Pode me devolver o livro? — indagou, arqueando uma de suas sobrancelhas.

Esperava que sua expressão fosse intimidadora e não a de uma piromaniaca e quem diria, afinal? Ninguém que a visse poderia adivinhar que ela passara os últimos três meses e doze dias espiando o cara pela fresta de dois livros surrados na biblioteca municipal.

O garoto riu como se ela tivesse dito algo muito engraçado. Só que ela era péssima em piadas, ainda mais quando não estava nem tentando.

— Posso saber do que você está rindo? Preciso do livro. Devolva!

O garoto olhou dela para o exemplar em suas mãos e de volta para ela.

— Esse?

As mãos dela se fecharam em punhos, mas eram pequenas demais para parecerem ameaçadoras. 

— Sim, esse mesmo! — grunhiu.

— Por que eu devolveria? Preciso dele, moça.

— Peguei primeiro — justificou com uma careta e ele riu.

— Não, eu peguei primeiro.

Se os olhos de Isabella pudessem ficar presos atrás das órbitas, ficariam com a força que ela os revirou. 

— Eu não tenho tempo para isso.

— Ótimo, então estamos resolvidos — E o desconhecido começou a lhe virar as costas.

— Ei, você tem algum problema por acaso? Não me entendeu? Eu realmente preciso desse livro.

Ele bufou e foi tão fofo que ela sentiu um pouco de sua raiva diminuir instantaneamente. Um pouco, não toda ela. 

— Não é a única que possui necessidades, senhorita.

A bibliotecária ressurgiu de seu sono das cinzas e sibilou um pedido de silêncio para os dois com a careta mais assustadora que Isabella já vira.

Os dois se viraram para ela, moveram os lábios em um pedido mudo de desculpas e viraram-se um para o outro em sincronia.

Isabella apontou um dedo para o outro e gritou, sussurrando:

— Mas, garanto que as minhas são mais urgentes.

Foi a vez dele revirar os olhos e aquilo a irritou ainda mais.

Bonitinho, mas detestável. 

— Deixe-me ver, você é uma daquelas garotas românticas que gostam de ler o mesmo livro pela centésima vez?

— E você é um daqueles garotos introvertidos que se masturbam com um romance de época? — Ela rebateu, cruzando os braços. Só não se sentia mais satisfeita consigo mesma pela resposta pois estava óbvio que o garoto poderia ter quem quisesse para fazer o trabalho sujo por ele e ela se incluía naquela sentença. — O tipo de garota que eu sou não interessa a você, querido.

— Por isso, eu vou ficar com o livro — findou o outro, balançando o objeto com malícia.

Isabella abriu e fechou a boca.

— Eu. Preciso. Desse. Livro — incitou pausadamente. — Consegue entender a minha língua?

Do outro lado do espaço, a bibliotecária sibilou seu "shiiii" prolongado novamente.

— E você consegue entender a minha quando digo que preciso desse livro também?

— Isso não me interessa. Quero o livro. Agora. 

— Já experimentou pedir "por favor" ou essa palavra não existe em nenhum dos livros que você leu? Regras básicas de etiqueta, moça.

— Você me encaixou em um estereótipo, foi mal-educado primeiro.

— Você disse que eu me masturbo com um romance de época. Isso é uma coisa muito educada a se dizer!

Isabella suspirou. 

— Certo, desculpe — pediu a contragosto. 

O garoto sorriu.

— Certo, pode pegar o livro.

Ela estendeu a mão para alcançar o livro, desconfiada com a carta branca, e estava certa. No último instante, o espécime do sexo masculino retirou o exemplar de seu alcance.

Ele riu de sua expressão que, provavelmente, era cômica.

— Depois que eu pegar, é claro.

Ela rosnou para ele e o asno teve a audácia de rir ainda mais em sua cara.

— Seu...Seu... — Estava sem palavras.

— Estou brincando, querida — Ele disse, estendendo mais uma vez o exemplar. — Pode levar.

Ela não deu espaço para que ele fosse jocoso com ela novamente. Avançou e rapidamente retirou o livro da mão auspiciosa dele, como se estivesse dando um bote.

Homens — bufou ao pegar o livro e sair rapidamente do corredor ao som do riso do desconhecido.

Ela sabia que não daria certo entrar no território daquele garoto.

 


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Notas finais do capítulo

Um beijo imenso >>>



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