Where We Belong escrita por Mad


Capítulo 4
Do Ponto Mais Baixo da Colina


Notas iniciais do capítulo

Boooooa noite (ou dia -q aqui agora é noite xP) a todos vocês!! Como estão?? Eu espero que estejam bem! Pq eu estou, por vários motivos, entre eles O GAMEPLAY DO HORIZON FORBIDDEN WEST AAAAAAAAA sim estou hypado, como percebeu??? Eu tô maluco com as novidades e adoraria saber o que vocês acharam também! Enfim, nesse clima de hype trago o capítulo 4, onde nossas duas protagonistas precisam pensar em tomar as rédeas de um problema iminente! Isso tudo em meio a um luto, e um conflito interno. Falo com vocês já já, por hora aproveitem!



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"Entrada ES-001. Eu acordei, mesmo tendo certeza de que não iria acontecer. Eu agradeceria aos pirados excêntricos do Far Zenith mas eu devo estar uns mil anos atrasada.

 

Deu tudo certo, exceto pelas partes que não deram… Descobri que o Ted estava realmente empenhado em ser o maior filho da puta da história, de novo. E que uma clone minha resolveu a situação enquanto eu estava dormindo, então podemos colocar na lista de vezes que o Protocolo Lightkeeper salvou o dia sem querer…

GAIA se foi… APOLLO se foi… E os Alphas também. Eu sei lá qual o do estado do Zero Dawn, pode ser qualquer coisa na escala de "Ok" a "Já era". Me sinto presa no chão, com medo demais de ir verificar.

Me desculpem, pessoal. Eu falhei com vocês."

 

Aloy acordou assustada. 

 

Com um grito abafado, Aloy levantou parcialmente seu corpo e abriu os olhos. A luz da manhã, agora não contida por nenhuma parede, inundou sua visão e a forçou a cobrir o rosto com as mãos. Sua respiração foi se acalmando e a brisa levava aos poucos o vago pesadelo embora. Com a vista já acostumada com a luz, virou um pouco seu tronco e seu pescoço para observar uma adormecida Elisabet, confortavelmente apoiada em sua bolsa e encostada na árvore, com alguns dos objetos em seu colo. Ficou aliviada por não tê-la acordado com seu grito pouco antes, mas  tendo em vista o longo caminho pela frente, decidiu acordá-la. Levando sua mão devagar até o ombro da doutora, disse gentilmente: 

 

“Elisabet, já está de manhã.” 

 

A mais velha ameaçou abrir os olhos algumas vezes antes de o fazer de fato. Via com os olhos entreabertos o caminho que percorriam anteriormente e, ao seu lado, aquela que lhe acordara mais uma vez.

 

“Bom dia."

 

Elisabet disse em um tom baixo, penoso. A Nora percebeu isso e disse, enquanto se levantava e batia a poeira de sua vestimenta:

 

“Você se acostuma com o chão, aliás, acho que não consigo dormir de outro jeito mais.”

 

Ambas compartilharam uma risada curta, insignificante. Não era o solo rígido o que mais incomodava Elisabet. Como poderia ser? 

 

"Estava falando sozinha ontem a noite? Desculpe, não pude deixar de ouvir."

 

A doutora saiu de um pequeno transe enquanto recolhia seus pertences para dentro da bolsa novamente e virou-se para a mais jovem, que segurava sua própria bolsa medicinal e amarrava ao longo da parte anterior do galope. 

 

"Ah... aquilo. Era um diário, acho que dá pra chamar assim." Ela respondeu cabisbaixa, ainda deitada.

 

"Mas planeja que alguém escute?"

 

Elisabet riu ironicamente.

 

"Planejamento não tem dado certo."

 

Ela tinha um ótimo ponto. Aloy não pôde assinar a conversa com uma risada libertadora como queria. Definitivamente não era possível. Talvez as más notícias finalmente haviam deixado o devastador efeito da tristeza no coração de Elisabet? Talvez o fato de estar sem rumo? Eram teorias plausíveis mas que Aloy não sabia como comprovar sem ser desnecessariamente invasiva. Sua única opção era permanecer firme em sua postura. 

 

"Vamos, temos pelo menos mais um dia e meio de viagem se tudo der…"

 

Ela disse enquanto subia no Galope, ansiosa para continuar a viagem. Era apenas ela, porém. Elisabet continuava deitada embaixo da árvore, com um dos braços apoiado em sua testa. Contemplava o horizonte como uma mera espectadora, sem expressão. Aloy desceu da montaria, pronta para repetir o chamado, antes de ser interrompida pela voz levemente mais nítida da mais velha. 

 

"Desculpa garota… Mas acho que precisamos conversar."

 

Ela permaneceu quieta, mesmo com o momentâneo atraso de Aloy para responder.

 

"Ah, claro." Ela caminhou até a que agora se encontrava sentada, virada para a mesma posição, e sentou-se logo ao lado. "O que foi? Desculpe, não quis te apressar."

 

"Eu deveria ter pressa. Muita pressa. Mas..." A confusão na expressão da caçadora era aparente o suficiente para que Elisabet continuasse a falar.

 

"Olha… Pode parecer ridículo mas eu não contava com isso. Sabe, acordar."

 

"Mas isso não é bom?"

 

Elisabet suspirou, e a mais nova finalmente percebeu algumas lágrimas se formando em seu rosto.

 

"Aloy, eu não deveria estar aqui. Eu deveria ter morrido em 2066 junto com todo o resto da raça humana, e tudo deveria começar do zero!" Seu tom de voz subiu, assim como no dia anterior, mas com um teor trágico de melancolia. Aloy ameaçou falar, sem conseguir tomar a coragem e as palavras necessárias. Elisabet então continuou seu desabafo.

 

"Eu vim até aqui pra isso… Morrer em casa. Mas por um segundo, essa ideia idiota da me congelar veio na minha cabeça. Por que não, não é mesmo?" Ela dizia em um misto de deboche e tristeza. "Uma ciência incompleta, provavelmente nem funcione!" Mas agora eu tô aqui, sozinha nesse mundo quebrado, enquanto meus amigos e tudo que eu conheço estão mortos! Eu não sei o que fazer Aloy, mesmo que eu volte com você pra seja lá onde for…"

 

Teve então suas teorias comprovadas. Uma leitura de mentes que Aloy não imaginava ser capaz de realizar com tanta precisão. Estava ao lado não da figura quase mitológica responsável pelo admirável mundo novo, mas sim de uma mulher fora de seu tempo, se sentindo culpada por ter sobrevivido e frente a uma situação a qual era incapaz de se preparar. Era uma questão que, mesmo fora de seu alcance, não poderia nem em um milhão de anos deixar não resolvida.

 

"Escute, Elisabet." 

 

Disse no mesmo tom de voz gentil com o qual dialogava com a doutora no dia anterior, esta que, com seus olhos marejados, não pôde deixar de olhar para quem estava falando. 

 

"Vamos tentar ir devagar, ok? Você está aqui agora, isso não vai mudar. O que você precisa fazer?"

 

O admirável mundo novo não estava como o planejado, estava longe disso na verdade. Era sem dúvidas o primeiro item na lista de prioridades. 

 

"Tem uma coisa… Mas não acho que seja possível. Não mais."

 

"Mas você não tem certeza, tem? Pode me contar."

 

Alguns segundos de silêncio se passaram, obra de um ponderar desesperançoso de Elisabet. Disse então, apenas para suprir a conversa:

 

"GAIA disse algo sobre reparar o Zero Dawn, não antes de purgar o HADES. Bem, você o purgou, mas teríamos que dar um jeito de reunir as funções subordinadas que se espalharam por aí… Sem a GAIA não sei como isso seria possível."

 

Era uma problemática longe das especialidades de Aloy, e se aquela por trás dos milagres do Zero Dawn não tivesse uma saída, ela não teria. Nada que a impedisse de ter ideias entretanto.

 

"Mas e se alguma outra máquina entrasse no lugar da GAIA?"

 

"Outra? Aloy, não tem nada como a GAIA nesse mundo… Bem, já teve. É uma boa ideia, mas…"

 

A Nora se viu mais uma vez no direito de interromper.

 

"Não, escute. Eu falei com CYAN e a ajudei quando viajei para o Corte semanas atrás. Você não ajudou a criar ela?"

 

"... CYAN ainda está ativa?

 

Um único nome desencadeou centenas de milhares de pequenas peças de dominó através da mente brilhante da doutora. A IA responsável pela instalação Firebreak havia sido uma das criações mais desafiadoras do mundo antigo, e as possibilidades se abriram como janelas enquanto pensava, o suficiente para fazê-la levantar, batendo a poeira como a mais jovem havia feito. Ambas se olharam esperançosas.

 

"Sim, nas terras Banuk. Está pensando em…"

 

Elisabet se aproximou antes de falar:

 

"Olha, eu sei que tínhamos outros planos, mas eu idealizei o Zero Dawn. Meus amigos morreram por ele. Se ele tá com problemas… Eu também estou."

 

"Então vamos consertar." Aloy respondeu sem o menor atraso ao se levantar. O propósito havia preenchido uma lacuna assustadora no caminho de ambas, e só havia o caminho a frente para percorrer. Subindo no Galope e estendendo a mão para a mais velha, ela completou: "Vou te levar até CYAN."

 

Elisabet sorriu, tomando a mão de Aloy e subindo na montaria, que iniciou seu movimento acelerado através do caminho de volta para o Solar. 

 

"Você tirou essa carta da manga na hora certa…"

 

Ainda em luto, a possibilidade de ser útil ao seu projeto de vida mesmo após mil anos era a única coisa a sustentando, além de seus braços agarrados firmemente a cintura daquela no controle da máquina que cavalgava sem hesitar.

 

Com o passar da viagem, o sol brilhava logo à frente de seus olhos, ofuscando de forma irritante o caminho. Em resposta, Aloy ativou seu Foco para que tivesse como destaque a rota de volta para a cidade de Pôr do Sol. 

 

"Hm, fico admirada desse Foco ainda funcionar. Como achou ele?"

 

Aloy escutou a pergunta após um bom tempo em silêncio, apenas com as duas observando a paisagem passar como um filme. Era uma pergunta que a levava a tempos bem distantes.

 

"Quando eu era menor, caí numa ruína dos Antigos, e isso estava junto de alguém morto. Achei legal e comecei a usar."

 

Elisabet riu, frente a situação inusitada. O Foco era uma das tecnologias mais simples e comuns de sua era e mesmo assim, em ambiente de comparação, se tornava um aparelho extremamente avançado, capaz de análises precisas e de auxiliar o usuário com presteza. Era um grande feito alguém sem experiência com tecnologia entende-lo e usá-lo.

 

"Eu teria essa conversa com qualquer criança da minha época. Tirando a parte do cara morto, claro. Todo mundo tinha um, e quem não tinha, queria ter.

 

"É uma vantagem enorme na hora de encontrar detalhes, mas vocês usavam para que?"

 

"Bem… Pra tudo, praticamente. Pesquisar, analisar, conversar… Aliás, por falar nisso."

 

Elisabet ativou o próprio Foco, e ambas ouviram um sinal sonoro logo depois.

 

"O que fez?"

 

"Agora nossos focos estão conectados, vou ter acesso ao que você analisou até agora. Com a sua permissão claro."

 

Aloy sorriu mesmo sem Elisabet conseguir ver. Isso pouparia certas perguntas no futuro, contanto que a doutora encontrasse as informações.

 

"Pode ficar a vontade, não tem nada comprometedor aí."

 

"Você ficaria surpresa, na minha época isso era um problemão."

 

"O que, privacidade?" Aloy costumava estar sozinha, principalmente em momentos íntimos. Mesmo Rost, sua figura paterna, lhe dava a liberdade de ter seu espaço pessoal, uma virtude que a mesma aplicava agora com Elisabet.

 

"Uhum, digamos que a gente gostava de saber e de contar…"

 

"Os antigos eram um bando de enxeridos, então?" A garota pela primeira vez ouviu uma gargalhada sair da boca de Elisabet, confrontada pelos próprios maus hábitos de seu extinto povo.

 

"Éramos um bando de idiotas, Aloy."

 

O Galope se movia rapidamente, cobrindo uma grande distância em tempo hábil. Aloy queria se distanciar do Oeste Selvagem o mais rápido possível, agora que tinha em sua companhia alguém com um duvidoso, se não nulo, preparo. Essa pressa, aliada a um conhecimento maior sobre o terreno que já havia percorrido, foram o suficiente para cortar boa parte do tempo de viagem estimado por Aloy, e dessa forma, os últimos raios de sol do dia brilhavam entre as nuvens esparsas quando finalmente chegaram a um terreno desértico. 

 

"Acordada aí atrás?" A jornada era preenchida por curtas conversas, mas Aloy estranhou a quietude que se mantinha pelas últimas horas. Entre bocejos, Elisabet respondeu:

 

"Mais ou menos… Ficou tudo tão quieto que o sono veio rápido. Onde estamos?"

 

Quieto? 

 

Máquinas povoavam o mundo de forma bem distribuída. Aloy encontrava rebanhos e patrulhas com uma frequência considerável em suas viagens pelo território a Leste. Esperava ainda mais frequência ao passo que adentrava as terras proibidas, mas com a exceção da máquina misteriosa de um dia antes e alguns rebanhos, ela não se lembrava de ter visto muitas máquinas. Isso pairou sobre a cabeça da caçadora, o suficiente para a fazer esquecer de responder Elisabet, que permanecia falando.

 

"...eu até pareço uma criança entediada no banco de trás falando assim... Aloy?"

 

"Hm? Ah, desculpe. Me distraí."

 

"É, você parecia longe. Tá tudo bem?"

 

"Ali." ela apontou para uma abertura no meio de duas colinas, no fim da subida que percorriam. "Depois dali, vai faltar bem pouco."

 

"Ótimo, vou poder me espreguiçar."

 

"Pelo menos não encontramos nenhum proble-"

 

O motivo da interrupção não era nada mais nada menos do que a prova definitiva de que o universo escutava Aloy atentamente, pronto para esmagar suas esperanças. 

 

Ao passar pela abertura, ambas eram capazes de observar um canyon que se entendia por dezenas de quilômetros. Mas a visão que deveria ser encantadora era manchada por centenas de brilhos de cor prateada, como um espelho do céu na terra vermelha, representando centenas de máquinas. Os olhos arregalados transmitiam espanto no rosto da mais jovem, enquanto na mais velha mostravam o mais puro fascínio. Os dois Focos foram acionados ao mesmo tempo, com propósitos diferentes.

 

"A variedade… Eu idealizei o projeto mas nunca poderia imaginar isso!" 

 

A voz empolgada de Elisabet foi cortada pelo tom preocupado de Aloy:

 

"Eu sabia que estava muito quieto… Todas as máquinas da região se reuniram aqui praticamente. É o nosso único caminho."

 

"Não podemos ir por cima?"

 

Elisabet apontou para as bordas com canyon, consideravelmente mais iluminadas pelos fracos raios de sol do que a fissura em si. 

 

"É muito irregular… o Galope só vai tropeçar e vamos ficar presas." Respondeu Aloy, descendo da montaria logo depois.

 

Mesmo estando muito longe para uma análise detalhada do Foco, Aloy reconhecia todos os modelos de máquinas a olho nu.

 

"Sem sinalizadores então sem Ardilosos… Vários Vigias e Pernalongas mas sem máquinas muito grandes…"

 

Era como se pensasse em voz alta mas ainda sim sussurrando para si mesma, fazendo com que Elisabet não entendesse suas palavras. A Nora voltou a falar normalmente após alguns segundos, apontando para o horizonte.

 

"Olha ali, elas não cobrem o canyon todo. Se passarmos por elas devagar vamos ter caminho livre."

 

"O quão devagar?"

 

Pegando algumas pedras no chão, Aloy atrasou sua resposta. Voltando a posição de cavaleira do Galope, enfim disse:

 

"Igual as noites no inverno." 

 

Tomando o caminho de descida para o fundo do canyon, o número de máquinas a espreita aumentava exponencialmente, até estarem cercadas por luzes prateadas em ronda. Aloy diminuiu a velocidade do Galope até a menor possível, e agora ambas se encontravam numa penosa procissão através da fissura, ainda mais escura com a noite em seu início.

 

Em meio ao desconhecido e ao perigo iminente, a geralmente destemida Elisabet respirava o mínimo possível, observando apenas com sua visão periférica os diversos clarões. Aloy, por sua vez, se mantinha focada, analisando o caminho das rondas com o aparelho em seu ouvido e contornando-os com precisão. 

 

Com a quantidade de máquinas, Aloy sabia que precisava se preparar para o pior, que aconteceu quando a luz prateada de um Vigia iluminou seu rosto, sua montaria e sua passageira. Sem perder tempo, se inclinou para frente para diminuir seu perfil, com Elisabet fazendo o mesmo logo em seguida. Tomando em mãos uma das pedras que havia pegado antes, sutilmente fez o movimento para jogá-la alguns passos atrás do Vigia, com sucesso o fazendo se virar livrando o caminho a frente.

 

Aloy conseguiu ouvir um suspiro de alívio vindo de trás de si, secretamente sentindo o mesmo. Aos poucos, as máquinas ficavam mais dispersas, o que consequentemente tornava o caminho mais tranquilo, assim como o coração das duas. 

 

Um leve tremor.

 

Aloy sentiu, Elisabet sentiu, e provavelmente a máquina que as carregava também. Sutil o suficiente para Aloy pensar consigo mesma:

 

"O terreno é instável…"

 

Não com o tom de certeza e sim uma tentativa de calar um pensamento, tão sutil quanto o tremor. 

 

"Está tudo bem?" 

 

Aloy ouviu a pergunta e silenciou ainda mais os pensamentos, respondendo:

 

"Sim, estamos quase lá."

 

Disse com confiança o suficiente para aumentar um pouco a velocidade do Galope, ainda sem chamar atenção das máquinas gradualmente mais dispersas.

 

Mais um tremor, mais agressivo.

 

"Só precisamos sair…"

 

Mais uma tentativa de acalmar seus ânimos, com menos sucesso dessa vez. Sabia que havia cometido um grave erro, mas ainda tinha esperanças de corrigi-lo simplesmente cavalgando para longe. 

 

"Aloy, o que-" 

 

Um último tremor interrompeu Elisabet, antes de finalmente o chão se romper com um grande estrondo. Aloy não podia olhar para trás, mas sabia exatamente do que se tratava. Elisabet por sua vez virou-se para trás, olhando com clareza a enorme máquina que saía voando do solo, com suas mandíbulas giratórias apontadas diretamente para onde estavam. Caía em um arco perfeito até finalmente fazer contato com o Galope, acertando parcialmente suas patas traseiras e desequilibrando o suficiente para que Elisabet caísse no chão, rolando na terra vermelha e seca. Em seu momento de adrenalina, Aloy ainda avançou bons metros até perceber o ocorrido, parando imediatamente. Olhando para trás, notou que não havia sinal da Britadeira e suspirou aliviada, porém avistou dois Pernalongas se aproximando de Elisabet. 

 

No chão, Elisabet ouvia os chamados por seu nome de forma distante, e instintivamente tentou se levantar apenas para cair de novo. Os diversos arranhões em seus braços eram suportáveis, mas a dor no seu tornozelo agora a imobilizava. 

 

Antes de tentar se levantar de novo, escutou uma explosão logo a sua frente, e conseguiu ver a silhueta de duas máquinas caindo. Aloy chegou logo em seguida.

 

O tremor voltava a ocorrer.

 

"Vem, eu te ajudo. Temos que ir!"

 

Sem dizer nada, Elisabet segurou a mão da jovem para se levantar e se apoiou em seus ombros para voltar rapidamente ao Galope.

 

"Eu preciso que você tome as rédeas agora."

 

"Eu? Mas porque? Aloy, eu nunca…"

 

"Lembre do Lewis! Eu preciso de você para sairmos dessa." 

 

O tremor ficava mais forte. A lembrança de suas experiências passadas e falta de tempo não permitiam outra resposta de Elisabet, subindo na montaria com o apoio de Aloy. A mais jovem tomou o lugar que antes era da doutora e ambas voltaram a se mover. 

 

O movimento desajeitado de início deu lugar a um galope suave, surpreendendo Elisabet. Pensou em dizer algo, sobre como o controle da máquina se mostrou mais previsível do que o de um cavalo, mas a tensão do momento costurava seus lábios.

 

Aloy tomou em mãos seu estilingue, e preparou no disparo uma de suas poucas esferas explosivas. Conseguia ver o solo se rachar pouco a pouco, aumentando a expectativa para o próximo ataque. Enfim, em mais um estrondo, a máquina gigantesca se lançou em direção às presas, ferozmente buscando triturar tudo em seu caminho. 

 

Porém, nada frente ao preparo.

 

Ignorando os tremores e a irregularidade do cavalgar da máquina, Aloy focou apenas em seu disparo, observando o explosivo percorrer a distância até o interior da Britadeira. O atraso fez seu coração parar, até enfim a grande explosão ocorrer segundos depois, abrindo um grande buraco na parte intermediária da máquina. Seus olhos prateados se apagaram e seu pouso desajeitado assinou o sucesso da fuga.

 

Ao passo que tomavam distância do perigo, apenas a respiração ofegante das duas sobreviventes podia ser ouvida. As máquinas confusas convergiam para a origem do grande estrondo e deixavam livre o caminho a percorrer para fora da fissura. Sentindo toda a adrenalina se dispersar através da brisa, não conseguiram evitar as risadas aliviadas pouco depois.

 

"Eu não tenho mais idade pra isso garota, puta merda."

 

"Não diga isso, você está ótima."

 

A noite finalmente chegava por completo, com apenas as luzes no céu como decoração.

 

"É… Dizem que 1000 é o novo 30."

 

O Grande Portão, Pôr do Sol.

 

O bater de canecas servia como vírgulas nas conversas em altíssima voz. Os membros da vanguarda pareciam não ter limite de histórias para contar com a chegada da madrugada em Pôr do Sol, cidade que agora tinham o dever de ocupar por ordens do Rei Sol. Erend, seu líder, secretamente dividia atenções com suas ordens secundárias. 

 

Ele a aguardava.

 

"Quando eles explodiram o portão, pensava que estávamos acabados. Que maldito caos foi aquele."

 

"A Vanguarda vai poder dizer pra sempre que enfrentou os demônios do Sol Negro, aquele caos nos marcou na história!"

 

Erend ouvia seus camaradas pronto para temperar seus contos de glória com mais contos de glória, quando ouviu o sinal sonoro de uma trombeta, logo acima do assentamento onde estavam reunidos. 

 

"Não toquem na minha caneca, eu vou saber."

 

Entre risos, subiu a pequena escada dando de encontro com o patrulheiro Carja responsável pela trombeta.

 

"Senhor, tem uma máquina vindo direto pra cá. Bem estranho."

 

"Máquina? Mas é só uma?"

 

Erend se mostrava confuso, até enfim olhar para baixo e ver a aproximação de Galope, com duas passageiras.

 

"Não é só uma máquina seu idiota, ela voltou!" O entusiasmado Oseram inclinou seu rosto para o outro lado, gritando alto o suficiente para toda a cidade ouvir: 

 

"Abram os portões!"

 

Entendendo a seriedade da ordem, os encarregados lentamente abriram os portões.

 

Aloy, de volta ao controle do Galope, abriu um grande sorriso ao notar a cena a sua frente e tratou de anunciar para sua passageira:

 

"Chegamos, e parece que não somos as únicas felizes."

 

"Mal posso esperar pra não conseguir dormir, depois daquela loucura."

 

Diminuindo o ritmo enquanto passava pelo portão, ambas conseguiam ouvir os membros da Vanguarda comemorando seu retorno. Erend, descendo rapidamente as escadas, disse enquanto sorria em direção a caçadora.

 

"Vamos com calma, pessoal, vocês sabem que a moça não gosta de agitação."

 

Enfim parando a montaria e descendo, frente a frente com seu amigo, Aloy respondeu;

 

"Posso não gostar, mas parece que a agitação gosta de mim."

 

"Ora, você precisa me contar tudo! Foi até o Oeste Proibido e voltou, deve ter sido…"

 

Erend interrompeu a si mesmo ao finalmente notar a acompanhante de Aloy, arregalando os olhos e dizendo enquanto se aproximava:

 

"Então você é a Mãe da Aloy? Caramba, vocês são iguaizinhas!"

 

Mãe?

 

A confusão era clara como a luz da lua em seus rostos. Elisabet não tinha filhos. Nunca havia encontrado tempo para isso. Em sua mente imaginou o por que de ter sido endereçada como tal, dizendo de forma desajeitada:

 

"Bem…"

 

"Sim, é ela. Mãe, esse é o Erend. Ele me ajudou com… Bem, muita coisa." 

 

Ao se referir a Elisabet como mãe, a voz de Aloy perdeu levemente o tom. Elisabet por sua vez continuou em sintonia com tal meia verdade, ficando calada e sorrindo em direção a Erend.

 

"Olha, ela me ajudou mais que eu a ajudei. Sua filha é incrível. É um prazer te conhecer."

 

"O prazer é todo meu." Enquanto respondia, Elisabet desceu do Galope apenas para perder o equilíbrio logo em seguida, vítima da dor em seu tornozelo. Erend instintivamente lhe deu apoio, e Aloy olhou para a doutora com certa preocupação.

 

"Erend, tem alguém que poderia cuidar disso? Tivemos problemas mais cedo."

 

Olhando para os lados como se procurasse alguém, Erend fez sinal para seus colegas, que vinham da mesma escada de antes.

 

"Levem ela para o curandeiro, e tratem-na bem." Um dos membros da vanguarda gentilmente ofereceu apoio, e Elisabet olhou para Aloy aguardando aprovação, recebendo-a da jovem sem hesitação. 

 

"Curandeiro? Na Vanguarda?" 

 

Aloy disse entre risos, deixando o grande homem ao seu lado desconfortável.

 

"Não, não, nem vem. Ele veio com o rei-sol. Por mim já teria voltado, mas acho que o Avad pensou em você deixando ele aqui."

 

Ambos subiam as escadas de volta para o assentamento acima do grande portão, um ambiente sem muitos detalhes exceto a fogueira no lado oposto a entrada e uma grande mesa, decorada com canecas de cerveja meio cheias.

 

"Amanhã voltamos à Meridiana. Avad mal pode esperar pra te ver, ele ficou todo preocupado quando…"

 

"Erend, calma. Eu não vou voltar, não ainda."

 

Ao ser interrompido com a informação inesperada, Erend olhou de volta com confusão.

 

"E pra onde pretende ir?"

 

"Nós temos algo a tratar no Corte. Mas não temos suprimentos o suficiente para a viagem. Por acaso vocês aqui…"

 

Erend retornou o pedido de Aloy apenas com decepção.

 

"Olha… Nada que vá ajudar vocês. Os malditos do Eclipse levaram tudo com eles pra Meridiana, aposto que não esperavam a surra que tomaram."

 

Aloy apenas suspirou em desânimo, tendo em vista o tempo que gastaria coletando recursos para a viagem, mesmo que pretendesse comprá-los. 

 

"Por que não vai até Meridiana? O Avad…"

 

"Fora de questão, já esgotei meus favores com ele."

 

"Calma ai, eu ainda vou dar um jeito de ajudar você. Deixa eu ver…"

 

Em meio a sua sentença, Erend puxou por baixo das canecas um grande mapa, se estendendo desde o Solar até as terras ao leste.

 

"Podemos te dar algumas coisas… Não dá pra chegar até o Corte, mas deve durar até chegarem… Aqui." Terminou indicando com o dedo o local que Aloy menos queria visitar no mundo.

 

"Sem chances."

 

"Tá, me escuta ok? Por que não pensa durante a noite?"

 

O líder da Vanguarda buscava amaciar a postura irredutível de Aloy apenas para ter a oportunidade de ajudá-la. Sabia exatamente o porquê da recusa tão severa. 

 

"Conversa com a sua mãe, espera ela se recuperar. E aí você me diz."

 

Olhando para as construções da cidade como se esperasse que as paredes de pedra lhe dessem a resposta, Aloy contemplou a possibilidade dizendo:

 

"... Ok, mas não garanto nada. E se estiver caído nessas canecas amanhã eu vou embora sem me despedir."

 

Rindo junto com a moça, Erend apenas disse:

 

"Tá, tá, você venceu. Sem bebida. Até você ir embora, claro."

 

"Fica todo feliz sem mim por aqui né?"

 

"Ah qual é, eu senti sua falta!"

 

"Eu também Erend. Até amanhã."

 

Ela disse descendo as escadas, deixando para trás um aliviado Erend.

 

Dentre as tendas montadas em frente aos muros da cidade, Aloy tentava encontrar aquela que pertencia ao curandeiro. Ao longo do caminho, entretanto, notou um foco de luz lilás vindo de uma das tendas maiores, escutando a voz abafada de Elisabet ao mesmo tempo. Discernindo apenas algum tipo de despedida, a caçadora adentrou a tenda.

 

"Hm, quer dizer que sou sua mãe?"

 

Era a óbvia tentativa de iniciar uma conversa deveras complicada. Mais uma vez Aloy se viu obrigada a se esquivar, refém das preocupações em relação à viagem no dia seguinte.

 

"E a sua perna?"

 

"Vai melhorar. Preciso agradecer aquele seu amigo depois… Mas você não me respondeu." 

 

Elisabet tentou ao máximo não ser rude, deixando transparecer apenas curiosidade.

 

Aloy se jogou em um dos dois acolchoados da tenda, virando-se para o outro lado.

 

"Amanhã eu te explico. Mas obrigada por manter as aparências."

 

"Você me salvou lá atrás… É o mínimo. Mas me pegou de surpresa."

 

"Espero ser a nossa cota de surpresas… Boa noite."

 

Aloy disse entre bocejos, pronta para adormecer em um ambiente controlado novamente. Elisabet fez o mesmo, se deitando confortavelmente.

 

"Boa noite."

 

Enquanto a noite se calava, ambas faziam o mesmo. Questões iminentes tomavam forma a cada segundo que passavam juntas, mas silenciar tais pensamentos ainda era possível.

 

Por enquanto. 


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Notas finais do capítulo

Esse capítulo ficou grande! Não é o padrão de número de palavras mas ainda tá no meu limite estipulado. Bem provável que isso seja raro! Enfim, o que acharam? Algumas cenas me deixaram inseguro mas no geral eu tô bem satisfeito! Em alguns capítulos (provavelmente dois) essa parte inicial vai terminar, e vou dar início a uma outra trama! Tô ansioso pra continuar escrevendo. Como sempre, peço o feedback de vocês! Cada elogio me leva pra frente e cada crítica me torna um escritor melhor, agradeço muito! E também como sempre, POR FAVOOOOR dêem uma olhadinha nas fics da minha irmã, a Vanilla Sky! Se você gosta de Marvel, não tem histórias melhores nesse planetinha chamado terra xP até a próxima! Se cuidem ok?



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