Coisas Quebradas escrita por Enypnium


Capítulo 3
Capítulo 3: UMA VERDADE DOLOROSA.


Notas iniciais do capítulo

Está aí um capítulo cheio de diálogos, que espero, não seja tedioso. Eu queria algo bemmmm lagrimoso e envolto em mistério, será que consegui?

Sobre o português, sinto muito, mas é bem possível que eu tenha assassinado ele variaaaaaaaaaaaas vezes!



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Capítulo 3: UMA VERDADE DOLOROSA.

Conquanto seus dedos estivessem enegrecidos pelo carvão que ele habilmente deslizava pelo grosso papel, sob a luz do amanhecer, o esboço em suas mãos, não parecia certo.

Ele soprou para longe o excesso do grafite que se depreendia dos traços mais fortes e avaliou a imagem atentamente para encontrar o erro: a suavidade das ondas dos cabelos castanhos estava lá, assim como, a curva graciosa dos lábios cheios, mas o retrato ainda não se parecia em nada com a mulher que ocupava seus sonhos com frequência nos últimos dias.

Steve poderia solucionar a imperfeição do desenho, bastava-lhe abrir a carteira e resgatar o cartão cuidadosamente guardado com o endereço da casa de repouso onde Peggy Carter, agora Peggy Smith, esperava pelo fim de seus dias. Então, ele poderia comparar seu esboço com a modelo, exceto pelo fato, de que, a Senhora que ele encontraria sofrendo de Alzheimer, já não era sua garota, não mais.

Quisera o destino que o tempo, esse inimigo inexorável, fosse seu algoz. Enquanto sua vida tinha permanecido em suspenso durante seu sono no gelo, Peggy tinha vivido cada um dos seus noventa e cinco anos e experimentado todas as experiências que um dia ele tinha sonhado para os dois.

Acordar em 2012 no que lhe pareceu apenas um minuto depois de 1945, foi uma experiência cruel, mas não mais desorientadora do que encontrar uma envelhecida Peggy, logo após ter feito juras de amor a sua versão setenta anos mais jovem.

Foi consideravelmente difícil reconciliar seus sentimentos, que agora seriam perturbadoramente inadequados, com a imagem da esposa, mãe e bisavó, que Peggy havia se tornado.

Apesar disso, Steve se sentia profundamente grato por, a despeito da sua situação incomum, pelo menos, ter tido a oportunidade de reencontra-la. Ainda que, a gratidão não evitasse o pesar pelo amor não vivido; ainda que, houvesse tristeza por não encontrar na Senhora - que agora só se recordava dele em raros momentos de lucidez - a mulher que ele tinha apreciado profundamente no passado; ainda que, ter sua amizade não fosse o suficiente para aplacar a vazio de estar tão impossivelmente longe de casa.

No fundo, o que de fato ele temia, era que nunca fosse capaz de construir um futuro que se igualasse as expectativas que o gelo lhe roubara, pois, ninguém superava a jovem Peggy que ainda preenchia sua imaginação.

Em última análise, era culpa de Wanda Maximoff, que com seu sonho que se assemelhava a um pesadelo disfarçado de desejo, reavivara em Steve, os anseios que ele julgava superados.

Steve voltou a contemplar o bloco de desenho, finalmente encontrando o erro em seu trabalho. Ele não tinha conseguido capturar a vivacidade que sempre brilhou nos olhos de Peggy, ao invés disso, tinha desenhado olhos tristes, sem vida, apáticos.

Ele não saberia explicar o porquê, mas inconscientemente esboçara no rosto de Peggy o olhar da Srta. Granger.

Steve arrancou a página do bloco e amassou o papel entre as mãos, irritado por seus pensamentos terem vagado sem permissão até a jovem. Isso era um insulto a Peggy. Diferente de Peggy, Hermione não parecia ter disposição para deitar-se sobre arame farpado para que outros pudessem passar, a julgar por sua insistência em manter em segredo, informações que poderiam ser úteis para deter Ultron: como o que o Androide poderia querer com ela, para começar.

Ele voltou a guardar o bloco de desenho na mesa de cabeceira e se levantou da cama deixando para trás os lençóis emaranhados; evidencias de uma noite insone que ele passara desenhando.

A madrugada que parecia nunca acabar, enfim tinha recuado para um dia que nascera luminoso, e ele finalmente poderia se concentrar apenas na caçada a Ultron, ao invés de se perder em antigas afeições por uma Dama que, embora ainda viva, estava apenas em seu passado.

Trocando o pijama pelas roupas de ginástica, Steve se dirigiu para a sala conjugada com a cozinha, que a equipe utilizava como um andar de convivência comum. A essa hora da manhã, ele possivelmente encontraria todos despertos.

Assim que as portas do elevador se abriram os burburinhos de conversa confirmaram suas suspeitas: apesar da hora precoce, todos já estavam reunidos, exceto por Tony que, ou ainda estava na cama, ou nem sequer tinha chegado nela, tendo adormecido em alguma bancada no laboratório, como era seu costume. No entanto, como que invocada por seus pensamentos dessa manhã, foi a Sra. Granger quem primeiro entrou em seu campo de visão.

Imediatamente, Steve se sentiu nu sem seu escudo e a familiar adrenalina pré-batalha inundou seu sistema, como sempre acontecia quando ele estava na presença dela.

Ele estava consciente do absurdo disso, já que ela não tinha realmente feito nada que remotamente os ameaçasse; e não era como se uma rajada de vento não pudesse nocauteá-la. Um peso pesado, de fato.

Ainda assim, a racionalização não calava seus instintos que gritavam por perigo.

Era um pouco incomodo, para dizer o mínimo, que eles não pudessem fazer da Torre Stark, o lugar de descanso que todos precisavam. Ao invés disso, essa pequena intrusa, os colocava em constante alerta, em permanente vigilância.

Não obstante, Hermione estava inocentemente de pé, recostada sobre o mármore Carrara da ilha da cozinha, observando a televisão ligada com uma expressão transtornada.

Sua queda das escadas de incêndio, que não tinha parecido tão grave no dia anterior, tinha se revelado mais preocupante essa manhã. Steve podia notar no rosto da jovem, os hematomas de diferentes tonalidades de cor que saravam em vários estágios, somados a um cansaço de uma evidente noite em claro.

A cada novo dia que a Srta. Granger permanecia na Torre, ela parecia mais cansada e abatida, o que só servia para reforçar a resolução de Steve, em encontrar Ultron o quanto antes, para poder liberta-la da presença deles que parecia não agradar a nenhum dos dois lados envolvidos.

Steve cumprimentou os demais e se dirigiu à cozinha para se servir de café; com uma caneca de tamanho decente nas mãos, ele finalmente se virou para o televisor.

O telejornal matutino de maior audiência dos Estados Unidos, estava com a tela dividida em três quadros: no primeiro, uma repórter loura e jovem, contava ao telespectador a história do ataque dos androides no prédio da Srta. Granger; no quadro logo abaixo, as imagens de Natasha lutando na recepção, apareciam em um looping incessante, em toda a sua glória de destruição - a mesa do porteiro estava em pedaços e o piso com diversos buracos; toda a metade esquerda da tela, tinha a honra de apresentar a luta do Capitão América contra os três androides restantes.

As imagens eram amadoras e tremulas e, por vezes, fora de foco, mas, ainda assim, dava para ver com clareza o momento, no qual, Hermione era arremessada pelo Androide sobre o chão de concreto; seu rosto machucado em evidência para as câmeras ansiosas.

Steve viu a versão em carne e osso empalidecer ao seu lado. Com os olhos pregados na TV, Hermione buscou o banquinho atrás de si, para se sentar; seus dedos apertaram as bordas da banqueta com tanta força que os nós estavam brancos; o mesmo olhar aflito que ele desenhara mais cedo, marcava seu rosto.

— Ação rápida essa. – Bruce comentou em tom de parabenização, enquanto observava as câmeras mostrarem Natasha se juntando ao Capitão para eliminar a última ameaça com pouco esforço. – Mas eu esperava que Ultron aparecesse, afinal, ele estava tão interessado na... - Bruce se calou assim que viu uma ansiosa Hermione, se encurvar ainda mais sobre o banquinho.

Steve engoliu em seco, com a culpa corroendo suas entranhas. Ele poderia não ser um apreciador da companhia taciturna dela, mas podia sentir simpatia pelo modo como Ultron tinha virado a vida dela de cabeça para baixo, estivesse Hermione colaborando com ele ou não.

— Bruce – Steve chamou com propósito renovado – Como está a construção do algoritmo de localização?

— Ainda sem resultados – O Doutor respondeu, lançando um olhar penalizado na direção da jovem, compreendendo, assim como Steve, o que estava em jogo. – Ultron está conseguindo desativar todos os mecanismos que construímos antes que a localização seja processada, e não ajuda que ele desative constantemente nosso acesso aos satélites. Tony e eu estamos trabalhando nisso incansavelmente; precisei fazer uma pausa, mas ele continua no laboratório.

— Vamos pensar em um modo de ajuda-los com isso. – Steve falou, dando as costas para o telejornal a tempo de ver a Srta. Granger saindo da sala com uma expressão angustiada.

Tony decidiu reaparecer alguns instantes depois. Ele se arrastou pela sala com olheiras enormes e marcas de fadiga pelo rosto, para corroborar com a tese de Steve, de que ele nem sequer tinha dormido noite passada.

— Onde está Hermione? – Ele perguntou de modo seco, à guisa do cumprimento.

— Acho que retornou para o quarto, porquê? – Informou Steve, com uma sobrancelha levantada.

— Porque ela tem uma visita. – Stark respondeu, aborrecido. – Jarvis, informe a Srta. Granger que ela deve retornar para a sala comunal imediatamente.

— Claro, Senhor. Além disso, acredito que irá gostar de saber, que a recepção acaba de liberar a entrada do visitante. Ele está embarcando no elevador social, nesse momento. – Jarvis anunciou.

Um silêncio incomum entre os Vingadores se seguiu à notícia. Todos estavam com expressões idênticas de surpresa.

Steve conteve o impulso de trocar olhares preocupados com a equipe, ao invés disso, ele fez um gesto para que os quatro companheiros se movessem em uma espécie de semicírculo ao redor do elevador comum. A precaução não era um exagero, considerando os mistérios que cercavam a Srta. Granger.

Rápido demais para que eles tivessem tempo de formular qualquer outo plano, um apito discreto reverberou pelo ambiente silencioso, anunciando a chegada do elevador no andar.

Não pela primeira vez no dia, Steve se amaldiçoou por ter baixado a guarda e deixado seu escudo para trás. De qualquer modo, só lhe restou tempo para se preparar mentalmente, para enfrentar qualquer coisa que pudesse acontecer a seguir. Entretanto, quando as portas metálicas se abriram, a imagem revelada o fez relaxar os ombros tensos.

Um único homem saltou para fora. Sua aparência sexagenária, embora excêntrica, na melhor das hipóteses, não tinha ares de ser perigosa; ele usava um estranho conjunto desalinhado de calças e paletó de cor grafite, com padrões de xadrez de linhas alaranjadas, que até mesmo Steve teria considerado antiquado; uma cruza esquisita entre uma capa e uma toga preta, pendia de seus ombros magros; e para completar o visual, ele carregava uma maleta masculina surrada, mais apropriada aos anos quarenta; cabelos ralos que ainda mantinham uma orgulhosa cor avermelhada e óculos com aros de tartaruga, emolduravam enrugados olhos verdes escuros, que olhavam a toda a volta com curiosidade.

O Senhor parecia ligeiramente deslocado, um sentimento que Steve compreendia muito bem e, pelo qual, não pode deixar de sentir simpatia.

O homem lançou um meio sorriso ansioso para cada um dos Vingadores, mas quando viu Tony Stark, seu rosto se iluminou, e todos os seus dentes ficaram a mostra em um sorriso radiante e olhos arregalados de admiração.

Ele caminhou a passos largos até Tony, ignorando completamente a postura ameaçadora, com o qual, o outro o encarava.

— Arthur Weasley, Sr. Stark – O homem se apresentou com um forte sotaque inglês, e estendeu a mão para um cumprimento animado, que muito hesitantemente, Tony aceitou. O velho Senhor, agarrou os dedos do Homem de Ferro num aperto forte, e sacudiu seu braço inteiro em êxtase. - É um prazer conhece-lo. Nunca imaginei que teria essa honra. Sou um grande admirador de seu trabalho. Não acredito que consegue voar com aquela armadura infernal.

— Obrigada? – Tony, ainda sem a posse integral da mão, agradeceu incerto.

— Não tem ninguém mais entusiasta da tecnologia trouxa do que eu. Meus amigos pensam que sou maluco, dá para acreditar? – O Senhor continuou tagarelando alegremente.

— Nem imagino o porquê! – Tony murmurou, com uma ruga se formando entre as sobrancelhas.

— Será que eu poderia pedir... não, isso seria um abuso..., mas quem sabe quando voltarei a ter essa oportunidade? O Senhor poderia, o Senhor explicaria para mim a função das tomadas? – O Sr. Arthur perguntou muito entusiasmado, completamente alheio aos barulhos de engasgo que Clint e Bruce fizeram, ao tentar conter as gargalhadas, diante da confusão cada vez maior com que Tony encarava o estranho. – Sabe, eu faço essa mesma pergunta a anos, mas ninguém foi capaz de me explicar satisfatoriamente para que elas servem...

Tony foi salvo de encontrar uma resposta à altura da esquisitice do Senhor, pela chegada de Hermione Granger.

A moça olhou em choque para as costas do visitante reconhecendo-o imediatamente.

O silêncio que se seguiu, fez o Sr. Weasley finalmente soltar a mão de Tony, e se virar para a recém-chegada. Assim que ele viu Hermione, toda a sua esquisitice e o entusiasmos anterior foram substituídos por uma expressão de desapontamento.

Os dois se encararam atônitos em igual medida, embora Hermione parece apavorada e o Sr. Weasley, zangado.

Foi então, que a coisa mais estranha aconteceu... todas as luzes da sala começaram a piscar como se estivessem prestes a entrar em curto-circuito e a televisão se apagou. Em uma fração do segundo seguinte, todos se entreolharam confusos com o evento, já que Tony falava sempre a exaustão, do quanto todo o prédio era energeticamente autossustentável e movido pela fonte mais segura e estável de energia limpa já desenvolvida pelo homem. Todos os Vingadores sabiam que um reator de arc não colapsava.

— Tony? – Steve indagou, preocupado. A última vez que a tecnologia Stark fugiu do controle, Ultron foi criado.

O Homem de Ferro estava congelado no lugar. Ninguém parecia mais pasmo do que ele, porém, antes que Tony tivesse a chance de responder, o fenômeno cessou.

— Não foi nada. Deve ter sido só uma pequena falha... – Tony garantiu, já com o telefone nas mãos, batendo freneticamente na tela, mas não passou desapercebido de Steve, o tom ligeiramente incerto do outro. – Todos os níveis de energia estão normais. Tudo correndo bem com o prédio.

Nada mais estranho aconteceu durante todo o minuto seguinte e não parecia que eles estivessem sob um ataque iminente, de modo que, com a pequena confusão resolvida, todos estavam livres para voltarem suas atenções aos dois intrusos na Torre Stark.

Granger e Weasley continuavam a se encarar, e toda uma conversa silenciosa estava se passando entre os dois. O Sr. Weasley parecia ligeiramente alarmado, quando finalmente perguntou à Hermione:

— Podemos conversar? – Ele relanceou um olhar para as pessoas que os cercavam, momentaneamente sério, e limpou a garganta antes de continuar: - A sós, se não for nenhum inconveniente.

Hermione abriu a boca para falar, parecendo prestes a negar o pedido, mas Tony se apressou em ser estranhamente prestativo.

— Podem usar a sala de reuniões do andar superior – Ele ofereceu.

A Srta. Granger lançou um olhar mordas para Tony, mas aparentemente sem opões, ela se voltou para apertar o botão no painel do elevador, que, como ainda não tinha saído do andar, abriu as portas imediatamente para recepciona-los. Solenemente, ela esperou que o Sr. Weasley entrasse para segui-lo para dentro.

O elevador mal tinha saído do andar, quando a explosão de vozes encheu a sala, disparando perguntas a esmo.

— O que exatamente foi isso?

— Trouxa? Devo me sentir insultado?

— O que significa?

— E eu é que sei?

— Tomadas? Sério?

— Quem é esse afinal?

— O que foi aquilo com as luzes? Isso deveria acontecer?

— Todos vocês, calem a boca – Tony exigiu, elevando o tom para se fazer ouvir – Jarvis, ative as escutas e as câmeras da sala de reuniões, por favor.

O Capitão trocou o peso de um pé para o outro, incomodado.

— Nós não deveríamos espiona-los. – Ele objetou imediatamente.

— Como vasculhar dados privados em agências governamentais é diferente disso? – Tony revirou os olhos, impaciente.

— Muitos desses dados são cedidos voluntariamente, mas essa é uma conversa íntima. Isso é bem diferente – Steve argumento.

— Estamos dando de cara com muitos becos sem saída no que se refere a ela, Cap. Já esgotamos todas as nossas fontes. Sem a S.H.I.E.L.D e com Fury incomunicável na Europa, não temos nada. - Ela respondeu com a lógica prática de uma espiã.

Steve olhou em volta em busca de apoio, mas logo ficou claro que não obteria. Os Vingadores pareciam concordar com o ponto de vista dela.

— Tudo bem – Depois de um momento de hesitação, Steve consentiu de malgrado.

— Ótimo – Stark suspirou, impaciente – Se ninguém tem mais objeções?!... Jarvis comece a gravação e libere as imagens para nós. Faça uma lista para pesquisa posterior, anote qualquer nome, lugar ou termo desconhecido. Inicie por Arthur Weasley e o termo “trouxa”. Se vou ser insultado quero, pelo menos, saber do que.

— Feito, Senhor – O IA respondeu, prontamente.

Imediatamente, a televisão de sessenta e cinco polegadas foi religada, mostrando uma imagem perfeitamente nítida da sala de reuniões ainda vazia. As câmeras estavam instaladas em diferentes ângulos permitindo que não houvesse nenhum ponto cego em todo o cômodo.

Um silêncio pesado se fez na sala entre os Vingadores. Todos prestando a atenção no monitor.

Ainda que não estivesse satisfeito com a invasão de privacidade, Steve decidiu que iria acompanhar a reunião, que ele esperava que realmente pudesse esclarecer as pontas soltas sobre a Sra. Granger, de uma vez por todas.

Logo em seguida, a porta da sala de reuniões foi aberta e o Sr. Weasley entrou acompanhado de Hermione, os dois ficaram parados na soleira por um momento. O desconforto entre eles era obvio, até mesmo através das câmeras.

— O Senhor quer sentar? – Hermione indicou as cadeiras que circundavam a grande mesa de vidro e aço, antes de caminhar incerta em direção a ampla vidraça que inundava o ambiente com a luz da manhã.

Sua voz saiu alta e clara pelos alto-falantes da sala, como se todos estivessem no mesmo ambiente.

O Senhor ignorou a oferta, retirando calmamente a capa e revelando toda a extensão de seu terno xadrez horrendo; ele dobrou o casaco cuidadosamente, como se a ação exigisse toda a sua concentração, ao terminar, depositou-o sobre a mesa, antes de colocar as mãos nos bolsos; foi só então, que ele focou sua atenção na Sra. Granger.

A moça tinha optado por permanecer de pé. De costas para ele, Hermione se pôs a contemplar a cidade através da ampla janela.

Por um momento, os dois ficaram em silêncio, cada um perdido em seu próprio pensamento, mas depois de um tempo, o Sr. Weasley pigarreou pretendendo começar a conversa; todavia, antes que ele tivesse a oportunidade de falar, Hermione se virou para ele apressadamente.

— Cuidado! É provável que a sala esteja grampeada. – Ela alertou, como se o pensamento tivesse lhe ocorrido no último instante.

Steve não pode evitar relancear um olhar na direção de Tony. O gênio parecia ligeiramente desconcertado por não ser a única pessoa esperta na sala. O Capitão quase sentiu orgulho da Srta. Granger, quase.

Ele voltou sua atenção para o televisor, quando o Sr. Weasley finalmente falou.

— Oh, sim?! Bem, isso é uma pena para você, minha cara, porque não vai me impedir de falar o que vim lhe dizer. – Ele respondeu categoricamente. Seu rosto era uma máscara que não revelava nada.

Hermione desviou o olhar, como se não suportasse encara-lo, enquanto abraçava o próprio tronco. O movimento fez seu suéter se esticar sobre seu corpo esquelético, marcando sua forma magra.

A frieza do Sr. Weasley perdeu um pouco de força diante da imagem descarnada da Srta. Granger.

— Está ferida? - Ele perguntou, em tom mais ameno, dessa vez.

A pergunta era retórica. Era bastante evidente pela quantidade de hematomas em seu rosto, que Hermione estava machucada, embora não mancasse como no dia anterior, ainda assim, ela ousou balançar a cabeça em negativa.

O Sr. Weasley levantou uma sobrancelha com uma expressão cética.

— Foram só alguns aranhões, nada demais. – Ela assegurou, teimosamente.

Ele bufou de indignação, mas não voltou a insistir.

— Como tem passado? - Perguntou, ao invés disso.

Hermione apenas deu de ombros, indiferente.

— Tem feito amigos novos, pelo que vejo. – O homem persistiu pacientemente, se referindo aos Vingadores, com um gesto amplo ao redor da sala.

— Eles não são meus amigos. – Ela fez questão de esclarecer.

— Pois isso é uma pena! – O Senhor suspirou tristemente. – Está tralhando?

— Trabalho no Museu Metropolitano.

O homem se apoiou no aparador atrás dele e cruzou os braços em frente ao peito, lançando um olhar crítico para a garota.

— Trancada entre quatro paredes e rodeada de coisas velhas e empoeiradas, aposto? – Ele adivinhou, com um ar conhecedor. – Parece ser muito saudável.

Novamente um encolher de ombros apático foi toda a resposta da Srta. Granger.

O silêncio voltou a imperar entre eles, mas dessa vez, pareceu a Steve, que o homem estava hesitante em continuar, como se ele temesse a própria pergunta.

— Pelo menos... conheceu alguém? Está... namorando? – Ele perguntou incerto, com a voz falhando ligeiramente.

Hermione saltou no lugar, virando-se totalmente para encarar o Senhor do outro lado da sala, com uma expressão mortificada em seu rosto pálido, como se a pergunta fosse uma ofensa irreparável. Ela balançou a cabeça em negativa engolindo em seco.

O Capitão viu como ela correu o polegar pela aliança de noivado, num gesto ansioso, que também não passou desapercebido do Sr. Weasley.

O homem admirou a joia por um instante, com um misto de decepção e alívio percorrendo seu rosto envelhecido, que confundiu Steve.

Um clima pesado pairou entre os dois, tangível até para os Vingadores que vigiavam à interação em absoluto silencio.

— Como... Como o Senhor conseguiu me encontrar? – Finalmente, Hermione decidiu fazer sua própria pergunta, mas sua voz não saiu mais alta do que um sussurro rouco.

O Sr. Weasley enrijeceu com o questionamento. Toda a frieza retornou ao seu semblante, mas ele não respondeu imediatamente, ao invés disso, caminhou até a janela ao lado de Hermione e se pôs a observar a rua lá embaixo, com as mãos nos bolsos.

Ele tomou folego antes de responder, ainda sem encará-la:

— Essa é uma excelente pergunta, mas você sempre soube fazer as perguntar certas. Porque de fato, esse é o cerne de toda a questão aqui, não é, Hermione? Já que estamos procurando por você a mais de três anos. No fim, depois de todas as dificuldades que enfrentamos, depois de todos os esforços, de todos os becos sem saída em que chegávamos e pistas que não davam em lugar nenhum, encontrá-la foi até bastante simples.

Ele estava muito zangado, quando se virou totalmente para ela e continuou:

— Uma luta entre o Capitão América e robôs? Nem mesmo nós poderíamos ignorar isso, por mais reclusos que sejamos. Não somos totalmente alienados no que se refere ao mun... a este lugar. Seu rosto está em cada uma dessas coisas. – Ele apontou para os monitores desligados que ocupavam, de modo substancial, uma parede inteira da sala. - Assim que as imagens começaram a aparecer, e ficou óbvio que se tratava de você, foi fácil encontrar seu novo endereço.

Hermione estremeceu diante da decepção com o que o Senhor a encarou. Ela fechou os olhos e suspirou resignada.

— Você pode me responder com sinceridade porque está fugindo de nós? Porque deixou que pensássemos que estivesse morta? – O Senhor perguntou, lutando para controlar a raiva que borbulhava na superfície.

A Srta. Granger não respondeu, não parecia ser capaz de fazê-lo, ao invés disso, ela correu os dedos pela aliança de noivado novamente, com uma expressão consternada.  

A maneira como Hermione se agarrava aquela aliança, como se aquele pequenino pedaço de ouro, fosse capaz de mantê-la na superfície de um oceano revolto, fez Steve se lembrar de seu próprio souvenir: a bússola com a foto de Peggy, que ele carregava consigo para onde quer que fosse.

Steve sabia porque mantinha por perto sua relíquia, gostaria de saber porque Hermione mantinha a dela.

Subitamente, ele desejou que o Sr. Weasley fosse embora e a deixasse em paz. Ele decidiu silenciosamente, que se ela pedisse para o homem sair, ele mesmo garantiria que isso aconteceria.

Os ombros do velho Senhor desmoronaram diante da visão devastada da pobre moça; ele parecia desejar chorar, mas, ao invés disso, tirou os óculos de tartaruga e limpou as lentes com um lenço que tirou do bolso do paletó, enquanto tentava buscar algum controle sobre suas emoções.

Hermione estava tremendo quando finalmente conseguiu falar, depois de mais um longuíssimo tempo de silêncio.

— Como está Harry? – Ela perguntou.

O Senhor apenas olhou para ela por um tempo, parecendo resignado com o fato de que não obteria uma reposta direta à sua pergunta. Por fim, ele respondeu:

— De início, quando notícias suas chegaram, pensei que ele ficaria extasiado, que faria questão de vir ao seu encontro pessoalmente, e ele estava mesmo se aprontando para fazer isso, mas no último instante, me pediu para substituí-lo – O Senhor olhou de esguelha para Hermione – Harry está... ele ficou profundamente ferido, muito abalado em saber que você estava tão perto de casa...

Hermione se encolheu, como se o Senhor a tivesse apunhalado no coração. Apesar disso, ele continuou, indiferente a dor avassaladora que transbordou pelo rosto pálido dela:

— Eu não o culpo. Nos últimos anos, todos tiveram a oportunidade de reconstruir suas vidas, mas não ele. Não houve descanso para Harry... com um bebe para criar sozinho; você desaparecida; tantos amigos perdidos... em dado momento, achei mesmo que ele fosse sucumbir, mas Harry... abençoado seja, é mais forte do que sua natureza gentil e complacente sugere. Ele passou os últimos três anos, concentrado apenas em encontrá-la; criou uma força tarefa interdepartamental permanente; usou de cada grama de influência, cobrou favores e ficou devendo outros tantos, para pessoas com as quais, sabemos, ele preferiria não se envolver; fez tudo o que podia e muitas coisas que não podia, para localizá-la. – O Senhor fez uma pausa, subitamente parecendo mais velho do que realmente era – O espaço que você ocupa na vida daquele rapaz, nenhum de nós conseguiu preencher, nem mesmo Gina. Não há nada que ele não faria por você. Ele nunca desistiu de encontrá-la!

Um soluço escapou por entre os lábios de Hermione e lagrimas silenciosas caíram por sua face consternada.

O Sr. Weasley suspirou, olhando para ela com desalento.

— Não vim até aqui para puni-la, Hermione, e nem cobrar respostas que você ainda não esteja pronta para dar – Ele falou em tom de desculpas – Mas não posso mentir para você e dizer que vivemos bem com a ameaça da sua morte pairando sobre nós.

Hermione buscou a mesa atrás de si, caindo sobre uma das cadeiras, tremula e pálida. Steve temeu que ela fosse desmaiar.

O Sr. Weasley se ajoelhou na frente dela, tomando cuidadosamente o rosto da jovem em suas mãos enrugadas.

— Sabe Criança, durante todos esses anos, sempre foi Molly quem disciplinou nossos filhos. Eu sempre fui brando de mais, e Deus sabe que tipo de homens eles teriam se transformado se só tivessem a mim para os educar. Mas, agora que minha esposa se foi... que Bellatrix a tirou de mim... de nós... infelizmente, cabe a mim, cumprir com o papel que sempre evitei desempenhar, e embora eu odeie isso mais do que você possa imaginar, realmente penso que essa e a única solução. Sei que é o que você precisa, por mais doloroso que seja, mas a verdade é assim, não é?!

Hermione tentou se afastar da mão que lhe segurava o rosto como se as palavras dele lhe queimassem.

— Não. Você irá me ouvir. Você me deve isso. – Ele exigiu e ela parou de se contorcer – Quando olho para você e vejo no que se transformou, isso parte meu coração. O que você fez com a mulher que enfrentou perigos inimagináveis para defender o que achava certo? Onde está e garota que fundou o F.A.L.E, a Armada de Dumbledore? - Hermione se sobressaltou sobre a cadeira, surpresa – Oh, Sim! Você realmente pensou que alguma coisa já escapou do conhecimento de Alvo Dumbledore? É claro que sabemos que a iniciativa foi sua, que você organizou a resistência contra Umbridge. Sabemos de tudo, Hermione, de todas as coisas que você já fez, grandes ou pequenas.

Com compaixão, o Sr. Weasley secou as lagrimas que persistiam em cair pelo rosto dela.

— Eu não sei em que momento você supôs que iriamos ama-la menos, pelo que aconteceu naquele dia.… naquela tragédia... isso nunca, nunca poderia acontecer! - Ele continuou, e agora era ele que tinha a voz embargada. – Mas você precisa parar com isso, meu bem! Precisa parar de se culpar, precisar parar com essa alto piedade. Isso não combina com você. Precisa parar de fugir e enfrentar o que aconteceu, com coragem, a coragem Grifinóriana que sei que ainda está aí dentro... porque, Hermione, não há nenhum lugar em que você possa se esconder de si mesma.

Com essas palavras a moça desabou nos braços do Sr. Weasley, ele a abraçou ternamente e também chorou silenciosamente enquanto Hermione soluçava com a cabeça enterrada em seu peito.

Depois do que pareceu uma eternidade, finalmente ela se soltou dos braços do Senhor e se recostou na cadeira com o rosto marcado pelo choro e pelo cansaço.

— Talvez você pense que eu não tenho o direito de lhe pedir isso, mas vou pedir mesmo assim, se não por mim, então por Harry que merece de você muito mais do que você tem dado a ele: Você precisa se perdoar pelo que aconteceu, porque só você pode fazer isso por si mesma.

O Sr. Weasley depositou um beijo na testa de Hermione antes de se levantar cambaleante do chão.

— Pense sobre minhas palavras e sobre a pessoa que você realmente é e que está fingindo não ser! Quando estiver pronta, estaremos também.

Ele caminhou pela sala e recuperou a capa, desdobrando-a para vesti-la. Depois de muito tempo, ele voltou a falar.

— Aquelas coisas... maquinas... estavam atrás de você, ou foi apenas o caso de estar no lugar errado e na hora errada? – O Sr. Weasley perguntou, com uma sobrancelha levantada suspeitosamente, seu tom de voz voltando ao normal.

Hermione não ofereceu uma resposta direta, entretanto, não seria preciso, a julgar pela compreensão que passou pelo rosto do Sr. Weasley. Um leve sorriso conformado levantou o canto de um de seus lábios.

— É só a sua sorte, suponho – Ele repetiu as mesmas palavras ditas por ela no dia anterior, o que fez Hermione lhe dar um meio sorriso entristecido, apesar de tudo.

 – Vai precisar de ajuda?

— Não precisa se preocupar, daremos um jeito. – Hermione apontou para o prédio ao redor, numa imitação do gesto que o Sr. Weasley tinha usado mais cedo, para se referir aos Vingadores.  

— Eu espero que sim.  – O Senhor falou, encarando-a com uma expressão mortalmente séria. – Tenha cuidado, Hermione. Ordem de Merlin ou não, temo que ninguém, nem mesmo Harry, seja capaz de livra-la de Azkaban novamente. 

A jovem balançou a cabeça em concordância.

— Posso pedir um favor? – Ela sussurrou timidamente. – Diga a Harry que estou bem, diga que vou procura-lo assim que eu puder. Diga a ele que... diga a ele que eu o amo, que ele sempre esteve em meus pensamentos.  

 - Não pensava em dizer nada diferente – O Sr. Weasley prometeu pegando sua pasta surrada do chão e se encaminhando para a porta, ele lançou um último olhar triste de adeus à Sra. Granger, antes de partir.


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