24 de dezembro de 1981

‘’Essa é provavelmente a 50ª vez que eu escrevo uma carta para você,

mesmo em tão pouco tempo, e estou cansado de ser formal e escrever cabeçário, e até porque a cada dia que passa, ao invés de diminuir a dor de dizer o seu nome, ela apenas aumenta. 

É difícil dizer o seu nome.

Por que você fez isso? 

Estou ainda em um hotel barato onde vou passar o natal nesse ano, assim como fazem dias que tenho passado. Euphemia e Fleamont provavelmente não acreditariam que você fez algo, sabe? Sei que minha mãe ainda não acredita. Eles provavelmente tentariam me dizer coisas boas sobre você, em como você falava de mim, como minha mãe tentou, comentando sobre um dia em que você disse como imaginava nosso futuro. Mas você acabou com ele, não?

 Não a tenho visto porque ainda tenho medo de ser perseguido e algo acabar acontecendo. 

Ainda tenho medo porque não consigo confiar em ninguém ou qualquer coisa. 

Foi você quem fez tudo isso. 

Independente do porquê, foi você.

E eu te odeio.

Eu realmente te odeio. 

Eu estou novamente sem ninguém, e espero que esteja satisfeito.

Sim, estou pensando de forma egoísta pela primeira vez na minha vida porque mereço. 

Sabe, esse deve ser o primeiro natal desde 1972 que não passo com vocês, em contato, podendo dividir essa época que por muitas vezes é difícil para mim. E eu me sinto um lixo por, nesse mesmo momento, estar pensando em como você deve também estar sozinho em uma cela em Azkaban, e que talvez esteja se culpando por tudo isso. 

Eu me odeio por isso. 

Eu não deveria pensar nisso já que você matou nossos melhores amigos, as pessoas que mais confiaram em você nessa vida. Você os matou. E agora Harry está com os tios, pode imaginar isso? Harry Potter filho de James Potter e Lily Evans, filho de um amor que vimos florescer, está vivendo com trouxas por aí porque você fez isso. Você fez isso com seu afilhado. 

E eu mesmo assim sinto sua falta, mesmo nesse estado, mesmo prestes a cair bêbado novamente, mesmo te odiando, ainda desejo você aqui, tentando chamar a minha atenção, fumando aquele cigarro que eu odeio, ou penteando seu cabelo idiota. 

Colocando alguma música alta e me puxando para dançar com você. Provavelmente agora estaríamos na sala dos Potter dançando Dancing Queen enquanto Marlene e você subiriam na mesa para encenar de forma digna.

Ela provavelmente iria até Azkaban para acabar com você pessoal, sabe? 

Alice também.

Não tem mais ninguém além de mim.

Lembra-se daquele ano em que eu não consegui ir até meus pais por conta de alguma tempestade de neve forte que estava acontecendo há alguns dias e você fez tudo parecer natal? 

Você fazia tudo parecer natal, todos os dias desde que te conheci se tornaram dias excepcionais de natal para mim. Você conseguia fazer com que eu sentisse o gosto dos biscoitos de gengibre e do chocolate quente em qualquer dia de semana, mesmo em uma aula de História da Magia ou de Poções; mesmo quando tinha de aguentar as dores dos remédios nas feridas após as noites de lua cheia, você pegava a minha mão enquanto James ou Madame Pomfrey colocavam aqueles malditos remédios e me dizia: ‘’Ei, Rem, eu tô aqui, nunca se esqueça disso.’’

Eu não me esqueci, mas acontece que você não está. 

Tiveram dias em que eu não aguentaria, tiveram dias em que não podia acreditar que tive a sorte de formar uma família e que eu te tinha ao meu lado. 

Mas tudo acabou. 

Então, como um feliz natal para mais uma carta que não será enviada, de um homem bêbado preso em seus próprios pensamentos mais do que nunca para outro preso em uma cela de prisão por um crime que matou tudo o que mais amávamos - porque eu quero acreditar que em algum momento você os amou - eu te desejo o pior.’’

Remus percebeu que estava chorando quando algumas lágrimas molharam as folhas em que escrevia, e isso o fez despertar para o vento forte que batia na janela. Ele estava ali sozinho, da mesma forma que estava quando recebeu a notícia de que Lily e James estavam mortos, assim como Peter, e que isso havia acontecido pelas mãos de seu melhor amigo e namorado que era aliado de Voldemort.

Tudo naquele dia bateu como um carro contra ele, e desde então não sabe se tem vivido realmente ou apenas repassando todas as palavras que ouviu, tudo o que viveu e o que aconteceu. Ainda não acreditava que permaneceu de pé no velório de ambos, e que logo após teve de visitar Alice e Frank em um hospital, os dois sem raciocinarem.

Não tinha mais esperanças.

Mary pediu para que ele se mantivesse escondido por mais um tempo, mesmo que todos estivessem comentando sobre o final da guerra, e assim tem feito, enfiado em um hotel qualquer na Alemanha, em pleno natal, bebendo e escrevendo cartas para seu ex-namorado assassino. Isso é como um sonho, não? 

Sentindo sua mão ficar mais pesada e as lágrimas caírem em ritmo mais acelerado, decidiu que era hora de terminar a carta e se afundar na cama de colchão duro da estalagem. 

‘’E isso é mentira porque não consigo te desejar o pior. Eu simplesmente não consigo e eu quero tanto. Quero que os dementadores acabem com sua esperança, que te enlouqueçam como Frank e Alice estão agora, quero que matem a sua alma como você fez com Eles, quero que encontre Marlene e Dorcas para que elas possam te dar um soco. 

Queria poder usar uma Imperdoável em você. 

E mesmo assim temo que nenhuma dessas minhas palavras sejam verdade. 

Porque ainda te quero aqui, pedindo pra eu relaxar e ir me juntar com você e os outros. Para roubarmos um pedaço de doce durante a noite e comermos do lado de fora da casa enquanto vemos a neve cair.

Porque ainda te amo.’’

Remus respirou, as lágrimas mais controladas, tal qual o tremor de sua mão. 

‘’Você fazia todos os dias parecerem natal… então, por que fez isso, Sirius?’’