The One that Got Away escrita por bella mas não a swan


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Olha eu demorei tanto pra escrever essa one que quas chorei quando terminei. Esse é meu ano de vestibular e as últimas semanas foram uma verdadeira loucura. Terminei de escrever hoje então não deu tempo de mandar para correção, qualquer errinho, me desculpem mesmo, não foi a intenção!
Mas espero que vocês gostem, e boa leitura!



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Viver fugindo não estava nos meus planos aos vinte anos.

Na verdade, olhando para trás, eu pensava que nessa idade eu já estaria no meu penúltimo ano de faculdade, quase terminando o curso de direito na Universidade de Chicago. Teria um trabalho e moraria, provavelmente, em um apartamento minúsculo e alugado.

Bom, pelo menos uma das coisas eu tinha conseguido.

Os lugares que eu ficava a cada poucos meses eram pequenos e pitorescos. O que ocupava naquela época talvez fosse um dos melhores que já tinha ficado, ao menos tinha uma sala e bichos asquerosos não se arrastavam para dentro do imóvel toda noite. Era uma região relativamente tranquila também, não costumava ouvir gritos pedindo ajuda durante a noite como em outros bairros que conheci, mas aquilo provavelmente se devia ao tamanho da cidade. Eu não me importava, não conseguia chamar nenhum daqueles lugares de casa. Porque não importava para onde fosse, eu não estaria indo a lugar nenhum... Estaria apenas fugindo.

Nada da minha realidade na época se comparava à vida que tinha perdido. No passado eu vivia em uma casa de dois andares em um bairro de classe média de Chicago. Não era rica, mas vivia uma vida bem confortável com uma vizinhança tranquila.

Mas não era o quarto decorado, a casa com climatizador de ar embutido na ventilação ou até mesmo a cidade grande que mais sentia falta. Era de um dos moradores da casa ao lado da minha.

Eu era amiga de Edward Cullen desde que me entendo por gente. Minhas primeiras vezes tinham sido acompanhadas por ele, sendo Edward parte daquilo ou não, mas sempre estava lá.

Edward era filho de Esme e Carlisle Cullen, meus vizinhos e tios. Esme e minha mãe, Renée, eram melhores amigas e se conheciam desde crianças, por isso, faziam quase tudo juntas, e, assim, minha convivência com Edward era frequente.

Minha mãe e minha tia costumavam dizer que, eventualmente, iriamos nos apaixonar e algum dia meu pai me levaria até o altar. Pra mim, aos dez anos, aquilo não fazia nenhum sentido. Até então meu único interesse em meninos era puramente para brincadeiras, mas é claro que aquilo foi mudando lentamente.

Na verdade eu lembrava quando caímos em um espiral de mudanças.

Era a festa de aniversário de Alice, uma amiga muito próxima da escola. Ela era uma criaturazinha pequena, mas animada. Tinha começado a planejar o aniversário de dezesseis anos quase dois meses antes de realmente acontecer, e nem era nada muito elaborado.

Na verdade, ela tinha basicamente convidado um grande grupo para sua casa no dia. Eram mais ou menos quinze pessoas, quantidade autorizada pela mãe dela, Lily. Não era uma festa propriamente dita também. Tínhamos chegado na casa dela por volta das seis horas da noite, eu segurando o presente escolhido para ela enquanto Edward tocava a campainha.

—Será que ela vai gostar? –questionei, lançando um olhar na direção do meu amigo, que se ajeitava do meu lado.

—Claro que sim –respondeu sem hesitar, sorrindo na minha direção. –É a cara dela. Relaxa.

A porta foi aberta na nossa frente repentinamente, revelando uma Alice que carregava um sorriso enorme no rosto.

—Vocês chegaram! Faltava só vocês pra gente começar a jogar. Por que vocês demoraram tanto? É pra mim? –Alice disparou, nos puxando para dentro da casa depois de pegar o presente que eu carregava, colocando gentilmente junto com os outros.

—O que vocês vão jogar? –Edward perguntou antes de mim após trocarmos um olhar.

—Verdade ou desafio!

Vários minutos depois estávamos todos sentados em roda. Edward estava ao meu lado, batendo os dedos nervosamente nas pernas cruzadas. A garrafa no meio do círculo já tinha girado algumas vezes, e eu também já tinha ido, sendo desafiada a comer uma mistura esquisita que tinham feito na cozinha.

Ele sempre foi mais tímido, até mesmo que eu. Aquele tipo de jogo era um dos quais ele fugia a torto e a direito, odiando a possibilidade de ficar no centro das atenções. Eu já tinha participado de alguns, todos por influência de Alice, apesar do meu rosto sempre explodir em um tom vermelho quando era escolhida ou tinha que fazer algo mais constrangedor.

Por isso, estava relativamente tranquila enquanto a garrafa rodava na minha frente. Ainda estava calma quando a boca parou apontando para Edward, o fundo na direção de Alice. Porém, fiquei nervosa assim que minha amiga trocou um olhar entre mim, ele e Tanya.

Ela era a mais nova de todos na festa, mas também a que mais chamava atenção. Tanya foi a primeira das meninas a desenvolver um corpo mais maduro enquanto todas nós ainda estava naquele meio termo entre a infância e a adolescência. Tinha um cabelo longo de cor acobreada que sempre me fazia pensar na possibilidade de pintar o meu, que tinha uma cor de loiro estranha, com comprimento que não passava dos ombros.

Apesar da aparência que levava muitos a pensar que ela era só mais uma menininha fútil, Tanya era uma das pessoas mais incríveis que eu já tinha conhecido. Eu sabia também que ela nutria uma paixonite por Edward desde o último ano, quando entrou na escola em que estudávamos, e, por conta desses sentimentos, tinha a impressão que ela se afastava propositalmente de mim.

Meu relacionamento com Edward era de amizade até aquele ponto, mas, precisava assumir que quem olhasse de fora teria uma impressão diferente. Naquela idade, qualquer braço envolta dos ombros, um abraço ou simplesmente andar um pouco mais próximos no corredor já era um indício de namoro. E, para o azar dela, eu e Edward tínhamos todas aquelas atitudes, platonicamente.

Ou ao menos eu pensava ser.

Por isso, apesar de prever o que viria quando percebi o olhar de Alice. E sabendo quais seriam suas próximas palavras, não consegui impedir a sensação estranha na minha barriga quando ela finalmente disse.

—Verdade ou desafio? –ela perguntou.

—Desafio –ele respondeu, me surpreendendo imediatamente. Olhei na direção dele com as sobrancelhas franzidas. Edward tinha uma expressão decidida em seu rosto, uma daquelas que eu conhecia como sendo a que ele sempre tinha antes de fazer algo que não estava confortável.

—Eu te desafio a beijar Tanya.

Todos ao nosso redor gritaram e assobiaram, batendo palmas enquanto o rosto de Edward se avermelhava. Ele olhou na minha direção momentaneamente antes de franzir a testa para Alice, mas se levantou, cruzando o círculo até a ruiva. Tanya tinha os olhos arregalados, surpresa, mas também ficou em pé quando Edward ofereceu a mão para ela.

Eu observava quando ele colocou as mão ao redor da cintura dela, mas desviei o olhar, encarando minhas pernas cruzadas, assim que ele se abaixou para encostar os lábios uns nos outros.

Tentei ignorar a todo custo a sensação no meu estômago, que quase se igualava a tomar uma bolada, enquanto todos ao nosso redor mais uma vez gritavam e assobiavam. Aquele momento pareceu ser eterno, eu ali sentada, esperando que os gritos parassem, mostrando que o momento tinha acabado, sem nem tentar entender o porquê de estar me sentindo daquele jeito.

Aos poucos, todos voltaram ao jogo e Edward sentou mais uma vez do meu lado. Ergui a cabeça, disfarçando o melhor possível a careta quando sorri na direção dele.

—Eu vou pegar refrigerante, quer?

Uma sombra passou nos olhos dele rapidamente, mas Edward balançou a cabeça enquanto eu levantava. Não demorei para ir até a cozinha, mas ao invés de pegar as duas bebidas, sentei na ilha de mármore, suspirando ao apoiar os cotovelos nas pernas e cobrir o rosto com as mãos.

Na época não soube identificar o ciúmes, ou simplesmente quis fingir que não era aquilo que tinha sentido. Inventei vários caminhos irreais para justificar o que aconteceu na sala até que me convenci que nada tinha mudado.

—Bella?

Rapidamente me ajeitei, desviando o olhar para a entrada da cozinha, onde Emmett estava parado, as sobrancelhas franzidas na minha direção.

Emmett era irmão mais velho, por um ano, de Alice. Ele não conversava muito com a gente, e, na escola, era o capitão do time de futebol. Andava com um outro grupo de pessoas, aquelas que geralmente andavam nos corredores da escola como se fossem donas do lugar, mas, todas as vezes que fui na casa de Alice, seu irmão deixava o que quer que estivesse fazendo para nos fazer companhia.

Alice costumava dizer que seu irmão gostava de mim, e, para ser honesta, eu devia ter enxergado a verdade em suas palavras. Sabia que quando outras amigas de Alice iam na casa dela Emmett não tinha as mesmas atitudes. Também sabia que ele não era todo sorrisos para qualquer pessoa que conhecesse, mas que sempre fazia questão de abrir um para mim sempre que me encontrava nos corredores da escola.

Apesar de ter percebido sim todos aqueles detalhes, eu simplesmente riria e negaria sempre que minha amiga trouxesse o assunto em pauta.

—Tudo bem? –ele perguntou.

—Sim –respondi rapidamente, sorrindo levemente na direção dele.

—Certeza? Não deve ter sido fácil ver Edward beijando outra menina na sua frente... Não sei o motivo da minha irmã ter feito isso.

Franzi as sobrancelhas, apesar de meu coração ter pulado uma batida com a memória.

—Por que?

—Vocês não namoram? –perguntou, também franzindo as sobrancelhas em confusão.

—Não. Ele é só meu amigo –esclareci.

Com isso, Emmett sorriu abertamente, evidenciando suas covinhas enquanto adentrava na cozinha, encostando ao meu lado na ilha, onde minhas pernas balançavam no ar.

—Sério? Eu poderia jurar que... enfim –balançou a cabeça negativamente, ainda sorrindo. –Eu fiquei um bom tempo pensando que vocês dois namoravam ou alguma coisa assim. Por isso não te contei que... –parou repentinamente, parecendo perceber que tinha falado demais.

—Me contou o que? –questionei, achando graça quando Emmett, aquele cara gigante para a idade e que parecia estar sempre de cara fechada, corou.

Ele balançou a cabeça e eu, agora com a curiosidade aguçadíssima, empurrei levemente seu ombro, fazendo com que ele balançasse.

—Me fala! –exclamei, sorrindo para ele.

Emmett pareceu pensar um pouco antes de se mover, ficando na minha frente e colocando as mãos ao lado das minhas pernas, criando uma jaula ao meu redor. Me inclinei um pouco para trás para conseguir ver seu rosto, apoiando as minhas no mármore frio.

—Eu meio que gosto de você... –ele começou, me surpreendendo.

—O que? –perguntei estupidamente, arregalando os olhos. –Por que?

—Ah, eu não sei. Eu gosto do seu cabelo –ele tocou uma mecha solta dos fios loiros. –E seus olhos são bonitos também. E você é legal. Eu gosto de conversar e passar tempo com você.

Somente o encarei, minha boca entreaberta enquanto o rosto de Emmett ficava ainda mais vermelho, mas ele não saiu da minha frente.

—Mas eu sou mais nova –argumentei fracamente.

Emmett deu de ombros e eu não falei nada, ainda o observando, quando o momento na sala voltou para minha cabeça de novo, do nada. Eu não tinha visto a cena, coisa pela qual eu era muito grata, mas sabia que chegaria o dia em que eu viria e não poderia fazer nada.

Por isso, mesmo sem entender o porquê de ver uma cena daquelas em um futuro próximo me incomodaria tanto, quando Emmett se inclinou na minha direção, deixei que meus lábios encostassem nos dele.

No mês seguinte ele me pediu em namoro. E eu aceitei.

Nós namoramos por quase um ano e meio. Nesse meio tempo, Edward e Tanya também engataram em um relacionamento. No começo, pensei que por conta dos namoros nós iriamos nos afastar, mas não poderia estar mais errada. Sempre que eu e Emmett discutíamos, o que acontecia com mais frequência do que eu gostava de admitir, pelos motivos mais estranhos, quem escutaria tudo até que eu me acalmasse era Edward. A recíproca também era real.

Apesar de, por fora, Tanya e Edward parecessem o casal perfeito – principalmente quando ele perdeu o rosto de criança e cresceu – o relacionamento dos dois era esquisito. Ele e Tanya não poderiam ser mais diferentes, em questão de personalidade. Onde ela era extremamente extrovertida, Edward era introvertido. Ele preferia simplesmente aproveitar a presença de quem estava com ele, ela odiava ficar muito tempo em silêncio.

Trocaríamos confidencias ao longo dos dois relacionamentos. Conselhos também. Só havia uma coisa a qual nunca conversaríamos sobre: sexo.

Eu sabia que os dois eram... ativos, por conta de uma conversa que ouvi no vestiário após a aula de educação física de Tanya com suas amigas. Eu e Emmett já tínhamos ultrapassado aquele nível do nosso relacionamento no dia em que fizemos um ano de namoro, mas Edward não sabia daquilo.

Na verdade, eu não tinha exatamente com quem conversar. Sentia muita vergonha para ir até minha mãe, seria desconfortável com Alice porque ele era irmão dela, então acabei simplesmente guardando aquela informação para mim e minha ginecologista.

Porém, Edward acabou descobrindo pouco tempo antes que eu e Emmett terminássemos tudo oficialmente. Nós quase discutimos naquele dia, mas, antes fosse somente a pseudodiscussão o maior dos meus problemas.

Estávamos na minha casa. No meu quarto mais especificamente. Edward estava jogado na minha cama, lendo um dos meus livros, enquanto eu estava sentada na escrivaninha estudando para uma prova que teria dois dias depois.

Aquela era uma posição normal para nós. Seus pais ainda estavam no trabalho no horário que chegávamos da escola, então Edward passaria quase a tarde inteira na minha casa até que Carlisle e Esme chegassem do hospital local onde trabalhavam. É claro, com a nossa idade na época, ele já poderia esperar sozinho na casa dele e inclusive tinha autorização para fazer aquilo, mas já tinha se tornado rotina para nós aquelas tardes.

Naquela época meu relacionamento com Emmett já tinha esfriado bastante. Éramos mais amigos com mais intimidade que o necessário do que qualquer outra coisa. Só ainda não tínhamos chegado ao fim porque era confortável estar da maneira que estávamos.

—Você estuda demais –Edward comentou da minha cama.

Revirei os olhos, nem me dando ao trabalho de desviar a atenção para ele enquanto continuava o exercício que fazia.

—Nem todo mundo nasceu com uma mente brilhante igual a sua –respondi.

Ouvi quando ele levantou da cama, parando atrás de mim e espiando o que eu fazia.

—Mas isso é fácil –descartou.

—Ok, Albert Einstein.

Ele puxou meu cabelo recém cortado levemente. Sempre mantive os fios na altura dos ombros e nunca tive coragem suficiente para pintar, até porque eu era a definição de preguiça com os cuidados com o meu cabelo. Alice dizia que eu tinha a benção da deusa dos cabelos – se é que aquilo existia – porque, segundo ela, os meus aparentavam ter uma saúde que não era possível ter sem fazer uma hidratação por semana.

Edward se mexeu ao redor do quarto, como se nem conhecesse o cômodo como se fosse dele, e eu continuei que eu estava fazendo, até ver, pelo canto do olho, ele andar até a mesinha que ficava ao lado da minha cama, indo abrir a gaveta.

Arregalei os olhos, provavelmente de maneira até meio engraçada, e larguei tudo que estava fazendo.

—Não abre isso!

Mas já estava feito. Edward congelou, encarando o conteúdo na gaveta. Eu sabia exatamente o que estava ali, mas não pude deixar de torcer que tivesse ido parar em outro lugar feito mágica.

Mas é claro que não tinha. Aquela gaveta era onde eu guardava todos os meus itens pessoais, desde remédio para dor e a alergia, que não me deixa em paz dede o dia em que nasci, até meus tampax e anticoncepcionais.

E claro, as camisinhas.

Edward fechou a gaveta lentamente e eu enfiei as mãos nos bolsos do shorts que eu usava, meu rosto ainda quente de vergonha. Nem tinha percebido quando levantei, mas estava em pé na frente dele quando meu amigo virou para mim.

—Você já... –perguntou.

Balancei a cabeça silenciosamente.

—Com Emmett?

—Sim! Claro! É meu namorado. Eu acho que me sinto meio ofendida com a pergunta –comentei, franzindo as sobrancelhas.

—Eu vou matar ele –foi a única coisa que ele disse antes de sair em disparada do meu quarto.

Arregalei os olhos e fui imediatamente atrás dele, quase tropeçando escada abaixo enquanto amaldiçoava Carlisle por ser tão alto e dar a genética de pernas longas para Edward.

—O que você pensa que vai fazer? –perguntei logo atrás dele quando chegamos no primeiro andar.

—Eu vou atrás do Emmett.

Acelerei o passo até que, finalmente, alcancei ele, o puxando pelo braço antes que ele alcançasse a porta.

—Qual a porra do seu problema? Ele é meu namorado, Edward! Eu sei que você também já fez sexo com a sua namorada, não entendo por que eu não poderia fazer com o meu também? –questionei, mantendo a voz baixa, já que meu pai e minha mãe estavam na cozinha, e se eu gritasse seria bem possível algum dos dois ouvir.

Ele pareceu se tocar do que estava fazendo, e seu rosto também assumiu uma coloração avermelhada. Edward abriu a boca quando larguei do braço dele, como se fosse dizer algo, mas então foi naquele momento que tudo mudou, mais uma vez.

Eu enxergo minha vida separada de duas maneiras, a época antes da morte do meu pai, em que tudo estava normal, e a época após a morte do meu pai, quando as coisas começaram a ficar estranhas.

Charlie Swan nunca foi um homem de muitas palavras, mas sempre teve um olhar que parecia perceber muito e dizer muito. Na verdade, pra mim nunca fez muito sentido meu pai ser meu pai. Éramos muito diferentes, tanto fisicamente quanto na personalidade. Aquela deveria ter sido minha primeira dica, mas assim como várias outras coisas na minha vida, eu ignorei. A coisa que talvez menos fizesse sentido era o fato de eu ter nascido loira quando Renée, Charlie, e meus avós tinham cabelo escuro.

Mas, apesar de todas as diferenças, eu amava ele. E eu sabia que ele me amava.

Também sabia que minha mãe nunca foi uma pessoa de gritar, por isso, assim que a ouvi berrar o nome do meu pai após o barulho de vidro quebrando, eu soube que tinha algo errado.

Esqueci de qualquer coisa sobre a quase discussão com Edward quando corri até a cozinha. Minha mãe tinha a cabeça do meu pai deitada em suas pernas, o rosto encharcado de lagrimas e os dois cercados de arroz e vidro quebrado.

Daquele momento em diante é difícil lembrar do que aconteceu. Tenho memória de pegar o telefone que tínhamos pendurado na parede e ligar para a emergência. Também lembro de dizer para Edward ligar para seu pai e avisar que estaríamos chegando no hospital em pouco tempo. Eu estava assustadoramente calma quando falei com a atendente no telefone e me abaixei, seguindo suas instruções de checar os batimentos cardíacos do meu pai enquanto ignorava minha mãe gritando por ele desesperadamente.

Os paramédicos chegaram em minutos e não demoraram em amarrar meu pai na maca, levando seu corpo desacordado para a ambulância rapidamente. Minha mãe os seguiu, entrando na van logo atrás dos médicos e me deixando em pé na porta de casa, observando enquanto o veículo disparava pela rua.

Edward deve ter me rebocado até o carro dele, porque, a próxima coisa que eu sabia era que eu estava encarando a parede branca do hospital, com Edward ao meu lado e Esme, ainda em seu uniforme, abraçando minha mãe chorosa algumas cadeiras de distância.

Eu não chorei até o momento em que o cirurgião entrou na sala de espera e disse que meu pai não tinha sobrevivido.

O enterro foi um evento estranho. Meu pai ser um policial fez com que muitas pessoas estivessem presentes para prestar suas condolências, a maioria sendo colegas de profissão que eu já tinha conhecido em algum momento da vida.

Mas não foram os rostos que reconheci que chamaram minha atenção. Na verdade, enquanto eu estava sentada entre Emmett – com a mão na minha nuca – e Edward, que agarrava minha mão na dele, meus olhos foram atraídos até uma senhora que tinha certeza nunca ter visto antes.

Ela estava um pouco afastada de onde ocorria o enterro, mas eu enxergava ela muito bem. Já tinha os cabelos já brancos presos em um coque baixo. Suas roupas eram diferentes das outras pessoas presentes. Usando um vestido preto que caía até os joelhos e que, mesmo com a distância, conseguia ver que provavelmente era de alguma marca que custava o salário inteiro de qualquer um dos presentes ali.

Apesar de estranhar a presença ali, estava prestes a voltar minha atenção para o que quer que o padre estivesse falando, assumindo que era alguém que conheceu meu pai. Mas quando Esme andou até ela de maneira decidida e agarrou seu braço bruscamente, eu soube que tinha algo errado.

Observei com interesse quando minha tia, sempre tão composta e elegante, claramente discutia com a mulher, que não parecia passar dos setenta anos. Esme gesticulava abertamente enquanto a idosa mantinha o rosto em branco.

Não sei quanto tempo assisti as duas, mas fui surpreendida quando minha tia apontou na minha direção e a mulher desviou os olhos para mim.

A respiração ficou presa no meu peito quando ela sorriu gentilmente para mim, seu rosto se enchendo com um sentimento que não soube identificar.

Rapidamente voltei a prestar atenção no sermão do padre, após ser flagrada as observando. Minha mãe também parecia ter percebido a mesma movimentação que eu, mas observava as duas com um sentimento diferente no rosto: medo.

Não entendi nada do que tinha acontecido naquele dia, mas não foi a última vez que vi aquela mulher. Na verdade, não demorou muito para reconhecer seu rosto no meio de uma multidão na segunda vez que nos vimos.

Aproximadamente quatro meses depois do funeral decidi terminar com Emmett. Já tinha percebido os olhares dele a uma menina que tinha entrado na escola na metade do ano. Rosalie era uma loira com quase um metro e oitenta de altura, e dizer que ela chamava atenção por onde passava seria um eufemismo.

Mas não foi só por conta do interesse de Emmett pela novata que me fez terminar o relacionamento. Os últimos dois meses tinham sido estranhos. Minha mãe tinha caído em um tipo de estado de paranoia desde a morte do meu pai. Por algum motivo ela tinha a impressão de que alguém entraria em casa a qualquer segundo e mataria nós duas. Ou de repentinamente eu, prestes a fazer dezesseis anos, iria ter um ataque cardíaco assim como meu pai e morrer.

Renée tinha parado de trabalhar, sobrevivíamos da pensão do meu pai e do salário do emprego de meio período que eu arranjei após a escola. Toda responsabilidade da casa caiu no meu colo, mas, para o azar da minha mãe, eu era uma negação na cozinha.

Essa atitude de Renée praticamente me empurrou para a casa dos Cullen com muito mais frequência que o normal. Eu odiava ficar dentro de casa e ouvir as quase alucinações dela, ficava lá apenas tempo suficiente para limpar as coisas e levar a comida que minha tia preparava. O natal naquele ano tinha sido esquisito, somente dois meses após a morte de papai, e precisei praticamente arrastar minha mãe até a casa vizinha, ainda que fossem pouquíssimos metros do nosso próprio quintal.

Ela não saiu do quarto depois disso.

Minha tia se demitiu do hospital, onde trabalhava como enfermeira, e passou a ficar quase o dia inteiro com a minha mãe. Caímos em um acordo silencioso, onde eu cuidaria das contas, limpeza e compras da casa, e minha tia seria quem faria companhia para minha mãe e tentaria a puxar de volta da concha de loucura que tinha criado em volta de si mesma.

Emmett não ligava para o tempo que eu passava sozinha com Edward, ainda empurrávamos o relacionamento com a barriga por alguma razão, então decidi colocar um ponto final naquilo antes de ganhar um par de chifres, e ser conhecida na escola pela pobre menina que foi traída pelo capitão do time de futebol.

Por isso, marquei um encontro com Emmett no shopping. Não sei o porquê da escolha do local, mas na época me pareceu mais apropriado.

Acabar com tudo foi bem mais fácil do que pensei que seria. Emmett claramente já estava pensando em fazer aquilo há algum tempo, mas provavelmente ainda não tinha arranjado coragem suficiente. Eu vi o alívio dele assim que as palavras saíram da minha boca, só não esperava pelo o que ele disse:

—Agora você pode finalmente ficar com o Edward. Eu juro, a quantidade de vezes que eu ouvi “nossa eu pensei que ela e Edward fossem acabar juntos” enquanto a gente namorava...

Ergui uma sobrancelha para ele, cruzando os braços. Estávamos sentados frente a frente na praça de alimentação do shopping, que ainda estava movimentado pela troca de presentes ganhados no natal. O frio ainda era bem presente em Chicago em fevereiro, e algumas pessoas ainda não tinham aberto mão do clima natalino, por isso poucas decorações ainda restavam.

—E você não se incomodou nem um pouco? Eu me sinto meio ofendida agora –brinquei.

—No começo sim. Muito, aliás. Eu posso ou não ter entrado em uma ou duas brigas por causa disso... mas nos últimos meses... –Levantou os ombros, meio que se desculpando. –Já não ligava tanto. Desculpa.

—Tudo bem –dispensei suas desculpas. –A gente ficou nisso tempo demais.

Emmett abriu um sorriso, mostrando as covinhas que eu sabia ter chamado atenção de Rosalie.

—Mas você não fica muito atrás, não é? Percebi seus olhares para a garota Hale. –Emmett corou, para o meu deleite. –Eu posso ou não ter intimidado ela um pouco...

—Bella! –ele repreendeu.

—É engraçado quando alguém como Rosalie Hale sente ciúmes, Emmett. Uma injeção de autoestima, eu diria.

Meu agora ex-namorado balançou a cabeça, rindo.

—Você é diabólica, Isabella Swan. Mas, então, amigos?

—Com certeza! Mas eu não estou te devolvendo nenhuma das camisetas –avisei. –São ótimos pijamas.

—Eu não esperava por isso –comentou antes de levantar da cadeira. –Vou comprar um pretzel, você quer? –perguntou.

—Você sabe que sim. O de sempre.

Ele assentiu antes de sumir da minha vista, indo em direção a barraquinha que vendia os melhores pretzels da cidade.

Eu suspirei, observando ao redor com tranquilidade, quase sentindo como se tivesse tirado uns dez quilos dos ombros, até que meu olhar trancou com o de um rosto conhecido.

Tinha pensando naquela mulher no enterro do meu pai algumas vezes nos últimos meses. Cheguei até mesmo a perguntar para minha tia, mas ela desconversou após trocar um longo olhar com Carlisle.

Nunca esquecia o rosto de alguém, ainda mais o dela, por isso, assim que a vi, soube instantaneamente quem era. A senhora estava vestindo roupas igualmente elegantes ao dia do enterro, mas era mais adepta ao ambiente de um shopping.

Ela me encarava incansavelmente, sozinha, até que uma menina loira, aparentemente com a minha idade, apareceu do lado dela. A garota tinha o mesmo tom de cabelo que o meu, assustadoramente parecido, na verdade e, uma vez que se virou, quase cai da cadeira quando vi seu rosto.

Éramos quase idênticas. As duas estavam mais próximas de mim do que a senhora estava no dia do funeral, então conseguia ver suas expressões com uma clareza impressionante. Por isso, vi claramente que o que separava eu e a menina de sermos gêmeas era o fato de que seus olhos eram azuis, e minha boca um pouco mais cheia que a dela. Além disso, todo resto era idêntico. Altura, o formato do corpo e até o corte de cabelo.

Eu vi quando a senhora apontou com o queixo na minha direção e a menina desviou a atenção para mim. Ela disse alguma coisa para a mais velha e as duas levantaram, vindo na minha direção.

Só sentei lá, completamente em choque, enquanto elas se aproximavam, observando enquanto desviavam dos caminhantes do shopping. Porém, despertei do meu estado de paralisia quando um corpo entrou na minha frente.

Pisquei, vendo Emmett me olhar preocupado.

—Tá tudo bem? Você parece que viu um fantasma.

—Vamos embora –falei, rapidamente me levantando e pegando o saquinho de papel da mão dele.

—O que? –perguntou, franzindo as sobrancelhas. –Por que?

—Só... vamos. Eu explico no carro.

Emmett aceitou e nós rapidamente saímos da praça de alimentação, ele passando o braço ao redor dos meus ombros protetoramente.

Olhei para trás brevemente enquanto nos afastávamos, vendo que elas tinham parado repentinamente, mas ainda olhavam na minha direção.

Eu inventei uma desculpa qualquer para Emmett quando chegamos no veículo. Falei que tinha um homem me encarando de maneira estranha, mas então tive que convencê-lo a não voltar lá e tirar satisfação. Sabia que, para ele, aquela história seria bem estranha. Emmett provavelmente pensaria que era somente uma conhecida do meu pai que queria conversar, mas algo me dizia que tinha muito mais naquilo.

Infelizmente, o evento voltou a repetir algumas vezes. Na verdade, cheguei em um ponto que pensei estar alucinando como minha mãe. A vi na saída da escola, quando estava chegando no trabalho, quando saia com Edward ou Alice, no mercado, até mesmo nos jogos da escola que participava por ser líder de torcida. Sempre acompanhada por dois homens que mudavam ao longo do tempo.

Porém, eventualmente, acabei aceitando a presença estranha. Não comentei nada com ninguém, e talvez aquilo tenha sido meio estúpido da minha parte, já que eu estava sendo claramente perseguida, a mulher nunca disse nada ou tentou fazer contato comigo além daquele dia no shopping, então pensei que estava tudo bem.

Talvez, se eu tivesse ido até ela e conversado, teria evitado tudo que aconteceu.

Após terminar com Emmett meu relacionamento com Edward tomou um caminho estranho. Comigo passando a quantidade de tempo que eu passava em sua casa, ficamos impossivelmente próximos, e foi quando as coisas mudaram, mais uma vez.

Ele tinha terminado com Tanya pouco depois que eu tinha acabado com as coisas entre mim e Emmett, porém, diferente do que aconteceu comigo, o término fez as coisas ficarem tensas entre os dois. Tanya ainda era total e completamente apaixonada por Edward, e a menina que um dia foi doce e gentil se transformou completamente.

Ela tinha feito desde pichações no meu armário até simples olhares atravessados nos corredores da escola. Tanya parecia pensar que eu era a culpada pelo término dos dois. Não estava exatamente ligando para aquilo, já Edward parecia muito preocupado com a situação.

—É meio engraçado –falei, observando meu armário.

—Eu não acho que seja engraçado –Edward comentou.

—Claro que é, você viu a cara dela quando eu comecei a rir?

Bem na porta do meu armário tinha uma caricatura enorme da minha cara com chifres desenhada em vermelho. Tinha acabado de sair da aula de biologia com Edward no encalço. Como sempre, ia passar no armário para deixar meus livros antes do almoço. Qual não foi minha surpresa ao chegar lá e encontrar um grupo de pessoas cochichando sobre algo.

Depois de passar no meio da multidão e ver o desenho, não consegui impedir a risada que pulou da minha boca. Eu balancei a cabeça e simplesmente abri a porta, largando minhas coisas lá como sempre antes de ir para a cafeteria.

Edward, infelizmente, não compartilhou do meu humor. Ele fechou a cara quando viu e até agora, quando já estávamos sentados na mesa que compartilhamos com Alice, Emmett e Rosalie, que tinham finalmente começado a namorar.

—Se você ligar tanto ela não vai parar, Edward. Nós dois sabemos disso. Relaxa e ela vai parar.

Acontece que, qualquer fosse o plano de Tanya – se é que ela tinha um – estava indo por água abaixo.

A primeira vez que nos beijamos foi um evento estranho e mal conseguimos olhar um para a cara do outro depois daquilo, tempo preciosamente perdido, eu enxergava agora.

O ano letivo já tinha acabado e meu aniversário de dezoito anos se aproximava. Com o verão em pleno andamento em Chicago, mal aguentávamos as altas temperaturas.

Assim, nas tardes em que eu não estava derretendo com o ar condicionado quebrado do mercadinho de bairro onde trabalhava, Edward e eu mantínhamos uma tradição desde que éramos pequenos.

Nossas mães tinham descoberto um tipo de praia quando tinham nossa idade. Era pouco visitada porque ficava literalmente no meio do nada, cercada por uma mata densa onde o único acesso era uma trilha.

Tínhamos o costume de deixar o carro no estacionamento mais próximo da trilha, que era uma boa caminhada até lá, e depois seguíamos o resto do caminho andando.

Quando saímos da trilha, eu e Edward estávamos felizes em descobrir que seria um dia com apenas nós na praia. Por isso não nos importamos em largar os pertences na areia antes de correr até o mar.

—Eu não acredito que a gente conseguiu pegar a praia vazia num dia desses –Edward comentou depois que já estávamos no mar há uns bons quinze minutos.

Eu boiava na água tranquilamente, sentindo paz que há muito não sentia, somente observando o céu sem nuvens acima da minha cabeça.

Edward provavelmente percebeu que eu não iria responder ao que ele disse, porque, com um rápido movimento da mão, empurrou uma onda de água para cima de mim.

Rapidamente fiquei na posição vertical, passando as mãos pelo rosto para afastar a água dos olhos e fazendo cara feia para ele.

—Você vai ficar só boiando aí? –ele perguntou.

—O eu mais você quer que eu faça?

Ele deu de ombros, mas percebi quando seus olhos adquiriram um tom malicioso. Edward passou a jogar mais água em mim, em ondas praticamente, e eu engasguei enquanto tentava, em vão, me afastar.

Porém, não fiquei parada. Uma vez que Edward pareceu cansar, rapidamente me impulsionei em direção aos seus ombros, o empurrando para baixo da água.

Não consegui manter meu domínio sob ele por muito tempo. Edward não demorou para conseguir me puxar para baixo junto com ele e, segundos depois, nós dois voltamos a superfície.

Não tinha percebido o quão perto estávamos um do outro até aquele momento.

O sorriso lentamente se esvaiu do meu rosto quando meu olhar caiu para a boca dele. Ainda tinha as mão em seus ombros, e Edward tinha deslizado os braços pela minha cintura para me firmar.

Nunca tinha estado numa posição daquelas com qualquer outra pessoa senão Emmett, mas, sabia exatamente o que estava prestes a acontecer quando Edward se inclinou na minha direção.

E não fiz nada para impedir.

Na verdade, muito pelo contrário. Quando ele se aproximou ainda mais, eu fechei o resto da curta distância entre nós, deixando que nossos lábios se juntassem hesitantemente.

Ficamos naquela posição por alguns segundos até que eu abrisse um pouco a boca, dando acesso e a liberdade para que ele fizesse o que ambos queriam.

Após isso, as coisas desceram em uma espiral confusa e rápida.

Num minuto, ainda estávamos hesitantes ao redor um do outro, lábios mal se movendo, e no próximo eu tinha minhas pernas envolta de sua cintura, os braços agora apertados firmemente no pescoço dele, enquanto suas mãos me sustentavam pela bunda.

Sua língua traçou minha boca antes de se enrolar contra minha, o ritmo do beijo quase alucinante, enquanto eu empurrava meu peito contra o dele.

Eu sinceramente não sei até onde teríamos ido se uma onda, ainda que pequena, batesse contra nós, molhando ainda mais nossos rostos no processo.

Edward e eu rapidamente nos desenroscamos. Não sabíamos o que fazer ou falar, por isso, não esperei para soltar qualquer desculpa sobre querer pegar um bronzeado antes de voltar para a areia.

Não nos falamos por umas três semanas depois daquilo. Eu comecei a ficar mais tempo na casa de Alice e ela, claramente, percebeu que tinha algo errado.

—Bella, não me leva a mal, mas por que você está passando tanto tempo aqui em casa?

Desviei o olhar para ela, a encarando pelo espelho da penteadeira a minha frente.

Naquele dia tinha concordado em deixar que ela fizesse um penteado no meu cabelo, coisa que eu nunca gostei muito. Passei algumas horas sentada na frente dela, e agora meu cabelo, já mais longo que o usual, estava metade preso em uma trança que parecia complicada demais e, e a outra metade solto em cachos que não se formaram sem algum trabalho da minha amiga.

—Você está me expulsando?

—Não, lógico que não! –Alice exclamou, se jogando na cama ao meu lado. –É que você passa bastante tempo com o Edward e eu estranhei... Vocês brigaram?

Mordi o lábio inferior antes de deitar do lado dela, encarando o teto pintado com estrelas em tinta fluorescente.

—Não. É que... ele me beijou. Ou eu beijei ele. Não sei.

—Ok, e qual o problema?

—Eu não sei! A gente não se fala desde então.

—O que você está esperando, Bella? Vai conversar com ele! Vocês já estão nessa palhaçada há anos! Ele gosta de você, você gosta dele mas nenhum dos dois assume!

Por isso, uns vinte minutos depois estava parada na porta da casa dos Cullen.

Sabia, pelo horário, que meu tios não estariam em casa, Carlisle no hospital e Esme cuidando da minha mãe na casa ao lado. Enfiei as mãos nos bolso de trás do shorts jeans, esperando ansiosamente que Edward aparecesse.

Meu desejo foi concedido pouco depois quando a porta foi aberta. Sorri desconfortavelmente para ele, trocando o peso de um pé para o outro.

—Oi –cumprimentei baixinho.

—Oi.

—A gente pode conversar?

—É sobre o beijo? –Edward se adiantou, saindo e fechando a porta atrás de si. –Se for, você não precisa se preocupar. Foi só um impulso, não significou nada.

Mordi o lábio, passando os braços ao redor de mim mesma e torcendo para que ele não percebesse. Não tinha parado para pensar sobre meus sentimentos por Edward, mesmo sabendo que não era uma amizade normal, e uma vez que Alice disse, bem, deixei a esperança de que fosse reciproco tomar conta de mim.

Bom, claramente não era.

Nunca mais voltei a tocar no assunto, assim como ele. Edward e eu caímos na mesma rotina de antes, apesar do clima entre nós ter demorado para voltar ao normal. As aulas também não demoraram para voltar e começamos nosso último ano com tranquilidade. Setembro passou junto com meu aniversário sem muitas emoções e, logo, o recesso de natal chegou mais uma vez.

Já fazia um bom tempo que meu pai tinha falecido, então pensei que minha mãe teria saído do estado que se encontrava, mas errei na minha previsão. Na verdade, Renée piorou até chegar em um estado em que eu e minha tia começamos a cogitar a hipótese de procurar ajuda profissional.

Eram raras as vezes em que ficava sozinha com ela em casa, porém, com o natal se aproximando, Esme precisou ir ao mercado para começar a preparar a ceia e, assim, acabei parada na frente da porta do quarto da minha mãe com um prato de comida na mão.

Bati hesitantemente na madeira, não esperando exatamente uma resposta, mas querendo anunciar minha presença. Depois de aguardar alguns segundos, empurrei a porta que agora vivia aberta.

Esme tinha sumido com a chave que fechava a porta do quarto por precaução, me disse, e eu preferi não pensar no porquê daquilo ser necessário.

—Mãe?

Quando entrei no quarto, minha mãe tinha abandonado o lugar de costume na poltrona que meu pai adorava e estava parada na frente da janela. Renée estava fisicamente saudável, graças a minha tia, mas eram pequenos detalhes que deixavam sua situação mental visível.

Seu cabelo, seco e opaco, ficava preso de qualquer jeito em um rabo de cavalo baixo, ela vestiria a mesma roupa por dias seguidos se não fosse eu ou minha tia a fazer tirar para lavar. As roupas de cama eram trocadas a cada três dias e uma vez por semana eu e Esme nos juntaríamos para praticamente arrastá-la de dentro do quarto aos berros para limpar.

Também era o único momento em que tínhamos alguma reação dela.

Além disso, acabei me acostumando com as respostas mínimas ou simplesmente nenhuma. Por isso, poderia dizer que estava agradavelmente surpresa quando minha mãe disse:

—Aquele carro já está parado ali há mais de dois dias.

Franzi as sobrancelhas, deixando o prato em cima da mesa que ela passou a fazer as refeições e me aproximei de onde ela estava. Olhei sob o ombro dela, colocando as mãos em seus braços levemente, e encarei o lugar que ela parecia já observar há algum tempo.

Tinha começado a nevar recentemente, então a rua e as decorações de natal externas estavam cobertas no que parecia um manto branco. Não tinha ninguém do lado de fora, apesar de eu ter visto algumas crianças na rua brincando mais cedo, então o único carro estacionado na frente da nossa casa se destacava como se fosse rosa neon, não preto.

Não lembrava de ter visto nenhum dos meus vizinhos com aquele modelo. Tinha certeza que já tinha visto um daqueles em uma das revistas automobilísticas de Edward e, pelo o que bem lembrava, aquele carro não caberia no bolso de alguém que morava em um bairro de classe média.

Não era possível ver se tinha alguém dentro do veículo – em razão dos vidros escuros -, mas a sensação de ser observada rapidamente se instaurou junto com um arrepio que parecia ter feito até meus ossos estremecerem.

Apesar disso, não queria alarmar minha mãe mais do que o normal, então somente apertei seus braços levemente, começando a virá-la para a mesa onde sua janta esperava.

—Algum dos vizinhos deve ter comprado um carro novo –falei, puxando a cadeira e deixando que ela sentasse. –Aqui, tia Esme fez steak com purê de batata. E tem torta de maçã de sobremesa! Você adora torta!

Entreguei o garfo e a faca, uma arredondada que na verdade não cortava nada, para ela e já ia sair do quarto quando minha mãe agarrou meu braço.

Me virei, me surpreendendo mais uma vez quando percebi que ela me olhava diretamente nos olhos.

—Eles estão observando, Bella –sussurrou. –Tenha cuidado.

Uma hora depois o carro desapareceu.

Na manhã de natal, após a divisão de presentes, ainda não tinha esquecido o carro. Eu tinha criado mil justificativas para aquilo, e faziam sentido, mas não consegui abandonar a sensação de que tinha algo errado.

Estava sentada na parte de trás da casa dos Cullen, encarando o jardim coberto de neve, quando o barulho da porta abrindo me distraiu. Desviei o olhar e vi Edward saindo de dentro da casa com duas xícaras na mão.

Minha relação com Edward continuava a mesma, porém, dessa vez, com o adicional de que eu tinha finalmente admitido meus sentimentos por ele, e Edward não parecia retribuir.

—O que você está fazendo sozinha aqui?

Dei de ombros, voltando a observar o jardim enquanto Edward sentava do meu lado no balanço que meu pai e Carlisle tinham instalado quando tínhamos sete anos. Ele estendeu uma das xícaras para mim e eu aceitei sem hesitar, esquentando as mãos com a cerâmica quente.

Ficamos em silêncio por algum tempo enquanto eu me deixei aproveitar o calor do corpo dele encostado no meu. Apoiei a cabeça no ombro dele, deixando que Edward nos balançasse suavemente.

—O que você tem? –ele perguntou.

—Uhm?

—Você está meio estranha desde semana passada. Não quis sair com a gente antes de ontem.

Já tinha uns três anos que saíamos perto da véspera de natal. Eu, Edward e Alice começamos a tradição e, ao longo do tempo, Emmett e Rosalie também começaram a fazer parte.

Não era como se eu pudesse contar para Edward que eu achava que tinha alguém me seguindo e tinha medo de colocar eles em perigo. Na melhor das hipóteses, eu acabaria em alguma consulta com um psiquiatra que diria que eu tinha algum tipo de psicose.

Então, acabei por decidir contar a segunda melhor verdade:

—Eu te amo.

—Eu também te amo, Bella.

—Não, Edward. Eu estou apaixonada por você.

Ficamos em silêncio e um caroço pareceu ficar preso na minha garganta enquanto esperava que ele falasse algo. Eu tirei minha cabeça do ombro dele, baixando os olhos para a xícara na minha frente, e pesquei um dos marshmallows que boiavam no chocolate quente.

—Isso é sério? Você está falando sério?

—Por que eu não falaria? –suspirei, levantando do balanço. –Você não precisa dizer nada de volta, Edward. Eu só... não consigo manter isso para mim mesma, não mais. Desde aquele dia na praia eu sabia, mas eu não disse nada. Na verdade eu ia contar mas ai você disse que o beijo não tinha significado nada e eu...

Enquanto eu falava, Edward levantou do balanço também, ficando em pé na minha frente. Não percebi quando ele tirou a xícara da minha mão, largando tanto a minha quanto a dele em cima do balanço com cuidado, e bateu a boca na minha.

Inspirei, assustada, mas meus ombros relaxaram instantaneamente. Abracei o pescoço dele, ignorando a blusa grossa que nós dois vestíamos para lutar contra o frio de Chicago, e deixei que ele me puxasse para o mais perto possível.

Quando nos afastamos, Edward tinha uma das mãos segurando minha nuca firmemente, enroscada no meu cabelo.

—Eu estou apaixonado por você desde que tínhamos dezesseis anos, Bella Swan.

Eu resolvi esquecer dos meus problemas momentaneamente depois daquilo.

Edward e eu começamos a namorar pouco depois, resolvendo parar de perder tempo. Os pais dele não pareceram exatamente surpresos com o desenvolvimento das coisas, apesar de terem ficado bem felizes por nós. Nossos amigos também não estranharam muito, fazendo apenas comentários de que tínhamos demorado o suficiente.

Minha mãe não teve reação quando contei a notícia e, apesar de tentar esquecer aquele dia que vimos o carro a todo custo, não consegui deixar a preocupação de lado. Tentei disfarçar a todo custo, mas as vezes Edward ou Alice percebiam quando eu olhava ao redor, procurando algo que eu nem sabia o que era.

Voltei a ver aquela mulher algumas vezes, mas alguma coisa dentro de mim, bem no fundo, dizia que ela não tinha nada a ver com o carro parado na frente da minha casa na época de natal.

Assim, meu último semestre na escola passou. Eu e Edward aplicamos para as mesmas universidades e, felizmente, quando as cartas de aceitação começaram a chegar, acabamos por descobrir que o destino tinha trabalhado ao nosso favor.

Ou assim pensava.

O dia da nossa formatura tinha sido incrível. Eu esperava pacientemente na fila por ordem de sobrenome para ser chamada para o palco quando minha atenção foi desviada para Esme e Carlisle. Tínhamos contratado uma enfermeira para ficar com a minha mãe em casa, de modo com que os dois pudessem estar presentes na cerimônia de formatura.

Meu tios estavam parados há alguns metros da plateia, quase saindo da quadra em que a formatura acontecia, mas não estavam sozinhos. Aquela senhora estava parada na frente deles, com dois homens enormes atrás dela, e os três pareciam discutir fortemente.

Mordi o lábio inferior, olhando para frente e tentando enxergar Edward, mas, para o meu azar, muitas pessoas estavam entre Cullen e Swan.

Pensei um pouco e, ao perceber que o professor monitor não prestava atenção em mim, sai da fila, rapidamente cruzando o espaço até eles.

—Ela precisa sair aqui agora! –a mulher falou quando me aproximei o suficiente para ouvir.

A senhora foi quem percebeu minha presença primeiro. Ela rapidamente se calou e, dessa vez, estando perto daquele jeito, consegui ver o olhar caloroso que mandou na minha direção. Parecia quase... saudade?

—Tio? O que está acontecendo? –perguntei, chamando a atenção deles.

Os dois viraram bruscamente, minha tia parecia quase desesperada e meu tio tinha um olhar que eu nunca tinha visto em seu rosto antes, de medo. Meus tios ficaram quietos, Esme colocou a mão na bica, seus olhos marejando, e desviou o olhar do meu, já Carlisle parecia sem palavras.

—O que está acontecendo? Quem precisa ir embora?

Já que nenhum dos dois parecia ter a iniciativa de resposta, a senhora se aproximou de mim, pegando minhas mãos nas dela.

—Querida, você não me conhece, mas eu preciso que você preste muita atenção, você corre perigo. Eu posso te levar para um lugar seguro, mas agora não temos tempo para explicar.

—Mas eu nem sei seu nome... não, tia, o que está acontecendo? Eu estou ficando assustada.

Assim, Esme pareceu saiu do estupor que estava. Ela rapidamente me afastou da senhora, me colocando em suas costas.

—Você nem sonha com isso! Você e sua família já fizeram o suficiente com Renée e eu só pude assistir, não vou deixar vocês fazerem isso com ela também.

Minha tia rapidamente começou a me afastar da senhora. Um dos homens atrás dela sussurrou algo em seu ouvido, ao que ela respondeu com um acenar negativo com a cabeça.

—Meu nome é Marie Dwyer, Bella. Não se preocupe, nós vamos te achar.

Tive mais um breve olhar dela antes que minha tia praticamente me enfiasse dentro do carro. Ela e Carlisle discutiram um pouco do lado de fora até que somente meu tio se sentasse no banco do motorista.

Ele rapidamente ligou o carro e saímos do estacionamento em disparada. Agarrei o banco, fincando as unhas no acolchoado. Carlisle era o motorista mais seguro que eu conhecia, então sabia que alguma coisa estava terrivelmente errada quando o velocímetro mostrou que ele estava quebrando pelo menos umas quatro leis de direção.

—Tio?

—Eu não tenho como te explicar, Bella, nem sua tia nem sua mãe me deixaram saber muito. A única coisa que eu posso dizer com toda certeza é que aquelas pessoas são perigosas, querida. Aquela mulher com quem falou com você... não é coisa boa, mas também não é o pior que poderia acontecer. Tem algumas pessoas bem perigosas atrás de você agora, e você precisa desaparecer.

—O que? Não, eu não posso ir embora, minha mãe, Edward... não.

—Bella, se você ficar vai colocar todos nós em risco. –Com isso, ele conseguiu me calar com eficiência. –Eu odeio fazer isso e só Deus sabe como eu queria ser capaz de te proteger, mas eu não posso. Eu vou te levar até sua casa, você arruma uma mala o mais rápido possível, e então vou te levar até a rodoviária.

Aproximadamente uma hora depois eu estava sentada ao lado do meu tio esperando que anunciassem o ônibus para Houghton em Michigan. Quem tinha escolhido o local tinha sido meu tio e, quando ainda estávamos no carro, ele me entregou um envelope cheio de dinheiro, que parecia pesar uns quatro quilos dentro da bolsa de ombro que eu carregava.

Estávamos em silêncio desde que sentamos, os dois perdidos dentro da própria cabeça. Meu rosto já estava seco de tanto chorar e em algum lugar na minha cabeça eu agradecia por ter lavado a maquiagem no meu rosto quando estava em casa. Também tinha largado a beca lá e rapidamente trocado meu vestido para um jeans e a primeira blusa que encontrei.

Também esqueci meu celular em casa, coisa que meu tio disse ser até melhor, apesar de não explicar o porquê, quando lhe contei o que aconteceu.

—Seu ônibus chegou.

Levantei os olhos do meu colo, encarando o outro lado do vidro e vendo o veículo parado, as pessoas ao redor começando a se mexer para entrar.

Também levantei, colocando a bolsa no meu ombro antes de virar para ele. Meu tio me puxou para os seus braços e eu apertei os olhos fechados, tentando conter mais uma rodada de lágrimas. Ficamos daquele jeito provavelmente mais do que o aceitável, porém, quando nos afastamos, vi que eu não era a única chorando.

—Edward queria te dar isso na formatura mas... bem. –Ele fungou, puxando uma caixinha de veludo de dentro do bolso antes de estender para mim.

Era um colar com dois pequenos corações grudados um no outro, aparentemente de ouro. Não consegui conter as lágrimas pela terceira vez no dia quando puxei a correntinha do suporte. Meu tio rapidamente colocou em mim antes de me dar um beijo na testa.

—Quando eu vou poder voltar, tio?

—Eu não sei, querida.

Assenti, me afastando e prestes a entregar minha passagem para o motorista quando virei mais uma vez.

—Diz para o Edward que eu amo dele.

Sete horas depois eu chegava em Houghton. Quando sai do ônibus eram quase duas da manhã, me hospedei na pousada mais barata que achei. Rapidamente me registrei, achando meio ruim ter que ficar em um quarto no térreo, coisa que acabou se mostrando eficiente pouco depois.

Não consegui passar nem cinco dias inteiros na cidade. Pensando agora, cometi vários erros. Começando com o fato de ter entregue meus documentos reais, e terminando com a questão que mesmo aquela pousada era luxo demais.

O dia em que fui embora o quarto no primeiro andar se mostrou útil. Estava deitada, quase pegando no sono, quando uma batida soou. Eu estranhei, não tinha pedido nada, então, sem acender as luzes, fui até minha porta fazendo o mínimo de barulho possível e encostei a orelha na madeira. Consegui ouvir sussurros de mais de duas vozes masculinas e um alarme acendeu dentro da minha cabeça instantaneamente.

Me afastei também nas pontas dos pés, rapidamente juntando tudo que tinha e aproveitando para rouba uns sabonetes, shampoo e condicionador que o hotel proporcionava. Me enfiei em um casaco de moletom enquanto mais batidas soavam.

Dei uma olhada ao redor do quarto antes de abrir a janela, agora ouvindo quem quer que estivesse lá fora chamar meu nome. Larguei a mala e passei uma das pernas para fora.

Olhei assustada para a porta quando as batidas viraram chutes e praticamente me joguei da janela. Cai em cima de um arbusto, provavelmente me cortando em alguns lugares, mas ignorei a dor, levantando e pegando a mala. Sai correndo, descalça mesmo, e entrei pelo corredor que eu sabia que levava até a saída de emergência da recepção.

Abri a porta levemente, espiando do lado de fora somente para ver o salão completamente vazio. Na verdade, a mulher que tinha me atendido quando cheguei estava deitada trás do balcão, e meu sangue gelou quando me questionei o que aquelas pessoas queriam comigo.

Ignorei minha vontade de ver se ela estava bem e, pedindo perdão a todos os deuses por estar indo embora sem acertar a outra metade da estadia, sai correndo da pousada.

Não sei por quantas ruas corri, mas era uma cidade relativamente pequena então não vi muitas pessoas. Também não tinha nem ideia de onde estava e, pensando somente naquele momento que não poderia usar meus documentos mais uma vez, também não sabia o que faria.

Parei somente depois de um bom tempo, minha respiração acelerada e pés doendo por ter corrido descalça no asfalto. Acabei em um ponto de ônibus e por ali fiquei, pensando em qual seria meu próximo passo.

Naquela noite fiquei só rodando pelas ruas, tentando achar um lugar aceitável e rezando para não esbarrar com quem quer que estivesse na porta do meu quarto. Somente quando amanheceu que percebi que estava em uma parte de aparência duvidosa e uma ideia apareceu na minha cabeça.

Fui passando em alguns bares em que tinham pessoas bebendo as oito da manhã, perguntando sobre algum lugar que eu poderia ficar que não pedisse nenhum documento. A maioria me olhou meio desconfiada, com certeza não acreditando na minha história de que tinha perdido a carteira na viagem, mas depois de umas três horas fui parar no quartinho de uma pensão, com instruções claras de trancar a porta bem a noite.

Sabia que não podia ficar muito tempo na cidade, já tinham me encontrado e provavelmente ainda estavam ali. Não ia ter tempo de achar alguém que fizesse documentos falsos, e a julgar pelo tamanho da cidade o preço seria um absurdo, então comprei uma passagem na segunda rodoviária da cidade, uma que era três vezes menor que a outra, e no dia seguinte estava em outra cidade do estado.

Os dois anos seguintes foram assim.

Uma vez que consegui documentos falsos, minha vida ficou mais fácil. Sabia que o dinheiro que Carlisle me deu eventualmente acabaria, então a cada cidade que chegava eu arranjava um emprego em qualquer lanchonete ou bar da periferia da cidade. Também precisava trocar os documentos a cada três ou dois meses, por precaução. Passei por mais cores de cabelo do que nunca nesse tempo e, depois de praticamente fritar os fios com um loiro platinado pouco tempo atrás, acabei em uma que parecia um castanho escuro, com o maior comprimento que já tinha tido, no meio das minhas costas.

Meu tempo em cada lugar também aumentou, mas nunca passava de dois meses. Aprendi a confiar na minha intuição e, assim que sentia que algo estava errado, não hesitaria em arrumar minhas coisas e partir para o próximo destino.

Apesar de continuar, não fiquei de braços cruzados para descobrir do que eu estava fugindo. Tinha certeza que aquela senhora tinha algo a ver com isso, então a primeira coisa que fiz quando comecei a pesquisar foi colocar o nome dela no google.

Tinha somente uma hora para usar o computador da lan house e não perdi nenhum segundo, porém, não teve nenhum resultado com “Marie Dwyer”, na verdade, o que apareceu foi Phil Dwyer, o falecido diretor de uma empresa de laticínios que morreu pouco antes do meu pai.

Aquilo claramente não me deu nenhuma resposta.

Então só segui minha fuga, me questionando quando ou se iria ver minha família e Edward de novo. Toda vez que deitava, o colar que nunca tirei do pescoço parecia pesar cinco quilos e eu não podia fazer nada além de chorar, lembrando do tempo em que tinha tudo.

A última cidade em que passei foi New York, de longe a maior que já estive, mas fiquei bem longe do centro. Acabei no Bronx, na rua mais calma possível que achei. Eu morava em um minúsculo cômodo em cima da lanchonete onde trabalhava, que os donos, James e Victoria, gentilmente me alugaram sem fazer muitas perguntas.

Eles eram um casal de meia idade, de longe as pessoas mais gentis que conheci no meu tempo fugindo, mas não me dei ao luxo de criar nenhum laço, ainda mais sabendo que logo meu tempo acabaria e eu teria que ir embora. Eu só não imaginei que seria mais rápido que imaginei.

Eu limpava o balcão na minha frente, tendo acabado de atender o que eu esperava ser o último cliente do dia. A outra garçonete já tinha ido para casa, assim como James e Victoria, e eu tinha ficado para fechar a lanchonete assim como nos outros dias quando o sino em cima da porta de entrada soou.

—Já estamos fechados –falei, já estando acostumada com alguns bêbados entrando naquele horário.

—Eu queria falar com você, Bella.

Minha cabeça ergueu assim que meu nome real foi pronunciado. Já tinha um bom tempo que não ouvia ele, na verdade, quase dois anos. Todos ali me conheciam por Elizabeth Smith, então soube que quem estava na minha frente tinha vindo de Chicago.

—Marie, não é?

—Você lembra, então? –ela perguntou, se aproximando até ficar parada na minha frente.

—Difícil esquecer.

Ela assentiu e eu a observei de mais perto. Tinha envelhecido, algumas rugas se juntando as que já tinha quando a conheci, mas não tinha perdido a pose elegante. Olhei para fora, vendo o carro que se destacava em contraste com o bairro humilde, as pessoas ali sabiam que não deviam se meter com quem aparecia naquele tipo de carro. Algumas gangues tinham ação naquela região e, apesar de raramente aparecerem por ali, praticamente a vizinhança inteira estava avisada.

Minha mente brincou rapidamente com a hipótese de tudo aquilo na minha vida ter sido obra de alguma coisa similar, porém, parecia muito cinematográfico para entrar na minha cabeça.

Como se tudo naquela situação já não fosse cinematográfico.

—Senta, por favor. Quer alguma coisa?

Ela recusou, então apenas empurrei o pano que usava para limpar para baixo, me apoiando na frente dela.

—Você é difícil de achar, Bella. Para alguém que nunca fez isso eu diria que você se saiu bem até demais.

Dei de ombros, dispensando o elogio.

—Veio me dizer que eu estou em perigo de novo? Acho que eu já suspeitava disso, contando com o fato de que eu tenho fugido há dois anos sem nem saber do que.

—Você está sim em perigo, Bella, como tão bem apontou. Mas hoje eu vim te dar uma solução para isso, pelo menos parcialmente, você só precisa vir comigo e tudo vai ficar b...

—Bem? Não, não vai ficar. Mas eu adoraria uma explicação do que eu tenho fugido nos últimos anos e então talvez eu possa pensar na possibilidade.

—Ok, mas é uma história longa.

Dei de ombros pela segunda vez.

—Bom, eu sou sua avó biológica.

Marie deve ter percebido quando minhas sobrancelhas quase saíram do rosto quando disse aquilo, porque logo se justificou.

—Calma –suspirou -, eu comecei do jeito errado.

Então, minha “avó” se lançou em uma narrativa que começou quando minha mãe era um pouco mais nova que eu. Segundo ela, Renée tinha conhecido Phil e os dois engataram em um namoro de anos, passando pela época da escola até chegar na faculdade.

O problema se mostrou presente quando o pai de Phil faleceu inesperadamente. Então, minha vó explicou que seu filho herdou mais que os genes. Ele descobriu a razão da fortuna do pai não era a empresa de laticínios, e sim o fato de que ele era a cabeça de uma gangue.

Marie me contou que minha mãe engravidou de mim ao mesmo tempo em que Phil assumiu a liderança. Ela também admitiu que, depois de ser engolido para aquele mundo, seu filho virou um péssimo parceiro para minha mãe, por isso, ajudou Renée a fugir, escondendo minha mãe embaixo do nariz dele, de maneira que ela conseguiu viver quase dezessete anos em paz.

Porém, o que era antes uma gangue se tornou uma máfia muito influente em Chicago, o que claramente trouxe muitos inimigos e, assim, se deu a morte de Phil. Um outro grupo rival estava disposto a tomar o lugar da família Dwyer, mas, de acordo com Marie, teriam que matar um a um até que não sobrasse ninguém que pudesse clamar o trono.

—Primeiro foi o Phil. E então duas irmãs dele. Eu perdi quase todos meus filhos em dois meses até percebemos o que estava acontecendo. E, infelizmente, somente meu filho foi estúpido suficiente para não te procurar na própria cidade, o dia do funeral do seu pai foi a primeira vez em que tentei avisar sua mãe, mas Esme –ela riu, balançando a cabeça negativamente -, eu não teria saído viva naquele dia se ela pudesse portar uma arma.

Eu duvidava daquilo, minha tia sempre foi a pessoa mais pacífica que conheci, mas, depois de tudo, aprendi que as vezes as coisas não são como nós vemos.

—Mas por que eles vieram atrás de mim? Eu não queria isso, eu estava feliz com o jeito que vivia.

—Eles não se importam querida. A única coisa que eles veem em você é uma ameaça. Também não ajuda você e sua irmã serem idênticas.

Assenti, desviando o olhar do dela e encarando o balcão.

—E quais são minhas opções, então?

—Você pode continuar assim, fugindo. Eu te garanto que tentarei te dar toda segurança, mas não posso prometer nada com você tão longe da família. Ou, você pode voltar para Chicago comigo e viver com a família até que a ameaça esteja sob controle. Então você pode voltar para sua vida.

Não foi muito difícil escolher.

Tinha passado dois anos tentando cuidar de mim mesma, desconfiada de todos ao meu redor e achando que alguém pularia do arbusto mais próximo e apontaria uma arma na minha direção, seria bom ter alguém cuidando de mim pela primeira vez.

Não sei por que exatamente acreditei totalmente em Marie, talvez tivesse sido o olhar que ela me lançou na minha formatura e também na lanchonete quando, antes de entrarmos no carro que esperava lá fora, ela me pediu um abraço.

Passamos a noite em um apartamento de luxo na parte mais rica de New York e, pela primeira vez em um tempo, pude dormir em um colchão que fosse macio e não cheirasse a mofo.

No dia seguinte, quando entramos no carro para ir até o aeroporto onde um jato particular nos esperava, perguntei como ela me achou se eu tinha sido tão bem sucedida em me esconder.

—Foi o colar. Você nunca tira, quando recebemos a foto e eu vi, soube na hora que era você.

7 anos depois

O tempo passa rápido demais quando a gente não quer.

Foi difícil a adaptação quando cheguei em Chicago, a maioria das pessoas ainda me encarava com desconfiança, mas conquistei um lugar no coração da minha família em pouco tempo.

Descobri que minha mãe tinha falecido pouco tempo depois que fugi, visitava o túmulo dela todo ano em seu aniversário, torcendo para que minha tia não aparecesse. Eu vi Esme ao longo dos anos, mas não falei com ela nenhuma das vezes, com medo de arrastar minha oura família, ou o que restava dela, para uma vida que não queria puxar.

Nunca esqueci Edward, não tirava o colar por nada, ainda que minha irmã, Kate implicasse comigo. A liderança da máfia tinha acabado nas mãos da única irmã ainda viva do meu pai biológico, após eu e Kate nos negarmos a assumir o papel que seria nosso se seguíssemos as leis da família.

Apesar da ameaça da máfia rival ter sido controlada, não me afastei dos Dwyer. Eu os amava, com toda certeza, então simplesmente fiquei, me formei na faculdade, e fazia alguns favores como advogada de vez em quando, representando alguns clientes que tinham algum tipo de ligação com a minha família.

Não quis ver Edward, com medo de ver que ele tinha seguido em frente enquanto eu continuava presa no passado, mas, mais uma vez, o destino não funcionou ao meu favor.

Em dois dias o natal chegaria e eu estava, como sempre, atrasada na compra dos presentes. Kate tagarelava do meu lado quando entramos na loja de brinquedos com os dois seguranças logo atrás de nós. Kate já tinha começado uma família e ganhou uma linda menininha de quatro anos, que amorosamente nomeou de Marie após a morte de nossa vó.

—Eu não sei o que dar para sua filha, a menina tem tudo.

—Se você desse um beijo e abraço ela ficaria satisfeita, a menina te idolatra.

Dei risada da careta dela e estava bem distraída com Kate quando trombei com alguém. Não era exatamente difícil, a loja estava lotada, e, se fosse qualquer outra situação eu pediria desculpas sem nem olhar para o rosto dela.

Mas eu olhei, e todos os meus pedidos dos últimos sete anos se tornaram realidade.

—Nossa, me desculpa eu estou tão distraí... Bella?

—Oi, Edward.

O encarei admirada, observando o tanto que ele tinha mudado. Edward parecia mais alto, tinha uma barba por fazer que me deu vontade de passar os dedos, a mandíbula estava mais marcada mas ainda era o mesmo garoto que eu amei uma vez.

—Uau... você... você está aqui! –ele disse. –Seu cabelo, você pintou...

—É...

Nós ficamos em silêncio por algum tempo, eu simplesmente sem saber o que dizer, mas, aparentemente, minha irmã decidiu por mim:

—O reencontro é lindo, mas a gente precisa ir, Bella. Você precisa comprar o presente da Marie e ainda falta o presente do resto de metade da família. Prazer em conhecer, Edward!

Assim, ela foi em arrastando pela loja em direção aos outros corredores.

—É ele? –sussurrou para mim, como se Edward fosse nos ouvir sob toda gritaria.

—Sim.

—Vamos logo embora, então, quando chegarmos em casa o Benjamin consegue descobrir tudo sobre ele, e aí você pode finalmente seguir em frente ou casar de vez com esse cara.

Assim fizemos. Benjamin, quem conseguia informações sobre tudo e todos para a família, conseguiu praticamente a vida toda de Edward nos últimos nove anos. Disse que ele namorou três garotas naquele tempo, mas se encontrava solteiro. Tinha se formado em fisioterapia e trabalhava em uma clínica particular no centro de Chicago, também me contou que ele tinha se formado, mas passava o natal todos os anos na casa da infância.

E foi isso que me levou até a porta dos Cullen na manhã do dia 25.

Eu mandei uma mensagem para o número que Benjamin tinha me dado, dizendo que o esperava na frente da casa e deixando meu nome no final, e esperei ali, embaixo da neve.

E esperei.

E esperei.

E esperei mais um pouco.

Estava prestes a ir embora, assumindo a derrota, quando a porta abriu, mostrando a figura de Edward que terminava de vestir um casaco.

Ele fez o caminho até mim, e repentinamente me lembrei do mesmo dia nove anos antes, quando assumi que o amava, e percebi que estava prestes a fazer aquilo de novo.

—Oi.

—Olá, Bella Swan –ele disse, mostrando o sorriso adorável pelo qual tinha me derretido todos aqueles anos atrás e me derretia mais uma vez.

—Na verdade é Dwyer agora.

—Você casou? –perguntou e eu percebi seus olhos tentarem ver minhas mãos que estavam enfiadas nos bolsos da blusa.

—Não! Mas – suspirei -, é uma longa história.

—Por que eu sinto que tem a ver com o fato de você ter desaparecido do nada depois da formatura?

—Porque tem. Olha... –Fechei os olhos –Eu não sei se tenho o direito de estar aqui agora, depois de ter sumido todo esse tempo, mas eu passei os últimos nove anos pensando em você, Edward. Eu não parei de te amar por nenhum segundo e eu quis tantas vezes vir atrás de você e dizer tudo... mas tive medo. De arrastar você para tudo isso, de descobrir que você tinha seguido em frente, mas quando eu te vi dois dias atrás... não consegui me conter. Eu consigo viver sem você, mas não quero.

Ficamos em silêncio e eu rapidamente passei as mãos no rosto, empurrando as lágrimas que caíram por minhas bochechas.

—Eu te amo, e vou entender se você não quiser me olhar mais depois que eu contar tudo, mas eu preciso...

Inspirei profundamente quando ele tomou meu rosto nas mãos e bateu os lábios contra os meus. Solucei fracamente, apertando o casaco dele com força até que fomos obrigados a nos afastar.

—Não tem nada que você possa me dizer que vai me afastar de você de novo, Bella Dwyer.

O destino funcionou para mim no final das contas.


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Notas finais do capítulo

Obrigada por ler até aqui! Beijinhos e até logo!