Souvenir escrita por Paulinha Almeida


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Fanfic inspirada na música All Too Well da Taylor Swift
https://www.youtube.com/watch?v=F8Jxo15Vfic



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I walked through the door with you, the air was cold

But something about it felt like home somehow

 

Em 1997 Harry Potter e Ginny Weasley se conheceram.

 

A princípio Harry não queria se mudar de cidade, mas não era como se os tios, com quem ele morava desde que se tornara órfão, ligassem muito para sua opinião sobre qualquer coisa que fosse. Então, ainda que contra sua vontade, ele se despediu dos pouquíssimos amigos que tinha conseguido fazer na escola publica que frequentava e entrou no carro para as poucas horas de viagem que separavam Surrey de Warrington, a pequena cidade perto de Manchester, onde o tio havia arranjado um emprego imperdível.

Depois de aproximadamente quatro horas de silêncio absoluto por parte dele e reclamações irritantes por parte do primo Duda, eles estacionaram em frente a uma casa grande e bonita, numa vizinhança requintada da região. Quando Harry carregou sua pequena mala de pertences para o menor quarto da propriedade e olhou pela janela para aquele lugar novo e nada empolgante, tudo que conseguiu pensar era que não via a hora de sair dali.

Duas semanas depois ele começou o primeiro ano do ensino médio, que foi marcado por absolutamente nada de especial, a não ser pelo fato de que Harry aproveitou cada minuto de tempo livre nos computadores da escola procurando por bolsas de estudo em qualquer universidade que o possibilitasse se mudar para bem longe dali.

No segundo ano Harry já estava mais habituado e tinha alguns amigos. Um deles, Olivio Wood, o convenceu no inicio do ano letivo a fazer o teste para entrar para o time de futebol, então foi assim que ele conseguiu uma desculpa a mais para passar mais tempo ainda fora de casa.

O time foi também o meio pelo qual ele olhou para Ginny Weasley pela primeira vez.

A equipe masculina e a feminina nunca faziam nada juntas, mas as meninas haviam se inscrito no campeonato feminino contra outras escolas da cidade e o time não tinha integrantes o suficiente para treinarem entre si, então decidiram que o time masculino as ajudaria a treinar. Harry, que tinha vivido uma vida inteira de exclusão e bullying, se recusou a participar das piadinhas que os companheiros fizeram a respeito de jogarem contra mulheres e estava mais do que disposto a participar de todos os treinos que elas precisassem para representar o colégio em grande estilo.

Harry chegou adiantado para o primeiro treino, se aqueceu com os exercícios costumeiros e ficou aguardando a partida começar. Ele estava um pouco distraído no dia, então talvez por isso não tenha percebido o drible inesperado que o fez bater a ponta da chuteira surrada contra o gramado ao invés da bola que estivera em sua frente até uma fração de segundo antes, e cair.

Ele rolou de costas para se levantar e olhou para cima quando viu a mão esticada para lhe dar apoio. Foi ali, sentado no chão depois de um tombo causado por um drible perfeito, que Harry olhou para ela. Claro que ele já a tinha visto antes, de relance pelos corredores com outros calouros, mas nunca antes ele a havia olhado. Enquanto aceitava a mão que ela lhe oferecia, o garoto se questionou como nunca tinha reparado melhor naquele rosto bonito antes.

Ginny, por sua vez, que já havia visto, olhado, reparado, escaneado e admirado o jogador caído em sua frente, não conseguiu evitar o coração um pouco acelerado pela interação, mas disfarçou tudo com louvor e o ajudou a se colocar novamente em pé como qualquer adversário respeitoso teria feito.

—Tudo bem? - Ela perguntou para prolongar o momento.

—Tudo certo, obrigado. Belo drible.

Depois disso vieram alguns acenos quando se viam de longe, umas duas ou três frases trocadas quando casualmente se encontravam em algum corredor, uma ou outra dica de treino de um para o outro, e mais as interações necessárias quando treinavam juntos. Quando começaram a ficar mais descontraídos na presença um do outro, as férias de fim de ano chegaram trazendo um intervalo de quatro semanas na lenta aproximação entre eles.

Foi durante essas mesmas quatro semanas que eles foram surpreendidos também por uma saudade que nem sabiam que sentiam, e que a princípio não entenderam direito o que causava.

O dia frio que marcou o retorno às aulas na segunda semana de janeiro de 1998 trouxe a confirmação do que era aquilo quando se viram e trocaram o aceno costumeiro, dessa vez acompanhando de um sorriso mais aberto, uma empolgação maior e um alívio inédito.

Os treinos retomaram, a interação aumentou e o campeonato que Ginny competiria começou um mês depois. Haveria jogos disputados no colégio deles e em outros colégios também, a escola toda estava empolgada com o primeiro campeonato esportivo feminino que competiriam e, melhor ainda, com o fato de terem um time que lhes dava chances reais de ganharem.

Harry assistiu a todos os jogos sentado na primeira fileira, comemorou cada gol como se fosse o dele mesmo, se irritou com cada jogadora derrubada e estava ali para acenar de volta quando Ginny olhava para ele do campo, com um sorriso satisfeito por encontrar exatamente quem ela estava procurando na arquibancada.

As meninas passaram com louvor pela fase eliminatória, venceram facilmente as oitavas de final, levaram a vitória suada nas quartas e, para a tristeza geral da turma de Hogwarts High School, perderam a semi final quando a decisão foi para os penaltis.

Ginny se despediu das companheiras de equipe quando deixaram a escola onde estavam competindo e se encostou no ponto de ônibus para ir para casa. Ela estava triste, suada, com o rabo de cavalo levemente fora do lugar e as bochechas vermelhas quando ouviu seu nome ser chamado e olhou por sobre o ombro direito apenas por hábito, porque ela conhecia aquela voz.

—Oi Harry.

—Oi. - Ele se encostou ao seu lado, os braços deles se tocando levemente e causando um arrepio apesar dos casacos que ambos usavam. - Queria dizer que vocês jogaram muito bem, não mereciam ter perdido.

—Obrigada. - Ela sorriu para ele, mas não conseguiu esconder que estava chateada.

Harry estava há semanas esperando o momento perfeito para fazer o convite que queria há tempos e achou que aquela poderia ser uma ocasião promissora, então limpou a garganta e a chamou novamente:

—Hey Ginny, eu estava pensando se você quer ir tomar um sorvete comigo?
Ela o olhou com pressa demais, e foi imediatamente mal interpretada.

—Quero dizer, para animar, não sei, mas tudo bem se você não quiser.

Ele coçou a cabeça sem saber o que dizer, mas ela não o deixou esperando muito.

—Claro, vou adorar.

Eles não sabiam muito bem como agir e o que fazer, porque naquela idade não dava para dizer que algum deles sabia exatamente o que estava fazendo na verdade, mas isso não os impediu de caminharem imediatamente até a sorveteria mais próxima e se sentarem para um sundae, ainda que o frio não fosse convidativo para o cardápio.

O passeio rápido para animar se estendeu pela tarde, transformou-se em uma caminhada de volta para o bairro deles ao invés do ônibus e acabou na avenida principal, onde cada um deveria virar para um lado diferente e ir para casa. A despedida, depois de três horas na companhia um do outro, trouxe da maneira mais espontânea possível o primeiro beijo, que ambos passaram o dia todo esperando.

Não foi o primeiro beijo de suas vidas, mas foi com certeza o melhor beijo que seus poucos anos de experiência havia lhes dado até então. O coração palpitando era uma característica que eles compartilhavam, assim como o sorriso largo que estampava seus rostos enquanto caminhavam o restante do caminho até suas respectivas residências.

Assim que passou pela porta, Molly e Arthur Weasley bombardearam a filha de perguntas sobre como havia sido o jogo, a resposta os surpreendeu e ambos não entenderam muito bem o motivo de todo aquele sorriso se elas haviam perdido. Harry, no entanto, entrou e foi direto para o seu quarto reviver o seu momento de glória em paz, ninguém se preocupou em perguntar nada a ele.

O dia seguinte chegou carregado de expectativas para os dois lados, mas continuar caminhando foi fácil depois que o primeiro passo havia sido dado. Assim, os dias que se seguiram os fizeram mais próximos, então agora além de beijos eles também compartilhavam o tempo juntos, conversas e todos os sorvetes que a cidade poderia oferecer.

Quando as férias de verão chegaram, Harry e Ginny descobriram que muito provavelmente estavam em um relacionamento, o que era inédito para ambos. A descoberta não veio em forma de um pedido, mas sim de uma constatação óbvia: eles se encontravam todos os dias na escola e gostavam desse ritmo, então era o próximo passo inevitável quando tinham dois meses inteiros de férias escolares pela frente.

A primeira vez que Ginny anunciou que estava saindo, os pais quiseram saber seu destino e ela os informou que tinha um namorado. Ninguém ficou muito surpreso, porque os sinais já existiam há meses, mas fizeram questão de conhecer o rapaz. Quando se encontraram naquele dia, Ginny estava meio sem graça em dizer a ele que seus pais queriam conhecê-lo, mas Harry fez o possível para não aparentar todo o nervosismo que estava sentindo e concordou imediatamente.

O jantar na casa dos Weasleys foi melhor do que o esperando, mesmo considerando que Ginny tinha seis irmãos mais velhos e todos fizeram questão de estar presente. Harry julgou que a experiência havia sido um sucesso, pois mais convites vieram depois desse e a presença do rapaz em encontros de família se tornou frequente.

Conhecer a família dela abriu espaço para perguntas sobre a família dele, que Ginny já havia notado não ser seu assunto preferido no mundo. Com essa barreira quebrada, agora não havia mais nada sobre o que eles não conversassem, o que incluía a infância triste que Harry havia tido até então e em como ele ainda se ressentia muito disso.

Naquele verão Harry descobriu duas coisas que marcaram sua vida: a primeira era a sensação de estar em uma família que se importa verdadeiramente com todos os integrantes, até com ele que nem era um integrante propriamente dito. A segunda, que ele não descobriu sozinho, foi o sexo.

Bastou uma tarde sozinhos, quando os tios de Harry viajaram para visitar algum parente com quem ele não se importava, para que Ginny conhecesse o quarto dele e todas as sensações novas sobre as quais ela só havia lido teorias bem amenizadas em suas revistas próprias para o público adolescentes. Não haviam planejado aquilo e sequer haviam diretamente falado sobre o assunto antes, mas ainda assim os dois concordavam que haviam superados as expectativas que nem sabiam que tinham criado.

Foi nesse dia também, enquanto ainda estavam abraçados sem roupa embaixo do lençol que Harry usava para dormir, a primeira vez que disseram “eu te amo” um ao outro. Aquela frase causou neles uma sensação de êxtase muito semelhante às reações que haviam experimentado apenas minutos antes,. Secretamente em seus próprios pensamentos, ambos podiam jurar que eram a pessoa mais sortuda do mundo enquanto estavam ali deitados.

Quando as férias acabaram em setembro, Harry e Ginny estavam num relacionamento tão estável que se alguém em Hogwarts já não soubesse que os dois estavam juntos, com certeza descobriram no primeiro dia de aula. Eles chegavam e saíam todos os dias juntos, passavam os intervalos de aulas juntos, estudavam juntos na biblioteca e, como era desde o inicio, treinavam futebol juntos.

Na terceira semana de aula a professora de literatura de Harry, que era a sua matéria preferida, pediu a ele que ficasse na sala depois da aula porque ela queria uma conversa a sós.

A Sr. McGonagall era o membro mais antigo do corpo docente de Hogwarts e conhecida por ser rígida e atenciosa nas mesmas proporções. Ela não precisou de mais do que duas reuniões de pais sem que os representantes legais de Harry aparecessem, para entender que havia algo não saudável naquela relação e chamar o rapaz para uma conversa. Ao entender que um dos melhores alunos que já havia tido na vida não recebia nenhuma motivação fora da sala de aula, a professora tomou para si a missão de motivá-lo enquanto ele fosse um de seus pupilos.

Quando o convite chegou Harry não estranhou, porque não era raro que ela o chamasse para emprestar algum livro ou conversarem sobre algo relativo à matéria. Naquele dia, no entanto, quando sentou-se do outro lado da mesa da professora, Harry viu que ela carregava alguns folhetos que lhe chamaram a atenção.

—Como vai Potter?

—Muito bem, e a senhora?

—Bem, obrigada. - Ela não era de meia palavras e sempre ia direto ao ponto. - Se bem me lembro das nossas conversas, você gostaria de cursar literatura, não é isso?

—Sim senhora, quero ser editor.

Harry teve tanto tempo sozinho, com nada mais para brincar além de tudo o que o primo Duda desprezava, majoritariamente livros, que se apaixonou por eles e decidiu muito cedo que gostaria de ser a pessoa que escolhe o que vai para as prateleiras.

—Muito bem, então acredito que isso vá lhe interessar.

Os folhetos que ela lhe estendeu eram sobre uma bolsa de estudos integral em literatura, com ajuda de custo mensal por todo o tempo de duração do curso. A oportunidade perfeita para ele, que certamente não poderia contar com nenhuma ajuda financeira dos tios, numa universidade respeitada em Budapeste, na Hungria. Vendo que o garoto ainda olhava impressionado para o papel e provavelmente não falaria nada pelos próximos cinco minutos, a professora continuou.

—Eu andei lendo o edital de inscrição e acredito que você tem chances reais de conseguir, mas para isso precisa trabalhar com cuidado na sua inscrição. Eles pedem uma carta de recomendação de algum professor, então eu tomei a liberdade de escrever uma te dando as melhores recomendações que você pode conseguir.

—Muito obrigado senhora McGonagall, eu não sei nem o que dizer.

—Não há de que, é um prazer ajudar. Dê o seu melhor e eu estarei satisfeita. Da minha parte era só isso, Potter, aproveite o resto do seu dia.

Ainda sem acreditar no que via, e tentando acalmar toda a expectativa que se formava dentro de si, Harry juntou os papeis e se virou para sair da sala com a cabeça a mil, criando mais expectativas do que deveria. Assim que abriu a porta, no entanto, encostada na parede oposta estava quem fez seu estômago afundar: Ginny.

Ela não levou dois segundos para perceber que havia algo errado e quis imediatamente saber o que era. Harry a guiou pelos jardins da escola até um banco mais afastado, se sentaram e ele explicou tudo a ela. Enquanto lia os folhetos que ele havia lhe entregado, Ginny entendeu perfeitamente o que aquilo significava: a única oportunidade de uma vida melhor que ele talvez tivesse e o fim do relacionamento deles, simultaneamente. Ainda assim, ela falou exatamente o mesmo que McGonagall havia dito anteriormente: é uma oportunidade muito boa, então ele deveria dar o seu melhor.

Os dois trabalharam juntos na inscrição dele pelos próximos três dias, imprimiram todos os papeis necessários, conferiram mais duas vezes que tudo estava em ordem e foram juntos até o correio enviar o envelope para a universidade. Os resultados não sairiam até o início do verão seguinte, então assim que depositaram o envelope na urna de envio, nenhum dos dois tocou mais naquele assunto e resolveram viver como se aquela carta não existisse.

Harry passou aquele natal com os Weasley e voltou para casa na tarde do dia 25 de dezembro com a certeza de que nunca antes havia comido melhor. A sacola que balançava em sua mão enquanto ele cruzava o bairro contra o vento frio de início de inverno continha um presente que fez seus olhos brilharem: um suéter de lã com um expressivo H no peito, feito a mão pela mãe da namorada. Todos os membros da família ganharam um com as respectivas iniciais e olharam para a peça com cara entediada, mas o rapaz pensou que aquela era a coisa mais legal que alguém já havia feito por ele.

Quando as férias de fim de ano acabaram, Harry recebeu os últimos cinco meses de aula de sua vida escolar com uma energia renovada, pois ele queria se despedir de Hogwarts deixando apenas memórias boas para trás e o melhor histórico que ele conseguisse.

As provas finais acabaram numa quinta-feira quente no fim de maio, então Harry e Ginny decidiram comemorar o início das férias com um piquenique que lhes ocupou toda a manhã e boa parte da tarde do dia seguinte sentados na beira do lago que havia no bairro vizinho.

Desde o fim das aulas, todos os dias quando acordava Harry descia as escadas com expectativa para ver se havia algo para ele no correio, mas as três primeiras semanas de junho não lhe trouxeram nenhuma novidade. Ele não havia comentado com ninguém em sua casa sobre a inscrição que havia feito, mas sentia mesmo assim que a proximidade do seu aniversário de dezoito anos deixava a todos ali com a esperança de que ele finalmente se mudasse.

Quando julho começou Harry já havia perdido boa parte da esperança e se convencido de que não havia dado certo, até que numa manhã, poucos dias depois, se surpreendeu com um envelope branco endereçado a ele e pousado em cima do tapete no hall de entrada. Assim que o viu, Harry perdeu toda a fome que estava sentindo, subiu novamente as escadas pulando de dois em dois degraus, trancou a porta do quarto apenas para garantir que não seria interrompido e o abriu: Aprovado.

Dentre tudo que havia escrito na carta de aceitação de seu requerimento de bolsa, apenas aquela palavra ficou rondando sua cabeça por bons cinco minutos, durante os quais ele pensou com alivio e felicidade que finalmente deixaria a casa dos Dursley e nunca mais voltaria. Foi inevitável não pensar também em Ginny, o que o acometeu de tamanha dúvida e hesitação que ele jamais pensou sentir diante da chance de se mudar para bem longe dos tios.

Ele tinha duas semanas para enviar sua resposta para a instituição, então decidiu pensar nisso com calma depois de ter se alimentado. Sem esperar nem mais um minuto após terminar sua refeição, Harry se dirigiu à casa da namorada, pois ele queria que ela fosse a primeira a saber, já que a situação a afetaria tanto quanto a ele. Ginny recebeu a notícia com o mesmo apanhado de reações que ele próprio: primeiro euforia e felicidade, depois tristeza e aquela sensação de perda que era difícil de ignorar.

Na semana seguinte, depois de muita conversa e noites mal dormidas, Ginny o acompanhou novamente até o correio para que ele enviasse sua carta de aceitação, e os dois decidiram naquele momento que viveriam o melhor verão de suas vidas juntos.

E assim foi: eles comemoraram o aniversário de dezoito ano dele, logo em seguida o aniversário de dezessete anos dela, e passaram juntos cada um dos quarenta e nove dias que separaram o envio da carta de aceitação e a data do embarque.

Como previsto, os tios de Harry receberam a notícia com uma felicidade que eles não se preocuparam em esconder e que nada tinha a ver com o futuro profissional do sobrinho. Por vários dias Duda fez piadas com a credibilidade da instituição de ensino que aceitaria alguém como o primo, mas desistiu quando viu que Harry apenas continuaria ignorando tudo o que ele dizia.

Na última semana antes do embarque os Weasley fizeram uma pequena festa de despedida para Harry, onde todos os irmãos e cunhadas da namorada fizeram questão de aparecer para parabenizá-lo e se despedir. A tensão entre ele e Ginny e o tanto que os dois estavam ainda mais grudados que de costume não passou despercebido por nenhum dos presentes, mas ninguém disse nada.

Na véspera da mudança, Harry e Ginny estavam deitados na cama dela em silêncio, trocando carinho e imersos em pensamentos. Ele desviou os olhos do teto quando a sentiu se mexer e levantar do seu peito e a observou caminhar até a estante onde mantinha os poucos livros que tinha. Essa era uma paixão que eles compartilhavam, mas nenhum dos dois tinha dinheiro o suficiente para comprar todas as edições que gostariam de ter.

Ainda em silêncio, Ginny puxou dali um exemplar que ele já havia visto muitas vezes e sabia ser seu livro preferido: Alice No País Das Maravilhas. A edição era de colecionador, com capa dura revestida em tecido branco e rosa. Ela abriu o livro em sua mesa de estudos, puxou uma caneta e se debruçou sobre a folha de rosto.

—Ginny! - Harry se levantou de imediato e foi até lá quando entendeu o que ela estava fazendo.

Ela bloqueou a visão dele enquanto terminava de escrever, fechou o livro novamente e entregou para ele.

—Eu quero que você tenha alguma para te lembrar de mim nessa sua nova vida.

Ele pensou em contestar, mas desistiu assim que abriu o livro e leu o que ela havia escrito:

“Harry, eu sei que você vai conseguir tudo o que sempre quis e o que eu mais queria é que fosse possível estar ao seu lado para ver tudo isso.

Onde quer que você esteja saiba que eu acredito em você e nunca vou te esquecer.

Eu te amo,

Sua Gin

—Eu não preciso de nada material para lembrar de você, você não precisava ter feito isso. - Ele a puxou para um abraço e ambos fecharam os olhos para se acomodar no que era a maior certeza que tinham naquele momento: o quanto se amavam.

Nem Harry e nem Ginny haviam chorado até então, mas nenhum dos dois conseguiu se manter forte naquele momento. Quando se deitaram para dormir naquela noite, cada um em sua cama, algumas lágrimas teimosas ainda vieram e o sono levou horas para finalmente aparecer, trazendo em sonhos tudo o que ambos mais sentiriam falta a partir do dia seguinte.

Os pais de Ginny se ofereceram para levá-lo até o aeroporto, então no dia 4 de setembro de 1999 eles estacionaram na frente da casa do rapaz meia hora antes do horário combinado para evitar o risco de atrasos. Mal o veículo parou e Harry saiu segurando a única mala que precisou para acomodar todos os seus pertences, usando um cachecol um pouco grosso demais para o clima agradável que fazia. A viagem de carro foi silenciosa, o casal manteve as mãos dadas o tempo todo no banco de trás. 

O saguão de embarque era novidade para Harry, que nunca havia andado de avião antes, mas em poucos minutos ele já havia despachado a bagagem e pegado o cartão de embarque no balcão da companhia aérea. Molly e Arthur se despediram dele com abraços carinhosos e votos sinceros de boa sorte, depois voltaram para o carro para dar privacidade aos dois.

Harry e Ginny não sabiam bem o que dizer um ao outro, então se preocuparam mais em se abraçar ao invés de tentar preencher o tempo com palavras que ambos já haviam dito milhões de vezes. Eles trocaram um beijo longo cheio de significados e quando se separaram Harry tirou o cachecol do próprio pescoço e colocou a peça nela.

—Eu nunca vou te esquecer também. - Ele falou em meio a outro abraço. - Você e sua família me deram nesse ano e meio tudo o que eu nunca tive antes. Eu amo você Gin, e isso não vai mudar.

Eles teriam ficado ali mais tempo se o embarque para o vôo dele não tivesse sido anunciado enquanto os dois trocavam mais um beijo. Algumas outras lágrimas, um último abraço e então Harry partiu.

Olhando pela janela do avião, enquanto via a cidade ficar cada vez mais distante e se despedia mentalmente de tudo o que estava deixando para trás, Harry tentou encontrar dentro de si a euforia que achou que sentiria quando finalmente dissesse adeus a tudo o que estava deixando para trás. A sensação estava ali, presente sob uma pilha de “e ses” que ele não conseguia evitar, os pensamentos rondando ao redor de realidades alternativas que o permitiriam ficar perto dela.

É verdade que o que ele via ficando para trás era uma vida cheia de ressentimento, sensação de abandono e solidão na maior parte do tempo, pois os Dursley nunca se esforçaram para fazê-lo sentir que era da família. Se essa viagem tivesse acontecido um ano e meio atrás ele estaria certamente dançando no corredor do avião.

No entanto, agora ele também estava deixando Ginny e toda sua família ali e partindo para uma vida desconhecida, com pouquíssima ou nenhuma possibilidade de contato com eles. Essa era a parte responsável por todos os sentimentos que encobriam sua felicidade, pois considerando que seus pais haviam morrido quando ele ainda era novo demais para sequer se lembrar de seus rostos, os Weasley, e principalmente Ginny, eram os responsáveis por lhe apresentar o único amor e acolhimento que ele havia conhecido até então.


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Notas finais do capítulo

Depois desse final a boa notícia é que semana que vem tem mais.
Vejo vocês lá.
Beijos e fiquem em casa se puderem.