As luzes piscando causava uma pirotecnia visual, os movimentos das pessoas mais pareciam frames, uma hora indo outra hora vindo na sua direção. O colorido dava um toque ainda mais vibrante. A batida da música era frenética e zunia, causando uma cacofonia nos ouvidos de Daniel. Antes de chegar até o bar, ele esbarrou sem querer em algumas pessoas. O lugar estava lotado, era dia de festa e comemoração, afinal.

— Desculpe. — Ele falou, afastando as mãos, para não se enroscar nas penas e plumas daquela pessoa.

— Não tenha medo, gostosão, pode pegar. — A gargalhada divertida daquela pessoa fez Daniel rir com humor. Porém, ele apenas moveu a cabeça e contornou o pequeno grupo até chegar no bar. A bebida selecionada chegou rápido, não era nenhum drinque requintado, mas porque Daniel não gostava de misturar bebidas.

Ele observou admirado o bartender musculoso, apenas de cueca e uma gravata borboleta, trabalhar no balcão, entretendo a todos.

A música foi abaixando e uma pessoa no palco anunciou ao microfone a primeira atração da noite. Os shows iniciaram com algumas performances de comédia, para dar então espaço para os shows musicais. A primeira drag queen apresentou-se, contando algumas histórias de sua carreira, como quando viajou na primeira turnê e precisou se abrigar numa furda, em meio a um temporal.

A segunda drag queen era mais politizada e suas piadas traziam sempre uma crítica. Daniel se viu interessado e imerso nas palavras dela, quando sentiu o toque de uma mão em seu ombro. O bartender ofereceu para ele um copo colorido com uma rodela de laranja, canudo azul todo enroladinho e um guarda chuvinha.

Era um presente.

Daniel ficou um pouco constrangido, ele não queria ser desagradável com ninguém e agradeceu, sem saber se deveria aceitar a bebida. Ele não era o tipo de pessoa que visitava boates ou que recebia bebidas de outras pessoas. Isso nunca aconteceu antes, por isso não conhecia qualquer regra de etiqueta para aquela situação.

— Relaxa, é só um presentinho. — O bartender piscou para ele, um sorriso cativante com dentes perfeitos.

Daniel olhou ao redor e viu a pessoa que ofereceu a bebida mover a cabeça e piscar em seguida. Ele apenas retribuiu o gesto e bebeu. Não deu outra, aquele cara sentou-se ao seu lado.

Já era tarde para ele devolver o líquido de volta ao copo?

Mas, antes que pudesse responder o motivo de estar naquela boate, que obviamente não combinava muito com sua aparência, as luzes do palco piscaram novamente e a nova atração iniciou.

Era uma música com ritmo de salsa, bem descontraída. Daniel atentou-se a apresentação e, em seguida, a diva subiu ao palco.

Áster Bem-Me-Quer dublou uma canção de Célia Cruz, uma das cantoras favoritas de Daniel. Embora ele não fosse o tipo de dançar, adorava o ritmo e as grandiosas apresentações de Célia Cruz, que tornava o palco sempre muito brilhante com suas roupas cheias de babados e colorido. Também agradava muito o som dos instrumentos e o tambor sendo batido no ritmo em que ela dançava.

No palco, Áster Bem-Me-Quer trazia tudo o que representava a salsa para sua apresentação. Era cativante, eletrizante. Daniel não parou de sorrir um só minuto, recordando-se da lua de mel em Havana. Uma época em que a eutimia fazia parte das manhãs ensolaradas e a noite aflorava-se, roubando-lhe o estral de seus sonhos.

Ao final da apresentação, Daniel aplaudiu calorosamente, esquecendo-se até mesmo da pessoa que lhe pagou uma bebida. Afinal, ele nem estava mais lá.

Daniel queria parabenizá-la, mas não sabia se podia ir até o camarim, esperou por um momento, outra apresentação iniciou. Com uma voz muito agradável e doce, Baby Sharana cantou Sem pecado e Sem juízo no palco, emendando uma outra música mais animada para dançar.

Sem querer esperar mais, Daniel foi até o corredor do camarim, ele olhou de longe a charmosa peruca bem moldada e os grandes brincos de Áster Bem-Me-Quer. Ela estava linda.

Quando notou a sua presença, um sorriso contido formou-se nos lábios pintados de vermelho. Assim que Daniel se aproximou, adorou a diferença de altura, geralmente ele era mais alto. No entanto, aqueles vinte centímetros a mais fazia uma boa mudança.

— Você veio mesmo. — Ela falou, após um cumprimento de beijos soltos no ar.

— Claro, eu disse que viria. — Daniel, passou as mãos nos bolsos da calça. Ele vestia uma calça jeans e camisa listrada com mangas dobradas. Seu guarda-roupa não possuía muita variedade como a do ex-marido, mas ele tentou ser o mais despojado possível naquela noite para agradar.

Tirou do bolso uma caixinha de veludo e entregou. Percebendo o olhar inseguro vindo dela, ele garantiu que não era nada demais, apenas um broche que ele achou que combinaria, para comemorar sua nova fase.

Áster aceitou, ainda um pouco reticente.

— É maravilhoso. — Disse, pedindo para que Daniel colocasse em sua roupa. Ele pegou o broche e prendeu no busto do vestido cintilante. — Ficou bom?

— É claro, tudo combina com você, meu amor. — Ele não resistiu, estavam separados, é verdade. Mas algumas coisas não tinham como mudar. Embora tivessem terminado o casamento, a amizade era fundamental. Queria fazer parte da vida de Caio e, agora, na vida de Áster Bem-Me-Quer. — Aliás, eu adorei a apresentação, era como se Celia Cruz tivesse te possuído.

Ela gargalhou, segurando sua mão e agradecendo o elogio. Conversaram um pouco mais, mas o corredor estava apinhado e o barulho aumentando. Da coxia, saindo do palco, Baby Sharana estava em êxtase falando sobre a energia do momento.

Ela rapidamente reconheceu Daniel.

— Finalmente você veio me ver. — Ela riu, mostrando a língua para Áster. — Tá, veio por ela, mas viu meu show também, ne?

— Claro. Também gosto muito de Baby Consuelo, a música foi ótima.

— Muito bom, viu? Ele tem bom gosto. — Baby Sharana cutucou Áster e depois virou-se, procurando, azoada, pelo namorado que não estava na primeira fila, como prometeu.

— Eu preciso ir. — Daniel aproximou-se mais de Áster, para que ela ouvisse. — Tenho que preparar minha viagem.

— Quando você vai?

— Em uma semana, mas podemos marcar um almoço.

— Vai ser ótimo.

Daniel ganhou um beijo no rosto. E antes de se afastar, disse que ela estava linda. Áster foi se afastando. Vê-la ir para longe, era como se Daniel visse um pedaço de si ganhar asas e partir para uma nova aventura.

O que ele poderia fazer era torcer pelo sucesso, sempre ao seu lado, porque ele só queria o seu bem.