Eve - Primeira Pessoa

 Eu não era boa em agradecimentos, mas tinha que tentar desta vez. Ele havia salvado a minha vida e, se não fosse por ele, eu ainda estaria estirada na rua, provavelmente morta. Alex e Jasmine nunca chamariam ninguém. Talvez o senhor Telloni, mas ele era mais surdo que uma porta.

 - O que eu quero dizer é: obrigado. Mesmo. Sem você eu acho que não teria sobrevivido.

 Ele sorriu e depois levantou os olhos, meio comovido. Eu não sabia o que ele estava pensando. Eu só sabia que ele também tinha olhos verdes, como eu já havia reparado antes. De longe, seus olhos tinham uma cor bonita, mas de perto eles eram incríveis. Eu quis me aproximar e beijá-lo, mas devia estar feia e machucada. Portanto me controlei e funguei um pouco.

 - É culpa minha você ter se machucado, eu devia ter te tirado da frente do carro – ele disse com a voz rouca.

 Eu dei uma risada e encarei-o com uma expressão brincalhona.

 - Ah, é. Você é o Super-Homem, eu tinha me esquecido disso – ele parou de sorrir e fechou a cara – Olha, Sam, não era sua obrigação me salvar. Eu praticamente me joguei na frente do carro, você não tinha que se desdobrar para me salvar. Mas salvou, porque ligou para ambulância.

 - Era o mínimo que eu podia fazer – ele disse e pousou sua mão em cima da minha.

 Eu me perdi em seus olhos e me aproximei dele, sabendo que isso era o certo a fazer numa situação daquelas e, principalmente, num clima daqueles.

 - Com licença, senhorita Crenshaw – disse o doutor Salverin ao entrar abruptamente no quarto – Oh, desculpem-me. Estou atrapalhando?

 Afastamos-nos e eu encarei o doutor Salverin, com uma expressão brava por ele ter atrapalhado, mas logo corei ao perceber o que havia realmente acontecido.

 - O senhor Alex Harcovic e a senhorita Jasmine Heathers insistem em vê-la – disse o doutor.

 - Ah, sim. Pode mandá-los entrar. Mas, hum, doutor, eu queria perguntar: o que aconteceu com o meu... bebê? - perguntei, indecisa, diminuindo a voz na última palavra.

 O doutor respirou fundo e tirou os óculos bifocais para depois colocá-los de volta. Eu tinha medo da resposta, mas já a sentia dentro de mim.

 - Sinto em lhe responder que ele não sobreviveu, senhorita Crenshaw. Agora, com licença, vou chamar seus amigos – e ele saiu, nos deixando sozinhos novamente.

 - Você estava grávida? - perguntou Sam, incrédulo.

 Assenti de olhos marejados. Pelo menos, essa criança teve o melhor destino dentre as possibilidades. Se Alex era o pai, eu iria criá-lo sozinha e não tinha dinheiro para isso. O que eu faria com um filho na barriga? Não poderia continuar estudando e teria que ter mais de um trabalho e como eu trabalharia grávida? Alex teria que me ajudar e eu não aguentaria ver seu rosto por mais de cinco segundos.

 - Descobri há poucos dias atrás e estava esperando para contar para Alex, mas aí isso aconteceu – respondi, já com o rosto vermelho e molhado.

 Sam se inclinou com misericórdia nos olhos e encostou seus lábios nos meus. Eu pousei minhas mãos em seu rosto, como se não quisesse que aquele momento acabasse; as mãos dele estavam no meu pescoço e nossas cabeças se movimentavam em sincronia. Seus lábios eram quentes e macios, mas os meus estavam molhados e frios. Minhas mãos subiram um pouco e agarraram seus cabelos e ele puxou meu tronco para frente, me fazendo sentar na cama. Um fogo suave subia pela minha coluna e passava pelo meu pescoço, exatamente no lugar onde seus dedos estavam. Esse calor suave chegou aos meus lábios e eu senti um grande choque de eletricidade me atingir. Mordi seu lábio inferior o bastante para fazer sangrar, mas ele não se incomodou. O fogo suave estava se tornando um fogo quente e perigoso demais e eu o afastei de perto de mim, ofegante e cansada, mas, além disso, receosa.

 - Não – eu disse – Não sei quando vou te ver de novo.

 - Se você quiser, eu fico – ele sussurrou.

 Eu estava quase me aproximando dos seus lábios novamente quando uma batida na porta nos tirou do transe em que estávamos. Eu voltei a me deitar rapidamente e Sam caminhou até a porta. Ele a abriu e se deparou com Jasmine e Alex. Ele não sorriu e não disse nada, mas abriu-a inteiramente e deixou-os passar.

 - Oh, meu Deus! Você está bem? Porque está tão corada? - perguntou Jasmine, quase pulando em cima de mim.

 Corei mais um pouco e murmurei que estava com calor. Os lábios de Jasmine estavam brancos, sem o batom, pois este estava inteiro e intacto nos lábios de Alex. Ignorei isso e disse que estava feliz por vê-los. Eles me paparicaram e me fizeram rir, mas não comentei nada sobre tê-los visto algumas horas antes.

 Só fui perceber que Sam não estava mais no quarto quando encarei a porta fechada. Uma forte dor de cabeça tomou meu lobo frontal e eu a ignorei, fechando os olhos e deixando mais algumas lágrimas cair. Sam nunca voltaria por mim, isso era certeza.

Sam - Terceira Pessoa

 Sam saiu do quarto enojado e incrédulo. Ela não havia dito, não havia feito nada. Ele viu que ela percebeu o batom de Jasmine nos lábios de Alex, mas ela não disse nada. Ela havia perdido um bebê por causa deles e ficou quieta, rindo como se nada tivesse acontecido a não ser um simples acidente. Naquele momento, o sangue no lábio inferior de Sam atingiu sua língua e ele colocou o dedo no pequeno ferimento.

 - Droga – murmurou, mas ele não sabia dizer se estava bravo por estar sangrando ou por ter beijado a garota.

 Se ela queria continuar levando a vida que levava, se ela quisesse continuar a ser traída, isso não era problema dele. E no que ele estava pensando ao dizer que ficaria lá se ela quisesse? Era total e completamente idiota. Ele não ficaria, não por alguém como ela.

 - Ei, e aí? - perguntou Dean.

 - Vamos embora – respondeu Sam.

 - Já?

 - É. Ela não vai precisar da gente por muito tempo.

 E eles saíram do hospital, entraram no Chevy Impala 1967 e correram para a estrada e para longe de Eve Crenshaw.

Fim da Parte 1