Conversa de Botas Batidas escrita por morphmagus


Capítulo 2
Sem Notar que a Nossa Estrela vai cair.




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sem notar que a nossa estrela vai cair.

capítulo final.

 

Abre a janela agora

Deixa que o Sol te veja

É só lembrar que o amor é tão maior

Que estamos sós no céu

Abre as cortinas pra mim

Que eu não me escondo de ninguém

O amor já desvendou nosso lugar

E agora está de bem

 

31 de julho de 2004

 

  Uma Lily Evans apressada corria pelas ruas molhadas de Hogsmeade. Estava atrasada e sabia que aquilo não ia ser bom quando chegasse em casa. O planejamento que fez as sete horas da manhã, quando saía para o trabalho, lhe garantia que chegaria cedo em casa e com tempo para descansar. Mas, ela não previu que teria mais provas para corrigir de uma de suas turmas, nem que enfrentaria uma fila gigante na padaria, ou que a atendente da papelaria levaria mais de dez minutos procurando as letras. Ah, e é claro, a chuva ridiculamente forte que a fez ter de esperar quinze minutos embaixo de um ponto de ônibus para não molhar o bolo. 

  Achando que mais nada poderia atrapalhar seu caminho até em casa, visto que já estava quase virando a esquina de sua rua, Evans seguiu correndo. Ela devia ter percebido que aquela seria uma ideia estúpida e que algo iria dar errado. Mas, nada no mundo a prepararia para aquilo. 

  James Potter. 

  James Potter parado distraído na esquina em que ficava seu apartamento. 

  E, obviamente, Lily esbarrou nele, derrubando as sacolas cheias de papéis na rua, mas, por sorte conseguiu segurar o bolo. 

  — Oh meu Deus! Me desculpe. — James, que avaliava se tinha deixado algo cair, ainda não tinha visto quem era. — Não devia ter ficado parado aqui que nem um idiota, me desculpe. 

  Lily levantou rápido e pegou suas coisas no chão, lutando para manter o rosto escondido e evitar uma possível conversa constrangedora. Não tinha tempo para aquilo, e mesmo se tivesse, não queria. Entretanto, sua missão falhou e ela pode ouvir Potter arquejar de surpresa quando finalmente a reconheceu. 

  — Lily. 

  — James. — Ficaram segundos em silêncio. — Foi um prazer te rever, mas eu preciso ir. 

  Deu as costas para ele e andou o mais rápido que conseguia até o apartamento. Sentiu os passos atrás de si antes de ouvir a voz dele.

  — Lily, por favor, vamos conversar. — Segurou seu braço, obrigando-a a parar. — Vamos tomar um café ou qualquer coisa do tipo, a gente precisa conversar. 

  — Não posso, James. — Sacudiu o braço para se soltar. — Estou atrasada, tenho que ir. 

  Antes que conseguisse sair dali e manter longe de James o segredo que guardava, a porta se abriu e uma criatura pequena de cabelos escuros e olhos verdes passou correndo por ela e se agarrou as pernas da ruiva. 

  — Mamãe, você demorou muito. — O garotinho possuía um bico enorme e fofo. 

  — Harry, você não pode sair correndo assim. — O homem que surgiu pelo corredor disse. — Eu tentei segurar ele, Lil. 

  — Eu queria ver a mamãe, tio Amos. — Esticou os bracinhos, pedindo pelo colo da mãe. 

  Lily entregou as coisas a Amos e pegou a criança, distribuindo beijinhos pelo rosto dele que gargalhou. James apenas observava a situação, sem nenhuma reação. Tentava entender o que diabos estava acontecendo ali, quem era a criança, quem era o homem. 

  — Esse é o James, Harry. Ele é um antigo amigo da mamãe. — Lily respondeu depois do filho ter sussurrado um “quem é esse homem?”. 

  — Oi Harry, tudo bem? — Recebeu um aceno como resposta. — Você é um menino muito bonito, quantos anos você tem? 

  — Cinco. — Levantou os dedinhos para mostrar. — É meu anisário… aniver… eu não sei falar esse nome. 

  — É muito difícil mesmo, eu também não sabia falar alguns nomes quando tinha sua idade. — James contou, tentando não dar risada. 

  O garoto começou a falar sobre as palavras que ele não sabia falar e como aquilo era um saco, Potter não conseguiu deixar de reparar o quão parecidos ele e o menino eram. O cabelo preto, o jeito de falar, a dificuldade com algumas palavras, a forma de sacudir as mãos enquanto conversava. Mas os olhos verdes eram de Lily, os mesmos olhos bonitos e profundos. De repente, foi como se soasse um clique na cabeça de James e ele percebeu. 

  — Lily, precisamos conversar. 

  Pelo tom firme e o olhar que ele tinha, Evans percebeu que ele sabia. Percebendo que não tinha como fugir daquela conversa, e nem queria, entregou Harry a Amos e pediu que o levasse lá pra cima, que ela logo iria subir. Diggory se aproximou para pegar a criança e depositou um selinho nos lábios de Lily, quase como se estivesse marcando território. 

  — Ele é meu filho, não é? — Assim que ficaram sozinhos James foi direto e perguntou. 

  — Sim. — Decidiu não fazer rodeios, apenas admitir. — Harry James Evans Potter. 

  — Você colocou meu nome nele? E não me disse que ele existia? — Seu tom subiu algumas notas e ele passou as mãos pelo cabelo, irritado. — Que merda, Lily. Você estava grávida e não me disse. 

  Lily percebeu que eles começavam a chamar mais atenção do que desejavam. Puxou James pelo braço, em silêncio, até um parque pequeno ali perto. Sentaram no banco mais afastado, Evans agradeceu que estava quase vazio devido a chuva. Não queria seus vizinhos fofoqueiros se intrometendo. 

  — Eu descobri depois que você foi embora, James. — Começou a explicar. — Depois da briga e que você saiu do apartamento, os enjoos continuaram, mas eu demorei para entender o motivo. Quando descobri, quase no natal, procurei o Remus pra saber de você, ele me disse que você já tinha ido embora pro Estados Unidos. Eu não tinha como te procurar mais e eu não queria. Estava magoada. 

  — Eu tinha o direito de saber, Evans. É o meu filho. Você devia ter pegado meu número ou qualquer merda do tipo. — Lily suspirou, começando a ficar irritada. — São cinco anos, Lily. A merda de cinco anos que o meu filho existe e eu não sabia porque você não me deixou saber.

  — Você foi a merda de um babaca cinco anos atrás, James. Não tava nem aí para o meu sonho e pras merdas que eu tava sentindo. E queria que eu corresse atrás? — Tentava se controlar para não começar a gritar. — Eu nem sabia se você ia querer um filho! Quantas vezes conversamos e você disse que éramos novos demais? 

  — E a gente era novo demais! Mas eu não ia te abandonar. 

  — Você abandonou, James. — Seus olhos começaram a marejar. — Você queria tanto ir pra outro país, aceitar aquele emprego. Eu não ia te atrapalhar. 

  — Era um bebê, Lily. Ia mudar tudo. 

  Ficaram em um silêncio desconfortável por longos minutos. A mulher se recusou a deixar as lágrimas caírem e James tentava controlar a irritação que crescia em seu peito. Estava pronta para se levantar e voltar para casa, afinal tinha um aniversário para preparar e logo seus amigos chegariam. 

  — Eu quero conviver com ele. — Potter disse antes que ela falasse algo. — Vou voltar para Hogsmeade e quero estar na vida do Harry. 

  — Tudo bem. — Evans sabia que não podia negar aquilo e que era o melhor pro seu filho. — Mas com calma, não quero assustá-lo. 

  — Certo. É uma boa ideia. 

  — Hmn, é aniversário dele hoje. — Começou depois de ponderar aquela decisão. — Você deveria ficar. Vai ser algo pequeno, só a gente e alguns amigos. 

  James concordou, empolgado em saber mais do filho. Em silêncio, se dirigiram até o apartamento que Lily e Harry dividiam com Amos, que James descobriu ser namorado da ruiva. Não levou muito tempo para colar as letras que formavam a frase “feliz aniversário Harry!”, com desenhos de cervos e árvores ao redor (James descobriu mais tarde que o menino amava aqueles bichos, assim como ele), nem para colocar o bolo numa mesa rodeada de docinhos. 

  Às sete horas em ponto a campainha tocou e os amiguinhos do menino começaram a chegar, e logo a casa se tornou uma bagunça de crianças correndo e gritando. Os amigos de Lily também começaram a chegar, os únicos que James conhecia eram Alice e Frank, que eram da época da faculdade, e o bebê deles, Neville, que parecia ter a mesma idade de Harry. Foi apresentado a Hestia Jones, uma mulher negra muito bonita, Mary Macdonald, uma coreana divertida que Harry parecia amar, e Benjy Fenwick, um loiro que falava alto demais, além dos colegas de trabalho que Potter não decorou os nomes. 

  Algumas horas mais tarde, a festa já tinha acabado e Lily, Amos e James arrumavam a bagunça, enquanto Harry estava deitado no sofá quase adormecendo. Quando terminou de jogar os últimos copos descartáveis no lixo, James se aproximou da criança. 

  — Ei, garotão. — Chamou. — Eu já vou e vim te dar tchau. 

  — Já? Ainda tá cedo. — Disse emburrado. 

  — Você precisa dormir e amanhã eu venho te ver. 

  — Você é meu papai? — Perguntou de repente, pegando James e Lily, que havia se aproximado, de surpresa.

   — Por que acha isso? 

  — A mamãe disse que meu papai morava em outro lugar e que eu tinha o mesmo nome que ele. — Explicou como se fosse óbvio. — Meu nome é Harry James e o seu nome é James. Você é o meu papai?

  — Eu… — Olhou para Lily que assentiu, permitindo que ele falasse. — Sim, eu sou seu pai. Tive que passar esse tempo longe de você, mas agora estou aqui e não vou mais embora.

  — Tudo bem, eu gostei de você. — Voltou a encostar no sofá, piscando lentamente, sonolento. — Você vai brincar comigo e me levar pra passear? 

  — É claro que sim. 

  — Bom. — Foi a última coisa que disse antes de cair no sono. 

  James o pegou e levou para o quarto, deixando-o aconchegado na coberta. Saiu do cômodo, e, depois de se despedir de Lily com a promessa de que voltaria no dia seguinte, saiu do apartamento da antiga namorada. Estava empolgado para conhecer melhor o filho e poder estar na vida dele. Mas, infelizmente, não achava que poderia ser mais que isso na vida de Lily. 

 

22 de abril de 2006

 

  Quando James imaginava ver Lily Evans vestida de branco, com um buquê de flores em mãos e pronta para entrar na igreja não era desse jeito. Ele se imaginava dentro da igreja, de pé no altar, pronto para dizer “sim” a mulher que ele passaria o resto de seus dias. Porém, ali estava ele. De pé, do lado de fora da igreja, olhando Lily se aproximar, pronto para levá-la para os braços de outro.

  — Você está linda, Lírio. — Usou o apelido que há anos não falava. — Amos é um cara sortudo. 

  — Obrigada, Jay. — Sorriu, os olhos marejados. — Estou grata por você ter aceitado o meu convite para me levar até o altar. 

  Aquele pedido tinha sido uma surpresa para James. O pai de Lily tinha morrido quando ela tinha apenas doze anos, infelizmente não poderia ter a companhia do pai na caminhada até o altar. Potter imaginou que ela pediria a Frank, a mãe ou até que entraria sozinha, mas aquela honra tinha sido dada a ele. 

  — Pronta? — Perguntou quando a melodia de entrada da noiva começou. 

  — Não me deixe cair. 

  — Nunca. 

  As portas se abriram e eles começaram a caminhada lenta. James via os rostos maravilhados dos convidados ao olharem para a ruiva e imagina que aquela deveria ser sua expressão. Ela estava radiante, quase brilhando. Amos, na outra ponta, tinha um sorriso gigante no rosto e enxugava as lágrimas discretamente. Potter sabia que ele iria fazê-la feliz. 

  Chegaram no altar e James beijou a testa de Evans antes de entregá-la a Amos. Saiu dali e foi sentar em seu lugar no primeiro banco ao lado de Dorcas Meadowes, sua namorada. Haviam se conhecido no trabalho um ano atrás e namoravam há três meses, quando Lily ajudou James a fazer o pedido de namoro.

  A cerimônia foi linda, mas Potter não conseguia se impedir de pensar que poderia ser ele e Lily ali se as coisas tivessem acontecido de outra forma, se ele tivesse sido menos idiota e se ela não tivesse escondido Harry. Entretanto, mesmo que pensasse aquilo, sabia que as coisas não poderiam ser diferentes. Talvez tudo tivesse sido pior, talvez eles tivessem brigado por outras razões e nem conseguissem ser amigos. 

  Além disso, Amos era um ótimo cara e tinha provado aquilo milhões de vezes durante os quatro anos que esteve com Lily. Era gentil com ela, se esforçava para deixá-la feliz e se importa com Harry como se ele fosse sangue de seu sangue. E era um bom amigo para James, depois que superou a estranheza que era ter o ex-namorado de sua namorada por perto. 

  James queria que ele e Lily tivessem tido mais, mas sabia que era impossível e era grato pelo que tiveram. 

 

13 de dezembro de 2012

 

  Lily nunca viu James chorar tanto quanto naquele dia depois daquela ligação do hospital. Eles estavam passeando com o Harry pela rua de lojas principais de Hogsmeade, fazendo as compras de Natal. Geralmente, ela deixava para comprar na semana do feriado, mas precisa de uma desculpa para tirar James do hospital por algumas horas.

  Desde que Dorcas, esposa de James, tinha descoberto, dois anos atrás, que sofria de um tipo raro câncer de mama, o casal passava horas no hospital, Potter a acompanhava em todos os tratamentos. Seis meses atrás, o estado da mulher piorou e as horas no hospital aumentaram, James se recusava a deixá-la sozinha, mesmo que Dorcas sempre brigasse e dissesse que ele devia sair. 

  Naquela tarde, finalmente Harry e Lily tinham conseguido convencê-lo a sair um pouco. Duas horas depois que saíram e James já estava começando a relaxar, o hospital ligou. Lily observou o sorriso sumir do rosto do homem, deixando apenas um ser pálido e inerte na frente dela. Ele a guiou até o carro, dirigiu pelo caminho e adentrou o hospital em modo automático. As lágrimas só vieram quando ele viu o corpo morto de Dorcas sendo tirado do leito de hospital. 

  Lily observou as pernas dele falharem e ele cair de joelhos, cobrindo o rosto com as mãos e soluçando como um bebê. Evans agradeceu mentalmente por ter feito Harry esperá-los na recepção. Correu até o homem ajoelhado no quarto e o abraçou com força, desejando poder tirar toda a dor dele, mesmo que precisasse colocar nela mesma.

  — Lily. — Chamou com a voz falhando, abraçando-a forte. — Foi minha… eu não estava aqui… sozinha… ela…

  — Eu sinto muito, James. — Respirou fundo, não podia chorar. Precisava ser forte por ele. — Não foi sua culpa, você não tinha como saber. 

  — Eu a deixei sozinha. Ela morreu sozinha porque eu tava fazendo compras. — Soluçou. — Eu deveria ter feito mais por ela. 

  — James, você esteve com ela todos os momentos, ela sabe que você fez tudo que estava ao seu alcance. — Fez carinho nos cabelos dele, tentando acalmá-lo. — Eu sei que é doloroso e a pior sensação do universo, mas você não ia poder fazer nada pra impedir mesmo se estivesse aqui. 

  — Eu sei, mas ela sofreu tanto. Eu deveria estar aqui.

  — Vamos pensar que ela está descansando agora, certo? Que ela está em paz, que ela foi muito amada quando estava aqui com a gente. 

  Ele apenas assentiu, as lágrimas escorrendo por seu rosto. Era um choro mais calmo, mas tão doloroso quanto. Lily se recusava a deixar uma lágrima escorrer, precisava se manter firme para dar suporte a ele e não ia deixá-lo desabar. 

  — Não quero ficar sozinho, Lily. — Apoiou o rosto no ombro dela. — Por favor, não vá embora. 

  — Eu estou aqui, Jay. — Segurou o rosto dele com as duas mãos, o obrigando a olhá-la nos olhos. — E não vou a lugar nenhum. 

 

31 de julho de 2014

 

  Era aniversário de quinze anos de Harry e todos estavam reunidos na casa de Lily para comemorar. O local estava cheio com os amigos do aniversariante e de seus pais. Os marotos, Alice e Frank, Marlene, esposa de Sirius, Tonks, prima do Black e namorada de Remus, e Emmeline, esposa de Peter, estavam reunidos em um canto conversando e Sirius tentava convencer os outros a fazerem alguma brincadeirinha com o afilhado, Remus era totalmente contra a ideia de envergonhar o adoslecente, ao mesmo passo que Marlene, Tonks e Peter apoiavam a maluquice do Black, e Emmeline apenas ria das idiotices. James estava ocupado demais prestando atenção na interação de Harry e Ginny Weasley, irmã mais nova do melhor amigo do filho, Ron Weasley.

  — Ei, Hermione. — Chamou a melhor amiga super inteligente de Harry. 

  — Oi, tio James. Tudo bem? 

  — O que aqueles dois tem? — Perguntou, apontando discretamente para o moreno e a ruiva. 

  — Acho que o Harry tem uma quedinha por ela, mas é covarde demais para fazer alguma coisa. — Revirou os olhos. — E a Ginny, eu tenho certeza, ela é corajosa o suficiente para admitir.     

  — Não acredito que vou precisar ter uma conversa com esse garoto. 

  — Só não faça isso aqui, tio. Ele vai morrer de vergonha. 

  Deixou a menina ir conversar com Ron, ali também tinha coisa, James tinha certeza. Saiu de perto dos amigos e foi atrás de Lily ver se ela precisava de ajuda. Estava feliz que agora eles tinham uma relação boa, eram amigos, depois de alguns anos falando o básico. Nesses dez anos desde que se reencontraram, James teve que admitir que foi um babaca quando pediu que ela desistisse de seu sonho e ela admitiu que deveria ter falado com ele, ao menos tentado mais. Assistiram um ao outro se apaixonar por outras pessoas. A levou até o altar para que se entregasse a Amos Diggory, estava ao seu lado quando se separou do mesmo três anos atrás. Ela o ajudou quando pediu Dorcas Meadowes em namoro e em casamento, Lily foi seu suporte quando, um ano e meio atrás, Dorcas morreu por conta de um câncer. Agora, estavam ali cercados dos amigos no aniversário de quinze anos do filho. 

  O aniversário foi ótimo e acabou depois das duas da manhã, quando a maioria das crianças foram embora, então foi a hora dos adultos beberem e contarem as histórias de quando eram apenas adolescentes idiotas, sentados na área da piscina. 

  — A coisa mais maluca que aconteceu, foi esses dois viajarem por dois meses sem um centavo no bolso e sem se importar com os trabalhos. — Remus acusou, apontando para Lily e James. — Vocês eram dois malucos sem noção. 

  — Eu acho que deve ter sido muito bom. — Tonks rebateu. — Imagina o tanto de coisa que eles viveram, os lugares que conheceram. A gente devia fazer isso, Rem. 

  — A Tonks tá certa. Foi muito bom, a gente conheceu vários lugares legais, muitas pessoas. — Lily explicou. 

  — E a gente tinha dinheiro sim. — James retrucou. — Pouco, mas deu pra se virar. 

  — Respondam rápido. — Sirius chamou, apontando a garrafa de cerveja em direção a eles. — Vocês fizeram o Harry nessa viagem? 

  — Não. — Responderam juntos. — Sirius, pelo amor de Deus, o Harry nasceu em julho de 1999 e a gente viajou de junho a agosto de 1998. Cadê as aulas de matemática? — Lily quem perguntou. 

  — Foi no apartamento que a gente dividia e, eu acho, que foi no halloween. — James completou. 

  Dali eles entraram em uma discussão de quando Harry tinha sido concebido, Sirius tinha as explicações mais malucas possíveis e Tonks sempre concordava, o que fazia Remus e Marlene se juntarem para rebater os parceiros. Não demorou muito para que eles começassem a ir embora, Frank e Alice sendo os primeiros. Em seguida, Sirius, Marlene, Remus, Tonks, Peter e Emmeline, até que sobrou apenas James e Lily. 

  — Vamos ajeitar isso aqui logo, essas crianças fazem muita bagunça. — Potter sugeriu. 

  — Você pode ir embora, James, eu me viro. 

  Recebeu apenas um aceno como resposta do homem que já começava a pegar as garrafas vazias. Não levou muitos minutos para que eles tivessem terminado de jogar as coisas fora e ajeitar o que estava fora do lugar. Lily se jogou no sofá da sala, sem acreditar o quão cansativo tinha sido uma festa com apenas alguns amigos. O relógio na parede indicava que já passava das quatro e meia da manhã. James sentou ao seu lado depois de jogar algumas latinhas no lixo da cozinha. 

  — Vem comigo. — James chamou depois de passar alguns minutos olhando o celular. 

  Sem questionar, Lily o seguiu pelas escadas até a pequena varanda no segundo andar. Potter sentou no chão, encostado na parede, e fez sinal para que ela se juntasse a ele. No horizonte, o sol começava a nascer, colorindo o céu com tons de azul, laranja e amarelo. 

  — Lembra de quando a gente viu o nascer do sol em Tarragona na Espanha? 

  — Sim. — Lily sorriu, fechando os olhos e deixando a memória tomar conta de si. — A gente passou a madrugada inteira perambulando, indo de bar em bar, irritando alguns bêbados jogando sinuca, aí a gente achou o Balcón del Mediterraneo e viu o nascer do sol mais lindo do mundo. 

  — Foi muita sorte a gente não ter levado uma surra daquelas gigantes alcoolizados. — Riram da ideia. — Esse mochilão foi uma das melhores coisas da minha vida. — Lily virou para olhá-lo. — Você foi uma das melhores coisas da minha vida, Lily. Mesmo que a gente tenha acabado daquele jeito. E me deu a coisa mais importante do mundo, o Harry. 

  — Eu lamento que a gente tenha acabado daquele jeito, porque o que nós tínhamos foi uma das coisas mais importantes que eu vivi. — O olhar que trocavam era intenso. — E lamento que eu tenha sido uma idiota e não tenha te falado do Harry antes. Teria sido bom ter você comigo. 

  — Teria sido bom estar contigo, mas, as coisas aconteceram como tinham que acontecer. Era preciso tudo isso para que a gente estivesse aqui, nesse exato momento. — Afastou uma mecha ruiva dos olhos dela. — Vendo esse nascer do sol lindo e lembrando do que a gente já viveu. 

  Lily não respondeu, se inclinou para frente e colou seus lábios em um beijo calmo e saudoso. Se afastaram apenas o suficiente para se olharem nos olhos, os corpos ainda próximos, arrepiados com o contato. 

  — Senti sua falta, Lírio. 

  — Eu também, Jay. 

 

Deixa o moço bater

Que eu cansei da nossa fuga

Já não vejo motivos

Pra um amor de tantas rugas

Não ter o seu lugar

 

31 de outubro de 2014

 

 Lily lembrava nitidamente do dia que teve a sua primeira conversa com James Potter, no ponto de ônibus do lado da Universidade de Hogwarts, quinze anos atrás. Lembrava também de todos os momentos com ele durante o ano em que ficaram juntos até a briga que acabou com tudo. Dos cinco anos em que passou olhando pro Harry e vendo a cópia do pai, tinha o desejo de procurar James e contar tudo, sabia que era o certo, mas não teve coragem e foi necessário o destino intervir e colocar Potter em seu caminho. 

  Agora, anos depois que iniciaram sua história, eles estavam deitados na cama do Leaky Cauldron, um restaurante e hotel pequeno que ficava no centro de Hogsmeade. Fazia três meses que tinham se beijado no aniversário do filho e que, no dia seguinte, Lily bateu na porta do apartamento de James dizendo que queria tentar de novo, que queria fazer dar certo dessa vez. E, desde então, eles se encontravam escondidos naquele hotel com uma estrela no nome, tentando descobrir como aquilo funcionaria antes de contar a todo mundo. 

  — Eu quero contar a todo mundo, Lírio. — James acariciava as costas da ruiva. — Quero que todo mundo saiba que estamos juntos de novo e que vai dar tudo certo dessa vez. 

  — Acho que a gente pode contar amanhã, quando tiver todo mundo junto. — Lily entrelaçou as pernas na de James, tentando aumentar o contato de seus corpos nus. — Como acha que eles vão reagir? 

  — Hmn, o Sirius e a Lene vão gritar como os idiotas que são, dizendo que sabiam. A Tonks vai se juntar aos dois depois do choque, Remus vai tentar controlar os três e depois dar os parabéns e falar que também sabia. 

  — Frank e Alice vão ficar felizes, mas eles não são tão doidos como os outros. — Concluiu. — E o Harry?

  — Não sei, mas espero que ele aceite bem e nos apoie. 

  — Espero que sim. — Lily suspirou, se aconchegou nos braços de James. — Não sei o que faria se ele fosse contra. 

  — Nem eu. 

  Deixaram aquela dúvida pairar, ambos pensando o que fariam se aquilo acontecesse. Sabiam que se amavam e que mereciam viver juntos e felizes, mas o filho era uma parte importante demais para que sua opinião não fosse levada em conta. Ouviram batidas na porta, com certeza deveria ser Tom, o dono do local, para perguntar se eles queriam algo. Decidiram ignorar as batidas e apenas voltar a aproveitar os carinhos. 

  — Vamos viajar? — Evans sugeriu, de repente. — Fazer outro mochilão, passar pelos mesmos lugares que fomos. Passear pelas ruas de Berlim, experimentar maconha em Amsterdam, ver o nascer do sol em Tarragona, fugir dos guardas na Torre Eiffel, fingir que somos turistas em Londres. 

  — Sim, por favor, vamos! — James respondeu, animado. — Por mim, a gente vai amanhã. Pedimos férias no trabalho, deixamos o Harry com os padrinhos, tenho certeza que Six e Lene não vão se importar de cuidar dele. Por favor, Lily. 

  — Podemos deixar para junho, que são as férias e aí vamos. — Achava engraçado a empolgação do homem.  — Podemos até levar o Harry. Mas nada de maconha! 

  — É perfeito, Lírio. — Sorriu apaixonado olhando para a ruiva. — Vamos fazer um mochilão em família. E, quem sabe, a gente não faz um filho nessa viagem?

  Voltaram a se beijar como se não houvesse amanhã, empolgados com os planos que estavam fazendo, com o amor que explodia dentro deles e consumia tudo. Estavam tão entrelaçados e focados um no outro que não notaram que as batidas na porta voltaram a acontecer, nem mesmo os gritos dos outros hóspedes do hotel ou as paredes rachando. Se amaram com alma e corpo, sem saber que a hora deles se aproximava. Aquele amor cheio de rugas, que passou por tanto, mas que finalmente tinha encontrado seu lugar e estava de bem. 

  Enquanto eles adormeceram abraçados, lá fora a estrela caía, marcando esse amor para a eternidade.

 

02 de novembro de 2014

 

  Ver aquelas pessoas vestidas de preto, com flores brancas, era a confirmação de que tudo tinha acontecido de verdade. Parecia que até o céu entendia o sofrimento do menino de apenas quinze anos, já que estava escuro desde que ele recebera a notícia, na manhã do dia anterior, de que o corpo de seus pais tinha sido encontrado nos escombros de um hotel que desabou na noite de halloween. Harry não conseguia acreditar que jamais veria eles de novo. 

  Sirius, Remus e Peter se abraçavam num canto, sofrendo pela morte do melhor amigo e da ruiva que eles aprenderam a amar. Marlene, Tonks e Emmeline observavam eles de longe, respeitando o momento deles e também em sofrimento por seus dois amigos. Alice e Frank choravam silenciosamente. Hermione, Ron e Ginny estavam ao lado de Harry desde que eles haviam chegado. 

  Depois de que os amigos dos pais falaram, menos Sirius que se recusou a falar qualquer coisa, era a vez de Harry discursar. Suas mãos tremiam e o suor manchava a folha que havia anotado algumas palavras que pareciam bonitas e apropriadas para um funeral. 

  — Meus pais, James Potter e Lily Evans, eram as melhores pessoas do mundo. E não digo isso só porque eram meus pais, mas porque eles eram… — Olhou no papel procurando as palavras que deveria falar agora, mas decidiu que não era o suficiente. — Eu pensei em não falar nada, pensei até em não vir ao funeral, mas eles merecem que alguém conte sua história. James e Lily se conheceram quando eram dois jovens adultos aventureiros. Deus sabe quantas vezes minha mãe contou as aventuras deles em um mochilão quando se formaram em Hogwarts. — Sorriu, lembrando das várias noites que essas eram suas histórias para dormir. — Mas, eles eram novos demais e não conseguiram continuar. Encontraram pessoas novas que os fizeram felizes e viveram anos apenas como amigos. No meu aniversário, três meses atrás, eu vi eles admitindo que sentiam a falta um do outro. Não sei porque, mas eles estavam juntos esses três meses escondidos. Eu já sabia, porque eles não eram muito bons em mentir ou se esconder, mas não disse nada porque eles iriam contar quando estivessem prontos. — Respirou fundo tentando conter as lágrimas. — Eu queria ter dito que apoiava eles e que queria que fossem felizes. Que eles não precisam se esconder de ninguém. Mas não consegui. 

  Harry observou os rostos molhados de lágrimas dos presentes ali. Todos sofriam pela morte de James Potter e Lily Evans, mas ninguém sofreria mais que ele. 

  — Eu espero, mamãe e papai, que onde quer que vocês estejam, que seja juntos e que saibam que eu os amo e que vocês mereciam mais tempo amando um ao outro. E, que para mim, a estrela de vocês nunca vai cair. 

  Andou os poucos passos até o túmulo que, a pedido dele mesmo, os pais dividiriam. Se abaixou, colocando os lírios brancos ali e tocando a estrela acima de seus nomes.   

 

Diz, quem é maior que o amor?

Me abraça forte agora, que é chegada a nossa hora

Vem, vamos além

Vão dizer, que a vida é passageira

Sem notar que a nossa estrela vai cair


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