— Ai!

Tommy murmurou enquanto eu caia de joelhos sobre o tatame, Morgan havia trazido minha cabeça para perto de seu corpo com uma das mãos e passou o braço pelo meu pescoço, “o fechando” com o outro braço.

Dei três tapas forte contra o tatame.

Mas Morgan não parou.

Insistentemente eu bati sobre o tatame e ao perceber que ela não finalizaria a golpeei com a perna fazendo com que nós duas caíssemos sobre o tatame dando-lhe uma chave de perna.

Foi a gota d’água para que como sempre o treinamento terminasse em uma grande discussão entre nós duas.

— Eu dei o sinal para que parasse! Reclamei em um tom exaltado de voz, Morgan sorriu em deboche se levantando do tatame.

— Você chora demais!

— Meninas que tal se acalmarem? Sugeriu Tommy se colocando entre nós duas.

— Eu choro demais? Murmurei me levantando logo atrás dela – Isso é um treinamento e não um combate onde uma de nós precisa matar.

— Vontade não me falta! Disse ela pegando a garrafinha com água e levou a boca, rolei meus olhos e respirei fundo, como todas as vezes que havia enfrentado Morgan nos últimos três anos ela sempre fazia aquilo, não era novidade algumas suas provocações.

— Cuidado para não morrer envenenada! Sussurrei após pegar minha toalha e passando por ela caminhando na direção da porta, porém o corpo de Morgan se chocou contra o meu me pressionando contra a parede – O que vai fazer, me morder? A provoquei instantaneamente.

— Você não dá o braço a torcer Mia! Disse ela dando um sorriso – Sabe muito bem que eu posso te matar nesse exato momento, eu sou muito mais forte do que você, eu poderia fazer você perder até a última gota de sangue do seu corpo.

Minhas mãos seguraram seus pulsos e a encarei com um sorriso nos lábios – Porque não me morde então, senhorita hibrida mais forte.

Morgan me encarou mostrando os dentes, mas parou ao ouvir a ordem de Zo – NÃO FAÇA ISSO! Gritou ele a fazendo recuar.

Levei uma das minhas mãos a nuca e respirei fundo.

— Mia me provocou! Morgan se justificou assim que Zo se colocou no centro do tatame entre nós duas – Você deveria saber que ela sempre me provoca.

Novamente rolei meus olhos respirando profundamente e neguei com a cabeça, como eu não via motivo algum para me defender aderi ao silêncio, peguei novamente a toalha e minha garrafinha de água e segui na direção da porta.

— As duas na biblioteca em uma hora! Disse Zo com seu tom de autoridade.

Parei na porta me mantendo de costas para ele apenas concordei com a cabeça.

Eu caminhei pensativa pelos corredores até meu quarto, apesar do aborrecimento momentâneo uma parte de mim havia se acostumado com as provocações e rivalidade de Morgan, desde minha chegada naquele lugar sempre havia sido daquele jeito, e seu ódio por mim apenas havia piorado após eu ter enfiado uma flexa em seu traseiro.

Infelizmente não estava envenenada.

Entrei em meu quarto e joguei a toalha sobre a cama enquanto me desfazia das peças de roupas, o ofurô estava cheio de água com pétalas de flores, como sempre Audrey havia deixado a minha espera como sempre fazia após meus treinamentos, desde a minha chegada a aquele lugar a vampira cuidava de mim, isso era mais uma razão para Morgan sentir raiva, mas eram as ordens de Zo e a vampira sempre acatava tudo que ele pedia.

Entrei na água e enrolei os cabelos fechando os olhos, e depois de alguns minutos finalmente relaxei, eu amava o cheiro das flores se apossando da minha pele, mas o abrir da porta me despertou, Audrey sorriu e eu deduzi que ela já sabia o que havia acontecido.

— Falou com ele? Perguntei mesmo já sabendo qual seria sua resposta, lentamente me levantei da banheira de madeira e a vampira me ajudou a vestir meu roupão.

— Você realmente fez aquilo?

—Fiz! Respondi dando um sorriso.

— Mia, isso é sério...

— Morgan quis me morder, eu vi a sede nos olhos dela, suas veias saltando e o queimar em sua garganta.

— Você não é assim! Disse ela me ajudando a me vestir.

— E como eu sou afinal? Perguntei me sentando sobre a cama – Quem eu sou?

—Sabe que não é disso que estou falando.

Eu suspirei.

Audrey colocou a toalha sobre suas penas e em seguida meus pés sobre o tecido e suavemente começou a massageá-los – Você sabe que tenho um carinho muito grande por você Mia, eu não cuido de você só porque Zo pede, mas porque compreendo que dentro dessa capa de mulher marrenta tem um coraçãozinho doce e gentil que ainda se pergunta todos os dias de onde veio e quem é, por isso me prometa uma coisa.

—Audrey...murmurei.

— É sério! Ela me interrompeu – Me prometa que não vai mais instigar ninguém a morder você.

— Tudo bem...sussurrei.

— Me prometa...

—Okay! Eu prometo solenemente...

Audrey riu – Engraçadinha – Em seguida tirou meus pés de suas pernas pegando minhas botinas – Zo está a sua espera! Disse ela se levantando e em seguida saiu do quarto.

Peguei as meias de tricô as erguendo até minhas coxas e calcei as botas, o dia estava frio e o banho havia diminuído a temperatura do meu corpo, quando finalmente terminei de me vestir sai do quarto seguindo diretamente para a biblioteca onde Zo já me esperava acompanhado de Morgan.

— Até que enfim vossa alteza saiu de seus aposentos! Disse Morgan me provocando, Zo a olhou com o canto dos olhos e ela se calou imediatamente.

— Eu não vou demorar! Disse ele pegando um livro que estava sobre a mesa – Afinal de contas vocês não são mais crianças, são duas mulheres e eu não posso mais deixá-las de castigo, mas não quero mais nenhum tipo de reclamação de nenhuma das duas, vocês entenderam?

Morgan e eu concordamos com a cabeça.

— Morgan a partir de amanhã você treina com Joseph e Mia treinará comigo.

Morgan que estava sentada se levantou imediatamente – O que? Por que eu tenho que treinar com aquele vampiro lunático?

“Por que você se parece com ele” eu falei em minha mente rindo, Zo moveu a mão encostando seu dedo mindinho no meu e me encarou sem querer eu enviei a ele o que eu havia dito anteriormente.

Eu odiava quando ele fazia isso.

— Já está decidido! Finalizou ele.

Morgan bufou mas sabia que Zo não voltaria atrás na sua decisão – Eu posso me retirar? Perguntou ela olhando para mim, Zo concordou e ela desapareceu de nossos olhos.

Os olhos do híbrido se voltaram para mim.

— Devo esperar seu sermão agora? Perguntei.

Ele sorriu – eu compreendo que Morgan não  da sossego a você desde sua chegada aqui Mia, mas você me prometeu lembra?

— Morgan não perde a oportunidade de me agredir.

Zo deu alguns passos, sua mão livre segurou a minha mão colocando o livro que tinha na outra mão na minha – O cão não ladra por valentia, mas sim por medo – Disse ele, em seguida suas mãos prenderam meu rosto entre elas, Zo olhou em meus olhos e beijou minha testa e então saiu da biblioteca.

Eu olhei para o livro e me sentei novamente em uma pequena poltrona que ali havia, como sempre passei horas lendo, quando terminei o ruido de meu estomago me lembrou que eu não havia me alimentado, deixei o livro no lugar vazio da estante e sai da biblioteca indo para a cozinha.

O lugar como sempre estava vazio, eu era a única pessoa que o usava já que os habitantes da vila eram vampiros e híbridos que se alimentavam da caça, o grande bolo sobre a mesa me arrancou um sorrido – Audrey! Murmurei pegando a faca e puxei uma cadeira me sentando a mesa.

Após meu pequeno lanche decidi sair, caminhei na direção da floresta, mas a presença de Jimmy, Tommy e Morgan chamaram minha atenção. Os três estavam sentados um pouco distante conversando, ao notar minha presença Jimmy acenou, eu decidi ir ao encontro deles.

— O que fazem aqui? Perguntei curiosa.

— Acha que devemos dizer a ela? Perguntou Jimmy a Tommy e Morgan.

— Me dizer o que?

— Hoje nós vamos sair! Respondeu Jimmy.

— Iamos! Disse Morgan em um tom de aborrecimento – o que nos garante que ela não vai correndo dizer ao Zo ou Audrey?

— O que eu deveria dizer...espera...Eu olhei para os três – Vocês vão sair da vila?

— Isso! Tommy disse animado.

— Vocês estão malucos? É proibido, está nas regras – Falei cruzando os braços.

— Está com medo do Zo? Morgan me provocou.

— Não é questão de medo, nós duas estamos na corda bamba com ele.

— Nós vamos aproveitar que Zo vai dormir, antes da troca de turno retornamos, quando ele acordar estaremos aqui – Explicou Jimmy.

— É mesmo e como passaremos pelos vampiros que estão na entrada? Perguntei curiosa.

— Eu tenho um plano – Disse Tommy sorrindo – então você topa ou não sair? Ou vai me dizer que também não se sente presa aqui?

Olhei para os três pensativa, tinha que admitir que não tinha lembranças portanto não fazia a menor ideia de como era o mundo fora daquele vale oculto e escondido, olhei para Jimmy e ele sorriu animado – Certo, mas retornaremos antes do Zo acordar e não vamos muito longe.

— Isso! Tommy falou sorrindo – Nos encontramos aqui daqui a uma hora, não se atrasem.

Eu concordei e dispersamos, apressadamente eu entrei no quarto procurando algo descente para vestir,  apesar de ter mutas roupas eu não fazia a menor ideia de onde iriamos, coloquei um vestido e mantive as meias e as botas, após colocar o casaco prendi os cabelos em um coque e sai novamente antes que Audrey terminasse suas  tarefas com os outros híbridos e acabasse com meus planos.

No horário marcado estávamos os três diante da passagem que dava entrada para o vale – Vamos ao nosso plano! Disse Tommy soltando um cervo, como esperado o vampiro que guardava a entrada saiu sedento atrás do animal e então saímos rapidamente.

Após alguns minutos caminhando por estreitos tuneis eu finalmente pude ver o mundo fora daquele lugar, por alguns minutos eu admirei as estrelas de uma outra visão, porém Morgan me apressou.

— Vamos para um vilarejo próximo pouco povoado, está acontecendo uma festa hoje.

— Como você sabe? Perguntei a ela.

Os três sorriram.

— Acha que é a primeira vez que fazemos isso? Disse Morgan orgulhosa de sim – Vamos logo que temos pouco tempo.

Os três desapareceram, eu suspirei e os segui sem perder mais tempo.