Seu coração estava dilacerado, assim como sua mente. Por mais que tentasse, não conseguia fechar os olhos por mais de 5 min antes que se lembrasse dos fatos recentes que o levaram até aquela situação deplorável.

   Era uma noite fria e o vento uivava ao seu redor, formando montinhos tão pequenos de poeira que entravam por suas narinas e faziam seus olhos lacrimejarem. Não teve tempo de arranjar um lugar para dormir, na verdade não se importou em procurar, pois achava que merecia passar por isso, como uma espécie de punição pelas falhas cometidas contra seus amigos.

   Sentou-se, deu um longo suspiro e olhou para o céu estrelado, o qual seria seu companheiro pelos próximos anos, porém estava sem animo algum para achar aquela visão agradável. Remexeu nos bolsos e pegou um objeto metálico que lhe era bastante familiar, fazendo- o se lembrar do dia em que fora construído.

   Anakin sempre teve bastante afinidade em construir coisas e com seu sabre de luz não foi diferente. Era um belo exemplar, concluiu Obi Wan que observava o objeto atentamente, como se não o visse há vários anos.

   Com os olhos marejados, não por causa da poeira, mas sim pelas lembranças dolorosas, ele o guardou em sua túnica e encarou o céu novamente. Onde ele estaria agora? Teria sobrevivido?

  Agarrou com força a gola de sua roupa e segurou-se para não extravasar sua raiva e frustração num grito que ardia em sua garganta. Que mal haveria em gritar? Ninguém o ouviria mesmo, nem mesmo os Lars, há quilômetros de distancia, que agora deveriam estar acordados tentando fazer o pequeno Luke dormir. Havia deixado o bebe com o jovem casal algumas horas antes e mesmo tendo passado tão pouco tempo com o pequeno, soube assim que o pegou no colo que seria tão agitado quanto seu pai.

  Mas nem para isso sentia-se digno. Não se sentia digno de mais nada, nem para carregar um titulo de mestre Jedi. Não era nada além de um desgarrado, perdido no deserto em busca de um pouco de consolo, que ele achava não merecer também.

  Achava-se merecedor de uma coisa apenas. Culpa. Culpa por não ter conseguido impedir os trágicos eventos que levaram ao fim da republica; culpa pela morte dos seus colegas Jedi; Culpa por não ter salvado seu irmão das garras do imperador; culpa por ter falhado em sua missão.

  Ainda enraivecido, Obi Wan colocou-se de pé e chutou a grossa areia, produzindo uma nuvem de poeira que o envolveu por inteiro. Tossindo e espirrando, desvencilhou-se da poeira aos tropeços e deixou cair o sabre de luz que um dia fora de Anakin Skywalker. Com os olhos irritados, ele apanhou o sabre empoeirado e o assoprou, deixando reluzente como antes. Uma arma tão bonita, para tempos mais civilizados, pensou.

  Olhou ao redor e percebeu que enquanto estivesse ali, não poderia usar sequer o seu próprio sabre de luz. Embora sua principal missão fosse manter Luke a salvo, teria que fazer isso sem sua arma para não chamar atenção indesejada. Os Jedi remanescentes estavam sendo caçados como ratos por todos os cantos da Galáxia e por isso teria que se tornar invisível, pelo bem do garoto.

  Guardou-o novamente em suas vestes e apanhou o seu preso na presilha em seu cinto. Ativou a brilhante e mortal luz azul e a contemplou por uns segundos, pensando em quantas vezes escapou da morte graças aquele minúsculo cristal que estava em seu interior. Aquele pensamento levou a outro: Quantas vezes o próprio Anakin o havia salvado? Com certeza mais vezes do que ele era capaz de lembrar no momento. Ouviu então um som que se assemelhava a um gemido e olhou para trás e o que viu atormentaria seus sonhos pelo resto da vida.

  Lá estava Anakin, rastejando devagar pela areia espessa. Seus membros amputados deixando um rastro de dor e agonia, enquanto se esforçava para se aproximar de Obi Wan. Ele Levantou a cabeça e fuzilou seu antigo mestre com um ódio mortal e gritou:

— Eu te odeio!

 Um cheiro forte de pele queimada pairava no ar e a raiva que emanava dos olhos do ex-cavaleiro Jedi era tão intensa que Kenobi fechou os olhos com força, na esperança de que aquela visão sumisse tão rapidamente quanto surgiu.

  Ouviu um ultimo suspiro de dor e soube que tinha terminado. Abriu os olhos devagar e procurou em vão por seu antigo aprendiz. Era claro que Anakin não esteve ali realmente,fora apenas sua mente lhe pregando uma peça por causa do seu esgotamento emocional, mas a sensação foi tão real que deixou Obi Wan perturbado. 

 Esgotado, Obi Wan caiu de joelhos sobre a areia, segurando com força seu sabre de luz e dessa vez não conseguiu conter o grito que saiu furioso de sua garganta. Foi alto o bastante para que alguns pássaros ao longe levantassem voo em direção ao horizonte imponente, assustados.

   Deixou a cabeça pender para baixo e engoliu em seco. Gritar não o fez se sentir melhor, pelo contrario, o deixou com a garganta seca e irritada, mas achava que merecia isso então não se importou.

    As ultimas horas tinham sido um verdadeiro inferno. Descobrir que poderia se comunicar com seu falecido mestre deveria lhe servir de consolo, mas não se sentia consolado, pelo contrario, sentia-se ainda mais sozinho e perdido. Refletindo, percebeu o quanto foi tolo em achar que estava apto para realizar uma missão daquela magnitude: Treinar aquele que traria o equilíbrio para a galáxia, o escolhido. O destino de incontáveis vidas em suas mãos e ele havia falhado.

   O que seu Mestre estaria sentindo a seu respeito... Decepção? Desprezo? Ele não estaria errado, afinal... O próprio Obi Wan sentia-se envergonhado demais.

 Totalmente desolado, não notou que uma brisa suave o envolvia, como se o abraçasse. Achou que fosse impressão, mas depois de alguns segundos, quando conseguiu retomar parcialmente o controle de suas emoções, foi que percebeu que estava realmente sendo abraçado, não pela brisa, mas por alguém.

  Obi Wan não precisou levantar a cabeça para identificar quem era e por um momento sentiu-se como uma criança sendo consolada por seu pai depois de ter tido uma enorme decepção.

— Mestre...

  Sentiu uma leve pressão e isso bastou para que enfim desmoronasse, sentindo que merecia pelo menos um pouco de paz naquele momento.