Wolves escrita por black swan


Capítulo 2
02 ━━ Enjoy your stay.


Notas iniciais do capítulo

espero que gostem, boa leitura docinhos ♥



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VIVIENE SABIA QUE AQUILO IRIA DAR MERDA, mas não deixou de ficar com raiva quando a merda de fato aconteceu. Espremida contra a árvore ao lado de Scott, ela praguejou baixinho vendo, por entre as folhas e os fios de cabelo, Stiles e Lavínia sendo arrastados pelo Xerife floresta adentro.  

 — Merda! — Scott sussurrou.  

— Eu vou matar esse maldito, eu juro por tudo que é mais sagrado... — resmungou. Ela estava com frio, gotículas de água caiam dos galhos e molhava seus cabelos e ombros. Aquela havia sido, definitivamente, uma péssima ideia. — Eu não sei porque eu ainda vou nas ideias dele! 

 Quando a polícia se dispersou, indo para o outro lado, seguindo a liderança de McGarrett, Scott soltou o ar que segurava num suspiro de alívio.  

 — Essa foi por pouco. — sussurrou ele, dando uma espiada pelos galhos. — Vamos, é melhor a gente ir.  

 Não querendo ser pega pela polícia, Viviene manteve a lanterna desligada e juntos, ela e Scott cambalearam na escuridão da floresta, tropeçando em galhos e pedras, tentando não fazer barulho. Por sorte a chuva não mostrava sinais de retornar — porque isso fecharia tudo com chave de ouro. Somente as gotas presas nas folhas caiam, molhando-os com pingos gelados.  

 — É ingênuo da minha parte perguntar se você lembra o caminho de volta? — Scott questionou com a voz fraca, a segurando poucos segundos antes de Viviene tropeçar num pedregulho enorme.  

 Recuperando o fôlego, ela apertou o braço dele com dedos gelados e encarou ao redor. Estava um breu quase total tirando a luz da lua no céu, as sombras dos galhos e das árvores formavam figuras no chão molhado e irregular — sombras que costumavam frequentar seus pesadelos. Nada era reconhecível e tudo era, sinceramente, assustador. 

 Sentindo um aperto de medo no peito, ela soltou um risinho nervoso.  

 — Agradeço sua fé na minha inteligência, Scott, mas não acho que ela vá tão longe. — murmurou, se encolhendo contra ele.  

 Ele suspirou, não parecendo muito surpreso. Quando o encarou, Viviene viu, mesmo com o breu, o cenho dele se franzir.  

 — Relaxa, a gente vai sair daqui. — falou gentilmente, como se estivessem de volta a escola e Vivienne estivesse frustrada por não entender a explicação da professora, não sozinhos numa floresta procurando um corpo morto. — Vamos. — murmurou, a puxando.  

 Voltando a cambalear pelo chão instável, Viviene se obrigou a respirar fundo. Era só uma floresta, nada demais. Não tinha assassinos espreitando no escuro para pegá-los, o corpo fora provavelmente desovado ali, só isso, pensou consigo mesma.  

 Subitamente, um som alto de asas ecoou pela floresta e Viviene teve absoluta certeza de que sua alma deu um pulo para fora do corpo tamanho o susto. Ganindo, ela ergueu a cabeça, conseguindo ver a sombra dos pássaros voando para longe do topo da árvore.  

 — Meu Deus. — sussurrou.  

 — Relaxa. — Scott repetiu, soando um pouco sem fôlego.  

 Viviene o fitou, tendo consciência de que deveria estar preocupada com a asma do garoto, mas o terror era forte demais para sentir qualquer outra coisa.  

 — Pega a bombinha. — resmungou, o cutucando com um dedo trêmulo.  

 Ele revirou os olhos, mas obedeceu. O observando atentamente — a última coisa que eles precisavam era de Scott tendo um ataque de asma no meio do nada —, ela o viu sacudir a bombinha lentamente, mas então seu cenho voltou a franzir.  

 — O que? — Viviene murmurou, seguindo o olhar dele. Por um segundo, ela não viu nada além das folhas cobrindo o terreno irregular, a noite escura e as árvores altas. Mas no segundo seguinte, eles atacaram.  

 Viviene sentiu o grito subir pelo peito, mas ficou entalado na garganta. Seu corpo foi jogado para trás com tanta força que ela demorou um segundo para registrar o que estava acontecendo enquanto tentava respirar. Scott caiu em cima dela, arrancando o pouco ar que conseguira reunir. Ao seu redor as patas dos cervos batiam no chão como tiros, ensurdecedores e velozes. Ela fechou os olhos e se encolheu, colando os lábios para evitar soltar o grito de pavor.  

 E então tudo cessou.  

 Lentamente Viviene abriu os olhos, aquele berro ainda parado na ponta da língua. Tudo estava quieto, assustadoramente quieto. As folhas caiam de volta no chão, o único rastro deixado pela manada de cervos. Tentando respirar, ela empurrou Scott de cima de si — ele rolou para o lado e respirou fundo, olhando ao redor, atordoado.  

 — Minha bombinha — ele ofegou enquanto se erguia, cambaleante.  

 Com as pernas bambas, Viviene tentou se levantar. Ela tropeçou para trás e bateu as costas no tronco da árvore. As pernas falharam e ela caiu na terra, sem forças para levantar, Viviene encostou a cabeça na madeira úmida e respirou fundo.  

 — Me dá sua lanterna — Scott exigiu.  

 Quando foi enfiar a mão no bolso, Viviene percebeu que estava tremendo. Tomou outra lufada de ar e forçou os dedos a se fecharem ao redor do objeto e a puxou para fora da jaqueta, a entregando a Scott.  

 Enquanto observava o garoto acender a luz e começar a procurar pela bombinha, Viviene tentou relaxar e fazer o coração voltar ao normal. Batia tão forte contra as costas que parecia que ia pular pela boca a qualquer segundo — era desconfortável.  

 — É por isso que eu odeio o Stiles — falou veementemente, tentando se levantar.  

 Dessa vez suas pernas não falharam, ainda estavam meio instáveis, mas firmes o suficiente para ela conseguir andar. Com passos vacilantes, ela foi até Scott, que chutava algumas folhas na esperança de achar a bombinha.  

 — Olha, eu que você e sua mãe tem orgulho e tudo mais, mas... será que se eu te comprar outra a gente pode ir embora? — Viviene implorou num chiado, cruzando os braços contra o peito na esperança de fazê-los parar de tremer. Scott somente maneou a cabeça, os olhos fixos no chão. Ela suspirou. — Qual é, Scott, é só uma bombinha, se te fizer se sentir melhor, eu posso até comprar a mais vag- 

 Viviene tropeçou e um gritinho escapou de seus lábios quando sua bunda atingiu o chão com força. Resmungando, ela se apoiou nos cotovelos e mexeu as pernas para se levantar, mas quando seu pé pousou em algo macio demais para ser uma pedra ou um galho, ela congelou.  

 — Scott... — choramingou. O garoto a encarou por um segundo, assustado, antes de mover a luz da lanterna.  

 Os gritos ecoaram alto na floresta silenciosa.  

 Desesperada para se afastar do corpo — que tinha os olhos escuros e mortos extremamente abertos —, Viviene se arrastou para trás, mas não encontrou chão. O ar abandonou seus pulmões e ela caiu rolando, batendo a cabeça e os cotovelos no caminho.  

 — VIVIENE! 

 O atordoamento a paralisou, entorpecendo a dor da queda. Quando as costas finalmente bateram com força no chão duro, bem encima de um galho, Viviene ficou parada encarando o céu escuro, sentindo a dor começar a irradiar para todos os lados e o coração fazer um valente esforço para se desgrudar do tórax.  

 Aquela havia sido a pior ideia já tida na história das ideias ruins.  

 — Viviene! — Scott exclamou.  

 Gemendo, ela se apoiou nos cotovelos, vendo Scott descer o morrinho que ela havia rolado, tropeçando e quase caindo umas três vezes no caminho. Dobrando as pernas, ela tentou se sentar, engolindo o grito de dor ao sentir a pontada aguda nas costas.  

 Scott derrapou no final do monte de terra, correndo até ela.  

 — Meu Deus, você tá bem? — ele perguntou, os olhos castanhos arregalados de preocupação e pavor. — Você tá bem?! 

 Ela choramingou.  

 — A gente pode ir embora agora? — esganiçou, esticando o braço.  

 — Você não respondeu minha pergunta. — Scott a segurou, a lanterna pressionando o cotovelo. Viviene chiou ao ser erguida. Tudo doía, absolutamente tudo.  

 — Eu não- — ela tirou uma mecha de cabelo do rosto, tentando ver melhor. Algo parecia ter se mexido na escuridão. — Scott...  

 Ele virou.  

 Por entre as árvores não havia nada além de sombras. Um galho se curvava para frente, parecendo uma mão. E então ela se mexeu novamente. E dois olhos escarlates se fixaram neles. Isso não é um cervo, Viviene pensou, sendo o pavor a consumir. Um som veio da escuridão, parecendo suspeitosamente com um rosnado.  

 E então a sombra atacou.  

 Sendo jogada para trás, Viviene berrou de pavor, sentindo Scott bater contra seu ombro e gritar de dor. Com os pés escorregando contra o chão lamacento, Viviene cambaleou, puxando Scott consigo. Tropeçando um contra o outro, eles correram pela floresta. 

 Viviene não estava conseguindo enxergar nada enquanto corria, os cabelos obstruindo a visão, mas o terror absoluto a mantinha correndo — a imagem daquela sombra os seguindo a fazia ir mais rápido. Escorregando pela terra, ela mais sentiu do que viu o asfalto sobre seus pés. E então subitamente ela foi cegada, uma buzina alta soou e ela se encolheu contra Scott.  

 Mas nada aconteceu.  

 Ela virou o rosto e viu pela fresta das pálpebras um carro vermelho sumir na curva da estrada.  

 Ouvindo nada além do sangue correndo nos ouvidos, Viviene suspirou e sentiu as pernas falharem. Ela escorregou dos braços de Scott e desabou na rua, olhando para a borda da floresta com os olhos arregalados, mas nenhuma sombra saiu dali.  

 — Eu não consigo levantar. — ela falou, a voz soando fraca e esganiçada. Eu nunca mais vou conseguir levantar.  

 — A gente tem que sair daqui — Scott sussurrou, a segurando pelos braços. — Vem. — e então ele a puxou com força para cima.  

 Viviene tentou fazer as pernas funcionarem, mas elas pareciam feitas de geleia. Ela se apoiou em Scott, que grunhiu de dor.  

 Os olhos dela se fixarem nele automaticamente.  

 — Você está machucado? — indagou sem fôlego, preocupada.  

 Scott sacudiu a cabeça.  

 — Eu tô bem. Vamos, a gente tem que ir.  

 Aquilo foi o suficiente para fazê-la focar. Ele tentou se afastar, mas Viviene o segurou pelas cordinhas do capuz.  

 — Você está machucado? — repetiu com seriedade, ignorando as próprias dores.  

 Scott abaixou o olhar, hesitando por um segundo. Levou a mão a barra do moletom e da blusa e os puxou. Uma marca de mordida se arqueava na pele acima do quadril, sangrenta e profunda.  

 Um tipo muito diferente de medo se apossou de Viviene.  

 — Você tem que ir para o hospital! — exclamou, todo o tipo de pensamento ruim consumindo sua mente. Scott escondeu a ferida antes que ela pudesse dar uma melhor olhada.  

 — Eu tenho que para casa. — corrigiu.  

 — UM ANIMAL TE MORDEU! — ela berrou. — Hospital, McCall. 

 Ele suspirou.  

 — Você sabe muito bem que eu não posso ir para o hospital. — Scott falou, parecendo frustrado. O familiar aperto no peito fez Viviene se encolher. — Minha mãe é enfermeira, ela vai dar uma olhada nisso, desinfetar e vai ficar tudo bem. Vamos! 

 — Mas...  

 — Mas nada — ele falou, passando o braço pelas costas dela e a puxando. — Eu estou bem. Vamos.  

 Contrariada, ela cruzou os braços e o acompanhou, ambos quase correndo na beira da estrada. E, para sua própria sanidade, Viviene ignorou a sensação de estar sendo observada.  

 Mas não pode deixar de tremer quando ouviu o uivo do lobo nas profundezas da floresta.  

*** 

 Vendo Scott sumiu na esquina, Viviene mordeu o canto da boca e enfiou a mão no bolso da jaqueta, caçando as chaves. Ele havia sido mordido por um animal... um lobo, aparentemente. Deveria estar indo para um hospital, não para casa. Aquilo poderia infeccionar ou pior.  

 Destrancando a porta o mais silenciosamente possível com as mãos ainda trêmulas e ardidas, Viviene deslizou para dentro. A casa estava silenciosa e escura, fazendo-a suspirar de alivio. O dia fecharia com chave de ouro se seus pais ou Jackson aparecessem. Ela trancou a porta e foi até a cozinha. O design moderno em tons de preto e prata estavam obscurecidos pela escuridão da noite.   

 O território de sua mãe estava estéreo, limpo e cheirando a desinfetante. Sua mãe havia passado por ali, Viviene percebeu, puxando um copo do armário. Antes de esgueirar para esperar o jipe no fim da rua, a pia estava com os pratos de jantar ainda sujos. Enquanto deixa o filtro encher o copo, Viviene olhou para as próprias mãos. Estavam vermelhas e arranhadas, e ela não queria nem pensar em como estava o resto de seu corpo — a manhã seguinte seria um pesadelo.  

 Quando o primeiro gole de água desceu pela garganta, Viviene finalmente percebeu o quanto estava com sede. A janela acima da pia mostrava a piscina interna e o céu escuro. Ela abaixou o copo e respirou fundo. Por mais que tentasse ignorar, as mãos e as pernas ainda estavam trêmulas, o terror ainda apertava seu estômago e deixava um gosto amargo na boca. A cada poucos segundos a lembrança daqueles dois olhos vermelhos entre as árvores vinham a mente, fazendo seu coração dar um salto todas as vezes.  

— Acabou — sussurrou para si mesma, colocando o copo da pia. — Relaxa.  

 Subindo as escadas quietamente, ela chegou ao quarto soltando um suspiro de alivio. Diferente do resto da casa, seu quarto estava uma bagunça. A cama desfeita com travesseiros a esmo e a colcha de retalhos coloridos no pé da cama, o closet estava com as portas abertas, transbordando com vestidos, saias e calcinhas. Sua mochila estava no canto ao lado da porta, já arrumada para amanhã. Até o mural de fotos acima da cama estava bagunçado. Era tudo tão familiar e reconfortante que Viviene sentiu vontade de chorar.  

 Chutou os sapatos do pé e puxou a jaqueta, grunhindo surpresa ao sentir as pontadas de dor irradiarem das costas e dos braços. Largando-a no chão, Viviene sentou-se na cama e tentou relaxar os ombros. Havia corrido, sido atropelada por cervos e rolado de um moro, ela tremia só de imaginar as dores que iria sentir amanhã — ou mais tarde, no caso.  

 No chão, seu celular vibrou. Tirando-o do bolso da jaqueta, Viviene desbloqueou a tela, havia mensagens de Stiles e Viviene, mas nada de Scott ainda.   

 

[ ruivinha  → vivien ] — VOCÊS ESTÃO BEM??? 

[ ruivinha  → vivien ] — RESPONDE INFERNO!!!!!!!!!!!!!1 

[ ruivinha  → vivien ] — VIVIENE KATERINA WHITTEMORE 

[ ruivinha  → vivien ] — ME RESPONDE 

[ ruivinha  → vivien ] — VIVIVIVIVIVIVIVIVIVIVIVIVIVI 

 

Ela balançou a cabeça, conseguindo abrir um sorriso.  

 

[ vivien → ruivinha  ] — dá pra parar com essa merda faz favor 

[ vivien → ruivinha  ] — estamos bem 

[ vivien → ruivinha  ] — ou algo vagamente semelhante a isso.  

[ ruivinha  → vivien ] — O QUE ISSO SIGNIFICA???W 

[ vivien → ruivinha  ] — olha eu to cansada e precisando de um banho 

[ vivien → ruivinha  ] — amanhã a gente se fala. 

[ ruivinha  → vivien ] — VIVIENE!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! 

 

Soltando uma risadinha, ela abriu o outro chat, vendo que Stiles também havia mandado mensagem — e ela fez questão de se lembrar mais tarde de provocá-lo pela preocupação, quando não estava mais tremendo de medo, claro.  

 

[ sherlock stilinski stiles holmes → vivien ] — Sei que satanás não morre 

[ sherlock stilinski stiles holmes → vivien ] — mas só por precaução  

[ sherlock stilinski stiles holmes → vivien ] — me fala que tá viva 

[ vivien → sherlock stilinski stiles holmes ] — infelizmente vim a falecer 

[ vivien → sherlock stilinski stiles holmes ] — voltei ao trono de minha terra natal 

[ vivien → sherlock stilinski stiles holmes ] — espero te ver aqui logo 

[ vivien → sherlock stilinski stiles holmes ] — tem um lugar especial SÓ PRA VOCÊ 

[ vivien → sherlock stilinski stiles holmes ] — (e scott tá a caminho de casa) 

[ sherlock stilinski stiles holmes → vivien ] — feliz em saber que tenho privilégios  

 

— Onde você estava?  

 Viviene suprimiu o berro de susto — pensando vagamente que estava ficando muito boa nisso. Sorvendo vários goles de ar, ela coçou os olhos com força e jogou o celular por cima do ombro. E então encarou o irmão.  

 Jackson estava vestindo calça de moletom e uma velha camisa de Beacon Hills High School, parado em frente a porta com sua usual expressão de desagrado. Seu cabelo ainda estava impecavelmente feito, fazendo Viviene perceber que seu irmão ainda não havia ido dormir.  

 — Porque quer saber? — retrucou, o medo persistente dando lugar a algo semelhante a expectativa, para seu desgosto. Sabia que a muito deveria ter desistido da esperança de ter seu irmão de volta. — Preocupado?  

 Jackson bufou, desdenhoso.  

 — Nos seus sonhos. — respondeu, revirando os olhos.  

 — Ao contrário do que a pau mandado da tua namorada te faz pensar, dormir e ver você não é sonho, Jackson. É o pior tipo de pesadelo. — Viviene falou, levantando-se e indo até ele. As dores que começavam a latejar em seu corpo a fazendo se arrepender logo no ato. — Agora vai se fuder e me deixa em paz. — e a porta bateu na cara dele com um barulho considerável.  

 Ignorando os xingamentos do outro lado da madeira, Viviene girou a chave e soltou um suspiro resignado, ainda se perguntando o porquê de ter esperanças. Jackson havia mudado e nada iria alterar isso. Esperar que seu irmão mais velho de seis anos atrás voltasse era inútil.   

*** 

  No dia seguinte, quando já estava devidamente vestida para a escola, Liv parou em frente a sua penteadeira e se encarou no espelho. O cabelo ruivo grande, a blusa de frio preta e a jaqueta de couro vermelha por cima fazia uma bela combinação. Pegando o colar — que havia aparecido em sua mesa de cabeceira no chalé há nove anos atrás —, ela o prendeu no pescoço e enfiou o celular no bolso da mochila. Lavínia saiu do quarto e desceu as escadas, indo até a cozinha. Quando estava com um muffin de chocolate a caminho da boca, uma buzina soou impaciente do outro lado da rua. Contendo um suspiro, Lavínia saiu de casa e trancou a porta, indo até o jipe com lentidão.  

  Mesmo que não tivesse dislexia ou TDAH, Lavínia ainda não suportava a escola. Sentia que poderia estar gastando seu tempo com algo melhor do que ouvir as reclamações e resmungos de Harris e seus colegas. Assim que abriu a porta do jipe e entrou, Stiles surrupiou seu muffin e pisou no acelerador.  

  — Obrigada por roubar meu café da manhã — resmungou, jogando a mochila no chão do carro. 

  — De nada — respondeu ele de boca cheia, a voz abafada pelo muffin.  

  Lavínia fez uma careta.  

  — Nojento.  

  Stiles sorriu para ela. Quando finalmente mastigou e engoliu, ele falou:  

— Falei com Scott ontem. — Lavínia respirou fundo e anuiu, sentido alívio e uma onda de culpa, ela poderia ter ido buscá-los sem chamar a atenção de ninguém, mas isso acabaria deixando Stiles desconfiado, e a última coisa que ela queria era um Stiles desconfiado na sua cola. — Ele foi mordido.  

Lavínia piscou e Stiles parou em um sinal vermelho, o último farol antes de chegar na escola.  

— Como é?   

— Aparentemente um animal o mordeu.  

— E ele vai para a escola? — exclamou ela, incrédula. — Ele deveria é ir para o hospital!  

 Stiles fez uma careta e acelerou quando o sinal ficou verde.  

 — Segundo ele, ele está perfeitamente bem.  

 Lavínia estralou a língua, vendo o estacionamento se aproximar. Quando Stiles parou — em uma vaga relativamente próxima do prédio principal —, Lavínia jogou a mochila por cima do ombro e saiu do carro, correndo os olhos por todo campo na tentativa de encontrar Scott.  

Ele e Viviene estava no caminho que levava ao prédio de tijolos escuros — que Lavínia havia gentilmente apelidado de Hades. Ambos pareciam em perfeito estado, mas quando se aproximou, Liv viu que as mãos de V estavam enfaixadas e ela estava exausta, os ombros caídos e a postura encurvada, nada semelhante a garota altiva e animada que estava acostumada.   

— Você tá acabada — comentou. Claro, ela estava bonita, com os cabelos refletindo a luz do sol, o vestido combinando com as botas e a jaqueta, mas ainda sim, exausta. 

Viviene a encarou.  

— Bom dia pra você também. — ela resmungou. — Mas o real problema é esse aqui — e apontou para Scott.  

— Eu estou bem — Scott retrucou automaticamente.  

 Lavínia arqueou a sobrancelha.  

— Stiles falou que você foi mordido. — falou. — Isso não parece nada vagamente semelhante a bem.  

— Ok, vamos ver. — Stiles interrompeu, gesticulando.  

 Scott suspiro e puxou as duas camadas de roupa para cima, revelando um curativo manchado de sangue.  

— Como você acha tá bem? — Liv questionou indignada.  

— Uou — exclamou Stiles.  

— Uou nada. Ele deveria era estar no hospital. — Viviene falou.  

Lavinia concordou com um aceno. Talvez tivesse algum feitiço para curar aquilo em de seus livros... Scott cobriu a ferida e jogou a mochila por cima das costas com uma ligeira careta de dor e incômodo. 

 — Estava escuro demais para ver, mas tenho certeza de que era um lobo. — comentou Scott, começando a caminhar em direção a entrada do prédio.  

Viviene tremeu, se encolhendo em seu casaco.  

— Definitivamente um lobo. — sussurrou, os olhos meio desfocados.  

O cenho de Lavínia se franziu.  

— Lobo?  

— Um lobo te mordeu? — Stiles indagou, cético. Ao aceno de Scott, ele balançou a cabeça. — Sem chance.  

— Nós ouvimos um lobo uivando.  

— Altamente improvável — opinou Liv, apertando os dedos ao redor da alça da mochila, vendo diversos alunos passarem por si e entrarem na escola. — Até onde eu sei, não tem lobos na Califórnia.  

Stiles apontou para ela como se disse: “viu?”.  

— Pelo menos não em 60 anos ou algo assim. — completou ele, parando no meio do caminho.  

 Scott intercalou o olhar ente Lavínia e Stiles.  

— Sério?  

— É. — respondeu Stiles. — Não tem lobos na Califórnia.  

Scott balançou a cabeça.  

— Se vocês não acreditam no lobo — falou Scott. —, então nunca vão acreditar se eu disser... que nós encontramos o corpo.  

Lavínia arqueou as sobrancelhas.  

— Tá me zoando? — falou Stiles, a animação hiperativa começando a tomar conta de sua voz.  

— Tá falando sério? — perguntou Liv ao mesmo tempo.  

 Scott bufou.  

— Eu queria estar brincando. — respondeu ele. — Vou ter pesadelos por um mês. Viviene tropeçou nele.  

A garota tremeu novamente. A luz do sol evidenciava o bronzeado das férias e as luzes no cabelo, ela parecia uma princesa californiana acabada.  

Stiles quase engasgou.  

— Isso é incrível. Deve ser a melhor coisa que aconteceu na cidade desde...  

— Lavínia — Lydia cumprimentou com certo desgosto ao passar por eles. — Vivien.  

Lavínia sorriu. Não era exatamente um sorriso falso mas também não era sincero. Há muito aceitara que provavelmente detestaria a garota que um dia considerou sua amiga por causa de um garoto — e quantas noites não passou em claro desejando que aqueles sentimentos simplesmente sumissem? —, mas encontrava consolo no fato de que Lydia havia se tornado uma patricinha insuportável e deixava tudo mais fácil. Claro, a culpa não era dela e nunca seria — e Liv não culpava Stiles também, por baixo daquela faixada mimada estava uma garota incrível —, mas os sentimentos de Lavínia não eram exatamente racionais.  

— Olá, Lyds.  

— Martin. — falou Viviene com um suspiro.  

A garota bufou e se afastou, o sobretudo e o cabelo — hoje encaracolado — esvoaçando atrás de si.  

Lavínia virou para Stiles.  

— Eu não sei por que você gosta dela — comentou, tentando deixar de fora seu amargor, mesmo que soubesse o porque. Se não fosse por Stiles e pela influencia maléfica de Jackson, ela também se apaixonaria por Lydia. — Ela te ignora.  

— Isso é culpa sua, sabia?  — pronunciou Stiles, encarando Scott. O garoto entortou os lábios e anuiu solenemente, não levando o comentário a sério. — Eu sou nerd por associação.  

 — Associação? — indagou Lavínia com a sobrancelha arqueada. — Você me acha nerd, Stilinski?  

 Inesperadamente Scott sorriu — era aberto e bobão, como se ele tivesse acabado de descobrir que o natal chegará mais cedo ou que ia ganhar um aumento.  

— Na verdade não — respondeu Scott, parecendo extremamente animada —, segundo ele, você é a garota mais gos-  

— Cala a boca! — disparou Stiles, as orelhas ficando vermelha. — Olha o sinal — ele apontou para dentro, onde ecoava o apito agudo e irritante. — A gente vai perder a aula, bora!  

 E ele saiu arrastando Scott pela camisa. Lavínia o seguiu com o cenho franzido.  

— Eu sou o que, Stilinski? Voltem aqui vocês dois! — mas eles já haviam desaparecido na aglomeração de alunos. Frustrada, ela se virou para Viviene. Ela não havia trago bolsa consigo naquele dia, carregava três livros e um caderno nos braços. — Como você está? — perguntou preocupada. Viviene não era assim, quieta.  

Ela piscou, meio atordoada.  

— Eu tô bem. — falou, balançando a cabeça.  

— Não tá não. — refutou, passando o braço pelas costas dela, a guiando para dentro da escola. — Parece meio... Desconectada.  

V fez uma careta.  

— Acho que é o remédio. — resmungou, coçando a cabeça.  

— Remédio? — Lavínia repetiu, parando no corredor. A preocupação apertou seu estômago.  

— Eu acordei com dor em tudo quanto é lugar, então tomei um remédio. Nada demais. — ela explicou.  

Lavínia a encarou por alguns segundos.  

— Ok..., mas quando as aulas terminarem você vai me contar tudo que aconteceu naquela floresta ontem. — exigiu. Viviene somente encolheu os ombros, a exaustão clara em todos os movimentos.  

 Aquilo só serviu para deixar Lavínia ainda mais preocupada. Quando chegaram na sala, uma das poucas aulas que os quatro teriam juntos, a de Inglês, Stiles e Scott já estavam sentados. Indo para trás de Stiles, Liv viu Viviene praticamente se jogar na cadeira em frente a eles, não se dando ao trabalho de abrir o caderno ou conferir a folha do cronograma sobre a mesa.  

O professor, conhecido como o detestável substituto, entrou e fechou a porta atrás de si. O fraco burburinho se dispersou e todos se sentaram. Ele pegou o giz e começou a escrever, direto como sempre.   

— Como todos sabem, foi mesmo encontrado um corpo na floresta ontem à noite. — ele anunciou, ainda escrevendo com sua letra garranchosa no quadro. Scott virou-se lentamente para encarar Stiles. — E tenho certeza que essas mentes ávidas estão pensando em vários cenários macabros para o que aconteceu. — Lavínia era obrigada a discordar. Ao redor uns trocavam papeizinhos de forma extremamente não discretas, outros estavam com a cara enfiada nos celulares, tinha uma garota passando batom. — Mas estou aqui para contar que a polícia tem um suspeito em custódia.  

Aquilo era novidade.  

Lavínia se inclinou e sussurrou para Stiles:  

— Sabia dessa?  

Ele negou com um gesto de cabeça.  

— O que significa — o velho continuou. — que podem dar sua total atenção ao programa das aulas deste semestre que está em suas carteiras.  

Lavínia suspirou, amassando a ponta do papel entre os dedos. Essa era a parte que ela não suportava. Sair do Acampamento, onde tinha pessoas como ela, onde fazia coisas interessantes e úteis, para cair ali. Na aula de inglês. Se não fosse por aqueles três ao seu lado — e seu pai —, Lavínia alegremente passaria o ano inteiro no Acampamento.  

A porta da sala abriu e Lavínia ergueu o olhar.  

— Classe, esta é a nova aluna, Allison Argent.  

A primeira coisa que Liv notou foi que a garota era muito bonita; tinha cabelos castanhos escuros, o rosto anguloso e usava um cachecol azul maravilhoso, junto com uma jaqueta marrom clara, jeans e bota. A segunda foi que ela estava visivelmente nervosa, os dedos pálidos brincando com os fios da ponta do cachecol. A terceira que Scott a encarava com um olhar meio estranho. E a quarta que o sobrenome dela era extremamente familiar.  

— Façam-na se sentir bem-vinda. — finalizou o secretário do diretor. Ele sorriu antes de sair.  

Allison, encolhida dentro da jaqueta, foi o mais rápido possível se sentar no único lugar disponível: atrás de Scott. E, mesmo com a cabeleira escura escondendo boa parte do rosto, Lavínia pode dizer com certeza que ela era linda.  

E então Scott se virou e a entregou uma caneta.  

Confusa, Lavínia observou a garota o encarar por alguns segundos, antes de sorrir e aceitar o objeto, um pouco hesitante.  

— Obrigada. — falou ela, soando surpresa.  

— Essa é nova. — Lavínia murmurou.  

*** 

 A dor surda na cabeça e ardência nas mãos distraiu Viviene durante todo o primeiro período. Seu cérebro parecia meio desconectada do corpo, como se ele fosse flutuar para fora do crânio a qualquer segundo. Mas isso com certeza era melhor que a dor insuportável que sentiu assim que acordou.  

Ela estava tentada a ficar assim o dia inteiro; quieta, calada, somente sentindo a dor e o cansaço da noite mal dormida. Porém, os olhares de preocupação que sentia vindo de Scott, Stiles e Lavínia durante toda a aula a fez fazer contrário. Quando o sinal finalmente tocou, ela endireitou os ombros e piscou freneticamente, tentando espantar o sono.  

Ao sair da sala, ela acompanhou os três para os armários, notando que em seus braços faltava o livro de química... que havia ficado no carro de Jackson, lembrou, suspirando. O corredor já estava lotado e não dava para ver em lugar algum o topete loiro no meio da multidão. 

— Alguém aqui viu meu irmão? — questionou, ficando na ponta dos pés para tentar localizar o loiro insuportável. 

— Graças a Zeus, não. — respondeu Liv, enfiando o livro de inglês no armário. — Porque? 

— Deixei meu livro de química no carro dele. — resmungou em resposta.  

Stiles arqueou a sobrancelha.  

— Você ganhou uma Mercedes de aniversário e veio com seu irmão? — questionou.  

Viviene bufou.  

— Não posso dirigir com as mãos assim, posso? — retrucou, balançando as mãos enfaixadas. As quedas haviam cobrado seu preço, assim que acordara, teve a distinta impressão de que suas mãos estavam em carne viva.  

Lavínia soltou um assovio baixo, chamando a atenção. Ela tinha um sorriso malicioso no rosto.  

— Alguém está interessado na garota nova? — provocou, sorrindo para Scott.  

Viviene viu que, do outro lado do corredor, a novata sorria para Scott.  

— Ela é bonita. — Viviene não pode deixar de perceber. — Querem apostar quanto que daqui a pouco a Lydia aparecer para dar o bote?  

— Tão rápido? Acho que não. — Lavínia opinou, cruzando os braços.  

Como se invocada, Lydia Martin apareceu no fim do corredor, deslumbrante em sua saia xadrez roxa e blusa de frio azul, parecendo uma bonequinha de porcelana com os cabelos caindo em ondas sobre os ombros. Viviene conteve o suspiro. Ela era tão bonita, pensou distraidamente. Bonita e inteligente... bem, Viviene ainda duvidava seriamente do inteligente, pois Lydia deveria ter no mínimo diversos neurônios a menos, afinal, estava namorado seu irmão.  

E para namorar Jackson tinha que ser burra.  

— Ainda bem que não apostei. — Liv suspirou.  

Lydia já havia se aproximado de Allison e apontava o dedo para a jaqueta da garota, claramente já iniciando um assunto para prendê-la consigo pelo resto do ano letivo.  

— Alguém pode me dizer como a nova garota está aqui só por cinco minutos e já está andando com a Lydia? — Maria, a filha do secretário do diretor e colega desde o fundamental, indagou quando se aproximou, abrindo seu armário ao lado de Scott.  

— Porque ela é gostosa. — Stiles respondeu na lata. — Pessoas bonitas andam juntas.  

Viviene engoliu a risada ao ver a olhadela mal-humorada que Lavínia o lançou.  

— Não tem um jeito mais delicado de dizer isso não, Stiles? — Liv falou. O garoto deu de ombros, batendo a porta do armário.  

— Bem, vou buscar meu livro de química. — anunciou, enfiando seus cadernos no armário de Lavínia ao ver Jackson se aproximar de Lydia. — E se estiver me sentindo solidária, talvez salve uma alma das garras da futilidade. — falou dramaticamente, fazendo Maria rir.  

Stiles fez uma careta.  

Cruzando o corredor, Viviene endireitou a postura e se aproximou do mais novo trio.  

— Jackson! — chamou, demandando atenção. Parou ao lado de Lydia e estendeu a mão. — Me dá a chave do seu carro. 

Ele a encarou com a sobrancelha arqueada.  

— Para?  

— Deixei meu livro de química no painel e é a minha terceira aula. — respondeu, e então gesticulou com os dedos. — Chave.  

 — Deixou a educação lá também? — retorquiu Lydia suavemente.  

Viviene a encarou por alguns segundos. Havia momentos em que Lydia a confundia, às vezes agia como uma pessoa legal, inteligente e sarcástica, mas no outro voltava para aquela casca fria e fútil. Era frustrante. Viviene sabia que aquilo irritava Lavínia em vários níveis, mas ver aquilo só a deixava triste. Ver alguém se anular e diminuir por outra pessoa era lamentável, ainda mais se essa pessoa fosse seu irmão — que não valia lá muito esforço.  

 Ela voltou-se para Jackson, ignorando Lydia e a constrangida novata. 

— Chave. — repetiu. 

Jackson enfiou a mão no bolso e puxou o molho de chaves. 

— Se você fizer qualquer coisa... — ameaçou de olhos estreitos.  

Viviene revirou os olhos.  

— E você acabou de frustrar meu plano maligno de furtar seu Porsche ridículo e fugir para o México! — falou dramaticamente. — Eu só quero a merda do livro. — ela puxou as chaves da mão dele, fazendo o seu melhor para esconder a dor lancinante que se alastrou por seu pulso e se afastou, mas então parou e se virou, encarando Allison por cima do ombro. — Quer um conselho? Não faça isso consigo mesma — falou, apontando com a cabeça para o casal maravilha. Allison se remexeu no lugar, exalando desconforto. Viviene sorriu. — Seja bem-vinda ao inferno, aproveite a estádia.  

E então se afastou.  


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Notas finais do capítulo

espero que tenham gostado e sigam o tumblr pra verem edits, fazerem perguntas e afins ♥ beijinhos ♥

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