Entre o Céu e o Inferno. escrita por Sami


Capítulo 37
Capítulo XXXVI


Notas iniciais do capítulo

Oie! Voltei mais cedo com mais um capítulo, já adindo um feliz ano novo pra todos que estão lendo, um ótimo 2021 pra vocês e que venha um ano muito melhor pra gente ♥
Capítulo de hoje trás o tão aguardado julgamento com presenças confirmadas de Lucifer, Lena e Eva haha. Eu precisei dividir o capítulo porque ele estava passando dos 9k de palavras e eu não ia matar vocês de tanto ler. Boa Leitura!



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CAPÍTULO XXXVI

 

Alana imaginou que seria uma viagem semelhante à que fizera ao inferno, com apenas um piscar de olhos estaria em outro ambiente, porém não foi nada disso. Ela se assustou quando Kambriel tomou uma distância segura dela e suas asas se esticaram, ambas bateram de maneira suave e lenta; uma bela cena ela observou. Apesar do som estrondoso que fizeram. Ela ficou encantada com a visão, as palavras escaparam de sua boca e durante três minutos exatos, a moça encarou a cena boquiaberta, estremecendo quando a mesma luz dos dois outros arcanjos também passou a percorrer pelo corpo inteiro de Kambriel. Ele passou a brilhar bem mais naquele momento.

Ele então se aproximou dela e Alana percebeu que assim como acontecia com Gabriel e Miguel, ele também parecia ainda maior que antes. O arcanjo estendeu as duas mãos em sua direção, as palmas viradas para cima como um convite.

— O que vai acontecer agora? — West perguntou, olhando para o rapaz na sua frente e depois para os outros dois arcanjos que levantavam Lucius do chão. Os dois conversavam entre si na linguagem dos anjos e por isso não entendera nada do que eles falavam.

E nem queria saber.

— Vamos nos encontrar com os Juízes agora. — O tom apressado em sua voz a deixou ciente de que não tinham tempo para perder com outras perguntas ou com coisas fúteis.

Desde que ele citou os Juízes Alana sentiu uma pontada gigantesca de curiosidade lhe dominar e doer sua mente, ele não explicou a ela quem eram ou o que faziam — apesar de seu nome já dizer muito a respeito —, mas imaginou que, se ele nada disse sobre aquele assunto então não era algo necessário para saber. Ou ele apenas estava protegendo-a de mais um novo estresse por ganhar mais conhecimento sobre seu mundo.

— Tudo ficará bem. — Ele garantiu com meio sorriso.

Alana moveu o rosto em um aceno curto e positivo, aproximou-se dele e segurou suas mãos. Sentindo o exato segundo em que ele fechou suas mãos sobre a dela, ele inclinou-se até ela, mas quem realmente se moveu foram suas asas que, se fecharam ao seu redor formando um tipo de casulo à sua volta. West sentia como se estivesse sendo protegida de alguma coisa, sentiu calor também, mas a sensação predominante era de um conforto tão absurdo que parecia até desconexo com o momento atual.

— E eles? — Ela questionou mais baixo, se referindo aos dois arcanjos e a Lucius mais adiante. Os quais ela não mais enxergava por estar com as asas de Kambriel sobre ela.

— Se encarregarão de levar Lucius para o Julgamento. — Sua resposta bastou para ela, pois bem sabia que não poderia exigir mais explicações quando estavam diante dos arcanjos líderes.

Novamente ela assentiu e então as mãos dele se moveram, soltaram-na e logo ele a abraçou muito forte. Trazendo ainda mais perto de seu corpo ao ponto de ela estar pisando em seus pés; ele não se mostrou incomodado com isso. Levou dois segundos para que seu corpo se tornasse leve e o par de asas que antes a envolvia não estivessem mais ao seu redor; estavam outra vez completamente abertas. Brilhando mais fortemente e se movendo lentamente.

Ela não estava mais se sentindo com os pés no chão e literalmente não estava mais. Primeiro julgou estar flutuando, mas era muito mais simples do que isso; estava levantando voo. Quer dizer, Kambriel estava. Não demorou para que o voo realmente se tornasse algo mais firme, ela ouviu o bater de suas asas se tornar mais forte e potentes, aumentando a velocidade. Alana conseguia sentir o vento gelado da madrugada bater contra seu corpo, seu cabelo ricocheteava por causa do vento, mas o que realmente lhe incomodava era o frio que começou a sentir. Seus braços se arrepiaram e percebendo isso, Kambriel fechou os próprios braços ao redor dela; a protegendo do frio e ao mesmo tempo mantendo-a aquecida. Por não estar vendo aonde estavam indo, Alana apenas sentia a mudança de ambiente e altitude; um silêncio absoluto fez-se presente e apenas o som do bater de suas asas era audível.

Em certo momento, houve um tipo de grunhido alto e assustador, o que cortou aquele silêncio. Em erguida o barulho de rochas cedendo também soou por lá, o que a assustou, pois era um som bem semelhante ao que escutava em seus pesadelos.

— Alana — A voz de Lucius começou a sussurrar seu nome, no princípio ela imaginou que até Kambriel o escutava, mas não houve reação dele. A voz novamente a chamou, agora parecendo estar dentro de sua mente. — Alana.

Automaticamente ela agarrou-se mais fortemente na camisa de Kambriel, escondeu o rosto contra o peito dele quando ouviu seu nome pela terceira vez. Um tormento particular, proporcionado pelo demônio que alegava ser seu pai — ela negaria essa verdade até sua morte, independente se carregasse o DNA dele em si. West se moveu inquieta, Kambriel pareceu notar algo de errado e nada disse, apenas fechou seus braços ao seu redor, bloqueando qualquer coisa que estivesse a sua volta; até mesmo a voz de Lucius ela parara de ouvir.

Tudo retornou ao silêncio de antes, até que seu corpo voltou ao seu estado normal, entre o peso comum de um humano e a tensão que a dominava com o que estava para acontecer. Kambriel pousou com ela com lentidão, suas asas bateram algumas vezes até se arrumarem para trás, repousadas com a mesma graça com a qual aparecera antes. Seus pés tocaram o chão e ela estranhou o lugar em que pisava, sentia como se fosse cair a qualquer momento, pois não sentia nenhuma firmeza no chão.

Ao olhar ao redor, constatou que não existia nada além do branco. Algo que feria seus olhos, mas que lentamente foi tornando-se algo com o qual já estava acostumada. O lugar era como um sonho, algo completamente indescritível para qualquer humano e impossível. Era como um campo aberto, fresco devido a uma brisa constante que soprava a sua volta. Ao redor, ela via morros altos, rochas perfeitas que apesar de altas demais, não lhe intimidavam e nem mesmo lhe causava o sufoco que sentia quando esteve no inferno.

O lugar era lindo, iluminado com a luz natural do sol que parecia brilhar com mais intensidade ali, o chão, ainda que não lhe transmitisse nenhuma confiança, era florido. O cenário perfeito para qualquer sonho agradável que pudesse ter. Alana se sentiu no céu e se perguntou se estava, até porque não achava que um lugar como aquele fosse real e aberto para a humanidade.

— Aonde estamos? — Ela perguntou boquiaberta, olhando com muita atenção tudo o que seus olhos conseguiam captar. Sentindo-se como uma criança, abismada e ao mesmo tempo encantada com tudo o que estava vendo ali. — Estamos na terra?

Virou-se para ele, ao mesmo tempo em que se mostrava confusa, ela também deixava claro em seu rosto a admiração pelo lugar em que estava; apesar de ser tudo muito inédito para ela.

— Estamos no que chamamos de meio termo, aqui não é o Céu e nem a Terra, mas sim o divisor existente entre os dois lugares. — Ele explicou, também olhando ao redor, porém com um olhar bem diferente do da moça. Enquanto Alana parecia encantada, Kambriel já se mostrava bem mais familiarizado com o ambiente. — Um lugar muito bonito, de fato, mas que...

O rapaz não terminou a frase, a hesitação em continuar não passou despercebido por Alana que, em vez de mostrar-se curiosa sobre o que ele falaria apenas esboçou um sorriso compreensível e aproximou-se dele outra vez. Esperando por mais uma instrução.

Como já era esperado, Kambriel apontou o dedo para um caminho discreto por entre o campo aberto aonde estavam e seguiram em direção ao lugar que não fora mencionado. Ali, o silêncio também era algo absoluto e quase incômodo, nem mesmo se ouvia seus passos ou o som natural daquele lugar; era apenas silêncio. Alana imaginava que sua respiração ansiosa e as batidas rápidas de seu coração eram o único som audível ali e, em um gesto sútil e nervoso de sua parte, levou a mão livre até o peito, achando que ao fazer aquilo ocultaria o som dos ouvidos atentos do arcanjo ao seu lado.

— Lucius já estará lá quando chegarmos, — Ele anunciou de repente, sua voz ressoou tão potente e alta que a fez levar um susto. A moça o olhou. — Será tudo muito simples e rápido, você não precisará falar nada por enquanto, mas fique atenta. Lucius sabe que estará em julgamento então jogará sujo com você. Não caia em suas provocações e não deixe nenhuma brecha se abrir.

As brechas. Ela pensou com um tremor leve no corpo. Alana se recordava perfeitamente da conversa com Baltazar e de como ela fora um perfeito fiasco, ele a provocou e ela... Fizera o que Eva dissera para não fazer. Mas isso não aconteceria ali, isso era uma certeza.

— Eles vão querer saber sobre meu envolvimento, não vão? E o que eu digo? — Questionou ansiosa, percebendo que à medida que caminhavam, estavam mais próximos de um lugar mais fechado.

— Diga a verdade. — Ele respondeu, olhando-a mais firmemente, segurando sua mão no processo. — Conte tudo, desde a morte de seu pai, aos pesadelos constantes, os dois ataques... Conte a eles tudo o que houve e claro, deixe-os cientes de que você serviu de grande ajuda em minha missão.

— Mesmo que isso?...

— Sim. — Concordou rápido. — Mas não há motivo para se preocupar com nada disso, Eva estará lá então terei nossa testemunha.

Alana assentiu e então mordeu o lábio com força, parando de caminhar quando Kambriel também o fez, ambos estavam diante de uma entrada larga, era um portão alto e dourado, uma visão estranha. A moça hesitou em continuar, o coração naquele momento disparou ainda mais e suas batidas se tornaram mais fortes também, seu peito doía, era ansiedade? Medo?

— O que houve?

— Eu sei que concordei com tudo isso, mas — Alana respirou fundo, sua mão em um ato automático apertou com mais força a do arcanjo, seu nervosismo estava a dominando e ele notou isso. O seu medo. E não a julgava ou a reprimia, era uma situação completamente inédita para ela, estranharia se ela não estivesse temerosa com tudo aquilo.

Kambriel não a deixou terminar a fala, apenas a puxou para si e a envolveu em seus braços, uma de suas mãos segurando-a pela nuca enquanto a outra apertava sua cintura; trazendo para ela uma sensação agradável e mais acolhedora. West parecia tremer diante da possibilidade do que acontecia assim que avançasse e era esse seu medo, o desconhecido que estava a sua espera. Ela também o abraçou, um ato inconsequente de sua parte, esquecendo-se de que aquela demonstração de carinho não seria vista com bons olhos pelos outros.

— Você ficará bem, não vou deixar que nada de ruim aconteça com você. — Ele garantiu, uma maneira que encontrou de acalmá-la. — Eu prometo.

Alana balançou a cabeça, ainda ansiosa, porém já um pouco mais calma. Kambriel estava fazendo muitas promessas ultimamente e ela sabia que existia uma grande possibilidade de ele acabar entrando em perigo por causa disso. Novamente respirou fundo, prendendo o ar por mais tempo e o soltando aos poucos, ele beijou o topo de sua testa. Demorando um pouco em sua ação e então, afastou-se dela, segurou sua mão outra vez e esperou que ela tomasse a iniciativa de prosseguir com a caminhada.

Ambos se olharam durante um longo tempo, até que ela reuniu toda a coragem que existia em si para prosseguir; afinal, não iria parar agora. Chegaram longe demais para que ela se acovardasse porque temia o que lhe aconteceria, Kambriel sempre deixou claro que nada de ruim iria lhe acontecer e ele sempre cumpriu com sua promessa, a trouxe do inferno com ajuda de Eva, impediu que ela fosse arrastada, a manteve segura... Ela confiava nele, talvez bem mais do que deixava transparecer.

Prosseguiu, com ele ao seu lado.

A caminhada não foi demorada, eles passaram pelo imenso portão dourado e logo, estavam parados diante de oito tronos pequenos, todos elevados a uma altura grandiosa, deixando claro para todos os presentes a diferenças de suas hierarquias e autoridades. Em cada um dos oito tronos, tinha um ser assentado, Alana não soube ao certo o que eles seriam, pois mesmo que tivessem a aparência perfeita como os três arcanjos presentes, a diferença em suas fisionomias era algo impossível de ser ignorado. Ela olhou para cada um com atenção, estavam todos envoltos pelo mesmo brilho presente nos arcanjos, porém, a luz dos oitos seres era um pouco menor; ainda que forte, não se comparava a luminosidade dos arcanjos. Seus rostos não eram rosto humanos, apesar de possuir características fortes de um, era evidente sua diferença. Eles não possuíam asas, mas ainda sim continham um tipo estranho de poder e intimidação que parecia ser uma característica própria de cada um ali, suas vestes eram longas e cobriam boa parte de seus corpos, permitindo que apenas suas mãos e rosto estivessem a mostra.

— São os Juízes? — Ela perguntou quase em um sussurro, olhando para todos os oito seres com temor, evitando demorar demais o olhar neles quando viu que todos estavam com os olhos também fixos sobre si; muito provável que fosse por ela ser humana. Em resposta, Kambriel apenas apertou mais a sua mão, disfarçando seu próprio tremor.

Gabriel e Miguel já estavam presentes, parados mais adiante, o maior gesticulou para que os dois se aproximassem deles e, conforme caminhavam em direção a eles Alana notou um peso diferente sobre si. Um olhar que sabia muito bem identificar e que, ao tomar consciência a quem pertencia, evitou ao máximo encará-lo de volta. Não foi preciso virar o rosto ou procurar por ele, o que sentia por receber o olhar atento e enfurecido de Lucius era uma sensação que ela já conseguia separar das demais.

Ao ficar próxima dos outros dois arcanjos, ela se virou e então o viu finalmente. Lucius estava do outro lado, de pé e a olhava com uma fúria palpável. Ao seu lado existia um lugar vago.

Alana também viu Eva ali, a mulher estava mais afastada do demônio e completamente sozinha. Contudo ela nem se mostrava incomodada com isso, pelo contrário, parecia até mais confortável do que Lucius.

O silêncio ali formado era ensurdecedor, a tensão no ar mostrou-se algo que todos ali compartilhavam, fosse através de seus olhares ou no modo de agir diante dos oito Juízes, apesar de ser quem seria julgado, Lucius apenas mostrava uma grande fúria que fazia questão de direcionar apenas para Alana, ela reconheceu o brilho incomum em seus olhos vermelhos e apesar de temerosa com o demônio — imaginava que ele fosse avançar contra ela e tentaria matá-la de alguma maneira — ela não sentiu o medo que ele parecia querer lhe transmitir, contrariando as expectativas do homem demônio, Alana se manteve firme e até conseguiu fingir indiferença, sabendo que ignorá-lo seria a melhor das opções no momento.

— Espero que não tenham começado sem mim! — Ao ouvir a voz ressoar, todos os olhares se direcionaram para o homem a caminhar em direção ao demônio que alegava ser seu pai. Ele era diferente dos outros, mais alto, mais forte e até mesmo um pouco mais envelhecido, mas seu envelhecimento não era como o presente em humanos, seu rosto e mãos — que eram tudo o que estavam expostos — possuíam um tipo de desgaste, o que lhe dava uma aparência mais envelhecida.

Não houve nenhuma resposta, o que tirou dele um sorriso largo. O novo demônio prosseguiu, caminhando muito calmamente para perto de Lucius. Alana percebeu que dele saia um tipo de líquido escuro e denso, era como se fosse sangue, porém o cheiro a fez lembrar de algo podre misturado ao enxofre que vinha naturalmente dele. Sua roupa era diferente, uma camisa social aberta pela metade que deixava exposto parte de seu peito, a calça escura e também social parecia estar queimada na barra e ela notou que ele estava descalço. Tudo no demônio era estranho, desde a sua aparência a uma mistura curiosa de perfeição e a falta da mesma, até o que ele deixava no chão por onde pisava que parecia apodrecer.

— Lúcifer. — Kambriel sussurrou ao seu lado, assustando-a, Alana o olhou com os dois olhos arregalados em surpresa e então os voltou para o demônio a caminhar. Ela percebera a enorme diferença entre ele e o outro demônio presente, mas quando Lúcifer se aproximou dele, essa diferença era ainda mais óbvia.

Nele, existia um tipo incomum de grandeza, ainda não fosse semelhante com o que vinha dos arcanjos era algo que o tornava maior entre o demônio. Até mesmo o cheiro de enxofre que emanava dele parecia ser diferente. Era mais forte, ao ponto de arder seu nariz e lhe causar uma forte náusea. Alana percebeu que sua presença não causava nos arcanjos o mesmo desconforto, Lucius permaneceu imóvel e completamente ereto, como se não fosse um ser vivente; os oito Juízes também não pareciam sentir a presença estranha do demônio, apenas Alana.

Lúcifer tomou o único lugar vago ao lado de Lucius e, estando os dois lados a lado, era como olhar para duas imagens muito perturbadoras; Alana já vira a real aparecia de Lucius e sabia bem como a imagem poderia lhe assombrar por toda uma vida. Mas a aparência de Lúcifer... O que estava vendo ali era apenas uma ilusão, a aparência humana que usava para que se misturasse em meio aos humanos. Mesmo que não fizesse ideia de como ele realmente era, o que sentia ao olhá-lo era... Algo ainda pior do que o sentimento que lhe dominava quando encarava Lucius.

Ela não demorou em desviar sua atenção deles. Voltou os olhos para os oito seres, os Juízes pareciam se preparar para o que se iniciaria em breve e, um deles — o último Juiz — colocou-se de pé. Sua autoridade e poder era algo que Alana pôde sentir com tanta facilidade que, suas pernas pareceram moles diante a ação tão simples.

— Uma audiência conosco sempre que requisitada precede a quebra das regras que regem os dois mundos, — O Juiz que se levantou começou a falar, sua voz era forte, quebrava o silêncio ambiente do lugar com a força de um trovão. — E, diante dos presentes hoje — Seus olhos correram por cada rosto, ele deu uma atenção maior em Alana, possivelmente incomodado por ela ser humana. — Não é diferente. Nos foi alertado que o enviado do Céu, Kambriel trouxe acusações seríssimas contra o enviado do Inferno Lucius Halphas.

Alana franziu o cenho ao ouvir os dois nomes serem ditos de forma diferente, seus olhos encararam o Juiz com curiosidade enquanto ele gesticulava em direção ao arcanjo ao seu lado e na direção de Lucius.

— Nós, Juízes, usaremos o princípio da justiça e das leis que regem os dois mundos. Deixamos claro para ambos os lados que, não proveremos de misericórdia para nenhuma das regras que foram quebradas! — A fala do ser preocupou a moça, Kambriel tinha lhe dito que eles seriam misericordiosos, mas após ouvi-lo isso pareceu alertá-la sobre o destino que receberia em breve. Provavelmente o mesmo de Lucius.

— Espero que sejam acusações sérias — Lucifer murmurou com tédio. — Odiaria pensar que me trouxeram aqui apenas para perder meu tempo precioso.

O Juiz sentou e então outro colocou-se de pé. Este segurava um tipo de livro, o mesmo era maior do que seus próprios braços e parecia fazê-lo sumir. Devagar ele o abriu e um brilho forte surgiu dele, aquela luz incomodou os dois demônios — exceto por Eva — e todos forem forçados a desviar os olhos daquele forte brilho. O Juiz que se encontrava de pé ergueu o rosto na direção de Kambriel.

— Venha, diga qual sua acusação.

Alana só percebeu que ele estava se afastando quando suas mãos se soltaram da outra, a ausência de seu toque trouxe para seu corpo um tipo inédito de resposta; algo que ela jamais julgou ser possível sentir.

Kambriel afastou-se dela muito lentamente, ele caminhava em direção aos oito tronos e assim que alcançou a distância de meio metro dos tronos, suas asas saltaram de suas costas e se esticaram mais uma vez. Naquele instante elas pareciam brilhar ainda mais, era uma cena quase hipnótica e West quase se viu perdida ali. Apenas retornou para a realidade quando viu o rosto de Kambriel se modificar.

— Arcanjo Kambriel — Saudou o Juiz com um aceno leve com a cabeça, o rapaz imitou a ação. — Aquele que guerreia em Seu nome! — Disse muito lentamente, aquele provavelmente sendo o significado do nome dele. Alana piscou abismada. — Diga-nos, qual a acusação?

— Venho diante de vós, Juízes, trazer a conhecimento os crimes de Lucius Halphas, enviado do Inferno. — A voz de Kambriel estava diferente assim como sua face, enquanto o rosto sempre perfeito reluzia um poder quase sufocante, seu tom de voz era intenso e potente. Fazendo com que todos os pelos de seu corpo se arrepiassem diante do que ela julgava ser parte de glória. — Lucius envolveu-se romanticamente com uma mortal, como se isso não lhe fosse o suficiente, arrastou a mortal para o Inferno e condenou a mulher com quem se envolveu. Além de, levar caos e mortes para toda uma cidade.

Alana estava prestando atenção quando o rosto de Lucius se contorceu em uma careta terrível. Os lábios secaram como se ele desidratasse em segundos e, os olhos vermelhos se voltaram para o arcanjo com tanta fúria que ela imaginou que o demônio saltaria para atacá-lo a qualquer segundo. Mas isso não aconteceu. O que realmente aconteceu foi Lucifer encarar o demônio com espanto.

Todos os olhos se voltaram para o demônio acusado e nesse momento Alana compreendeu que, a quebra da regra sobre seres do Céu ou Inferno se envolverem com humanos era algo realmente muito mais grave do que ela pensou Pois ela conseguia sentir, o peso acusatório em todos os olhares que se dirigiram a ele. Excerto por Eva que, parecia se controlar para não rir.

— Lucius não apenas atacou uma cidade inteira como levou levas de demônios para a mesma, muitas pessoas foram mortas e incontáveis vidas perdidas. — Prosseguiu Kambriel, mantendo a firmeza de suas palavras. Os olhos em momento algum se desviavam dos oito Juízes. — Mas acredito que seu crime mais hediondo foi gerar uma prole na humana, a qual ele condenou ao inferno sem sequer ter tal direito.

Alana estremeceu. Ouvir o arcanjo falar sobre si daquela maneira causou-lhe um desconforto, mas sabia que ele estava apenas agindo como deveria diante dos outros arcanjos e diante dos Juízes. Durante um longo momento houve silêncio, até que aconteceu uma pequena agitação entre os quatro demônios presentes.

— Isso foi muito baixo para um arcanjo, Kambriel — Acusou Lucius, ele parecia um animal que estava se descontrolando aos poucos. Os olhos vermelhos brilhavam muito raivosos, o corpo estremecia ao ponto de veias começarem a saltar em pontos específicos de seu rosto e corpo. Dando a ele uma aparência ainda pior do que a de Lúcifer ao seu lado.

— Lucius! — Foi Lúcifer quem o chamou, como se tentasse controlá-lo de alguma maneira, mas o demônio apenas o ignorou. Como mostrava fazer desde que Kambriel começara a falar.

— É tão covarde que preferiu me levar a julgamento a me enfrentar! O que teme tanto, guerreiro? Perder? Morrer? — Cuspiu com nojo, grunhindo cada vez mais alto e completamente descontrolado

Ignave!

Lucius Halphas!

Lúcifer e Lucius gritaram ao mesmo tempo, suas vozes cortaram o lugar com um tremor leve, chamando a atenção de Gabriel e Miguel que, deram passos certeiros para frente; como se estivessem se preparando para um possível conflito ali. Lucius já se mostrava completamente descontrolado, mas ele não reagia como os demais já pareciam esperar. O demônio fez menção de avançar, mas parou no mesmo instante, instintivamente Alana recusou quando achou que ele avançaria.

— Basta! — Os oito Juízes bradaram mais alto, interrompendo aquele descontrole com a ordem. Foi imediato, todos pararam o que estavam fazendo e voltaram seus olhos para os oito tronos. Novamente o silêncio reinou naquele lugar, alto absoluto e estranho, deixada o ar mais pesado.

— Ouviremos o acusado, apesar de termos regras rígidas sobre o que acabamos de presenciar e ouvir — O mesmo Juiz que se encontrava ainda de pé retornou sua fala, calma demais. — Estamos dispostos a ceder um momento para ouvi-lo Lucius, isso se concordares com nossa decisão. 

O demônio assentiu lentamente, seu descontrole ainda era algo visível em seu rosto e olhos, mas de alguma maneira surpreendente ele conseguia esconder isso ao olhar na direção dos Juízes. Lucius afastou-se também, ao mesmo passo que Kambriel tomava uma distância maior dele, mantendo-se no campo de proximidade de Alana; pronto para jogar-se na frente dela se isso se mostrasse algo necessário.

Lucius também mostrou suas asas e prosseguiu em direção aos tronos, parou também a meio metro de distância.

Lucius Halphas — Saudou o Juiz, no mesmo tom neutro. — Príncipe de Lúcifer, dono das legiões. — Reconheceu, Lucius se mostrava orgulhoso quando seu nome fora dito pelo Juiz. Um sorriso cruel brotou em seus lábios, era como se ele estivesse prestes a atacar alguém ali.

— O arcanjo está correto em suas acusações, não as negarei porque não me sinto envergonhado do que fiz e sim tenho orgulho disso — Lucius ergueu o queixo de maneira prepotente, deixando transparecer que ele realmente tinha orgulho das próprias palavras. — Orgulho porque ele, — Em um gesto dramático apontara para Kambriel. — Fez questão de trazer minha prole para este julgamento.

Uma exclamação surpresa escapou dos lábios de todos os presentes quando o demônio gesticulou na direção de Alana — exceto Eva e Kambriel, era como se eles já estivessem esperando que o demônio falasse tais palavras. A mulher estava levemente inclinada para frente e mostrava-se muito atenta a todo movimento feito, apenas esperando o momento certo. Já o arcanjo, agia de maneira semelhante aos outros dois arcanjos presentes, a postura ereta e firme, os olhos fixos no demônio e suas asas abertas eram um sinal claro de que todos os três se preparavam para algo.

— E com minha prole presente diante de todos, de meu pai e dos Juízes, quero reivindicar meu direito ao comando do Inferno. — Lucius soltou cada palavra com estranha lentidão, olhando atentamente em direção aos oito Juízes enquanto esticava os lábios em um sorriso torto e orgulhoso.

Aconteceu tudo ao mesmo tempo, Alana sentiu o corpo inteiro tremer, Kambriel colocou-se para frente e Lúcifer também, ambos gritando:

— Não pode fazer isso!

A mistura de suas vozes fez com que um vento forte soprasse pelo lugar, enquanto Gabriel e Miguel colocaram-se ao lado de Kambriel, Lucifer também avançou e ficou alguns passos mais à frente do outro. Eva foi a única que não se moveu e Alana começou a se perguntar o motivo.

Lucius não podes e nem tem direito a tal pedido quando és tu a ser julgado — Um dos Juízes começou a argumentar, nesse momento existiam três deles de pé e apesar da clara tensão existente ali, sua voz era serena demais.

Lucius arqueou uma sobrancelha em desafio.

— Quero meu direito ao domínio do Inferno, caso contrário, trarei toda uma legião ao meu favor. Tragam arcanjos, tragam todos que quiserem, mas levarei o inferno para terra e farei dela meu reino! — A ameaça feita fez estremecer a todos, os três arcanjos tiveram suas asas agitadas e o demônio voltou seus olhos para Lúcifer. — Se meu pai negar meu pedido, levantarei guerra!

Mais uma nova exclamação de espanto.

— O Céu jamais permitirá que faça isso, demônio! — Gabriel rapidamente falou, pondo-se mais a frente, sua postura tornando-se algo mais defensivo. Os músculos de seu corpo se tensionaram e, até mesmo suas asas pareciam tensas também.

— Está sendo julgado! Perdeu tal direito quando decidiu confraternizar com uma humana e espalhar sua semente! — Dessa vez era Lúcifer a falar, sua voz ressoando pelo lugar com a mesma intensidade de sua presença. Havia nojo em seu tom de voz ao mencionar subliminarmente a prole do outro demônio.

— Ah, eu posso fazer isso e o farei. — Garantiu, o desafio em seu tom de voz irritou o demônio com facilidade. — E pode acreditar, farei isso com a minha filha ao meu lado!

Lucius apontou o indicador na direção de Alana sem ao menos olhá-la e ele nem mesmo precisou fazer isso, a maneira como a ação aconteceu a fez sentir-se enfraquecida, de alguma maneira — ela nem mesmo sabia se isso poderia ser real ou não — a fala dele tivera um tipo de reação em seu corpo. Mesmo que ela negasse ajudá-lo ou ter qualquer proximidade com ele, a maneira como falou dela, com a convicção de ela ser sua filha, foi o suficiente para tirar qualquer força existente nela.

— Você não tem direito algum sobre mim! — Alana nem mesmo percebera o momento em que ela esbravejou as palavras, apenas sentiu elas saindo de seus lábios com a mesma fúria com a qual aquele julgamento acontecia. Seu corpo se inclinou para frente e, se não estivesse sentindo-se fraca, se não fosse apenas humana, ela teria avançado no demônio. — Eu me nego a aceitar que alguém como você seja meu pai! Eu não vou me juntar a você. JAMAIS!

Suas palavras tiraram olhares assustados de todos os presentes, Kambriel, girou em sua direção com lentidão enquanto Lucius, a olhou quase torcendo a própria cabeça em 360° graus, uma visão horrenda e digna de um filme de terror; na opinião de Alana. Os lábios tremeram e, lentamente ele sorriu, apesar de seu rosto demonstrar um tipo incomum de irritação. Era como se ele tivesse sido possuído ali mesmo.

— Possuí você uma vez, acha que não posso fazer isso de novo? — Perguntou, arqueando uma sobrancelha. O desafio lançado não era para amedrontar Alana, quer dizer, ela era seu alvo principal, mas Lucius sabia que fazer aquela provocação iria atingir a Kambriel em especial.

Ele soltou uma risada curta. E o que veio em seguida aconteceu rápido. Lucius avançou em direção de Alana sem nem hesitar ou temer o que lhe poderia acontecer, Alana ao perceber isso recuou, mas devagar demais; sabia que ele a alcançaria. Gabriel e Miguel se adiantaram em impedir o demônio, Kambriel praticamente se lançou para Alana a puxando para trás de suas asas, Eva também fez menção de agir, mas foi impedida por Lucifer.

Os dois arcanjos líderes seguraram Lucius sem muito esforço, o mesmo se debatia em uma tentativa falha de se livrar, rangia os dentes e rosnava; se mostrava um animal descontrolado. Alana estava assustada, não esperava que algo daquele tipo viesse a acontecer e, até os Juízes pareciam surpresos, assustados até.

— CHEGA LUCIUS! — Lucifer bateu as duas mãos uma na outra, o som que se levantou ali fora semelhante à de um trovão a rasgar o silêncio. Seu corpo parecia queimar, mas não se consumia com o fogo. Os olhos vermelhos estavam mais brilhosos e de suas costas, um par de asas saltara também; as suas pareciam ter sido queimadas e traziam um odor forte de podridão.

Demorou, mas Gabriel e Miguel soltaram o demônio que, agora se mostrava mais controlado, internamente estava visível sua luta em tentar novamente atacar Alana ou obedecer ao pai. Mas a forma como a voz de Lucifer ressoou, aquilo bastou para que ele — ao menos naquele momento — finalmente agisse com um pouco de prudência. Lucifer e Lucius se encararam pelo que pareceu uma longa eternidade, o desafio visível na expressão do demônio a jurar ser pai de Alana em contraste com a fúria do maior parecia ser o início de uma briga entre gigantes.

— Imprudente! — Gritou com força, em seu pescoço várias veias começaram a saltar enquanto se aproximava do demônio. — Traidor!

Lucifer passou a ofender o outro na língua que Alana não compreendia, suas palavras eram no mínimo terríveis e traziam para aquele lugar um peso estranho. West pensou em avançar, mas Kambriel se adiantou e a impediu com o braço esticado na sua frente, forçando uma parada.

— Basta! — Os oito Juízes interferiram quando perceberam que as palavras de Lúcifer para ofender o outro eram intermináveis. O silêncio levantou-se sobre o lugar mais uma vez e logo, todos estavam olhando para eles.

Alana olhou na direção dos dois demônios, Lucius estava agora com o corpo curvado para frente em um sinal de pura submissão — algo que ela nunca viu acontecer antes —, porém a expressão de seu rosto era algo preocupante. Estava claro que ele iria atacar alguém a qualquer momento ali, apenas parecia esperar pelo momento certo para isso. Já Lucifer, parecia ainda maior perto dele, com suas asas e sua postura ereta, estava evidente a diferença de hierarquias ali e também de poder.

Todos os olhares voltaram-se para os tronos, exceto de Lucius.

— As leis que regem Céu e Inferno são antigas, feitas apenas para proteger os seus. Infligir estas regras tornam-nos rebeldes e destituídos de qualquer direito, seja o infrator alguém enviado do Céu ou Inferno — Um dos Juízes começou a falar enquanto os outros sete encaravam Lucius com firmeza e fúria. — Lucius estava presente quando essas regras foram feitas, escritas em rocha para que nunca fossem desfeitas ou até alteradas. E o que acabamos de presenciar aqui...

Houve uma pausa.

— Conhecendo tais regras, o destino de Lucius é escrito hoje em rocha também, firmado e imutável para que não haja qualquer possibilidade de reverter o que decretaremos. — A mão do Juiz ergueu-se em direção ao demônio. — O acusado perderá tudo, suas asas, sua essência... Seus direitos como demônio. Viverá como um humano condenado, preso pela eternidade no inferno!

Um outro Juiz afastou-se dos demais, se aproximava de Lucius segurando uma corrente de ouro. Lucifer recuou alguns passos, assistindo a cena com uma expressão neutra em sua face. Já o outro demônio, ao perceber o que iria acontecer caiu ao chão, levou as mãos para o rosto e cravou as unhas em sua carne, rasgando a pele humana que o cobria. A cena foi perturbadora, a pele de seu rosto começou a ser arrancada com desespero até que sua face — sua real face — fosse mostrada. Imediatamente ele virou-se em direção a Alana, encarando-a tão fixamente que ela sentiu como se ele estivesse a possuindo novamente e, notando esse medo crescer em si, Kambriel fez questão de segurar sua mão com força, fazendo-a lembrar de que isso não aconteceria novamente.

A besta que existia por debaixo daquela máscara humana rosnou para a humana e ele até fizera menção de avançar uma segunda vez, por sorte, o Juiz já o tinha acorrentado e por isso nada aconteceu. Nem mesmo a tentativa foi concretizada.

Lucius gritou, arqueando o corpo para trás e jogando a cabeça para trás também, as mãos que antes estavam agarradas a sua face agora arranhavam o próprio corpo em uma agonia interminável. Ele começou a se debater, puxando o cabelo escuro em tufos grandes e soltando o que arrancava no chão ao seu lado, tentava rasgar as próprias roupas, mas ele já não parecia mais ter força para isso. E então, o pior aconteceu. Suas asas se abriam e tremeram, Lucius estava com o corpo ereto nesse momento e gritou ainda mais alto assim que elas começaram a queimar. A chama era forte, queimava toda a estrutura de suas asas em uma velocidade descomunal, as penas cinzas caiam pelo chão; transformadas em poeira. Mais afastada, Eva assistia a cena com pesar, pois ela conhecia aquela sensação.

A cena em si durou tempo demais na opinião de Alana e então, soltando o que pareceu ser seu último gemido de dor, o demônio caiu no chão, completamente ofegante e fraco. Retornando a sua face humana anterior. Os olhos não eram mais velhos e não existia nele aquela mesma áurea escura de antes; ele era um humano agora.

— Você será levado ao inferno, viverá toda eternidade acorrentado como as almas condenadas, sofrerá como elas diariamente; que Lucifer traga a conhecimento de todos no submundo que todos os direitos que Lucius possuía foram perdidos. Ele não falará com ninguém, não poderá sair do inferno e nem mesmo de sua prisão. Caso isso venha acontecer, o Céu irá interferir. — Alertou o Juiz, o mesmo que tinha acorrentado Lucius. — E, diante de todos, declaramos que Príncipe Lucius Halphas está condenado por toda a eternidade.

Alana escutou um tipo de estrondo alto cortar qualquer tipo de som ali presente, o céu escureceu brevemente e, relâmpagos iluminaram o lugar com força.

— Lucifer e seu condenado poderão voltar para seu lar, lembre-se, Lucifer, Lucius jamais sairá de sua prisão. — Finalizou. Não houve intervenção ou reclamações, nem mesmo vindo de Lucius, ele parecia fraco demais para reagir ou tentar alguma coisa. Respirava com dificuldade e tremia como se tivesse sido lançado no gelo.

Lucifer assentiu, lançou um olhar de repulsa em direção a Lucius e em seguida olhou para os outros presentes, parecendo envergonhado com o que acabara de acontecer.

— O que acontece com a humana que foi condenada por Lucius? — Questionou Kambriel, nesse instante Alana encarou os oito juízes com expectativa.

Eles não responderam de imediato, o que a preocupou, o rapaz lhe dissera que nunca houve uma tentativa de tirar uma pessoa condenada do inferno antes e por isso ela tentou não depositar todas as suas esperanças naquele pedido escondido.

— A humana e mãe da prole de Lucius?

Kambriel assentiu e eles demoraram para responder, conversavam entre si apesar de nenhum deles se moverem de seus lugares.

— Lucifer?

O demônio olhou para a humana, depois para Kambriel e só entrou olhou para os Juízes.

— Ela tem parte na quebra da regra — Disse lentamente. — O que os Juízes acatarem estarei de acordo.

Alana sentiu todo o corpo enrijecer imediatamente. Houve um momento em que ela ousou olhar para os Juizes e se arrependeu do que fez, um deles a olhou antes de retornar a falar com os outros e West sentiu que naquele momento o destino de sua mãe não seria nada agradável.

— Traga-a para o Julgamento, Lucifer. — pediu um deles, o demônio assentiu e se afastou, Alana estava com o coração acelerado. Olhou na direção de Eva, depois para o arcanjo próximo a ela e ousou até mesmo olhar para os outros arcanjos, suas expressões eram tensas e indescritíveis.

Engoliu seco várias vezes, sentindo como se sua garganta estivesse secando com o passar dos segundos e então, Lucifer retornou, com Lena a caminhar ao seu lado. Os dois pararam próximos aos oito tronos, ela nem mesmo olhou na direção da filha.

— Lena West — saudou um dos Juízes com um aceno leve com sua cabeça. — Nos foi dito sobre sua situação, condenada ao Inferno por um demônio e mãe de uma criança herdeira, filha de Lucius.

Lena apenas assentiu.

— Lucius não mais é um demônio, seus crimes geraram a ele a perda de todos os seus direitos sobre o Inferno, agora ele é apenas humano. — contou, sua voz ressoando pelo lugar com firmeza. — Deve entender que, você também teve sua parte, ao gerar uma criança herdeira também cometera o crime junto a Lucius. — Alana sentia que estava prestes a vomitar, tamanha era sua ansiedade. — Porém, Lucius perdeu todo e qualquer direito que tinha, isso também se diz respeito à sua condenação. Estamos de acordo a libertá-la.

A West mais nova abriu a boca em espanto e soltou uma exclamação silenciosa, estremeceu diante a possibilidade de ter sua mãe de volta. Ela levou as duas mãos para o rosto, alegre, aliviada.

— Entretanto, há um porém em sua libertação da condenação dada a você — aquela pausa foi o suficiente para tirar de Alana qualquer vestígio de uma alegria, seus ombros caíram. Foi como levar um tapa. — Viverá seus dias em terra, mas não será permitido que fique com a prole de Lucius.

O cenho de Alana se franziu, Lena finalmente ergueu o rosto para olhar os Juízes e parecia tão perdida quanto a moça.

— O quê? — Perguntou confusa, Alana também estava, mas conseguiu segurar a língua para não questioná-los.

Um dos Juízes uniu as mãos.

— Você poderá voltar a terra, não estará mais condenada, porém não lhe será permitido viver junto a filha que gerou. — ele olhou diretamente para Alana enquanto falava. — Apesar de não viver sob as leis que regem nossos mundos, uma prole gerada entre o relacionamento entre um humano e um demônio ou anjo, é inaceitável.

Sua mente afastou-se aos poucos, até o ponto em que Alana não estivesse prestando mais atenção não Juízes ou nos outros presentes. Eles ainda falavam, Lena não demonstrava reação, mas parecia mais atenta a cada palavra ali dita. Contudo Alana, sentia que estava perdendo e realmente estava; conseguiu tirar a condenação de sua mãe, porém não poderiam viver juntas. Como ela tanto desejava. Um dos Juízes prosseguia com sua fala, parecia explicar melhor o que aconteceria quando Lena retornasse a terra, mas a moça continuou a não dar atenção alguma para o que estava sendo dito.

Aquilo lhe parecia muito injusto, passara anos de sua vida achando que a mãe estava desparecida por aí ou até mesmo morta e, quando finalmente soube de algo sobre a mulher, descobrira que ela estava no Inferno, condenada a toda a eternidade para viver naquele lugar tão desprezível. Quando finalmente tivera a chance de tirar a condenação dela... O mesmo viera com uma consequência terrível. Teria a mãe de volta, mas jamais poderia viver com ela outra vez.

Alana West só pareceu despertar de seu momento de devaneio quando sentiu o toque suave de Kambriel em seu ombro. O arcanjo lhe encarava como se esperasse que ela fizesse alguma coisa, Alana piscou e percebeu que Lena estava diante dela. Os olhos levemente marejados, apesar do claro esforço em manter um sorriso firme em seus lábios.

— Não é justo — murmurou a moça, esforçando-se para não desabar em lágrimas ali mesmo, ainda teria de passar pelo julgamento também e, imaginava que demonstrar tanta fragilidade diante dos seres que iriam decidir o que lhe aconteceria parecia algo como um gatilho para deixar sua situação ainda pior do que realmente era. — Por que?...

— ... Decidir manter a prole afastada da mulher que a gerou é a melhor decisão que encontramos, compreendemos que o real culpado em sua existência é Lucius, mas isso não anula a participação da mulher em sua existência — O Juiz continuava a falar e dessa vez Alana realmente passou a ouvi-lo atentamente. Apesar de odiá-los pela decisão tomada. — Lena West, poderá retornar para sua vida em terra a qualquer momento, Lucifer ficará responsável por levá-la de volta. — O ser apontou o dedo para o demônio. — Que fique claro que, tudo o que viu, o que sabe e o que viveu até esse momento continuará com você, como um lembrete do crime que cometeu junto a Lucius Halphas.

A mulher assentiu lentamente sem tirar os olhos de Alana.

— O que acontecerá com a minha filha? — questionou a mulher, a West mais nova notou que houve um leve tremor em seus lábios ao perguntar o destino de Alana.

— Ela passará pelo Julgamento também — outro Juiz respondeu. — Assim como o pai, ela precisa ser julgada e decidiremos o que lhe acontecerá, seja qual for nossa decisão, as duras terão um momento para se despedirem assim que tudo terminar.

Despedida. Alana engoliu seco ao ouvir aquela palavra, sentiu como se estivesse prestes a morrer e talvez, ela realmente estivesse perto disso. Afinal, ela não tinha como saber de seu destino, do que lhe aconteceria assim que fosse julgada como Lucius também fora antes dela. Pôde perceber que o tom usado pelos Juízes para menção de si mesma não era algo muito agradável ou tranquilizador, era uma voz firme e furiosa, soprando em seu interior um temor que fez com que ela se sentisse ainda menor.

Lena assentiu lentamente, aproximou-se da moça alguns passos e tocou a face mais nova, seus lábios estavam esticados com leveza, mostrando um sorriso materno que, Alana percebeu precisar mais do que nunca. Isso deveria lhe trazer mais tranquilidade e, apesar de conseguir causar o efeito necessário, o medo ainda era um fator predominante em seu corpo.

— Vai ficar tudo bem, meu bem. — a mulher praticamente sussurrou, seus dedos em sua face pareceram mais pesados quando ela demorou na carícia. — Independente do que acontecer, eu vou sempre, sempre estar com você. Mesmo que distantes da outra, nada vai me impedir de continuar cuidando de você; como sempre fiz!

Respirando fundo, Alana conseguiu esboçar uma reação, apesar de sentir que lhe faltavam palavras, o aceno com a cabeça pareceu bastar para a mulher. Ela sorriu, beijou rapidamente o topo da testa da filha e então se afastou, seguindo Lucifer para fora daquele lugar. Demorou para que os dois sumissem de sua vista e quando isso aconteceu, todo o ambiente pareceu tornar-se mais leve, a presença do demônio que reinava o Inferno não mais era sentida e nem algo marcante ali. Alana conseguia apenas sentir a presença dos três arcanjos e o peso do olhar de Eva sobre si.

— Aconteceu aqui algo inédito para todos nós, creio eu. — O Juiz prosseguiu com sua fala, ganhando a atenção dos que permaneceram ali. Todos os olhos estavam voltados para os tronos.

Alana então piscou, sabendo que agora seria a sua vez de ser julgada. Instintivamente a moça olhou na direção de Eva, a mulher estava mudando de lugar e não a olhava mais e mesmo que não estivesse mais sentindo o peso do olhar da mulher, ela queria aquilo sobre si. Era o que a tornava mais humana.  

— Ficou evidente que, há recusa por parte da prole de Lucius qualquer tipo de envolvimento com o mesmo e, não precisamos de provas ou testemunha para nos dizer o óbvio. Apesar do claro apego que esta tem com a mãe. — Disse, apesar de sua fala agora ser muito mansa e até possuir um certo tom convidativo para que ela relaxasse, Alana sentia que existia algo de ruim prestes a ser falado. Algo do qual ela não gostaria nada; isso a fez apertar a mão do arcanjo com mais força. — Contudo também presenciamos algo... Que em nossa opinião nos pareceu muito controverso. Em especial envolvendo a humana em questão e o Arcanjo Kambriel.

A moça sentiu engasgar com algo, a garganta coçou e o ar pareceu faltar em seus pulmões, já Kambriel, ele apenas abaixou o rosto em uma ação já costumeira dele, aos seus olhos não pareceu ser nada demais, mas para Eva, os dois arcanjos líderes e os oito Juízes... Aquele era um sinal claro de culpa.

— Creio que os Arcanjos Líderes também se surpreenderam com a cena em questão e que, assim como nós, compreendera o que realmente acontece. — Aconteceu uma segunda pausa, algo que a preocupou bem mais que antes. — Aproximem-se, os dois.


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Notas finais do capítulo

SPOILER LOGO ABAIXO:
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~ Crueldade com a Lena?? Infelizmente. Mas eu não queria dar um final nem muito feliz e nem muito triste pra ela, Lena vai poder ver a filha (ela vai fazer isso nas escondidas), mas não vai poder viver com a Alana por causa de ela ser uma herdeira, filha de demônio.

~ Alana ainda vai ser julgada.

~ Gostaram da participação do Lucifer???

~ E o final de Lucius? Merecido? Merecia mais? Queriam ele morto????



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