Amanhecer: Novos Começos escrita por Sarah Lee


Capítulo 22
Adeus


Notas iniciais do capítulo

Alô, Alô! Tem alguém aqui ainda?
Faz quanto tempo desde que eu estive aqui da última vez? Acho que uns dois anos né. Mas pareceram uma eternidade.
Eu poderia dar mil e um motivos de ter sumido mais uma vez, mas acho que não preciso. Foram anos complicados pra todo mundo, eu perdi muita coisa, muitas pessoas, e quase me perdi também. E só esses dias que eu tive coragem de voltar aos meus manuscritos, inclusive esse cap que já estava pronto desde 2020.
Eu volto então dizendo que estou bem, e que espero que você estejam bem também, e que ainda tenha sobrado algum lugarzinho para essa fic, que eu não deixaria sem um final, não importa quanto tempo demore kkkkk
Acho que o termo ideal é "bem-vindos" de volta, e nos encontramos lá em baixo



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A mão fria se fechou firme sobre a minha garganta, e a sensação era que eu estava sendo segurada por uma estátua. O ar já me faltava pela tentativa fracassada de fuga, mas agora eu realmente comecei a me engasgar. Ele aproximou os lábios famintos do meu braço, o hálito congelante provocando um comichão onde o sangue fluia mais rapidamente, mais quente. O cheiro doce me enjoava agora, e um leve gosto de metal surgia como presságio do que aconteceria a seguir. 

O vampiro mordeu ferozmente onde já havia uma cicatriz, como que para concluir o trabalho que deveria ter me levado muito tempo atrás. Eu ouvi um som de uma maçã sendo abocanhada, e um grito abafado que não era meu, já que minha garganta esmagada não me permitiria nunca mais gritar.

— Não há como fugir Bella... — Alguém sussurrou no meu ouvido por trás.

E reconhecer a voz foi o que me fez acordar.

Meu coração estava tão acelerado que ele poderia facilmente rasgar meu peito pela força do batimento. E eu sentia o suor gelado escorrendo enquanto eu encarava o nada, tentando me convencer que tinha sido apenas um pesadelo. Mas o frio e o medo eram reais demais.

Eu demorei um tempo para perceber que o frio que sentia era pela janela que estava aberta, e mais alguns instantes para lembrar por que ela estava desse jeito. Por algum motivo Jacob não estava me abraçando como geralmente fazia, impedindo que o frio me alcançasse.

Ele havia dito para que tentássemos dormir pelo menos um pouco no começo desta noite, pois amanhã seria um dia cheio, já que Sam começaria a tomar providências sobre os vampiros que se uniam. As rondas longas, a falta de sono, e o estado constante de alerta. As lembranças de como eles ficaram após a caçada de Victoria passavam como um flash na minha mente, e ela era apenas uma naquela época.

E no momento que eu comecei a ir para lugares mais obscuros, pelas possibilidades sangrentas de uma guerra, eu reconheci uma respiração no quarto silencioso. Mas foi só prestar um pouco de atenção para perceber que Jake também não estava dormindo.

— Pesadelos? — A voz me sobressaltou, mesmo eu sabendo de quem ela era.

— Como adivinhou? — A resposta saiu monótona, apenas uma reação automática do meu cérebro.

— Conseguiria ouvir seu coração a quilômetros de distância.

— E você? — Algo em seu tom de voz me dizia que Jake nem ao menos tentou dormir.

— Muita coisa na cabeça… — E eu só podia imaginar uma fração dos problemas que irão recair sobre suas costas a partir de hoje. — Desculpa por não ter te acordado, não sei se deveria. — Ele suspirou pesado. — Ultimamente não ando tendo mais certeza de nada.

— Não tem problema. — Mais uma resposta automática. 

Passamos mais tempo em silêncio, enquanto eu pensava se deveria dizer algo que martelava no fundo da minha mente desde ontem, quando estávamos no caminho para a minha casa. Talvez eu me arrependesse do que ele diria, mas também havia essa necessidade crescente de ter algum tipo de resposta, mesmo que ela confirmasse meus temores, e ela tinha que vir dele. 

— Jacob?

— Hum?

— Você está com medo?

Sua respiração perdeu o ritmo, e eu pude perceber que ele estava pensando cuidadosamente no que diria. —  Quer a verdade?

Um arrepio frio subiu pelas minhas pernas, e eu as encolhi por instinto debaixo do cobertor.

— Aterrorizado… — ele completou, e eu senti a verdade dolorosa na sua voz. E se Jacob estava assustado, como que eu deveria me sentir?

— Pelo o que exatamente? — Minha voz saiu como um sussurro. E eu percebi que não era minha curiosidade fazendo a pergunta, mas sim minha autopreservação se preparando para o pior.

— De perder todo mundo. De perder você… — A resposta me causou um desconforto abafado, porque se eu realmente fizesse parte de tudo isso, como estava disposta a fazer, essa era uma das coisas que eu não poderia prometer a ele, a minha segurança. E Jacob já tinha se dado conta disso.

— Vamos ficar bem, você vai ver… — eu menti por instinto, para tentar trazer algum conforto para ele por hoje. Mas não havia luz no mundo que pudesse nos alcançar no meu quarto escuro. Éramos apenas nós dois essa noite.

Mais algum tempo de silêncio se passou, enquanto eu tentava organizar meus pensamentos, para manter o pânico crescente sob controle.

— Bella? — Jacob se aproximou mais do meu corpo, encostando suas costas nas minhas.

— Sim?

— Se eu pedisse para você deixar a cidade e fugir com Leah, você fugiria?

A pergunta era inapropriada e insana, quase como um insulto. E eu demorei mais para entender que ele realmente estava falando sério, do que para formular minha resposta. — Você sabe que não há a mínima possibilidade disso acontecer.

— Eu sei — ele grunhiu, quase como uma risada. — Mas a esperança é a última que morre. — As árvores se agitavam cada vez mais violentamente pelo vento lá fora. — E você? Assustada?

Eu não tive coragem de responder, pois admitir como verdadeiramente me sentia já parecia um prelúdio para a derrota. Eu havia guardado esses sentimentos bem no fundo de mim, e os abafado com outros pensamentos, pois precisava ser apenas corajosa daqui para frente. Mas sabia que eles estavam lá, apenas espreitando para me ver vacilar, famintos novamente.

Então, em vez disso, eu procurei sua mão pelo escuro do quarto, e sem a mínima surpresa a encontrei esperando pela minha. Eu entrelacei forte nossos dedos, e Jacob suspirou pesado em concordância.

— Você acha que estamos fazendo as escolhas certas? — Jake se remexeu do meu lado para mudar de posição, e finalmente me abraçou. — Não só sobre esse problema, mas sobre tudo?

— Não sei dizer. Fico revendo tudo que já sei, e não entendo como chegamos neste ponto. — respondi, cansada. E a realidade estranha era que, mesmo não entendendo como chegamos aqui, também aprecia inevitável que algo assim acontecesse.

— Nem eu… — Ele respirou pesado. — Mas nunca fui bom em prever ou evitar problemas mesmo. Normalmente eu lido com eles na hora que aparecem, então estou tentando confiar no meu instinto até onde der.

— Parece uma boa maneira de se pensar.

— Talvez seja — ele concordou.

Então um pensamento surgiu na minha garganta, e foi tomando forma à medida que eu refletia mais sobre ele. E apesar de eu querer encerrar logo esse tema, que provavelmente voltaria a me assombrar quando dormisse, eu precisava colocá-lo para fora. — Você também tem essa sensação de que estamos nos esquecendo de algo?

— Como assim?

— Algo que deixamos passar — Mas o pior de tudo, era que não parecia só um mau pressentimento agora. — Não sei, talvez eu esteja só ficando paranóica…

Ele me abraçou um pouco mais forte antes de responder. — Provavelmente todos estamos, pelo menos um pouco. — E Jacob riu, aliviando o clima. — É muita coisa para adolescentes terem que lidar.

— Nisso você está certo. — Eu concordei, mas ele ainda não havia respondido. — Você também acha que algo está faltando?

— Huuum… — Ele pensou por um tempo. — Felizmente, faz muito tempo que eu não tenho a sensação que me falta algo.

— Como assim?

— Não desde que eu encontrei você — E ele completou dando um beijo na minha cabeça.

Então Jake finalmente conseguiu. A fala toda era tão absurda para uma situação tão séria, e as emoções estavam tão à flor da pele, que eu não tive reação a não ser uma crise de riso.

— Ei! — Ele me abraçou, com seu tom divertido na voz. — Foi uma das minhas melhores cantadas, admita. — Jacob já não conseguia mais segurar o riso também.

E passamos algum tempo assim, rindo, até que nos lembramos que não tínhamos motivos para rir, e o silêncio voltou a se instaurar no quarto escuro. Mas pelo menos agora ele estava mais suportável.

— Jacob?

— Sim? — Eu virei para encará-lo, e seus olhos, assim como eu suspeitava, traziam com eles uma espécie cruel de medo, bem lá no fundo. Não havia dúvidas de que algo nos aconteceria, mas era a incerteza do que especificamente seria isso que o machucava.

— Eu amo você

— Eu também amo você, Bella

Jacob estava claramente se esquivando da pergunta, mas eu não tinha certeza se queria saber o porquê disso. Estava cansada por hoje, então deixei o calor dele me levar para sonhos mais tranquilos.

 

***

 

Eu acordei novamente, agora com o sol forte no meu rosto.

— Jake? — chamei, sonolenta. Eu estava com essa sensação horrível na boca do estômago, como se a noite passada tivesse sido inteiramente um sonho meu. Mas acabei respirando aliviada quando ele grunhiu do meu lado. — Que horas são?

— Cedo… — ele gemeu novamente com um bocejo alto. — Muito cedo…

Eu procurei o relógio e fiquei alarmada quando vi o horário — Cedo? São três da tarde! — me sobressaltei.

— Muito cedo… — Ele afundou a cabeça no travesseiro.

— Não sei como Charlie não veio me levantar hoje.

— Na verdade eu ouvi quando ele saiu de manhã para ir à cidade com Billy. — Jacob finalmente se virou. — Ele sabia que você provavelmente estaria destruída hoje depois da festa da Jessica, e resolveu te deixar dormir o quanto quisesse.

E não consegui conter a sensação de surpresa. Por causa das últimas enxurradas de informações das últimas horas, eu havia me esquecido completamente que a festa de Jessica foi ontem. Parecia que tinham passado pelo menos dois anos.

— Bem devo agradecer a ele depois, eu realmente estava precisando dormir — completei.

— Seu pai consegue ser bem racional às vezes.

— Será que ele seria assim tão racional se soubesse que você dorme aqui? — Fiz menção de levantar da cama, mas Jacob me puxou para mais perto.

— Provavelmente eu acabaria com algumas balas no meu corpo.

— Provavelmente.

— Mas acho que se elas não forem de prata eu devo ficar bem. — Ele sorriu e me deu um beijo na testa. — Temos que ir à reserva em uma hora, você acha que está pronta?

— Para encarar todo mundo? — Eu sabia que não, só de imaginar seus rostos aflitos, e a sensação inerente de mais despedidas, faziam meu estômago despencar. Mas eu tinha que tentar ser forte. — Estou.

— Essa é minha garota.

Mas algo que Sam disse me veio à mente. Não sabíamos ao certo quanto tempo tínhamos para nos preparar, ou se teríamos realmente algum tempo de preparo. Então cada segundo importava a partir de hoje.

Eu voltei a me sentir mal à medida que fui recobrando a consciência das coisas que iríamos enfrentar, e por instinto me encostei ainda mais no corpo de Jacob.

— Ei, tudo vai ficar bem… — ele sussurrou na minha boca logo após me beijar. Agora foi a vez dele mentir para me confortar.

— Vamos nos esforçar para que fique. — respondi.

Era incrível como as viagens para a reserva eram sempre mais rápidas quando eu não queria que fosse. Os meus cabelos se emaranhavam e voavam ao vento enquanto grande lobo corria sem dificuldade por entre as árvores. Mas a verdade é que eu estava apreensiva. Uma ideia estava me incomodando desde a noite passada, quando Sam nos colocou a par da situação com os vampiros. Os pontos se ligaram no caminho de volta aquela noite, mas foi em algumas partes dos meus sonhos conturbados que eu resolvi mais um mistério e, consequentemente, conseguir mais um fantasma para me atormentar

Provavelmente, muito provavelmente, o primo que Angela procurava tanto estava oficialmente morto. Não que essa hipótese tivesse sido descartada antes, mas saber que ele poderia ter sido ceifado por um vampiro deixou um gosto amargo e familiar na minha boca, como se eu fosse responsável por algum motivo.

E a grande questão era, será que eu deveria contar para Angela? Será que eu poderia? Revelar essa informação, mesmo sem me aprofundar nos porquês, trariam muitas outras perguntas. Perguntas que eu não poderia responder, pois os segredos não eram meus. E eu continuei nessa espiral de culpa e medo quando chegamos à casa de Emily.

Mas ela estava estranhamente silenciosa, muito diferente do frenesi de vozes de lobisomens que eu esperava ouvir à metros de distância. E de certa forma isso me fez estremecer. 

O pensamento que me inundou foi que seria assim a vida se eles morressem em combate.

— Está com frio? — Jacob me fitou, curioso

— Só um pouco. — Tentei disfarçar, mas não sei bem se ele engoliu a desculpa. Jake estava bom demais em ver por trás das minhas mentiras, assim como Charlie era. — Onde estão todos? — consegui perguntar, quando nos aproximamos da porta amarela e remendada

— Em um lugar um pouco mais distante — Ele suspirou e me abraçou

— Um lugar particular dos lobos?

— Um lugar sagrado dos lobos. — Ele afagou minha bochecha antes de se afastar. — Volto para te pegar em breve, e te colocar a par do que discutimos, ok?

— Ok… — respondi, um pouco magoada de ser colocada de escanteio tão rápido. Tinha juntado toda minha coragem para me colocar na linha de frente se precisássemos, mas é claro que eu não estava lá de fato. Ainda era um problema dos lobos, e eu não fazia parte da matilha. — Volte logo, está bem?

Ele concordou e se afastou em um salto, correndo como homem até a entrada da floresta. E apesar do breve sentimento de rejeição, eu estava até que satisfeita pelo espaço, pois ainda tinha essa batalha para travar. Eu já imaginava o que Emily responderia, mas algo dentro de mim ainda pede pelos conselhos maternais dela, já que eu não poderia contar com minha própria mãe para isso, sem fazê-la me internar em um hospício.

— Emily? — chamei ao passar pela porta.

— No quarto, Bella!

Eu andei pela casa, a sentindo estranhamente muito menor do que era, até que encontro Emily sentada no colchão desgastado do seu quarto, arrumando uma pequena mala que está aberta ao lado da cama. Ela colocava coisas diversas e ajeitava com cuidado, somente para depois de um minuto ou dois tirá-las, repensar todo o processo, e voltar a arrumá-las de outro modo. Ficamos em silêncio por esse espaço de tempo, porque eu estava encantada demais na concentração que ela fazia para arrumar a mala, e ela provavelmente se esqueceu da minha presença assim que eu chamei.

— Posso ajudar? — Emily se virou para mim rapidamente, como se tivesse sido flagrada. Mas depois sorriu com ternura.

— Não precisa — Ela voltou sua atenção novamente para a mala, e levantou uma camisa rosa claro e sem mangas — O que acha?

— Bonita, você vai usar?

— Não… — ela suspirou fundo. — Estava pensando em dar para Leah… — Emily dobrou com cuidado a roupa, e retirou mais algumas coisas na mala antes de colocá-la lá dentro também.

Foi quando eu reparei no conteúdo que ela arrumava, e entre alguns porta-retratos, jóias e roupas, também tinha uma carteira de tecido bordado, que estava particularmente estufada. Além de um molho com muitas chaves. 

— Acha que é muita coisa? — Emily perguntou, após notar meu olhar atento.

Mas neguei com a cabeça. —  Acha que ela vai acertar tudo isso?

Ela também negou, mas com um leve sorriso no rosto. — Ela sempre foi muito independente, mesmo quando criança. — A mulher se voltou para mim, mas o olhar estava perdido em lembranças. — Teve essa vez, muitos anos atrás, que a casa dela havia sofrido muito com as chuvas, e no meio desse caos, com os pais atolados de trabalho, Leah teve que virar praticamente a mãe de Seth. Ela cuidava dele, se certificava que comia todas as refeições que preparava, e o levava e trazia da escola. Ela teve que aprender a se virar muito cedo. — Emily encarou o porta retratos na sua frente, onde havia uma foto deles bem mais jovens. Ela então pegou o objeto, e o guardou com carinho dentro da mala também. — Só queria ter feito mais por ela naquela época, mas acho que posso compensar agora.

Ela virou o rosto para mim, como se esperasse uma resposta, e eu apenas concordei com a cabeça. — Sempre há tempo para compensar as coisas. — E seus olhos brilharam em concordância.

— Leah não está errada, sabe? Em se preservar e ao irmão. — Emily rapidamente se levantou e foi até a cômoda do quarto, e começou a revirar algumas gavetas.

E era um ponto que eu tinha que concordar. Se houvesse um jeito de eu conseguir fugir, e ainda sim garantir a proteção de todos, eu faria. Não quero mais mortes me rondando, então não posso culpá-la por tomar esse tipo de atitude. Talvez Leah até convença sua mãe a sair da reserva por alguns dias.

— De qualquer modo, pelo menos assim eu sinto que ela não vai estar totalmente desamparada. — Emily completou.

— Você é uma boa prima.

— Eu tento meu melhor… — Ela sorriu, mas havia algum tipo de tristeza persistente em sua voz.

— Emily — comecei, sem saber ao certo como começar essa conversa. — Há algo que eu gostaria de te perguntar…

Foi rápido, quando eu contei toda situação de Angela, e como a própria família dela estava parcialmente envolvida nisso tudo. Quando como o seu primo desapareceu, e agora o quebra-cabeça se completando com a informação do levante dos vampiros. 

Emily digeriu delicadamente todas as informações que eu joguei em suas mãos, e no fim adivinhou a minha pergunta antes mesmo de eu fazê-la.

— Então, você quer saber se deve ou não contar à ela a possível verdade? Estou certa?

— Exatamente. — E minhas bochechas coraram, como se eu tivesse sendo repreendida. – Mesmo que ela me ache uma louca e provavelmente queira me internar, acho que ela é confiável o bastante para pelo menos não sair espalhando por aí tudo que eu contar a ela. E talvez, vendo com os próprios olhos…

— E você acha que deve contar? — Emily perguntou, não com um olhar ou tom de voz recriminativos, de como “você sabe que não deve”, mas com uma preocupação genuína com a questão.

— Não tenho certeza, no final das contas o segredo não é meu…

— Na verdade, Bella, o segredo agora é seu também. — Ela segurou delicadamente minha mão. — Você faz sim parte desta família, e querendo ou não, esse segredo também é seu agora.

Um rubor tomou conta das minhas bochechas enquanto eu pensava o quanto estava sendo tola, me excluindo e duvidando destas pessoas que já me consideravam muito mais importante do que eu me achava. E se eu pensasse direito, a resposta era sim mais óbvia do que aprecia, pois todos os Lobos já devem ter se perguntado isso alguma hora.

— Então, você acha que deve contar? — Emily reforçou a pergunta.

— Sinceramente? Pensando melhor agora, não acho que essa informação trará algum alívio para ela. Apenas mais dor e preocupação. — Apesar de eu querer realmente ajudá-la, não poderia ser deste modo.

— É um bom ponto a ser analisado. — Ela sorriu com ternura novamente. — Jacob teve a mesma preocupação quando decidiu te contar. — E a lembrança dele no meu quarto, e sua dificuldade para dizer algo tão simples, veio à tona na minha mente. — Trazer alguém para nossa família é algo maravilhoso, mas também muito perigoso. Jacob com certeza se sente ainda mais responsável por você, depois que ele escolheu te contar sobre nosso mundo. Mas algumas coisas são inevitáveis.

— Não quero ver Angela se ferindo mais…

— A ignorância é uma benção Bella, quem disse isso mesmo? — Emily pensava enquanto fechava a mala. — Eu gostaria de pedir um pequeno favor, se não for te incomodar.

— O que gostaria? — Depois de tudo que ela fez por mim, não havia muita coisa que Emily pedisse que eu pensasse em recusar.

— Eu combinei de ver Emily na praia essa noite, antes dela ir embora com Seth. E eu sei que seria mais fácil dela aceitar essas coisas, e também morar na minha casa em Seattle, se você falasse com ela. — Ela me entregou a mala de couro, e eu a peguei com carinho. — Pode não parecer, mas você é o mais próximo que ela teve de uma grande amiga em muito tempo.

Apesar de ainda duvidar se “amiga” seria mesmo a palavra que Leah usaria para me descrever, eu também não podia negar que havíamos ficado estranhamente próximas nos últimos dias. — Vou entregar, não se preocupe.

Ficamos por mais algumas horas discutindo amenidades, ambas tentando fugir do assunto principal que nos pairava, até eu não conseguir mais segurar o que eu estava pensando.

— Emily… O que você acha que os lobos estão fazendo agora?

A expressão dela ficou visivelmente mais rígida quando eu mencionei o tópico, e o olhar se tornou distante antes de focar completamente no meu, talvez avaliando o quanto eu realmente precisava saber, assim como Angela.

— Nós não temos muitas opções para o que está acontecendo Bella, não sabemos se ainda temos mais uma semana, ou algumas horas antes do bando de vampiros atacar. — Ela começou contando, enquanto as mãos se esfregavam uma na outra com angústia. — Na verdade, em todos os nossos registros, tanto orais quanto em artes, nunca havia acontecido algo como isso. Um grupo tão grande de vampiros se formou em prol de um único objetivo. — Ela se levantou da cama e olhou pela janela, o sol já estava se pondo longe. — Eles não são como nós. Os vampiros não precisam formar grupos, primeiro que são poderosos mesmo sozinhos, e segundo que muitas pessoas juntas significa competição de alimentos. E eu fico pensando sobre isso, mas há algo estranho no porquê dos vampiros também manterem segredo de sua existência. Nós fazemos pois esse dom foi criado unicamente para proteger nosso povo, não para ganância própria. Mas ainda sinto que algo na história está se perdendo.

Meu estômago se revirou com as lembranças da noite anterior, então não era apenas uma paranóia minha afinal.

— Então não temos algum tipo de estratégia definida para situações como essa? — Eu senti o sangue sumir do meu resto, por perceber exatamente o tamanho do buraco que estamos.

— Não exatamente… — Ela voltou a se sentar, e passou o braço por meus ombros. — Mas não pense que nós não podemos nos revidar. Há certas coisas que ainda podemos tentar, e nossos números de lobos estão em seu ápice, como nunca registrado antes.

— Então, exatamente o que vocês planejam? — Minha curiosidade era tão grande quanto meu receio.

— É um assunto delicado, Sam descobriu, após os estudos de rituais antigos do nosso povo, algo que talvez possamos usar para aumentar ainda mais nossos numero.

— Transformar mais gente em lobisomem? — Imaginei por um momento os lobos correndo na noite de Lua cheia, mordendo pessoas desavisadas por aí

— Não, nosso dom não pode ser passado assim, não é algo como o que os vampiros fazem. — Ela riu, mas eu me encolhi, envergonhada pela piada imprópria. — Eu sei apenas que é um ritual antigo e muito perigoso que eles estão planejando performar, mas os detalhes infelizmente estão além do que eu posso te explicar. E eu não faço a minima ideia do que eles estão tramando, mas confio em Sam, ele vai fazer o melhor para nós. — E se levantando comigo. — Mas de qualquer forma teremos que esperar Sue chegar amanhã, e apresentar essa ideia para ela. É ela que entende toda essa parte de rituais por aqui.

— Certo… — Não sabia se realmente tinha entendido algo que ela disse. — Volto logo então — completei enquanto caminhava para a porta.

— Ah, Bella. — Antes de sair, ela me entregou uma carta embrulhada em papel pardo, onde havia escrito “para Leah” em caligrafia caprichada. — Obrigada… Emily me olhava com ternura novamente. — E você poderia avisar para Leah se cuidar? E também reforçar que ela pode voltar quando quiser, aqui sempre será a casa dela.

— Vou dizer. — E me retirei da casa.

A descida para praia foi fria e silenciosa, a noite chegava cada vez mais rápido que o normal, espantando o sol e qualquer calor e segurança que o dia traria. “Tempos difíceis nos aguardam…”, a frase de um livro surgiu na minha mente.

Continuei andando, agora tremendo um pouco graças à proximidade da água, o que fazia a temperatura baixar ainda mais. Até que eu avistei a silhueta dela, e depois seu rosto, com as expressões rígidas mas iluminas enquanto encarava as águas. 

Mas por algum motivo senti vontade de chamar seu nome.

— Leah! — A garota que se virou não aprecia nada com a que eu havia visto nos últimos dias. O olhar afiado havia voltado, e a luz ido embora.

— Ela não vem, não é? — A loba voltou a olhar para o mar quando me aproximei.

— Não, mas ela me pediu para te dar isso — disse, enquanto entregava a carta e a mala para ela.

— Realmente não precisava… — Ela amoleceu o semblante, e eu pude ver algo brilhante se remexendo em seus olhos. — Só espero que ela não me odeie por isso, eu já estou me odiando o suficiente.

— Ninguém vai te julgar Leah, por querer proteger aqueles que você ama.

— Sam vai — ela respondeu, amarga. — E tenho certeza que os outros meninos também vão entrar na dele, aqueles…

— Não. — A interrompi, firme. — Não diga nada para você se arrepender depois. — E suspirando. — Eu te entendo… Então apenas… Se cuide, está bem? — Segurei firme a sensação de despedida dentro do meu peito, tentei dar a ela um último sorriso amigo, ou algo assim. —  Por Emily… E por mim.

Leah então fez uma coisa que eu imaginaria que nunca iria acontecer, ela em um movimento rápido me puxou para perto e me abraçou. Um abraço breve e quente, que machucou um pouco meus ombros pela brutalidade, mas que fez meu coração bater mais pesado. E eu só consegui raciocinar o que realmente tinha acontecido logo depois que acabou.

Eu estava surpresa demais para esboçar qualquer reação quando ela se afastou, visivelmente desconfortável. — Se cuidem também, vou contar com você para por juízo na cabeça daqueles… — Ela pensou por um momento. — Cabeças-ocas. — E riu rapidamente com a própria piada.

— Vou tentar. — Eu pisquei rapidamente para afastar as lágrimas que, por algum motivo, se formaram no canto dos meus olhos. “Eu veria Leah novamente, quando tudo isso acabasse", me confortei. Mas me pergunto o quanto dela eu perdi nesses últimos tempos, por só encará-la como a ex namorada amarga de Sam, e não pela pessoa que ela realmente é. Talvez nós realmente possamos ser boas amigas no final. — Seth vai com você, não é? — Perguntei enquanto caminhávamos para o outro ponto da praia, em direção à estrada que dava para fora da cidade.

— Contra a vontade dele, obviamente. — Leah riu, iluminando-se. — Mas acredito que ele vai sobreviver. Eu só…

— Quer protegê-lo a  todo custo. — E por alguns segundos, a imagem ficou clara, de uma Leah pequenina, com os pais distantes, tendo sempre que tomar a melhor decisão para criar o irmãozinho sozinha.

— Protegê-lo a todo custo… — Ela repetiu, confiante.

— E sua mãe?

— Virá após alguns dias, ela só vai ajudar Emily com alguma coisa que foi pedida, e nos encontrará no Canadá.

Nós finalmente tínhamos chegado na metade, onde finalmente nos separaríamos. Um momento de silêncio confortável nos envolveu quando ela ajeitava a mala na mão, e colocava a carta dentro da grande mochila que levava nas costas

— Sabe Bella… — Leah começou. — Eu gostaria que você tivesse me ouvido daquela vez que estivemos aqui, há muito tempo. — O olhar dela escureceu enquanto eu tentava procurar na memória o dia que ela estava se referindo. — E eu te alertei que estar com a nossa espécie só te trará dor? Mas agora temo que não há mais como escapar… — Leah deu um meio sorriso sem luz, o que tirou o calor que havia começado a se criar com sua presença. —  Eu sei que parece egoísta, mas você poderia tentar me fazer um favor? Isso vale para Jacob também, então por favor avise ele mais tarde.

Eu não respondi, inerte, mas ela continuou mesmo assim.

— Por favor, não morra… — completou. E depois partiu, sem olhar para trás. 

As pegas logo foram logo engolidas pelo mar que subia, enquanto eu a perdia de vista na entrada da floresta. E depois parecendo que ela nunca ao menos esteve ali.

E algo me dizia que aquela era realmente a última vez que eu a veria.


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Notas finais do capítulo

Estou com um projeto de reescrever e corrigir a primeira parte desta fic, o "Lua nova: Outros caminhos", para se adequar tanto às regras do novo +Fiction, como em outras plataformas que eu postarei e atualizarei. Então, quando tudo estiver pronto, eu informo vocês, então não deixem de ler as anotações, ok?
Por fim, todo domingo (eu espero), terá um cap quentinho para vocês. Vamos que vamos! E até mais, fiquem bem ♥



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