Nápoles sob a Lua Cheia - Oneshot escrita por Andréia Santos


Capítulo 1
Capítulo Único




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Renesmee adorava passar as horas livres enfiada no sótão da casa de seus “avós” e “tios” fuçando em baús que atravessaram os séculos até chegar em suas mãos. Foi ali que ela aprendeu boa parte dos 18 idiomas que ela falava – alguns que sequer são falados mais – em velhos livros empoeirados e encontrou objetos de valor histórico inestimável; contudo nada chamou-lhe mais atenção do que uma velha fita cassete com uma etiqueta improvisada com esparadrapo que dizia “Ascolta quando sei in viaggio per Napoli”...

 “Meu bom amigo Carlisle, sinto não poder encontrá-lo pessoalmente para contar as coisas que descobri e sinto mais ainda em dizer-lhe que há esta altura estarei morto de vez porque meus novos ‘amigos’ não são tão amistosos quanto os Volturi… é tão bom saber que eles ainda existem e que podem ser a chave para tirarmos aqueles três infames do poder, mas mais ainda estão ficando cada vez mais civilizados e organizados. Na última lua cheia um bando de seis licantropos desceram em direção à Volterra e…”

— “Licantropos”? – Renesmee murmurou e correu até uma estante de onde tirou um grande livro com capa dura sobre lendas e monstros – Eles são os filhos da lua! – ela disse em voz alta lembrando-se do dia em que os Volturi conheceram Jacob e o restante da matilha.

“... naquele dia apenas dois retornaram, mas como conseguiram fugir antes de retornarem a forma humana, eles perderam completamente o cheiro de lobo e não puderam ser rastreados, o que foi bom para a segurança da vila. Ouvi dizer que os rastreadores dos Volturi, quando encontram um deles, os consideram tão inaptos devido ao vírus da licantropia que nem se demoram por lá...”

— Gostaria de ir à Nápoles? – Carlisle perguntou surgindo de repente ao lado de Renesmee.

— Não posso negar que fiquei extremamente interessada em saber mais sobre eles. – ela comentou olhando fixamente para uma versão de “O homem vitruviano” com um lobisomem em vez de um homem no centro do círculo – Quando eles estão transformados são tão semelhantes ao Jake…

— Mas os Quileute são uma espécie de xamã, é muito diferente de um portador da licantropia. – Carlisle pegou outro livro e mostrou para Renesmee – Na história dos lobisomens, assim como na nossa, muita coisa foi adaptada e a verdade foi se perdendo, mas na Itália o conhecimento sobre a principal ameaça contra nossa espécie é mantido vivo por uma óbvia questão de autopreservação. Giorgio, meu amigo da fita, conseguiu se aproximar desse bando e observá-los por muito tempo no início dos anos 90, mas foi descoberto numa noite de lua cheia e só depois de alguns meses encontraram sua cabeça boiando em alto mar... Queimá-lo foi um ato de misericórdia.

— Se eles são tão perigosos para nós, porque o Giorgio tinha tanto interesse neles?

— É a mesma situação de Stefan e Vladimir. Há muitos vampiros que são veementemente contra a centralização de poder nas mãos do Volturi e eles são capazes de extremos para “destroná-los”.

— Até tentar “domesticar” um licantropo... – Renesmee notou olhando pela janela para Jacob.

— Nápoles é linda essa época do ano. – Carlisle disse com um sorriso gentil nos lábios e desceu as escadas.

 

***

Não foi nada fácil achar um carro equipado com toca-fitas em pleno ano de 2018, mas com um pouco de persistência eles acabaram encontrando e alugando um modelo bem fora de moda numa lojinha espremida em meio a outras pomposas locadoras de carros do ano. Embora Jacob e Renesmee tivesse levado muito mais dinheiro do que podia gastar a mestiça não cedeu aos desejos de seu companheiro por motores potentes: eles precisavam escutar aquela fita enquanto dirigiam rumo ao local indicado por Giorgio.

— Poderíamos viajar ⅔ mais rápido se o áudio estivesse num pendrive. - resmungou Jacob tentando tirar o máximo daquele motor velho.

— Não seja chato Jake. - Renesmee comentou e apertou o botão de play logo em seguida.

“Há cerca de vinte minutos da região metropolitana de Nápoles há uma zona rural. Lá você encontrará um povo aparentemente pacato, mas todos conhecem o segredo da licantropia. Não se engane com a fragilidade humana: eles sabem como ninguém reconhecer um vampiro…”

— Vamos voltar agora. – Jacob disse firmemente tentando girar o volante, mas Renesmee segurou com firmeza e o motor do carro cessou de repente – Nessie, eu não vou te levar para o meio do nada onde vão te matar se descobrirem que você é uma vampira!

— Meia-vampira. – ela corrigiu – Você mais do que ninguém sabe que eu posso passar por humana facilmente.

— Tudo bem. – ele respirou fundo e preferiu ceder – Se eu não for você vai de qualquer jeito, não é?

— Com certeza. – ela confirmou e girou novamente a chave na ignição – Essa noite, com sorte, presenciaremos uma transformação em massa.

— Você sabe mesmo como me deixar tranquilo. – ele resmungou ironicamente e tentou não pensar mais no assunto. Do bolso da jaqueta ele puxou um walkman de seu pai e entregou para que Renesmee escutasse o restante da narração sozinho.

 

A primeira visão daquele vilarejo era acolhedora e bucólica, mas a modernidade deixava sua marca com força principalmente na parte central que já era asfaltada e com comércios e ruas similares ao subúrbio de grandes centros urbanos. A palidez de Renesmee e a pele avermelhada de Jacob logo chamaram atenção e, quando os dois estacionaram no posto de gasolina uma pequena multidão se formou ao redor para espiar.

— Precisam abastecer e pegar a estrada logo. – um senhor adiantou-se num inglês bem carregado de sotaque italiano – Já vai escurecer e não temos quartos disponíveis.

Signore, nós vamos ficar nem que seja dentro do carro. – Renesmee respondeu em italiano e as pessoas ao redor começaram a cochichar entre si.

É quasi ora di andare. – um rapazinho de mais ou menos doze anos disse próximo ao ouvido do senhor.

— Jake, melhor voltarmos para o carro. – Renesmee disse colocando um punhado de euros no balcão e saindo pelo meio das pessoas.

— Senhorita, eu estou tentando ser educado! Vá embora! – o senhor disse correndo atrás dela e a segurando no braço.

Não encoste nela!— Jacob disse num rosnado e todo mundo ao redor recuou.

— Jake, acalme-se. – Renesmee pediu olhando fixamente nos olhos dele – Está tudo bem, senhor. Podemos nos cuidar.

Mannaro. – uma mulher idosa disse com uma voz assustada, mas aproximando-se de Jacob.

— O que ela disse? – ele perguntou para Renesmee enquanto encarava a mulher delicada em frente a ela.

Mannaro significa lobisomem. – ela respondeu séria – Tem algum quarto disponível agora, senhor…?

— Genaro. – ele respondeu gaguejando – Me acompanhem por favor.

...

Na última meia hora que antecedia o anoitecer uma grande fogueira foi acendida no meio da praça para que a comunidade se reunisse. Diferente da narração na fita, não eram mais uns poucos os infectados, mas sim todos os moradores daquele local. Ainda temerosos pela segurança de Renesmee os mais velhos sugeriram que ela ficasse no quarto da pousada e não saísse de lá até que o sol nascesse novamente, o que deixava tanto Jacob, quanto ela aliviados por eles não suspeitarem de sua verdadeira natureza.

Nos primeiros minutos que a lua firmou seu espaço no céu todos começaram uma espécie de dança descoordenada como se estivessem hipnotizados. Logo os passos cessaram e uma forte agonia expressada através de rugidos deixou o ambiente mais aterrorizante. Renesmee aproveitou a distração daqueles que começavam a se contorcer de dor e saiu saltando pelos telhados até ficar numa distância segura. Jacob só se transformou quando os humanos ao redor já não eram mais humanos e se surpreendeu quando conseguiu ouvir claramente os pensamentos dos licantropos.

“Incrível… eu consigo entender vocês.” – comentou ele e os lobisomens viraram-se ao mesmo tempo em sua direção – “Vocês conseguem me ouvir? É claro que conseguem me ouvir, mas não podem me responder porque não são como eu.”

Jacob farejou no ar o aroma que Renesmee exalava e o seguiu para ficar mais próximo dela e protegê-la caso algum deles perdesse o controle de suas ações. O que ele não esperava era que a alcateia o seguisse como se ele fosse uma espécie de líder e ele deteve-se ao chegar num beco iluminado por um punhado de luzinhas incandescentes onde Renesmee desceu até uma escada de incêndio e ficou sentada ali com suas pernas balançando pelas grades.

— Eles estão esperando que você lhes diga o que fazer. – Renesmee disse encantada com o que via.

“Sentem-se.” – Jacob disse em pensamento e eles obedeceram – “Esta noite ficaremos aqui, quietinhos, até o amanhecer. Não vamos quebrar nada, nem machucar pessoas inocentes… principalmente ela.”

— Posso sentar ao seu lado? – Renesmee pediu ao final da primeira hora e Jacob assentiu com a cabeça. Num salto ágil ela desceu e sentou-se num banco de madeira ao lado dele lhe fazendo carinho no pêlo.

 

Já era quase quatro horas da manhã quando todos os lobisomens dormiam tranquilamente. Não houve um deles, nem mesmo os mais jovens, que ousasse se rebelar e até foi possível que Jacob retornasse à forma humana e fizesse companhia para Renesmee que anotava o que tinha acontecido com riqueza de detalhes para levar até Carlisle:

— Como você se sentiu? – ela perguntou com a caneta preparada para escrever o que ouviria.

— Foi… intenso. – ele respondeu meio incerto, como se não houvesse uma palavra para descrever a sensação, procurando conforto deitando sua cabeça no colo dela – Eu consegui ouvir os pensamentos agitados deles. Eles pediam socorro porque não tinham controle sobre suas ações e minha voz lhes pareceu uma luz no fim do túnel. Eu pedi que eles se sentassem e esperassem a transformação passar e não houve resistência. Eles pareciam desejar por uma orientação e eu lhes ofereci isso.

— Você quer dormir um pouco? – ela perguntou e ele confirmou com a cabeça – Eu te levo para o quarto.

— É tão estranho quando você quer me carregar no braço. – ele disse zombeteiro e pôs-se de pé.

— Precisamos ser silenciosos para não acordá-los. – Renesmee envolveu Jacob pela cintura e tomou impulso para pular sobre os telhados pairando como uma pluma.

— Sabe, eu nem estou com tanto sono assim. – ele disse puxando ela pela cintura e a beijando com carinho.

— Sorte a sua que eu não preciso mais dormir tanto assim. – ela disse numa voz abafada entre os lábios dele.

 

***

— Nunca tivemos uma temporada tão tranquila. – o senhor Genaro disse com um sorriso enorme no rosto – Vocês tem mesmo que ir embora hoje?

— Preciso voltar para os Estados Unidos. – Jacob respondeu contrariado – Eu farei o possível para retornar na próxima lua cheia para me certificar que vocês aprenderam a se controlar por si mesmos.

— E a senhorita? O que a senhorita é? – o senhor virou-se para ela com curiosidade – Como você sobrevive ao lado de um lobisomem?

— Jacob e eu somos parecidos, mas não sou parecida com vocês. – ela respondeu vagamente.

— Tudo bem. – Genaro respirou fundo e deu de ombros – Depois do que fizeram por nós eu vou aceitar sua resposta senhorita. Façam uma boa viagem de volta.

— Obrigada. Se cuidem e não pisem em Volterra se tiverem escolha.

— Sabem até sobre isso... – ele comentou ainda mais intrigado – não se preocupem com isso. Volterra para a gente é como uma cidade de faz-de-conta.

 

Sobre as nuvens brancas no céu azulado Renesmee observava a Itália ficando para trás. Em seu caderno de bolso ela levava páginas abarrotadas de informações que ela poderia simplesmente mostrar com seu dom, mas preferiu transformar em palavras em consideração à Carlisle. Para Jacob era visível que após esses vários dias imerso nos pensamentos de lobisomens de verdade tinha-se firmado uma conexão que só perdia para o imprinting e Nápoles certamente seria uma segunda casa para eles.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado. Foi bem curtinha, mas taí com todo carinho. Amei participar do desafio e espero ter outras oportunidades!

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