— Então... – Nico se aproximou na escuridão. Ele era muito habilidoso se esgueirando por cantos mal iluminados – Você vai mesmo aceitar a proposta de Zoe?

Bianca levantou o olhar do arco prateado que tinha em mãos. Ponderou alguns segundos antes de responder, olhando dentro dos olhos vivos de Nico.

— Creio que sim.

Ele chutou uma pedrinha solta da caverna em que os semideuses estavam escondidos. O resto do pessoal estava do lado de fora conversando e arrumando algo para comer.

— Não temos que conversar isso?

Bianca franziu as sobrancelhas. A tiara em sua testa brilhava com a luz proveniente da lua que invadia o buraco.

— Não. É minha decisão, Nico.

O garoto parou o que fazia e a encarou com os olhos arregalados em descrença.

— E ela não afeta ninguém? Ela não me afeta?

— O que quer dizer com isso? – Suspirou cansada.

— Quer dizer que quando se for eu vou ficar sozinho.

Bianca largou o arco prateado ao seu lado e levantou, ficando de frente para o irmão. Apoiou as duas mãos meio sujas em seus ombros magros e falou:

— Você já é bem grandinho para se virar sozinho.

— Não é só sobre isso que eu estou falando – Resmungou balançando o corpo para quebrar o contato com a irmã.

— Você consegue se cuidar sem mim – Ela continuou com os braços soltos do lado do tronco – Temos a mesma idade, me explique como eu posso cuidar de nós dois e você não.

— Não é disso que eu estou falando – Repetiu aumentando o tom de voz com a raiva – E você sabe.

— Está bem, Nico – Bianca cruza os braços – O que quer que eu diga?

— Quero que me diga que não vai – Ele pede apoiando a mão fria no braço da garota – Quero que diga que fica por mim.

— Eu não posso Nico – Foi a vez de Bianca se afastar do toque do outro – Eu não posso viver a minha vida pensando apenas em você.

Nico abriu e boca e fechou algumas vezes, como um peixinho fora da água. Seus olhos começaram a marejar e o garoto engolia as lágrimas vez e outra, impedindo-as de cair, porque, no momento que uma delas caísse, todas correriam desenfreadas pelo rosto amargo.

— Mas pode viver a vida junto comigo – Concluiu apenas dando de ombros.

— Eu ainda posso – Ela sorriu, mas foi cortada pela frieza do irmão.

— Não, Bianca. Não pode. Se você for com Zoe você vai virar uma caçadora de Ártemis, sabe todo o peso disso? Além de você viver para sempre enquanto eu envelheço e morro?

— Eu sei, Nico.

— Mas não parece que sabe, ou não liga – Tentava controlar o tom de voz e o choro, mas os dois o desobedeciam – Deixe que eu desenho pra você: Você não pode ter nenhum contato com homens, não pode ter namorado nem nada.

— Eu sei, Nico – Repetiu.

— Ah, você sabe? – Ele podia sentir as gotas salgadas correndo pelas bochechas coradas do nervosismo.

— Eu já pensei em tudo e vou aceitar – Bianca concluiu – Eu quero viver por mim, quero pensar em mim pelo menos uma vez na vida.

Nico encarava a irmã trêmulo. Sem pensar muito, aproximou seu rosto rapidamente do dela e beijou sua boca tão familiar. Os lábios unidos e as línguas dançando em uma melodia cruel de separação. As mãos geladas do garoto tocaram o pescoço dela, aproximando seu rosto e impedindo o afastamento brusco. Bianca emaranhou seus dedos finos pelos cabelos negros e despenteados do irmão gêmeo, acariciando as madeixas e bagunçando ainda mais a cabeleira.

— Não vai – Nico implorou com a voz sufocada pelo boca dela sobre a sua. Baixou suas mãos pálidas até a bunda da garota, erguendo ela do chão e caminhando até uma parede para apoiá-la e continuar o beijo. As lágrimas dele já estavam secas, mas o gosto salgado ainda permeava suas faces, entreabrindo os olhos, Nico viu que era porque Bianca era quem chorava agora.

Afastou-se da boca dela com um selinho carinhoso, migrando para seu pescoço, onde depositou mordidas, ouvindo suspiros saindo pelos lábios inchados de Bianca.

— Por favor – Pediu mais uma vez, devolvendo sua boca para a da garota. Mais uma vez, ela não respondeu, apenas aprofundou o beijo ainda mais, ainda fazendo carinho nos cabelos dele. Nico separou seus rostos, olhando nos olhos castanhos da irmã – Não vai. Me fala que não vai ir com a Zoe.

— Eu não posso, Nico – O choro silencioso e lento se transformou em uma torrente de lágrimas desesperadas.

— Não vai – Escondeu seu rosto no pescoço dela, coberto pelos cabelos lisos, e soltou suas pernas lentamente.

— Eu não posso dizer isso – Falou soluçando. Ela nem tentava controlar o choro, apenas deixava que a água saísse de seu corpo.

Nico desenterrou o rosto, olhando para ela. Tocou seu rosto com a ponta dos dedos que tremiam com a dor que sentia no peito.

— Fica – Pediu quase sem voz. Queria pedir muitas coisas. Não vai com Zoe, não vai com Ártemis, não se compromete com isso, fica comigo, eu te dou todo amor que você suportar e você nunca vai se sentir incompleta. Mas não teve folego para nada.

Bianca nem mesmo conseguiu falar. Apenas negou veementemente com a cabeça. A cada aceno, Nico dava um passo irregular para trás, até que, quando ela parou de abanar o rosto, viu que o garoto nem mesmo estava lá mais.

Se ajoelhou no chão frio, abraçando o arco que Zoe Doce Amarga dera para ela, e chorou até a madrugada, com certeza apenas de uma coisa: seu coração estava partido, nunca mais veria Nico e seria uma das caçadoras de Ártemis. Seria a melhor delas, porque sacrificara mais coisas pelo sonho.