A Duquesa e Eu escrita por Hunter Pri Rosen


Capítulo 2
Capítulo 2




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Os homens se julgam tão inteligentes e perspicazes, querido leitor...

Essa autora só pode recomendar que pensem duas vezes antes de afirmarem que entenderam algo.

Eles vão se surpreender!

CRÔNICAS DA SOCIEDADE DE LADY WHISTLEDOWN

06 DE OUTUBRO DE 1813

 

Simon fez o possível para deixar Daphne confortável. Tirou os sapatos dela, desprendeu seu penteado e afrouxou o espartilho, depois de acomodá-la na enorme cama de dossel que compartilhavam na Casa Hastings.

Antes de deitar ao lado da esposa, fechou as cortinas, ajeitou o travesseiro sob a cabeça de Daphne com cuidado para não acordá-la e puxou um cobertor sobre ela.

Simon adorava dormir abraçado a Daphne, sentindo o calor do seu corpo e seu perfume suave. Gostava de saber e sentir que ela era sua, assim como ele pertencia irremediavelmente a ela.

Dessa vez, no entanto, achou prudente manter alguma distância. Se Daphne estava doente ou apenas indisposta, ficaria mais confortável sem o corpo dele tão colado ao seu. Assim, Simon contentou-se em acariciar os longos e volumosos cabelos castanhos da esposa entre os dedos enquanto ouvia uma ou outra carruagem percorrendo a Mayfair lá fora.

Até que os sons foram ficando mais baixos, mais distantes, e ele mesmo adormeceu.

[...]

Quando ele acordou, cerca de uma hora depois, Daphne havia se arrastado na cama. Na direção dele. Como se guiada por um instinto, pela necessidade de ficar mais perto do marido, ela havia se aconchegado ao corpo de Simon, as costas no peito dele e o traseiro deliciosamente encaixado mais embaixo.

Simon suspirou com um sorriso diabólico e passou um braço em volta dela, mergulhando o rosto na pele quente de seu pescoço.

— Ah, Daff... Bem melhor agora.

Um som parecido com uma risada se formou na garganta dela e, quando se virou para Simon, ele viu que seus olhos estavam mesmo rindo.

— Oi... — ela murmurou, a voz ainda rouca pelo sono.

Simon arqueou uma sobrancelha.

— Oi... dorminhoca.

Daphne piscou algumas vezes. Só então olhou para a cama, ao redor e estranhou o ambiente.

— Como eu vim parar aqui?

O duque sorriu. Era encantador quando ela ficava com aquela expressão confusa no rosto.

— Eu te trouxe no colo. — Como ela o encarou ainda sem entender, Simon decidiu explicar melhor. — Depois que você dormiu durante o chá com a sua mãe. Tsc-tsc... Que rude, Daff.

Ao ouvir isso, ela despertou de verdade e sentou na cama de maneira abrupta.

— Ah, meu Deus! Eu... E-eu fiz mesmo isso?!

Simon assentiu, divertindo-se com o embaraço da esposa. No fim, apiedou-se dela e disse:

— Não se preocupe, sua mãe pareceu compreender e até achar graça. Com certeza você já está perdoada.

Simon quase se sentiu um bobo por ter se preocupado antes. Daphne parecia bem. Até mais bonita e radiante, a pele com um brilho especial. Com certeza, ela só pegou no sono mais cedo porque eles foram dormir muito tarde e gastaram mais energia quando o sol começava a nascer.

Mas então, como se um diabinho quisesse acabar com sua paz momentânea, Simon viu de novo a cor sumir do rosto da esposa. E viu mais. Viu Daphne saltar da cama às pressas, tropeçar na barra do vestido enquanto levava uma das mãos à boca e correr em disparada à procura do urinol.

— Daphne?!

Simon foi atrás dela, a preocupação voltando com uma força que o esmagou por dentro.

— Você está bem?

Era a pergunta mais estúpida a se fazer e, no entanto, o duque de Hastings não pôde evitar.

Ele assustou-se um pouco com os ruídos que a esposa fazia enquanto vomitava e chegou a hesitar por um instante antes de entrar no banheiro com uma passada. Então, abaixou-se perto dela e afastou os cabelos castanhos do rosto suado dela.

Simon ficou atônito com o que viu. Ao invés de pálida, Daphne estava meio verde agora e parecia muito desamparada.

Pensou em perguntar se ela havia comido alguma coisa que não lhe caiu bem, porém desistiu. Duvidava que Daphne fosse conseguir responder qualquer coisa no estado em que se encontrava. Ou falar sobre comida.

Assim, Simon fez o que lhe pareceu certo. Ficou ao lado dela até Daphne colocar tudo para fora e lhe serviu bastante água quando ela pediu. Daphne limpou a boca várias vezes, sob o olhar perdido dele. Depois, Simon a conduziu de volta à cama.

— M-Melhor?

Ela assentiu e, para alívio de Simon, a cor realmente parecia estar voltando ao semblante dela.

— Você estava verde, Daff.

A duquesa sorriu sem jeito e deu de ombros.

— Acho que combina com os meus olhos, certo?

Simon teve a estranha sensação de que a esposa tentava desviar do assunto. Era um pouco orgulhosa, metida a estoica e, de certo, não estava gostando nenhum pouco de se sentir frágil perante ele.

O duque fez menção de sentar ao lado dela, pretendia convencê-la a receber um médico ainda naquele dia, porém teve que parar a poucos centímetros do plano, pois Daphne disparou um tanto afoita:

— Eu gostaria de um momento sozinha! — Forçou um sorriso. — Por favor...

Simon cruzou os braços e foi como se seus pés de súbito tivessem criado raízes no meio do tapete.

— Não até você me contar o que está acontecendo.

Daphne revirou os olhos. Simon ficou ultrajado. Era assim que ela agradecia pela preocupação?

— Simon, eu estou bem.

Ele arqueou uma sobrancelha com ar de sarcasmo.

— Acho que o urinol discordaria disso.

Daphne respirou fundo e tentou de outro jeito:

— Eu quis dizer que estou bem agora. Agradeço por ter ficado comigo, mas adoraria um momento sozinha.

Ela viu a boca do marido se abrir e teve absoluta certeza que ele perguntaria por quê. Então, foi mais rápida e levantou da cama. Apoiou as mãos no peito dele com carinho e reforçou do jeito mais suave que conseguiu:

— É só um momento. Confie em mim.

Simon fechou a boca. Não gostava da ideia de deixar a esposa sozinha naquele estado. Ela podia passar mal outra vez. Por outro lado, não queria irritá-la impondo sua presença.

Assim, aquiesceu com um meneio de cabeça e resmungou ainda contrariado:

— Se é o que deseja. — Olhou para Daphne e não pôde evitar o tom mais carinhoso depois. — Se precisar de alguma coisa, se sentir qualquer mal-estar...

— Eu mando chamá-lo na mesma hora, Simon.

— E eu chamarei o médico na mesma hora.

Ela deu tapinha no ombro dele e sorriu.

— Não será necessário.

Ele não ficou convencido, porém a deixou sozinha como era o desejo dela.

[...]

Tão logo Simon se foi, Daphne despencou sentada na cama e se pôs a refletir.

Antes da porta se fechar, a duquesa acreditava que pediu para ficar sozinha pois não queria fazer uma conta matemática na frente do marido. A conta do seu ciclo menstrual.

No entanto, agora que Simon não estava mais ali, percebeu que tinha mentido para si mesma. Porque não precisava fazer mais qualquer outro cálculo. Havia contado os dias justamente naquela manhã. Como vinha fazendo há vinte dias. E o resultado era sempre o mesmo. Suas regras estavam cada vez mais atrasadas.

Daphne já havia suposto que estava grávida uma vez, e o alarme fora falso. Agora, todavia, vinha sentindo muito sono e, apenas há alguns minutos, o terrível enjoo. Ela também se sentia diferente dessa vez. Sabia que era muito cedo para vislumbrar qualquer saliência na barriga, mas Daphne sabia, de algum jeito simplesmente sabia, que só podia estar...

— Grávida! Céus, eu estou mesmo grávida...

Levou a mão à boca, contendo um largo sorriso, mas o seu próprio coração sorria e não podia mais ser contido.

Daphne estava muito feliz, não tinha mais dúvidas de que havia uma criança crescendo em seu ventre, um bebê dela e de Simon! Era incrível! E, no entanto, havia pedido ao marido para sair porque... estava com medo de lhe dar a notícia.

Era verdade que o tempo em que Simon era taxativo sobre nunca ter filhos havia ficado para trás, porém Daphne não pôde deixar de se perguntar se isso significava que ele ficaria feliz com a novidade. Ele passou tantos anos sem se permitir cogitar um filho, que talvez ainda não estivesse pronto para o desafio da paternidade. E se Simon não ficasse feliz quando ela contasse, Daphne sabia que ficaria arrasada.

Respirou fundo, afastando tal pensamento, e lembrou a si mesma que, desde a reconciliação há dois meses, Simon não vinha fazendo nada, absolutamente nada, para evitar uma concepção. Então, se ele não ficasse radiante, ao menos não ficaria surpreso ou tão infeliz. Ele sabia dos riscos de fazer amor com ela, oras!

Além disso, um filho seria um novo desafio para Daphne também. Ela precisava do apoio de Simon. E ele, certamente, precisava saber a verdade, agora que ela tinha certeza que não se tratava de alarme falso. Ele era o pai, afinal de contas.

Decidida, Daphne levantou da cama, arrumou-se e saiu em busca do marido, deixando qualquer receio para trás.

[...]

A caminho do estábulo, para onde ele havia ido segundo lhe informou o mordomo, ela ensaiou como contaria. E sentiu-se uma boba. Não precisava de meias palavras com Simon. Os dois se amavam, muito e profundamente, podiam conversar sobre qualquer assunto e ficavam bem à vontade um com o outro.

Além disso, as divergências sobre filhos eram passado. Daphne só precisava se concentrar no presente e ser ela mesma.

Avistou o marido em frente a uma das baias, acariciando a cabeça de um dos animais e alheio à proximidade da esposa.

Como num efeito cascata, os cavalariços que trabalhavam por ali, passaram por Daphne, cumprimentando-a respeitosamente e saíram para dar privacidade aos patrões.

Assim, foi impossível para Simon não perceber que tinha uma nova companhia.

Ele estreitou o olhar na direção dela e a voz soou grave:

— Você devia estar na cama.

Daphne parou diante do marido, com as mãos unidas na frente do vestido.

— Eu não estou doente.

— Ainda assim, um pouco de repouso não lhe fará mal.

Ela sorriu fraco.

— Eu descansei o bastante por hoje.

Simon analisou Daphne por um momento. Embora a aparência dela houvesse melhorado, ele não relaxou por completo. De qualquer forma, ficou contente que o momento sozinha tivesse sido breve mesmo. Ele tinha começado a se torturar, imaginando ter feito algo que a desagradou.

— Pretende sair? — Daphne perguntou de repente, ansiosa por alimentar a conversa.

O duque negou com a cabeça. Depois, pegou uma escova e passou a deslizá-la no pelo do robusto cavalo.

— Não ia conseguir me concentrar no escritório agora, então resolvi sair para respirar um pouco. — Simon parou e tornou a olhar para ela, meio desconfiado. — Espero que não esteja pensando em cavalgar, Daff. Mesmo que esteja se sentindo melhor agora, pode ser que...

— Eu adoraria cavalgar — ela o interrompeu, louca para contar de uma vez. — Acontece que não é mesmo recomendado no meu estado.

Daphne esperou que isso fosse o suficiente. Não era necessário rodeios com Simon, no entanto, uma charada lhe pareceu algo divertido. Em seu peito, o coração voltou a sorrir.

— Ah... Então você admite que está doente? Eu sabia!

Foi tudo o que Simon disse, numa mistura de apreensão e ar vitorioso.

Daphne cruzou os braços e franziu o cenho. Olhou para o marido como se, de repente, ele tivesse criado chifres.

— Você se formou mesmo em primeiro lugar em Oxford? Isso não deveria significar que é um homem inteligente?

Daphne venceu a curta distância entre eles, controlando uma súbita vontade de rir. Enquanto Simon a encarava com ar perdido, ela pegou a mão dele e trouxe-a para junto do ventre, prendendo-a ali ao colocar a própria mão sobre a dele.

Simon observou o gesto, seus dedos espalhados na barriga da esposa. Engoliu em seco e ergueu o olhar para ela. A cabeça fervilhava.

— Eu não estou doente, Simon — Daphne repetiu, com ternura, pelo o que sentiu ser a milésima vez. — Na verdade, é totalmente o oposto disso. Eu nunca me senti tão viva.

Simon manteve os olhos azul-claros cravados no rosto dela. Sua garganta de repente seca, enquanto os pensamentos giravam num vórtice e ele unia as peças finalmente.

Sentiu-se um estúpido por não ter entendido antes. Por nem sequer ter desconfiado. Mas o ciclo da mulher era tão irregular e Daphne não era boa em matemática, então talvez ela mesma tivesse demorado a descobrir.

— Daff?

Havia uma pergunta na maneira doce e urgente como o apelido escapou dos lábios dele. E Daphne viu os olhos de Simon brilharem com uma emoção intensa quando ela balançou a cabeça com veemência e afirmou num sussurro rápido:

— Sim.

O coração de Simon então disparou. O mundo ao redor pareceu congelar. Ele abriu a boca. E fechou logo depois, uma vez que não sabia o que dizer. Contudo, estava certo que não era uma manifestação da gagueira. Ele apenas estava... sem palavras.

Deve ter ficado muito tempo em silêncio, apenas olhando para Daphne e sentindo a mão ficar mais quente sobre o ventre dela, porque, em dado momento e visivelmente ansiosa, ela rompeu o silêncio:

— Assustado?

Simon piscou, reencontrou a própria voz e admitiu:

— Muito.

Era impossível não imaginar que talvez aquela criança, o filho deles, pudesse herdar sua dificuldade com a fala. No entanto, lembrou a si mesmo que se isso acontecesse, iria amá-lo do mesmo jeito e ajudá-lo no que fosse preciso. E não estaria sozinho nisso, teria a mulher que amava ao seu lado. Tudo daria certo.

Também havia a chance da criança ser como Daphne, e ele estar preocupado sem necessidade.

De qualquer jeito, seria uma criança muito especial e muito amada.

— Feliz?

Daphne parecia temerosa agora, e isso fez Simon se sentir um bruto. Claro que ela estava insegura, provavelmente recordando o histórico tumultuoso do casamento até chegarem ali e se perguntando se Simon estava bem com a novidade, interpretando errado a inércia dele.

Assim, Simon olhou para dentro de si mesmo e, apesar do medo, encontrou outra coisa também. Algo mais forte e mais importante. Ele queria ser pai. Não tinha percebido, até aquele momento, o quanto queria isso.

Emocionado, tocou o rosto da esposa com carinho, sorriu e lhe disse:

— Feliz não chega nem perto. Isso é... incrível, Daff. Nunca me senti tão vivo também. Nem tão esperançoso.

Os ombros dela relaxaram e um suspiro de alívio escapou. Um sorriso exuberante surgiu, ocupando metade do rosto dela, e o duque sentiu seu coração disparar mais uma vez.

— Mesmo?

Simon trouxe Daphne para mais perto, colando seus corpos de maneira calorosa e indecente. Não ligou, estavam sozinhos ali, eram marido e mulher e aquela era a casa deles. Em breve, o lar de uma terceira pessoa muito importante para os dois.

Com esse pensamento, tomou os lábios de Daphne para si num beijo que reunia todas as palavras que ele gostaria de dizer. Agradecendo com seu corpo por ela ter lutado por ele e o libertado do fantasma do pai. Agradecendo por Daphne tê-lo salvado da raiva e de si mesmo. Por ter lhe dado esperança ao entrar em seu caminho.

Simon moveu a língua com reverência, fazendo Daphne se derreter em seus braços e se agarrar mais a ele para não cair. Beijou-a com tudo o que tinha, para fazê-la entender o quanto ele estava feliz e o quanto confiava que seriam cada vez mais felizes.

Quando finalmente se deu por satisfeito, Simon afastou os lábios e observou, com orgulho masculino e um olhar diabólico, a esposa visivelmente zonza e arrebatada em seus braços.

Sem fôlego, tudo o que ela conseguiu dizer foi:

— Boa resposta... Vossa Graça...

Simon riu.

Daphne riu.

Como Lady Whistledown dissera certa vez, aquele era mesmo o casal mais apaixonado de Londres.


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