Trovoada escrita por Wi Fi


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Olá! Disse tudo nas notas da história: essa oneshot ignora tudo depois da temporada 4 parte A porque eu quis UASHAUSHASUH
A filha do Rollo aqui chama Adela, e não Celsa como na série.
Eu adoro o Rollo, ele é um dos meus personagens preferido na série, apesar de todas as merdas que ele fez. Essa oneshot é mais um character study sobre ele.
Espero que gostem!



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A chuva começou no meio da tarde, e não parara desde então. Rollo não sabia dizer o quão tarde era, uma vez que o céu estivera escuro com nuvens pesadas o dia todo, mas sabia que seus filhos, sua esposa e a maior parte dos habitantes do castelo estavam dormindo.

Ou era isso que ele achava.

Conforme os trovões altos e relâmpagos rápidos atravessavam o céu, o duque da Normandia assistia silenciosamente da sua mesa, em um dos vários salões do castelo. Alguns papéis haviam sido deixados para ele ler e estudar, relatórios de guerra e assuntos de estado, mas Rollo não estava com vontade de se debater com todos aqueles assuntos irritantes de Frankia.

Por outro lado, também não conseguia dormir. A imagem de Gisla deitada pacificamente ao seu lado, debaixo de cobertores quentes e macios, era tentadora, mas a trovoada o mantinha acordado. Fazia Rollo lembrar-se do mar, e como era empolgante e perigoso enfrentar uma tempestade quando procuravam algum lugar para saquear. As forças destrutivas da natureza eram tão assustadoras, mas tão bonitas.

Rollo também se lembrava da primeira vez que navegou para Oeste, para Inglaterra, e como todos achavam que Ragnar era um homem louco, que os deuses afundariam seu navio por os terem desafiado. Mas o navio – a obra prima de Floki – resistiu à tempestade, e todos viveram para contar a história.

Aquelas memórias vieram à mente de Rollo tão rápido quanto os relâmpagos corriam pelos céus, e ele se encontrou sorrindo para a chuva que caia, observando pela janela mais próxima. Foi quando percebeu que não estava sozinho.

Uma pequena sombra estava parada ao lado da porta, não mais que alguns passos de distância dele, parcialmente iluminada pela lareira acesa no lado oposto do cômodo. Rollo rapidamente reconheceu os cabelos escuros e cacheados, assim como o vestidinho delicado.

— Olá, Adela – ele disse, calmamente – Não deveria estar dormindo?

— O senhor devia estar dormindo também, papa! – respondeu sua filha, caminhando em sua direção com divertimento na voz.

— Bom, eu sou adulto. Eu escolho o que fazer. Por que está fora da cama?

Adela hesitou antes de responder. Então, ouviram um trovão, alto e ressonante, e a garotinha correu rapidamente para se esconder atrás das pernas do pai. Rollo entendeu o que acontecia e a pegou no colo.

— Está como medo dos raios e trovões, não está? – ele perguntou.

Ela assentiu e abraçou o pai, quando mais um som ensurdecedor rugiu pelos céus.

— Eu sou uma menina boba. Mamma disse que no castelo, nada pode nos machucar. Eu não devia ter medo – Adela murmurou – William e Marcellus não têm medo do trovão.

— Ah, mas eles têm medo de outras coisas, tenho certeza. Eu vi o Marcellus correr gritando de medo dos cães de guarda, depois que latiram para ele, e o William acha que o salão do trono é assombrado pelo fantasma de Carlos Magno.

Adela riu e brincou com a barba do pai, olhando-o com timidez.

— Papa, o senhor tinha medo do trovão quando era criança?

— Eu tinha, por algum tempo – Rollo confessou, passando uma mão pelos cabelos da filha – Mas eu tinha vergonha de admitir. Eu tinha um irmão mais novo, assim como William tem você e você tem o Marcellus. Eu queria que ele pensasse que eu era mais forte.

— Então o senhor não contou para ele que você tinha medo?

— Sim. Mas acho que ele sabia, de qualquer forma. Toda vez que eu ouvia um trovão, escondia-me no quarto e cobria os ouvidos.

— Como o senhor parou de ter medo do trovão, então?

Rollo pausou enquanto pensava numa resposta. Ele não falava sobre sua família – sua família pagã – e as crianças não sabiam muito sobre seu passado. Por que deveriam? Ele era seu pai, duque da Normandia, e isso era suficiente.

— Minha mãe me contava uma história, quando chovia. Ela dizia que os trovões eram apenas o som de um homem gigante batendo seu martelo, em sua forja, e os relâmpagos eram as faíscas que saíam do metal.

Era o mais próximo que ele poderia chegar da verdade. Os olhos grandes e castanhos da menina estavam cheios de curiosidade, e Rollo percebeu o quão perigoso aquilo podia ser.

Como estar de pé em um navio no meio de uma tempestade, era lindo, mas altamente destrutivo.

Ele queria poder sentar com os filhos perto da fogueira e contar histórias sobre seus deuses, como seus pais costumavam fazer com ele e Ragnar.

Quando era jovem e inconsequente, Rollo não pensava que seria pai, mas nas poucas ocasiões em que considerava o futuro com uma família, ele imaginava seus filhos como pequenas feras, caçando e treinando para serem guerreiros e damas de escudo. E depois de todos comerem e ficarem com sono, prontos para ir para a cama, ele lhes contaria sobre Jormungand, enrolada no mar, ou sobre a árvore que segurava os nove reinos, sobre Valhalla e Asgard.

Entretanto, o destino tinha um senso de humor sombrio, e agora ele era duque numa terra cristã. Para seus filhos, Thor, o homem gigante batendo seu martelo, não era ninguém. Valhallha não significava nada para eles – só acreditavam no Céu, no Deus único e seu filho. Rollo podia ter aceitado aquela fé para casar-se com Gisla e ganhar seu título de Duque, mas o cristianismo não significava nada para ele. Ele podia ir para a missa, ajoelhar e rezar, mas nunca esqueceria sua terra natal e seus deuses.

Rollo gostaria de acalmar Adela contando sobre Thor e seu martelo, mas se ele o fizesse e ela acabasse por contar a história para outra pessoa, poderia ser jogada em um convento e Rollo seria um pagão de novo. Ele não poderia arriscar. Talvez, quando ela fosse mais velha, ele explicasse tudo. Mas por agora, Thor era só o homem gigante na forja.

— O seu irmão tinha medo da tempestade também, papa? – perguntou Adela, e subitamente o ex-viking foi trazido de volta à vida real.

— Eu não sei, querida. Ele nunca me contou, porque achava que eu faria piada com ele. E para ser sincero, ele estava certo.

A menina ficou quieta por algum tempo, pensando. Era uma garota muito inteligente para a sua idade. Em mais de uma ocasião, Rollo viu Adela questionar seus tutores, ou responder-lhes com algo esperto, deixando-nos em busca de palavras para repreender sua rebeldia. Rollo não sabia com quem ela se parecia mais nesses momentos – ele, ou Gisla.

— Papa, eu não sabia que o senhor tinha um irmão – Adela disse, os olhos curiosos encarando os do pai – Por que nunca o conhecemos?

Rollo suspirou com cansaço. Ele voltou para sua cadeira, e agora Adela estava sentada sobre seus joelhos, rosto virado para o seu. Ele se perguntou se ela saberia que esse era um assunto proibido, e se só queria quebrar as regras de novo.

— Meu irmão vive longe, no Norte.

— No Nord-pas-de-Calais, no norte de Frankia?

— Mais ao norte. Em outro país, chamado Dinamarca.

— Di-na-mar-ca – Adela repetiu, assentindo – E como chama o seu irmão?

— O nome do meu irmão é Ragnar – Rollo respondeu, muito ciente de que aquela conversa estava chegando em um ponto complicado.

Não só sua filha estava aprendendo demais, como ele também começou a sentir um peso no peito. O peso da culpa.

— Ele tem filhos ou filhas? – Adela agora tinha um olhar sério, quase como se estivesse insultada – A mamãe não tem irmãos, então não temos primos para brincar. O tio Ra-gue-narre deve ter criancinhas para nos fazer companhia.

Rollo passou as mãos pelo rosto, tentando organizar seus pensamentos. Demorou para continuar a conversa, e era um assunto que ele nunca esperava discutir com seus filhos. Não devia contar sobre Ragnar ser tio deles, ou que eles tinham tanto sangue pagão em suas veias quanto sangue francês.

— Os filhos de Ragnar são adultos agora, embora fossem tão pequenos quanto você na última vez que os vi – Rollo respondeu. Ele frequentemente imaginava como seus sobrinhos mais novos estavam agora. Esperava que todos estivessem vivos – E temo que você nunca os irá conhecer, querida. Nem meu irmão nem meus sobrinhos virão para Frankia tão cedo.

— Por quê?

Deuses, as crianças nunca paravam de fazer perguntas. Com três deles correndo por aí, Rollo se questionava se ainda não havia ficado louco.

— Na última vez que Ragnar esteve aqui, nós batalhamos. Lutamos um contra o outro. Não somos mais amigos.

Ah, ele queria que fosse tão simples.

— Uma batalha? Uma batalha de verdade? – perguntou Adela.

— Sim, uma batalhar de verdade.

Ela assentiu e deitou no peito de Rollo mais uma vez, olhando pela janela. A chuva parecia diminuir agora, mas um trovão solitário apanhou Adela de surpresa, e ela deixou escapar um grito. Rollo podia apenas apertá-la em seus braços e sossegá-la.

— Eu disse, sou boba. Tenho medo mesmo estando com o senhor – Adela murmurou – Marcellus disse que é isso que as meninas fazem, temos medo o tempo todo.

— Ele está errado, sabia. Eu conheci mulheres mais corajosas que qualquer homem.

— Como quem?

— Sua mãe – Rollo respondeu, embora Gisla não tivesse sido a primeira pessoa a passar por sua mente – Quando eu a conheci, ela estava no meio de uma batalha, gritando para os homens lutarem e proteger Frankia. Foi quando me apaixonei por ela.

— Foi a mesma batalha em que lutou contra o tio Ra-gue-narre?

Aí estava. Adela era esperta demais para seu próprio bem.

— Não. Foi outra batalha, quando cheguei em Frankia. Eu era uma pessoa muito diferente – Rollo respondeu, devagar – Mas isso não importa agora. Eu sou um bom homem hoje porque seu avô me deixou virar um franco.

— Ah, então o senhor não nasceu em Frankia, papa? É por isso que o senhor fala engraçado às vezes?

— Exatamente – Rollo sorriu – Eu nasci na Dinamarca, assim como meu irmão.

— O senhor sente falta da Dinamarca, papa?

Mais um peso foi somado ao peito de Rollo. Ele sentia falta de casa, terrivelmente. Sentia falta do hidromel, das músicas, da luta e dos gritos, ele sentia falta de seus amigos e sentia falta de Kattegat. Acima de tudo, Rollo sentia falta de sua família. Björn fora como um filho para ele, a morte de Gyda ainda era uma memória dolorosa, e Rollo gostaria de ver seus outros sobrinhos crescerem e se tornarem guerreiros também.

Rollo sentia falta das mulheres corajosas que tinham sido suas amigas. Aslaug, que usava sua realeza com orgulho e honra, Lagertha, a brava dama de escudo que ele nunca deixou de amar, e Siggy, que merecera um amor do que o dele, e acima de tudo, merecera uma vida melhor.

E é claro que ele sentia falta de Ragnar. Como não? Eram irmãos, lutaram lado a lado a vida toda. Alguns dias, Rollo acordava e se odiava por tê-lo traído mais uma vez. Ele desejava ter deixado Björn ficar em seu lugar em Frankia, e desejava não ser um traidor.

Mas então, Rollo via seus filhos, a cada dia mais fortes e orgulhosos. Ele via Gisla, com toda sua beleza, todo seu amor, e toda sua inteligência. Ela não era uma dama de escudo, mas não deixava de ser uma guerreira. E era por isso que Rollo não podia abandoná-la, nunca traí-la. Ele via o quão longe havia chegado – duque, numa terra poderosa, como ele sempre sonhara. Era suficiente para fazer Rollo se contentar com sua situação.

Ele deve ter ficado quieto por tempo demais, e provavelmente houve alguma mudança em sua expressão, porque então Adela perguntou:

— Papa? O senhor está me ouvindo?

— Estou, querida, perdão. Eu estou longe da Dinamarca há muito tempo – ele respondeu. Adela olhou-o nos olhos, preocupadas.

— Eu te deixei triste, papa? Me desculpe.

— Está tudo bem, Adela. Mas acho que nós dois temos que ir dormir agora. A tempestade quase acabou, e você mal notou os trovões.

***

Rollo levou Adela para o quarto dela, e a colocou na cama. Ele beijou sua testa e estava a meio caminho apra a porta quando Adela o chamou timidamente.

— O que foi, querida?

— O senhor disse que lutou em batalhas.

— Em muitas, sim.

— Marcellus e William vão para batalhas também? – a voz dela era quase um sussurro e ela tinha lágrimas nos olhos.

— Eu não sei, Adela – Rollo respondeu com um suspiro – Talvez vão. William é o próximo rei de Frankia. Ele tem que defender o reino. Talvez eles tenham que ir para a guerra, algum dia.

Adela permaneceu de coração partido com o pensamento dos irmãos lutando, e escondeu o rosto atrás do cobertor. Rollo podia ouvir seu choro, então sentou ao seu lado de novo, e tirou o cobertor do rosto dela.

— Adela, olha para mim. Você não tem que se preocupar com isso agora. Vocês são apenas crianças, e crianças não vão para batalhas. Seus irmãos estão seguros. Quando a hora chegar, tenho certeza que vão estar preparados o suficiente para enfrentar qualquer perigo que seja. Não vão estar sozinhos, terão muitos soldados ao seu lado – Rollo disse – E se alguém tentar ameaçar a vida de algum dos meus filhos, aqui em Paris ou em qualquer lugar do mundo, vão ter que me enfrentar primeiro, e eu terei a sua cabeça numa lança. Nunca vou deixar meus filhos ficarem em perigo. Isso é uma promessa.

A menininha ouviu atentamente, e parecia acalmar-se com a resposta do pai. Ela lhe deu um último abraço e deitou de novo na cama. Com seus olhos fechados e um sorrisinho nos lábios, Rollo pensou que sua filha parecia um pouco com um anjo.


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